Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 01122/20.7BEPRT-1 |
Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
Data do Acordão: | 07/14/2023 |
Tribunal: | TAF do Porto |
Relator: | Rogério Paulo da Costa Martins |
Descritores: | PEDIDO DE SUBSTITUIÇÃO DE PATRONO; PEDIDO DE ESCUSA PELO PATRONO; INTERRUPÇÃO DE PRAZO EM CURSO; N.º2 DO ARTIGO 32.º E N.º2 DO ARTIGO 34º DA LEI 34/2004, DE 29.07. |
Sumário: | 1. Do confronto entre o disposto no n.º2 do artigo 32.º da Lei 34/2004, de 29.07 (Lei de acesso ao direito e aos tribunais), relativo à substituição do patrono, com o disposto no n.º2 do artigo 34.º do mesmo diploma, relativo ao pedido de escusa do patrono, forçoso é concluir que a interrupção de prazo em curso só ocorre depois de deferido o pedido de substituição, na hipótese de pedido de substituição, ao contrário do que sucede com o pedido de escusa em que a interrupção de prazo em curso ocorre logo que é apresentado no processo o pedido de escusa. 2. Caso a disciplina fosse a mesma, ou seja, a interrupção de prazo em curso ocorresse assim que fosse dada a informação no processo de ter sido feito o pedido de substituição do patrono ou fosse feito o pedido de escusa, então a existência de dois preceitos distintos para as duas situações não teria qualquer sentido útil. 3. Esta diferença de regime tem, de resto, uma justificação objectiva e lógica: no caso de pedido de escusa existe, pressupõe-se, uma razão ligada ao patrono que o impede, na sua perspectiva, de defender os interesses do patrocinado; faz sentido que qualquer prazo em curso seja de imediato interrompido assim que é apresentado no processo o pedido de escusa para acautelar os interesses do patrocinado; já o pedido de substituição é da iniciativa do patrocinado; não é da iniciativa do patrono, o qual, enquanto não for deferido o pedido de substituição, mantém as suas obrigações de patrocínio – n.º 2 do artigo 32º e artigo 35º da Lei 34/2004, de 29.07. 4. Como o patrocinado continua a ter patrono enquanto este não for substituído não se pode falar em violação do direito de acesso aos tribunais ou do direito à tutela jurisdicional efectiva - artigo 20.º da Constituição da Constituição da República Portuguesa.* * Sumário elaborado pelo relator (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
Votação: | Unanimidade |
Meio Processual: | Acção Administrativa Comum |
Decisão: | Indeferir a reclamação. |
Aditamento: |
Parecer Ministério Publico: |
1 |
Decisão Texto Integral: | EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: «AA» veio apresentar RECLAMAÇÃO do despacho de 06.06.2023, pelo qual foi rejeitado, por extemporâneo, o recurso interposto da sentença de 09.02.2023, que julgou totalmente improcedente a acção administrativa que interpôs contra a Ordem dos Advogados para a anulação dos despachos de 17.12.2019 e 14.01.2020 do Conselho Regional ... da Ordem dos Advogados que indeferiram os pedidos de substituição de patronos oficiosos nomeados e, bem assim, para a condenação da Ré a compensar o Autor pelos danos morais sofridos pelo impugnante com a constante demora em obter satisfação para o seu legítimo direito de apoio judiciário em quantia não inferior a cinco mil euros. Invocou para tanto, em síntese, que o despacho reclamado viola do n.° 2 do artigo 34° e o artigo 32° da Lei 34/2004, artigo 11° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e artigo 20° da Constituição da República Portuguesa. * Cumpre decidir já que nada a tal obsta. * I - Factos com relevo: 1. Por sentença de 09.02.2023, foi julgada totalmente improcedente a acção administrativa que o ora Reclamante interpôs contra a Ordem dos Advogados para a anulação dos despachos de 17.12.2019 e 14.01.2020 do Conselho Regional ... da Ordem dos Advogados que indeferiram os pedidos de substituição de patronos oficiosos nomeados e, bem assim, para a condenação da Ré a compensar o Autor pelos danos morais sofridos pelo impugnante com a constante demora em obter satisfação para o seu legítimo direito de apoio judiciário em quantia não inferior a cinco mil euros – página 1296 do processo principal. 2. Por ofício eletrónico de 09.02.2023 foi a patrona do ora Reclamante notificada desta sentença – página 1321 do processo principal. 3. Em 15.03.2023 o ora Reclamante veio informar os autos que nessa mesma data tinha requerido a substituição do patrono – página 1325 do processos principal. 4. O pedido de substituição de patrono, acabado de referir, foi deferido pela Ordem dos Advogados em 24.03.2023 - páginas 1326-1329 do processo principal. 5. Em 02.06.2023 o ora Reclamante veio apresentar recurso da sentença de 09.02.2023 do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto – páginas 1361-1372 do processo principal. 6. Com a data de 05.06.2023 foi proferido o despacho ora reclamado, com este teor, na parte relevante (ver certidão a instruir a presente reclamação e página 1375 do processo principal): “(…) Requerimento de fls. 1361-1372 do SITAF A sentença ora recorrida foi objecto de notificação electrónica elaborada no dia 09.02.2023, pelo que, levando-se em consideração a presunção prevista no artigo 248.º do CPC, o prazo de interposição de recurso previsto no n.º 1 do artigo 144.º do CPTA terminava às 23h59m de 15.03.2023. E a verdade é que nesse mesmo dia o Autor apresentou pedido de substituição da sua defensora oficiosa. Todavia, nos casos de substituição de defensor oficioso, a interrupção do prazo que se mostre em curso apenas ocorre após o deferimento do pedido de substituição, nos termos do n.º 2 do artigo 34.º da Lei n.º 34/2004, de 29/07. Isto, porque, conforme se disse, entre vários outros, no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14.03.2023, processo n.º 982/22.1T8SRE-A.C1, “não obstante o pedido de substituição, o patrono nomeado permanece no cargo/função, com os inerentes deveres, até que haja decisão que determine a sua substituição, altura em que a sua cessação na função coincide com o investimento/nomeação do novo patrono. Como a parte/beneficiário não deixa de ter patrono enquanto o prazo corre, posto o patrono originário somente cessar a função com a nomeação do patrono de substituição, não resulta comprometido o direito de acesso aos tribunais e de defesa na ação judicial, nem o direito à tutela jurisdicional efetiva e a um processo justo e equitativo (cfr. art.º 20.º da Constituição), visto que não há hiato no patrocínio decorrente do apoio judiciário” [acessível em www.dgsi.pt]. Ora, no caso dos autos, conforme resulta dos ofícios de fls. 1326-1329 do SITAF, o pedido de substituição que o Autor apresentou na presente acção apenas foi decidido (deferido) pela Ordem dos Advogados em 24.03.2023. O que significa que até então o prazo de interposição se não havia interrompido, e assim, que este se transcorreu plenamente no dia 15.03.2023. Tanto basta, pois, para que se conclua pela intempestividade do requerimento de interposição de recurso ora em análise. * Termos em que se indefere, por extemporaneidade, o requerimento de interposição de recurso ora em análise . Condena-se o Autor no pagamento das custas processuais, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que goza.” * II - Enquadramento jurídico: O Reclamante insurgiu-se contra o despacho que não admitiu o seu recurso, acabado de transcrever, nestes termos: “(…) 1° A presente Reclamação do Douto Despacho de fls..., que indeferiu o Requerimento de Interposição de Recurso, fundamentando o mesmo por extemporaneidade. De forma sucinta: “A sentença ora recorrida foi objecto de notificação electrónica elaborada no dia 09.02.2023, pelo que, levando-se em consideração a presunção prevista no artigo 248.° do CPC, o prazo de interposição de recurso previsto no n.° 1 do artigo 144.° do CPTA terminava às 23h59m de 15.03.2023. E a verdade é que nesse mesmo dia o Autor apresentou pedido de substituição da sua defensora oficiosa. Todavia, nos casos de substituição de defensor oficioso, a interrupção do prazo que se mostre em curso apenas ocorre após o deferimento do pedido de substituição, nos termos do n.° 2 do artigo 34.° da Lei n.° 34/2004, de 29/07.” 2° Ora, salvo o devido respeito, que é muito, o Autor tem diferente opinião. “O artigo 34 da Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho menciona que “O patrono nomeado pode pedir escusa, mediante requerimento dirigido à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores, alegando os respectivos motivos.” Aditando o n.° 2 que “O pedido de escusa, formulado nos termos do número anterior e apresentado na pendência do processo, interrompe o prazo que estiver em curso, com a junção dos respectivos autos de documento comprovativo do referido pedido, aplicando-se o disposto no n.° 5 do artigo 24.°” - In, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo n.° 2561/22.4BEPRT , Recurso Jurisdicional – Urgente- 24/3/2023 O recorrente comunicou ao Tribunal que tinha solicitado a substituição de patrono, dentro do prazo legal. Para efeito de interrupção do prazo, o pedido de escusa/ pedido de substituição patrono, tem de ser comunicado ao processo, a sua junção tem como consequência, a interrupção do prazo. “O recorrente está a salvaguardar o seu direito constitucional de acesso à justiça, cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 28-09-2022, ao ser o próprio a comunicar tal pedido de substituição, e dado que se aplicam as mesmas regras do pedido de escusa, o prazo deveria ter sido interrompido.” - In, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo n.° 2561/22.4BEPRT, Recurso Jurisdicional – Urgente-24/3/2023 Face ao exposto o despacho recorrido viola do n.° 2 do artigo 34° e o artigo 32° da Lei 34/2004, artigo 11° do CPTA e artigo 20° da CRP. Nestes termos e nos demais de direito invocados e aplicáveis e pelo que será doutamente suprido por Vª EXA., deverá dar-se provimento à Reclamação apresentada, e consequentemente, ser proferida Decisão que revogue o douto Despacho proferido e admita o Recurso interposto, para todos os efeitos e consequências legais. (…)” Mas sem qualquer razão. Dispõe o artigo 32.º da Lei 34/2004, de 29.07 (Lei de acesso ao direito e aos tribunais), sob a epígrafe “Substituição do patrono”: “1 - O beneficiário do apoio judiciário pode, em qualquer processo, requerer à Ordem dos Advogados a substituição do patrono nomeado, fundamentando o seu pedido. 2 - Deferido o pedido de substituição, aplicam-se, com as devidas adaptações, os termos dos artigos 34..º e seguintes.” Por seu turno dispõe o artigo 34.º do mesmo diploma sob a epígrafe “Pedido de escusa”: “1 - O patrono nomeado pode pedir escusa, mediante requerimento dirigido ao presidente do conselho distrital da Ordem dos Advogados ou ao presidente da secção da Câmara dos Solicitadores, no qual se contenha a alegação dos motivos da escusa. 2 - O pedido de escusa, formulado nos termos do número anterior e apresentado na pendência do processo, interrompe o prazo que estiver em curso, com a junção dos respectivos autos de documento comprovativo do referido pedido, aplicando-se o disposto no n.º 5 do artigo 24.º (…)” Ora, desde logo, pela existência destes dois preceitos, distintos, se conclui, ao contrário do que pretende o Reclamante, que o pedido de substituição de patrono tem uma disciplina legal distinta da do pedido de escusa, caso contrário o segundo preceito seria uma mera redundância, não teria qualquer sentido útil. E, na verdade, a interrupção do prazo em curso, neste caso para interposição de recurso da sentença, nos termos previstos no n.º 2 do citado artigo 34.º da Lei 34/2004, de 29.07, para o caso de pedido de escusa do patrono, só pode ocorrer depois de deferido o pedido de substituição, como expressa e inequivocamente dispõe o n.º do artigo 32º do mesmo diploma para o caso de pedido de substituição de patrono. O que faz todo o sentido. No caso de pedido de escusa existe, pressupõe-se, uma razão ligada ao patrono que o impede, na sua perspectiva, de defender os interesses do patrocinado. Faz sentido que qualquer prazo em curso seja de imediato interrompido assim que é apresentado no processo o pedido de escusa, para acautelar os interesses do patrocinado. Já o pedido de substituição é da iniciativa do patrocinado. Não é da iniciativa do patrono, o qual, enquanto não for deferido o pedido de substituição, mantém as suas obrigações de patrocínio – n.º 2 do artigo 32º e artigo 35º da Lei 34/2004, de 29.07. Como o patrocinado continua a ter patrono enquanto este não for substituído não se pode falar em violação do direito de acesso aos tribunais ou do direito à tutela jurisdicional efectiva - artigo 20.º da Constituição da Constituição da República Portuguesa, Em suma, o despacho reclamado não violou, antes respeitou, as normas invocadas na reclamação. Quanto à citação que o Reclamante faz do acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 24.03.2023, no processo n.° 2561/22.4 PRT, é uma falsa citação porque este trecho pertence às alegações de recurso, transcritas no acórdão, e não à fundamentação do acórdão. Termos em que se indefere a reclamação, mantendo o despacho de rejeição do recurso porque extemporâneo. * IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em INDEFERIR A RECLAMAÇÃO do despacho que não admitiu o recurso. Custas pelo Reclamante, sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido. Porto, 14.07.2023 Rogério Martins Paulo Ferreira de Magalhães Helena Maria Mesquita Ribeiro |