Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03012/13.0BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/30/2014
Tribunal:TAF do Porto
Relator:José Vital Brito Lopes
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR A FAVOR DO CONTRIBUINTE.
REQUISITOS DO ART.º147.º, N.º6, DO CPPT.
Sumário:1. O decretamento das providências cautelares encontra-se dependente da verificação de três condições essenciais: o “periculum in mora”(fundado receio de que quando o processo principal chegue ao fim a decisão nele proferida se torne inútil por virtude de circunstâncias entretanto ocorridas na pendência desse processo principal); o “fumus bonis juris” (probabilidade séria de existência do direito); e, não ser o prejuízo resultante da providência requerida superior ao que com ele se pretende evitar;
2. É de indeferir a providência cautelar quando o requerente não alegue factos concretos que permitam ao tribunal perspectivar uma situação de prejuízo irreparável, para próprio requerente, decorrente da procedência do processo principal.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Autoridade Tributária e Aduaneira
Recorrido 1:N..., SA
Decisão:Concedido provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO NORTE


1 – RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Director de Finanças do Porto, recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a providência cautelar intentada ao abrigo do disposto no art.º147.º, n.º6, do CPPT com todas as consequências legais, designadamente, abster-se a Administração tributária de proceder a notificações a realizar à L… através da N…, S.A.

Com a interposição do recurso, apresentou alegações e formulou as seguintes «Conclusões:

A. A douta sentença recorrida, considerou verificados os pressupostos de que depende a admissibilidade da providência cautelar a favor do contribuinte prevista no art. 147º, nº 6 do CPPT e adequada a presente providência cautelar à pretensão formulada pela Requerente – tendo em conta “o prejuízo irreparável que poderá surgir na esfera jurídica da autora, caso esta situação se mantenha no tempo” e que a presente providência “é a forma de obviar à sua manutenção”27, dando procedência à acção, determinando dever “abster-se a Administração Tributária de proceder a notificações a realizar à L… através da N…, com o que o Director de Finanças do Porto, não pode conformar-se, pelas três ordens de razões, de seguida resumidas por sistematicidade na exposição.
[27 Citamos a douta sentença recorrida, página 12 da mesma.
28 Citamos a douta sentença recorrida, página 19 da mesma.
29 Citamos a douta decisão recorrida, página 19 da mesma, correspondendo o sublinhado ao texto original citado].
B. A sentença como conclusão da fundamentação de direito, estabelece “Pelo exposto, julgo procedente a presente providência cautelar, com todas as consequências legais, designadamente, abster-se a Administração Tributária de proceder a notificações a realizar à L… através da N…, S.A.”29, determinando a abstenção da prática de actos a entidade que não se identifica, em concreto, com a aquela que integra a relação jurídica processual estabelecida na presente acção cautelar – Director de Finanças do Porto – encontrando-se viciada de nulidade, porque se revela ambígua e obscura, o que a torna ininteligível, para efeitos do disposto no art. 615º, nº 1, alínea c), última parte, do CPC ou, assim não se considerando, porque condena em objecto diverso do pedido, para efeitos do disposto no art. 615º, nº 1, alínea e), última parte;
C. Sem conceder, a legitimidade processual passiva consiste numa qualidade posicional da parte face à causa, qualidade essa, no que respeita ao réu, que se verifica quando a procedência lhe venha a causar (para si não para outrem) uma desvantagem ou consequência – no segmento decisório “a desvantagem” ou condenação vem reportada a outrem (a “Administração Tributária”), que não tem aquela qualidade posicional face ao litígio – o que determina que a sentença se encontra viciada por erro de julgamento.

D. Por último, ainda sem conceder, a decisão encontra-se viciada por erro nos pressupostos de facto considerados, o que infirma as conclusões de facto e de direito alcançadas com base nos mesmos, acarretando erro de julgamento no que respeita à verificação dos requisitos exigidos para a admissão da providência, nos termos do disposto no art. 147º, nº 6 do CPPT.
E. Por se mostrar pertinente, para a análise do aspecto especificado na conclusão B. destas alegações, importa considerar a seguinte factualidade:
E.1. Por despacho datado de 23.12.2013, foi ordenada a notificação à Requerente, no sentido de que, “não se mostrando cumpridos de forma cabal os requisitos do art. 114º, nº 3 do CPTA, mormente a identificação, em concreto, de quem é visado dentro da Administração Tributária (art. 114º, nº 3, alínea c) do CPTA)”, conforme teor da decisão de fls. 48 a 52 dos autos, parte final.
E.2. A requerida, veio aos autos, conforme teor de fls. 56 e 57 dos mesmos, especificar, em cumprimento do ordenado, o seguinte “tendo sido notificada para identificar a entidade demandada (…), vem informar que a presente providência cautelar é intentada contra a Direcção de Finanças do Porto (Serviços de Inspecção Tributária)”.
E.3. No mesmo requerimento, a Requerente solicita o prosseguimento dos autos, “concluindo-se nos precisos termos do pedido formulado no requerimento inicial” (cfr. fls. 57 dos autos).
E.4. O despacho de admissão liminar da presente providência cautelar, proferido em 03.01.2014, ordena a citação da “Entidade Requerida identificada a fls. 57”, para deduzir oposição, conforme teor de fls. 58 dos autos.
E.5. O Director de Finanças do Porto apresentou oposição à providência cautelar, na qualidade de entidade Requerida, em 20.01.2014, conforme fls. 61 a 77 dos autos.
F. No pedido formulado no requerimento inicial, corrigido em função do requerimento de relevação do lapso que procedeu à especificação, em concreto, da entidade Requerida de fls. 57 dos autos, onde se lia “ser ordenado à Administração Tributária se abstenha de proceder a quaisquer notificações dirigidas à sociedade L... INCORPORATION na morada e/ou pessoa da aqui requerente” deve ler-se “ser ordenado à Direcção de Finanças do Porto se abstenha de proceder a quaisquer notificações dirigidas à sociedade L... INCORPORATION na morada e/ou pessoa da aqui requerente”.
G. Analisado o requerimento inicial da providência cautelar em conjugação com o requerimento de fls. 57 dos autos e considerando uma interpretação contextual, plausível e congruente30, conclui-se no sentido de que a “providência requerida”31 a final, peticiona a abstenção da prática de actos integrantes da esfera de competência e de actuação da concreta entidade requerida, na pessoa do Director de Finanças do Porto, uma vez que a sentença apenas poderá produzir efeitos vinculativos entre as partes da relação jurídica processual estabelecida, na interposição da acção.
[30 Ou seja, uma interpretação que permita afastar a ineptidão da petição inicial, privilegiando uma interpretação que permita ao Tribunal, mantendo-se, com abertura total à detecção da vontade de quem vem ao Tribunal apresentar a sua pretensão, desde que se consiga perceber com segurança o que o requerente pretende e sem que se mostrem coarctados os direitos de defesa da entidade requerida, por ter percebido a vontade do requerente, sendo contra esta que dirigiu a oposição, limite imposto pelo princípio da proibição da indefesa que é corolário do princípio da tutela jurisdicional efectiva, cfr art. 20º, nº 1 da CRP. Neste sentido veja-se Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo, Anotado, Áreas Editora, 6ª Edição, 2011, Volume II, paginas 81 e 82.
31 Para efeitos de integração do pressuposto identificação da “providência requerida” exigido na parte final do nº 6 do art. 147º do CPPT.
32 Hipótese que a lei processual actual não contempla.
33 Citamos o Acórdão proferido pelo STA de 14.01.2010, no processo 040673A, disponível em www.dgsi.pt.
34 Resultante da fusão da Direcção-Geral de Impostos, da Direcção-Geral das Alfandegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo e da Direcção-Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros].
H. A sentença revela-se ambígua e obscura, o que a torna ininteligível, e por isso ferida de nulidade, nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, alínea c), última parte, do CPC, porque «Como ensina ALBERTO DOS REIS, in Código do Processo Civil Anotado, V, p. 151, “Se a sentença contiver alguma obscuridade ou ambiguidade, pode pedir-se a sua aclaração32. A sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso não se sabe o que o juiz quis dizer; no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que, em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é susceptível de duas interpretações diversas, não se sabe ao certo, qual o pensamento do juiz”»33.
I. De acordo com o DL 118/2011, de 15 de Dezembro, foi aprovada a estrutura orgânica da Autoridade Tributária e Aduaneira34, sendo que o nº 1 do artigo 1º deste diploma, estabelece que “A Autoridade Tributária e Aduaneira, abreviadamente designada por AT, é um serviço da administração directa do Estado dotado de autonomia Administrativa”, especificando o nº 2 que “A AT dispõe ainda de unidades orgânicas desconcentradas de âmbito regional, designadas por direcções de finanças e alfandegas, e de âmbito local, designadas por serviços de finanças, delegações e postos aduaneiros”.
J. Constitui prática corrente, na expressão oral, como na expressão escrita, nos Tribunais Administrativos e Fiscais, designar a Autoridade Tributária e Aduaneira por “AT” da forma abreviada, através da sigla definida no diploma supra citado, assim como constitui prática corrente, apesar do estabelecido na lei, designar a Autoridade Tributária e Aduaneira, por “Administração Tributária”, escrito por extenso (em vez da utilização da sigla “AT”).
K. Considerandos estes que sustentam o motivo pelo qual ficamos sem perceber a intenção do juiz, no segmento decisório, em que determina a abstenção da prática de actos de notificação, quando utilizou a expressão “Administração Tributária”, se designa a unidade desconcentrada de âmbito regional que é a Direcção de Finanças do Porto, Requerida nestes autos, a qual integra a “AT”, ou, se designa a Administração Tributária identificada como “AT”, serviço da administração directa do Estado referido no art. 1º, nº 1 do DL 118/2011, de 15 de Dezembro.
L. A “Administração Tributária”, não teve intervenção processual na mesma acção, pelo que não poderia a sentença condená-la a abster-se da prática de actos de notificação, não obstante, por ausência de determinação da entidade que, em concreto, vai condenada dentro da Administração Tributária, o que resulta do segmento decisório é que a condenação de abstenção da prática de actos de notificação vai dirigida à “Administração Tributária”, por nós entendida como a “AT”, ou seja Autoridade Tributária e Aduaneira.
M. Sem conceder, assim não se considerando, o mesmo segmento decisório, por ter determinado como nos parágrafos anteriores se transcreveu, determina a nulidade da sentença, porque condena em objecto diverso do pedido, para efeitos do disposto no art. 615º, nº 1, alínea e), última parte, do CPC, na medida em que o juiz está limitado pelos pedidos das partes e não pode deles extravasar – a decisão não pode pronunciar-se sobre mais do que foi pedido ou sobre coisa diversa da que foi pedida, não se admitindo que ultrapasse em quantidade ou qualidade os limites do pedido formulado.
N. Sob este prisma, com base no exposto na conclusão F., a condenação da “Administração Tributária” à abstenção da prática de actos de notificação extravasa os limites do pedido formulado, porque nesta condenação estão incluídos actos que não são apenas os susceptíveis de serem emitidos pela entidade requerida (Direcção de Finanças do Porto) – abarcando actos (de notificação emitidos pela “Administração Tributária”) que não se integram dentro dos limites do pedido, em termos de qualidade.
O. No que concerne ao segundo dos aspectos questionados nestas alegações de recurso, levado à conclusão C., a legitimidade do réu afere-se pelo “prejuízo” que da procedência advém, existindo legitimidade do réu sempre que se afigure que tal procedência lhe venha a causar (para si não para outrem) uma desvantagem, devendo o interesse deverá ser directo, não meramente reflexo ou indirecto, sendo necessário que as partes sejam os sujeitos da própria relação jurídica litigiosa35.
[35 Cfr. J. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume I, página 84.
36 Cfr. J. Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, volume I, página 74.
37 Cfr. António Montalvão Machado e Paulo Pimenta, in O Novo Processo Civil, 11ª Edição, Almedina, 2009, página 78. ote-se que desde 1995 se encontra superada a querela anteriormente existente – se era a relação jurídica tal como configurada pelo autor na proposição da acção se aquela que se viesse a apurar como real].
P. Esta qualidade posicional da parte face ao litigio36 é aferida segundo a relação tal como ela vem configurada pelo autor na petição inicial37, pelo que, face à qualidade posicional da Direcção de Finanças do Porto relativamente à causa, a procedência deveria impor a si (não a outrem) uma “desvantagem” ou consequência – no segmento decisório em que a consequência ou condenação vem reportada a outrem (a “Administração Tributária”), que não tem aquela qualidade posicional face ao litígio – a sentença encontra-se viciada por erro de julgamento.
Q. Prosseguindo para a abordagem do erro de julgamento incorrido, terceiro dos aspectos visados neste recurso, focado na conclusão D., importa considerar preliminarmente os factos que ficaram especificados em concretos dos pontos 3.A.1 a 3.A.15 destas alegações de recurso, parte deles não relevados na factualidade fixada na decisão recorrida, quando deveriam tê-lo sido, por se mostrarem pertinentes para as soluções de direito tendo em consideração as posições assumidas pelas partes no requerimento inicial e oposição e ainda os elementos documentais integrantes dos autos.
R. Com base nos factos supra mencionados e no teor dos documentos ali identificados que se encontram juntos aos autos, é possível extrair as seguintes conclusões de facto:
R.1. Foi oficiosamente inscrita no registo de contribuintes a entidade designada por L... Incorporation, à qual foi atribuído o número de identificação de contribuinte 7…e atribuído o domicílio na Av…., 4450-012, Matosinhos, tendo como tipo de sujeito passivo estabelecimento estável (entidade doravante designada L... estabelecimento estável em PT), a qual constitui estabelecimento estável em Portugal da L... Incorporated, com residência na República do Panamá, Edifício…, registada no Registo Comercial sob o nº 3…, doravante referida como L... Panamá (pontos “II.3.1. Identificação da Entidade” e “II.4. Enquadramento do Sujeito Passivo” integrantes do RIT, a fls. 103 verso dos autos).
R.2. A L... estabelecimento estável em PT, nif 7…, constitui a entidade que foi objecto da acção inspectiva credenciada pelas OI 201304909 e OI201304908 (cfr. notificações de aviso prévio de realização de acção inspectiva de fls. 87, 88, 92 e 93, despachos que ordenam as ordens de serviço externas com os números OI 201304909 e OI201304908 de fls. 94 e 95, certidões de diligência negativa e notas de diligência de fls. 96 a 99 e frontispício de fls. 103 e pontos II.3.1. a II.4 do RIT).
R.3. A AT efectuou as notificações relativas ao procedimento inspectivo indicado no ponto anterior dirigidas à N…, SA, na qualidade de “ Representante Legal de L…”, na morada Rua…, Matosinhos.
R.4. Relativamente aos anos de 2009 e 2010, o projecto do RIT especifica no ponto “II.4. Enquadramento do Sujeito Passivo” que a N…, SA, assume a qualidade de representante no território nacional da L… estabelecimento estável em Portugal da L… e os factos patentes dos documentos recolhidos que lhe permitiram concluir pela existência de estabelecimento estável da L… Panamá (fls. 5 a 10 e 14 a 18 do RIT), aos quais acrescem (de fls. 10 a 13 do RIT), as considerações efectuadas na decisão do Tribunal Arbitral para considerar como provada a “existência de um estabelecimento estável da sociedade panamiana”38, pelo que não se tratou de impor a um sujeito que não foi parte naquela acção os efeitos da decisão citada, mas de assumir no RIT como válidos para efeitos da acção inspectiva e correcções operadas aspectos ali integrados.
[38 Processo Arbitral n.º 01/2013-T, Decisão Arbitral, ponto C.2.2., página 23].
S. Tendo em consideração os factos supra, assim como as conclusões de facto que dos mesmos é possível extrair, as conclusões de facto exaradas na sentença recorrida encontram-se influenciadas por erro nos pressupostos de facto, especificamente, as que se referem, constantes da página 11 da mesma, não podendo manter-se, designadamente “a Requerente vem sendo notificada de todos os actos relativos a uma acção de inspecção tributária de que foi alvo uma sociedade terceira, a L... Incorporation, a qual tem a sua sede no Panamá” e “não se compreende como é que a Administração Tributária vem notificando uma sociedade terceira face àquela que vem sendo objecto de inspecção, de liquidações e de projectos de relatórios de inspecção tributária, quando bem sabe que estas são sociedades distintas, com personalidade jurídica distinta” e mais adiante “tal não significa que uma sociedade se confunda com a outra podendo esta receber notificações em nome ou em representação daquela”.
T. A este respeito, é de ter em conta que a entidade inspeccionada foi o estabelecimento estável em Portugal da L... Incorporation com sede no Panamá, o qual foi oficiosamente inscrito no registo de contribuintes, com o nif 7…e com o domicílio na Av…., 4450-012, Matosinhos.
U. Das três entidades em causa, duas são sociedades, a N… e a L… Panamá e são dotadas de personalidade jurídica, mas a terceira entidade, aquela que foi inscrita no registo de contribuintes oficiosamente, como entidade designada por L…, à qual foi atribuído o número de identificação de contribuinte 7…, e atribuído o “tipo de sujeito passivo” de “estabelecimento estável”, apesar de possuir personalidade tributária, personalidade judiciária tributária e capacidade tributária e capacidade judiciária tributária, carece de personalidade jurídica própria, distinta da sociedade principal que é a sociedade L... Incorporation, entidade não residente (que tem sede no Panamá).
V. A actuação da inspecção tributária não demonstrou que a mesma tenha efectuado notificações em sociedade terceira face àquela que é alvo da acção inspectiva, por estar em causa a não distinção dos entes jurídicos visados, quer no procedimento inspectivo, quer nas notificações a efectuar – a inspecção tributária efectuou as notificações dirigidas à N…, SA, na qualidade de “Representante Legal de L…” (estabelecimento estável), na morada Rua…, Matosinhos, porque esta assim é considerada (qualidade de representante) pela inspecção com base nas razões transpostas para o RIT.
W. As disposições legais assentam os dois aspectos que são o pressuposto da actuação da inspecção tributária: A decisão de efectuar as notificações relativas ao procedimento inspectivo de que é objecto a L…, estabelecimento estável em Portugal com nif 7…, dirigidas à N…, SA, na qualidade de “Representante Legal” daquela, advém de a inspecção tributária ter entendido, conforme teor do RIT, que “a agenciação” supra descrita constitui o estabelecimento estável da sociedade panamiana de que é mero prolongamento, sendo sujeito passivo de IRC, relativamente aos rendimentos e pelas operações praticadas em Portugal, e goza de personalidade tributária, personalidade judiciária tributária e capacidade judiciária tributária, carecendo, contudo, de personalidade jurídica própria, distinta da sociedade principal – cfr. art.ºs 2.º, n.º 1, als. c) e 5.º, n.ºs 6 e 7 do CIRC, art.º 15.º da LGT e art.º 3.º, n.ºs 1 e 2 do CPPT e, que N… é representante da L… (EE), porque assim age efectivamente e, nos termos do disposto no art. 8º, nº 1 do CPPT, nº 1, as entidades desprovidas de personalidade jurídica mas que disponham de personalidade tributária são representadas pelas pessoas que, legalmente ou de facto, efectivamente as administrem.
X. Em termos de obrigações declarativas, inerentes à inscrição no registo e início de actividade e cessação da mesma, estas entidades devem cumprir, o disposto nos art. 8º, nº 5, b) e 117º, nº 1 a) e b) e 118º, nº 1 e 2, e 118º do CIRC e Art. 3º e 11º do Decreto-Lei 14/2013 de 28 de Janeiro39, estabelecendo o artigo 3º deste último que o NIF é obrigatório para as pessoas singulares e colectivas ou entidades legalmente equiparadas que, nos termos da lei, se encontrem sujeitas ao cumprimento de obrigações, como é o caso da entidade a que nos reportamos, conforme obrigações legalmente estabelecidas pelo CIRC.
[39Com a consideração da declaração de rectificação nº 7/2013, o DL 13/2013 entrou em vigor 30 dia após a publicação no Diário da República, 1.ª série — N.º 19 — 28 de janeiro de 2013 e harmoniza a legislação atualmente em vigor, clarificando o conteúdo e procedimentos da atribuição e gestão do NIF, instituídos e regulados originariamente pelo Decreto-Lei n.º 463/79, de 30 de Novembro.
40 Acórdãos do STA de 21.05.2008, processo 0191/08 e do mesmo tribunal, de 07.05.2008, recurso 200/08.]
Y. O não cumprimento das obrigações impostas pelo presente diploma, autoriza a inscrição oficiosa, nos termos do art. 27º do mesmo, a efectuar pela AT – sem prejuízo da infracção que ao caso couber, a AT procede fundamentadamente à inscrição oficiosa, para efeitos de atribuição de NIF, designadamente, nas seguintes situações: a) O contribuinte não proceda à respectiva inscrição, estando para isso obrigado a faze-lo nos termos do artigo 3.º.
Z. A atribuição de personalidade tributária a entidades sem personalidade jurídica, designadamente a estabelecimentos estáveis de não residentes em território português, constitui uma ficção, válida para determinar a medida da tributação e das obrigações tributárias, justificada por razões de equidade na repartição interestadual de receitas fiscais, que se reconduz a que a entidade sem personalidade jurídica seja tratada como se fosse um ente distinto da pessoa singular ou colectiva que o cria, para efeitos da determinação da tributação que deve incidir sobre a sua actividade em Portugal40, operacionalizando a relação jurídico-tributária e criando um centro de imputação, ou seja um ente com quem a AT possa estabelecer comunicação.
AA. Coerentemente, o art. 126º do CIRC41 dedicado à representação de entidades não residentes, de acordo com os cânones de interpretação, a contrario sensu, permite concluir que as entidades que, não tendo sede nem direcção efectiva em território português (como é o caso da L... Panamá), mas com estabelecimento estável em Portugal (L... EE), não se encontram obrigadas a designar representante – na medida em que ao estabelecimento estável é reconhecida personalidade tributária, personalidade judiciária tributária e capacidade judiciária tributária.

41 Citamos o seu nº 1: As entidades que, não tendo sede nem direcção efectiva em território português, não possuam estabelecimento estável aí situado mas nele obtenham rendimentos, assim como os sócios ou membros referidos no n.º 9 do artigo 5.º, são obrigadas a designar uma pessoa singular ou colectiva com residência, sede ou direcção efectiva naquele território para as representar perante a administração fiscal quanto às suas obrigações referentes a IRC (destacado nosso).
BB. Nos termos da fundamentação contida no RIT e na Informação elaborada para efeitos de inscrição do contribuinte no registo de contribuintes, considerando que a N…, SA, nipc 5…, com sede na Rua…, Matosinhos é representante da L…, que foi oficiosamente inscrita como contribuinte com o número 7… e domicílio atribuído na Av…., Matosinhos, com o “tipo de sujeito passivo” de “estabelecimento” estável com enquadramento em vigor desde 01.01.2009, tem procedido às notificações inerentes ao procedimento tributário antecedente e tendente à emissão de liquidação junto desta morada (que é a mesma) e na pessoa dos seus administradores e/ou funcionários.

CC. No RIT demonstrou-se que a N… é representante da L…, porque assim age efectivamente e nos termos do disposto no art. 8º, nº 1 do CPPT, nº 1, as entidades desprovidas de personalidade jurídica mas que disponham de personalidade tributária são representadas pelas pessoas que, legalmente ou de facto, efectivamente as administrem.

DD. Por seu turno, o art. 16º, nº 3 da LGT esclarece, que relativamente às entidades sem personalidade jurídica os seus direitos e deveres são exercidos pelas pessoas que administrem os respectivos interesses – esta administração de interesses é, de acordo com tudo que foi recolhido pela inspecção tributária no âmbito do procedimento inspectivo, exercida, em termos de facto, pela N…, relativamente à L…, nif 7…) – Encontra-se demonstrado no RIT que a L…, nif 7… estabelecimento estável em Portugal é efectivamente administrada pela N….

EE. Os documentos pela entidade Requerida não são susceptíveis demonstrar o preenchimento das condições legalmente estipuladas para que eventualmente se ponderasse demonstrada uma cessação de actividade da L… e a continuação da existência dos pressupostos considerados não se encontra dependente, em exclusivo, de contrato escrito que assim demonstre, se por outros meios, for verificável que a situação fáctica inerente à relação comercial entre a N… e a L… Panamá permanece, em substância, idêntica - sendo certo que, em termos de registo de contribuintes a entidade em causa permanece inscrita, sem que haja cessado actividade, ou haja sido levantado obstáculo ou tenha sido judicialmente sindicado o teor da respectiva inscrição como contribuinte através dos meios adequados previstos na lei42.
[42 Acção Administrativa Especial.
43 Ressalvado todo o respeito devido, permitimo-nos citar nesta peça e seguir de perto o Acórdão do TCAS, de 04.06.2013, no processo 06676/13, disponível em www.dgsi.pt, o qual esclarece quanto a esta consideração, ter por base os autores Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, I, Coimbra Editora, 1982, pág.619 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.22 e seg.; Artur Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, I, Almedina, 1981, pág.129 e seg.; José Carlos Vieira de Andrade, Justiça Administrativa, 6ª. edição, Almedina, pág.321 e seg.).
FF. Sendo este nº 6 do art. 147º uma norma especial sobre a tutela cautelar no contencioso tributário, não há uma lacuna de regulamentação, quanto aos requisitos da adopção de providências cautelares no contencioso tributário, pelo que não é viável recorrer aos critérios previstos no CPTA, pois são de aplicação meramente subsidiária (art. 2º, alínea c), do CPPT), havendo que invocar e demonstrar o “fundado receio de uma lesão irreparável”, que possa ser causada pela actuação da administração tributária, e no direito tributário estando em causa, normalmente, meros interesses patrimoniais, os prejuízos que se podem considerar como irreparáveis serão aqueles que não sejam susceptíveis de quantificação pecuniária minimamente precisa].

GG. Qualquer providência cautelar, visa combater o periculum in mora (o prejuízo da demora inevitável do processo principal), a fim de que a sentença da decisão principal se não torne numa “mera decisão platónica” – a necessidade da prevenção contra a demora, imprime nas providências cautelares características típicas como a instrumentalidade, a provisoriedade e a sumariedade43– a providência encontra-se funcionalmente dependente da acção principal cuja utilidade visa assegurar, não constitui uma resolução definitiva do litígio e traduz-se num conhecimento sumário de facto e de direito inerente a um processo urgente.
HH. Concomitantemente, importa considerar que, no contencioso tributário o critério da impugnabilidade dos actos é o da sua lesividade imediata, objectiva, actual e não meramente potencial, ao contrário do que acontece no contencioso administrativo, onde a impugnabilidade depende apenas da externalidade ou eficácia externa do acto44.
[44 Neste sentido, por todos, acórdão do STA de 23.10.2013, no processo 01361/13, disponível no mesmo sitio electrónico, o qual seguimos de perto nos pontos seguintes desta peça processual.
45 Rui Duarte Morais, in “Manual de Procedimento e Processo Tributário”, Almedina, 2012, pág. 10].
II. No procedimento tributário, face ao art. 54º, os actos interlocutórios, sendo meramente instrumentais ou preparatórios da decisão final, ainda que ilegais, não são, em princípio, lesivos dos interesses do contribuinte, pois a sua situação tributária não fica com eles definida ou resolvida, pelo que a sua ilegalidade só pode ser suscitada aquando da impugnação deduzida contra o acto final, excepto se se tratar de um dos seguintes actos susceptíveis de impugnação imediata: (i) actos interlocutórios cujo escrutínio imediato e autónomo se encontre expressamente previsto na lei (“actos destacáveis”); (ii) actos que, embora inseridos no procedimento e anteriores à decisão final, sejam imediatamente lesivos; (iii) actos trâmite que ponham um ponto final na relação da administração com o interessado, já que nestes casos, muito embora o acto continue a ser, na economia geral do procedimento, um acto preparatório pré-ordenado ao acto final, é para o seu destinatário o acto que define a posição da Administração e, por isso, o acto lesivo dos seus direitos ou interesses legítimos.
JJ. No caso destes autos, estamos perante meros actos de notificação efectuados no decurso de acção de inspecção tributária, integrados num inequívoco procedimento tributário, definido como um conjunto de actos e formalidades, relativamente autónomos, organizados sequencialmente, dirigidos à produção de um determinado resultado (a liquidação do imposto – do qual são instrumentais), praticados por órgãos de uma administração tributária45, adstrito às regras e princípios que regem esse procedimento e às normas e princípios jurídicos vigente no contencioso tributário sobre a impugnabilidade dos actos que o integram, e que, como vimos, faz depender a impugnabilidade desses actos da sua lesividade imediata e actual, e não da mera externalidade desses actos.
KK. As notificações constituem apenas “o acto pelo qual se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa”, e a doutrina e a jurisprudência têm vindo a firmar o entendimento de que no procedimento tributário, tendo em conta a opção do art. 77º nº 6 da LGT, a notificação aparece assumida como mera condição de eficácia do acto.
LL. Defendemos a inimpugnabilidade dos actos de notificação da Decisão da Direcção de Finanças do Porto no âmbito do procedimento inspectivo, por constituírem actos procedimentais sem lesividade imediata, pelo que a presente providência cautelar visando que à Direcção de Finanças do Porto seja imposta abstenção da pratica de actos de notificação da L... na pessoa/morada da requerente, não reúne, os requisitos, estabelecidos na lei tributária para ser concedida.
MM. Não estão verificados os requisitos para que a providência cautelar possa vir a ser adoptada, ressalvado o respeito devido por melhor opinião, porque:
MM.1.Não se concede, em abstracto, existir a susceptibilidade de decorrer prejuízo irreparável da actuação da inspecção tributária (relativamente à qual a requerente pretende que a mesma se abstenha), porque os actos preparatórios e instrumentais de notificação carecem de lesividade em si mesmos, apenas os actos notificandos que constituam actos finais do procedimento ou actos autonomizáveis ou destacáveis deste procedimento, terão essa aptidão, constituindo mera condição de eficácia;
MM.2.Não se concede, em concreto, existir prejuízo irreparável ou de difícil reparação decorrente da actuação da inspecção tributária relativamente à qual pretende que a mesma se abstenha porquanto, ainda que nos reportemos não à notificação mas aos actos notificandos e tenhamos em vista o acto final do procedimento – a liquidação – porque este encontra expressão ou quantificação no valor da liquidação efectuada, juros liquidados, coimas aplicadas, sendo jurisprudência pacífica que apenas são considerados irreparáveis os prejuízos que não se prestem a uma “quantificação pecuniária minimamente precisa”;
MM.3.Não é a providência cautelar, nem a acção para reconhecimento de um direito ou de um interesse legítimo em matéria tributária46, identificada pelo requerente como acção principal a intentar, o meio próprio para obter a anulação do acto final do procedimento que é a liquidação de imposto47 e/ou dos actos instrumentais que constituem seus preliminares e integram o respectivo processo formativo, sendo adequada para este efeito a acção de impugnação judicial nos termos do disposto nos art. 97º, nº 1 a) e 99º do CPPT e 101º da LGT, ou para a impugnação de actos administrativos em matéria tributária que não comportem a apreciação de actos de liquidação que assumam a qualidade de actos destacáveis por se mostrarem imediatamente lesivos a acção administrativa especial, nos termos do art. 97º, nº 1 p) e nº 2 do CPPT.
[46 Prevista no art. 145º do CPPT.
47 Referimos expressamente o principio da impugnação unitária plasmado no art. 54º do CPPT, na medida em que os actos do procedimento não assumem, a nosso ver, como adiante se especifica, natureza de acto destacável para efeitos de impugnação autónoma, cabendo impugnar o acto final do procedimento tributário].
NN. A actuação da inspecção tributária encontra-se legitimada pelas circunstâncias fácticas e normativos legais, ao abrigo dos quais tem vindo a ser praticados os actos no procedimento tributário supra descritos, incluindo as notificações efectuadas e se a intenção era a de obter a suspensão do procedimento através da interposição da presente acção cautelar, inviabilizando as notificações a efectuar ou atacar a legalidade dos actos praticados pela inspecção tributária, não se afigura ser este meio adequado para alcançar esse desiderato.
OO. A anulação dos actos da inspecção tributária integrados no procedimento inspectivo, sejam os preparatórios ou instrumentais como as notificações das ordens de serviço e relatórios (entre outras), seja o acto final de liquidação, é possível através dos meios contenciosos adequados previstos nas leis processuais, susceptíveis de operar a reposição da situação ex ante, pelo que, não se encontram reunidos pressupostos para que possa ser declarada a procedência da presente providência cautelar, por ausência de prejuízo irreparável que decorra para a requerida da actuação em causa.»

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

A recorrida apresentou as seguintes contra-alegações e formulou as seguintes «Conclusões:

A. A douta Sentença em causa não se revela ambígua ou obscura, nem é ininteligível;

B. Nem condena em objecto diverso do pedido,

C. Não existe erro de julgamento;

D. A Sentença em questão não se encontra, assim, ferida de nulidade ou de qualquer outro vício;

E. Nos termos do disposto no artigo 1º, nº 3 da Lei Geral Tributária (LGT), integram a Administração Tributária a Direcção-Geral dos Impostos, a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo, a Direcção-Geral da Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiros – estas entidades foram entretanto fundidas, tendo daí resultado a Autoridade Tributária e Aduaneira –, as demais entidades públicas legalmente incumbidas da liquidação e cobranças dos tributos, o Ministro das Finanças ou outro membro do Governo competente, quando exerçam competências administrativas no domínio tributário, e os órgãos igualmente competentes dos Governos regionais e autarquias locais;

F. Ou seja, a Direcção de Finanças do Porto e os seus serviços de Inspecção Tributária, integram a Autoridade Tributária e Aduaneira (cfr. artigo 1º, nº 2, do Decreto-Lei nº 118/2011 de 15 de Dezembro) e esta integra, por sua vez, a Administração Tributária (cfr. artigo 1º, n 3 da LGT);

G. Quando a Recorrida foi notificada para especificar, nos termos da alínea c), do nº 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), quem era visado dentro da Administração Tributária, a Recorrida indicou efectivamente a Direcção de Finanças do Porto (Serviços de Inspecção Tributária), pois era esta entidade quem, até essa data, tinha praticado a generalidade dos actos objecto da providência cautelar interposta;

H. O pedido em concreto da providência cautelar referia-se e refere-se à Administração Tributária como um todo, que integra, entre outros órgãos, a Direcção de Finanças do Porto;

I. No mesmo requerimento em que a ora Recorrida informa nos autos que a providência cautelar é intentada contra a Direcção de Finanças do Porto, termina com os dizeres “concluindo-se nos precisos termos do pedido formulado no requerimento inicial” (cfr. fls. 57 dos autos).

J. E os termos do pedido inicial formulado no requerimento inicial – que assim se mantiveram neste mencionado requerimento – eram: “ser ordenado que a Administração Tributária se abstenha de proceder a quaisquer notificações dirigidas à sociedade L... INCORPORATION na morada e/ou na pessoa da aqui Requerente, até que seja proferida decisão final e transitada em julgado, na acção judicial principal”;

K. Por esta razão, quando na douta Sentença recorrida se decide “Pelo exposto julgo procedente a presente providência cautelar, com todas as consequências legais, designadamente, abster-se a Administração Tributária de proceder a notificações a realizar à L… através da N…, S.A.”, existe total coincidência entre a decisão e o objecto do pedido.

L. Nos termos do artigo 9º, nº 4, do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) é a Administração Tributária quem têm legitimidade no processo judicial tributário (além do Ministério Público, do representante da Fazenda Pública, os contribuintes e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido).

M. Sendo certo que o processo judicial tributário compreende as providências cautelares de natureza judicial (cfr. alínea i) do nº 1 do artigo 97º do CPPT).

N. Ou seja, quem tem legitimidade nesta providência cautelar é a Administração Tributária e não um qualquer órgão central, regional ou local/periférico que a integra.

O. Quem o contribuinte encontra “do outro lado” na relação jurídico-tributária, no procedimento tributário ou no processo judicial tributário é sempre a Administração Tributária, independentemente de aquele se dirigir e ter como interlocutor um qualquer órgão que a integre, como um serviço de finanças ou uma direcção de finanças.

P. Também por esta razão se compreende o carácter abrangente e integrador do regime previsto no nº 3, do artigo 78º, do CPTA.

Q. E a Recorrente bem sabe que, no processo em causa, não se limita a representar a o órgão regional Direcção de Finanças do Porto, sendo bem demonstrativo de tal facto que, na oposição à providência cautelar em causa, a Recorrente se intitula de “AT”, discorrendo e alegando em nome desta, nomeadamente nos seus artigos/pontos nºs. 29.1.; 29.2; comentário prévio ao 30.; 32.; 36.; comentário prévio ao 41.; 41.; 44.; 46.; 51.; 57.; 58.; 63.; 64.; 65. e 66.;

R. Embora a Recorrente se debruce sobre a matéria de facto, invocando erro nos pressupostos de facto e pretendendo retirar daí conclusões, a verdade é que, nas suas alegações de recurso, a Recorrente não contesta especificamente um único facto dado como provado na Sentença aqui em causa.

S. A Recorrente não impugna, nem coloca em causa nenhum meio de prova trazida aos autos pela Recorrida (quer os vários documentos juntos pela Recorrida, quer o depoimento prestado pela Testemunha Dr. A…),

T. E a Recorrente não questiona nem coloca em crise, de forma especificada, a interpretação e a convicção que o Tribunal extraiu da prova produzida nos autos, constantes da respectiva fundamentação da matéria de facto.

U. E poderia tê-lo feito, no julgamento, apresentando para o efeito no processo, quaisquer meios de prova para contraprova do alegado pela Recorrida ou, pelo menos, para que se contradissesse ou descredibilizasse a prova apresentada pela Recorrida,

V. Poderia tê-lo feito igualmente nas alegações de recurso, impugnando especificadamente os factos dados como provados, fundamentando as razões pelas quais não deveriam tais factos terem sido julgados provados.

W. Os factos que resultaram efectivamente provados e que fundamentam a douta Sentença em causa são:
i. Entre Outubro e Dezembro de 2013 a Administração Tributária enviou para a morada da N…, ora Recorrida, diversas notificações dirigidas a L…, Inc.;
ii. Entre a Recorrida e a referida L... vigorou desde 22 de Janeiro de 2007, um contrato de agência;
iii. Em Junho de 2013 foi comunicado à Recorrida a rescisão do contrato de agência, com efeitos a partir de 30 de Setembro de 2013;
iv. Entre 30 de Setembro de 2013 e 31 de Dezembro de 2013 a Recorrida exerceu funções de armador por não querer transparecer para o exterior que não tinha quem assegurasse esse serviço;
v. Actualmente, desde o dia 1 de Janeiro de 2014 a Recorrida trabalha com um outro armador, a P....
X. Refere ainda a douta Sentença, na motivação da matéria de facto dada como assente, que:
i. Desde Janeiro que não há qualquer tipo de relação com a L..., encontrando-se actualmente saldadas as contas entre as duas empresas;
ii. A Recorrida nunca foi representante fiscal da L..., ou gestor de bens ou direitos desta, e
iii. As liquidações que vêm sendo remetidas à Recorrida, em nome da L..., são de valores muito elevados, 2 ou 3 milhões de euros, valores que, caso a Recorrida viesse a ser responsabilizada, determinaria o seu fim.

Y. E são estes factos, provados e assentes nos autos e nunca contestados ou impugnados pela Recorrente, que indicam que se encontram preenchidos os pressupostos ou requisitos da providência cautelar, a saber: 1. A provável existência do direito em análise; 2. O fundado receio de um prejuízo irreparável.

Z. Quanto à existência provável do direito em análise, de acordo com a matéria de facto provada (e não provada) a Recorrida tem o efectivamente direito de não ser notificada pela Administração Tributária (por qualquer dos seus órgãos) na sua pessoa ou morada, de quaisquer notificações dirigidas à L....

AA. E aqui tanto vale dizer notificações dirigidas à L... inc., como à L... Estabelecimento Estável (EE) em Portugal.

BB. Pois, mesmo que se concebesse – por mera hipótese de raciocínio – que existia um EE da L... em Portugal, o facto é que não resultou provado no processo que a morada desse EE fosse na sede e escritórios da Recorrida (bem pelo contrário, resultou provado que esse EE não tinha morada na Recorrida).

CC. Nunca tal foi afirmado por uma qualquer testemunha nem decorre dos documentos junto aos autos, (nem sequer da mencionada sentença do Tribunal Arbitral Tributário).

DD. De igual forma, não resultou provado nos autos que a Recorrida tivesse alguma vez sido administradora desse EE, e assim legal representante do mesmo, conforme pretende fazer crer a Recorrente.

EE. Pelo contrário, na sequência do depoimento da Testemunha Dr. T…, resultou sim provado que a Recorrida nunca foi representante fiscal da L..., ou sua gestora de bens ou direitos.

FF. Não tendo a Recorrida quaisquer poderes de administração da L... ou quaisquer poderes de representação desta para lá daqueles que decorriam do contrato de agência de navegação.

GG. Pelo que, ainda que concebesse a existência do EE da L... em Portugal, não existiam razões – nem de facto nem de direito – para que a Administração Tributária pudesse proceder a notificações dirigidas ao tal EE na pessoa e/ou na morada da Recorrida, ainda que na qualidade de administradora ou legal representante daquela entidade, pois a Recorrida nunca o foi efectivamente.

HH. Mas, mesmo admitindo que a Administração Tributária pudesse notificar o EE da L... em Portugal na morada da Recorrida – o que não se concede e apenas se admite como mera hipótese de raciocínio – a verdade é que, sendo o pressuposto de existência do EE da L... em Portugal o contrato de agência de navegação existente entre a L... e a Recorrida, já não o poderia fazer a partir de 30 de Setembro de 2013, uma vez que esse contrato cessou os seus efeitos, tendo deixado a Recorrida de ser agente de navegação da L...;

II. Donde nunca poderiam ser efectuadas quaisquer notificações pela Administração Tributária dirigidas à L... Inc ou L... EE em Portugal, a partir de 30 de Setembro de 2013, data a partir da qual já não existia a agência de navegação;

JJ. E, por maioria de razão, muito menos poderiam tais notificações acontecer a partir de 1 de Janeiro de 2014, quando já não existiam quaisquer relações comerciais ou contratuais entre a Recorrida e a sociedade L..., Inc.;

KK. Assim, fica estabelecido o primeiro dos requisitos legais da providência cautelar, a existência provável do direito em análise;

LL. Neste caso, direito a não ser notificada pela Administração Tributária na sua pessoa e/ou morada, de notificações dirigidas à L..., fosse a que título fosse, por resultar provado no processo que a Recorrida não é nem nunca foi legal representante da mesma (ou do respectivo EE), nem gestora dos respectivos bens ou direitos, nem ter qualquer outra obrigação legal ou contratual de receber ou reencaminhar tais notificações.

MM. Ou, pelo menos e sem conceder, nunca ser notificada pela Administração Tributária na sua pessoa e/ou morada, de notificações dirigidas à L..., partir de 30 de Setembro de 2013 – data em que resultou provado ter cessado o contrato de agência (condição essencial para a existência do referido EE).

NN. Ou, ainda e sempre sem conceder, nunca a partir de 1 de Janeiro de 2014 – data em resultou provado terem deixado de existirem qualquer tipo de relações entre a Recorrida e a L....

OO. E da matéria provada decorre, igualmente, o pressuposto do fundado receio de um prejuízo irreparável, o periculum in mora.

PP. Ou seja, decorre que a actuação da Recorrente (na violação do direito supra exposto) coloca a Recorrida num sério e fundado risco de sofrer prejuízos irreparáveis.

QQ. É que, conforme resulta da motivação da matéria de facto dada como assente, em razão do elevado valor em causa, a responsabilização da Recorrida por parte da L... – em função da não entrega ou reenvio das notificações a esta entidade ou, mesmo, em função da aceitação de tais notificações – determinaria o seu fim.

RR. O Prejuízo em questão advém da do facto da referida responsabilização por parte da L... – por lhe remeter ou deixar de remeter tais notificações – levar a Recorrida fatalmente à insolvência, em função dos elevadíssimos valores em causa.

SS. Tendo ficado o fundado receio dessa insolvência da Recorrida provado nos autos.

TT. E é essa insolvência que se traduziria um prejuízo irreparável para a Recorrida.

UU. Sendo certo que tal prejuízo ou lesão – a insolvência da Recorrida e necessárias consequências da mesma – ultrapassa um mero interesse patrimonial, não sendo susceptível de uma quantificação exacta.

VV. Resulta assim provado o preenchimento do 2º requisito da providência cautelar, o fundado receio de um prejuízo irreparável.

WW. Por fim, deve referir-se que esta providência cautelar (antecipatória da acção para reconhecimento de um direito ou de um interesse legítimo em matéria tributária) é o meio processual próprio.

XX. Pois nunca pretendeu nem pretende a Recorrida obter a anulação da liquidação de impostos ou dos actos instrumentais que integram o respectivo processo formativo.

YY. Até porque, repete-se, não está em causa ser a Recorrida considerada sujeito passivo, contribuinte ou devedora dos impostos em causa – nem sequer própria Administração Tributária o considera – pelo que a Recorrida nunca teria legitimidade processual para recorrer aos meios processuais de contencioso tributário de anulação, graciosos ou judiciais, como a reclamação, impugnação ou oposição (e, consequentemente, requerer a suspensão de processos executivos, nos termos da lei).

ZZ. Não restava à Recorrida outro meio processual, que não a presente providência cautelar, que pudesse salvaguardar o fim útil da decisão na acção especial para reconhecimento de um direito ou de um interesse legítimo em matéria tributária – de que esta providência é antecipatória – e que pudesse, ao mesmo tempo, acautelar e evitar o prejuízo irreparável acima exposto.

AAA. Tão pouco, para acautelar a sua pretensão, a Recorrida podia lançar mão do recurso hierárquico, pois, como é sabido, este é um meio gracioso e o que a Recorrida pretendia é a tutela jurisdicional (cfr. artigo 147º, nº 2 do CPPT).

BBB. Outro entendimento ou interpretação da aplicação do nº 6 do artigo 147º do CPC, levaria a que a Recorrida não dispusesse de qualquer meio de tutela judicial efectiva, determinando necessariamente a inconstitucionalidade do mesmo por violação do artigo 268º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa (CRP).

CCC. Ou seja, se o artigo 147º, nº 6, do CPPT for interpretado no sentido da impossibilidade do decretamento da providência cautelar pelo facto de a lesão poder ser reparável, por considerar-se a possibilidade de quantificação pecuniária dos danos que são infligidos ao Recorrido pelo lesante Estado (lesão, esta, não ligada – neste caso – à liquidação de imposto, muito volumosa e que implicaria a insolvência da Recorrida se a providência não fosse decretada), então o artigo 147º, nº 6, do CPPT, nesta interpretação, é materialmente inconstitucional por violação do artigo 268º, nº 4, da CRP, que prescreve a tutela judicial efectiva dos administrados.

DDD. Em conclusão, a douta Sentença recorrida faz correcta interpretação dos factos e escrupulosa aplicação do Direito, pelo que deve ser a mesma mantida.

Termos em que, julgando o presente recurso totalmente improcedente, e mantendo a Douta Sentença proferida, por correcta apreciação dos factos, da prova produzida e aplicação do Direito, V. Exas. assim farão a costumada
JUSTIÇA!

Remetidos os autos a este tribunal, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu mui douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso e revogada a sentença recorrida.

Com dispensa dos vistos legais (artigos 36.º, n.º2, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos e 657.º, n.º4, do Código de Processo Civil), cumpre agora apreciar e decidir, visto que nada a tal obsta.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões das alegações apresentadas pela Recorrente, são as seguintes as questões que importa resolver: (i) se ocorre nulidade da sentença por excesso de pronúncia na medida em que condenou a administração tributária a abster-se de praticar actos de notificação à Requerente, quando o pedido vinha circunscrito a actos praticados no âmbito da Direcção de Finanças do Porto; (ii) se a sentença incorre em nulidade por obscuridade e erro de julgamento na medida em que figurando a Direcção de Finanças do Porto no processo como Ré e parte legítima não podiam as consequências da condenação projectar-se na esfera jurídica da administração tributária que não detém aquela posição processual; (iii) se estão reunidos os requisitos legais de que depende o decretamento da providência requerida.

3 – DA MATÉRIA DE FACTO

Em 1ª instância foram considerados provados os seguintes factos:

1. Em 25.10.2013 a Administração Tributária remeteu para a Avenida …, Matosinhos, uma notificação para o exercício da audição prévia, em nome de L... Incorporation – cfr. notificação de fls. 14 dos autos para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
2. Na sequência da notificação supra, a Requerente, devolvendo-a, dirigiu-se à Administração Tributária informando que aquela morada é sua, N..., S. A., sendo aí que se situam os seus escritórios onde exerce a sua actividade comercial, informou ainda que a L... ali não exerce qualquer actividade, esclareceu ainda “a N… é agente de navegação em Portugal da L... Incorporation, armador marítimo com sede e actividade no Panamá. Esta relação comercial sustenta-se num contrato de agência de transporte marítimo. A N... não é, pois, nem representante fiscal, nem sequer gestora de bens ou de direitos da L... Incorporation. A N... não tem assim, qualquer obrigação legal ou contratual de receber ou remeter esta notificação à entidade a quem se dirige” – cfr. missiva remetida à Administração Tributária constante de fls. 15 e seguintes dos autos para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
3. Em 29.11.2013 a Administração Tributária remeteu para a Avenida…, Matosinhos, uma notificação para o exercício da audição prévia, em nome de L... Incorporation – cfr. notificação de fls. 17 dos autos para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
4. Em 06.12.2013 a Administração Tributária remeteu para a Avenida …, Matosinhos, uma notificação, em nome de L... Incorporation referente a uma liquidação oficiosa de Imposto sobre o Valor Acrescentado do período 2013.08 – cfr. notificação de fls. 18 dos autos para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
5. Em 06.12.2013 a Administração Tributária remeteu para a Avenida…, Matosinhos, duas notificações referentes à condenação em coimas pela prática de contra-ordenações relativas à falta de declaração de Imposto sobre o Valor Acrescentado nos períodos de 2013.08 e 2013.09, ambas em nome de L... Incorporation – cfr. notificações de fls. 19 e 20 dos autos para as quais se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais ;
6. Todas estas notificações – identificadas nos factos provados n.º3, 4 e 5 – foram devolvidas pela Requerente ao Serviço de Finanças de Matosinhos – 1, com base na argumentação despendida no facto provado n.º2 – cfr. Petição Inicial, facto que não foi impugnado;
7. Em 25.10.2013 e 05.12.2013 um funcionário da Administração Tributária dirigiu-se à Avenida…, em Matosinhos “a fim de notificar o Sujeito Passivo L... Incoporation, na pessoa do seu representante a N... –, S. A., das ordens de serviço externas n.º OI201304908 e Oi 201304909, ambas de 07.10.2013” – cfr. certidão de diligência negativa constante de fls. 21 e 24 e seguintes dos autos, para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
8. Uma vez nas instalações da N... apurou a Administração Tributária que “o Senhor F… (…) no cargo de Director da Delegação do Porto da N... –, S. A., encontrando-se nestas instalações não aceitou assinar as Ordens de Serviço acima identificadas”, aí fazendo exarar que “não assino as ordens de serviço referidas por considerar que não tenho obrigação legal, nem contratual, para receber essas notificações, uma vez que a N..., firma para quem trabalho, não é representante fiscal nem gestora de bens ou direitos da L...” – cfr. certidão de diligência negativa constante de fls. 21 e 24 e seguintes dos autos, para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
9. Em 05.12.2013 a Administração Tributária enviou, mais uma vez para a morada da N..., o projecto do relatório de inspecção tributária, dirigido à L... Incoporation – cfr. notificação de fls. 27 e seguintes dos autos, para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os feitos legais;
10. Entre a Requerente e a sociedade L... vigorou, desde 22 de Janeiro de 2007, tendo a “validade de um ano, com renovações tácitas por períodos de igual duração, a não ser que seja rescindido por qualquer uma das partes através de aviso escrito, nos 90 dias anteriores à data da renovação tácita, um cujo caso o contrato cessará no termo da respectiva renovação” – cfr. contrato de agência, tradução, constante de fls.129 e seguintes dos autos para o qual se remete e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais;
11. Em Junho de 2013 foi comunicado à Requerente a rescisão do contrato com efeitos a partir de 30 de Setembro – facto que resulta da prova testemunhal produzida nos autos;
12. Entre 30 de Setembro e 31 de Dezembro de 2013 a N... exerceu as funções de armador por não querer transparecer para o exterior que não tinha quem assegurasse esse serviço – facto que resulta da prova testemunhal produzida nos autos;
13. Actualmente, desde o dia 01.01.2014, a N... trabalha com um outro armador, a P... - facto que resulta da prova testemunhal produzida nos autos;
14. A N... –, S. A., requereu a constituição de Tribunal Arbitral tendo em vista a obtenção de pronúncia arbitral relativamente à legalidade da liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas relativa ao ano de 2009, ali tendo sido Requerida a Autoridade Tributária e Aduaneira – cfr. decisão arbitral constante de fls. 113 e seguintes dos autos, para a qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais;
15. Na referida decisão, analisando a possibilidade da L... dispor de um estabelecimento estável em Portugal, diz-nos que: apesar do Sujeito Passivo não residente ter “(..) um estabelecimento estável, com base nas instalações da empresa em cujas instalações actuaria. O que não se poderia fazer, seguramente, era dizer que a outra empresa, que cedeu as instalações, seria um estabelecimento estável da não residente. Tendo em consideração a situação sub judice, o teste do estabelecimento estável, instalação física, não seria de aplicar (não tendo sequer a AT suscitado este teste), pois a actividade de navegação, não era desenvolvida através das instalações da Requerente” – cfr. decisão arbitral constante de fls. 113 e seguintes dos autos, para a qual se remete e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais;
16. Depois de concluir que a L... tem estabelecimento estável em Portugal, por força do contrato de agência em vigor, naquela decisão, podemos ainda ler: “o facto de uma sociedade não residente ter um agente em território nacional poder levar a concluir pela existência de um estabelecimento estável não implica que seja o próprio agente o estabelecimento estável, que o agente perca a sua individualidade e consequentemente que lhe sejam imputados lucros daquela. Na verdade a existência de um estabelecimento estável, incluindo, como é óbvio, as situações em que é determinado com base na agência, é uma questão de tributação da empresa por conta de quem o agente actua, e não uma questão de tributação do agente em si, que tem um regime de tributação distinto. O Agente será tributado no Estado onde actua como tal, tendo em conta o elemento de conexão residência. Neste âmbito o agente enquanto residente em Portugal, verá a sua comissão tributada como parte do seu rendimento de base mundial, não se confundindo estes rendimentos com os da sociedade panamiana por conta de quem actua.”, ainda nesta matéria a decisão em causa conclui: “do que foi explanado infere-se que, apesar de se ter concluído que a existência de um contrato de agência (…) dá azo a um estabelecimento estável em Portugal da sociedade panamiana, esta será a única relativamente á qual poderão ser liquidados os valores em litígio, nunca à Requerente. A indistinção entre Sujeito Passivo não residente, neste caso a sociedade panamiana, e o agente cuja actuação pode dar origem ao surgimento de um estabelecimento estável assenta no equívoco de que o estabelecimento estável que surge nesse contexto é o próprio agente, isto é, a Requerente”. – cfr. decisão arbitral constante de fls. 113 e seguintes dos autos, para a qual se remete e cujo teor se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais;
17. Em 23 de Dezembro de 2013 deu entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto o presente pedido de providência cautelar – cfr. carimbo aposto no rosto da Petição Inicial a fls. 1 dos autos».

E mais se consigna que:


«Factos não provados
Para além da matéria dada como provada, inexistem outros factos que revelem interesse para a boa decisão da causa.
***

Motivação da Matéria de Facto dada como assente
Os factos dados como provados resultam da análise crítica dos documentos juntos aos autos, referidos em cada uma das alíneas, os quais não foram impugnados pelas partes e que, dada a sua natureza e qualidade, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova, mereceram a credibilidade do tribunal.
Atendeu-se ainda ao depoimento de A…, TOC da Requerente, apesar da relação laboral existente com a Autora a verdade é que depôs de forma calma, clara e ponderada, razão pela qual o mesmo foi atendido, por se considerar credível.
Este esclareceu que a L... é a empresa armadora com quem a Requerente trabalhou até ao fim do ano de 2013; depois daquela ter comunicado pretender a cessação do contrato que entre ambas vigorava, o que se deu em Junho de 2013, a N... exerceu, ela própria as funções de armador, visto não querer deixar transparecer para o exterior que não tinha empresa que assegurasse tais funções.
Disse ainda que, desde Janeiro de 2014 que não há qualquer tipo de relação com a L... sendo que, actualmente, as contas entre as duas empresas estão saldadas, encontrando-se a trabalhar, desde o início do ano com um novo armador, a P....
Esclareceu que nunca a N... foi representante fiscal da L..., ou gestora de bens ou direitos desta.
Disse ainda que as liquidações que vêm sendo remetidas à Requerente, em nome da L..., são de valores muito elevados, 2 ou 3 milhões de euros, valores que, caso a N... viesse a ser responsabilizada, determinariam o seu fim».

4 – APRECIAÇÃO JURÍDICA

Alega a Recorrente que a sentença é nula, nos termos do disposto na alínea e) do n.º1 do art.º615.º, do CPC, por ter condenado em objecto diverso do pedido, concretamente, que a condenação se reporta a actos da Administração tributária quando o pedido se circunscrevia a actos praticados pela entidade requerida (Direcção de Finanças do Porto). Vejamos.

No seguimento de despacho, a Requerente veio indicar a fls.57 como entidade demandada a Direcção de Finanças do Porto. Mas no articulado em que o fez, conclui assim: “Termos em que se requer a V. Exa. se digne considerar suprida a falta, nos termos do disposto no art.º116.º, n.º2 alínea a), a contrario, do CPTA e, bem assim, ordenar o prosseguimento dos autos nos normais trâmites legais, concluindo-se nos precisos termos do pedido formulado no requerimento inicial”.

No articulado inicial (que omitia a identificação da entidade demandada), é formulado o seguinte pedido: “A) Ser a presente providência declarada procedente por provada e, consequentemente, ser ordenado que a Administração tributária se abstenha de proceder a quaisquer notificações dirigidas à sociedade L... INCORPORATION na morada e/ou na pessoa da aqui Requerente, até que seja proferida decisão final e transitada em julgado, na acção principal; B) Ser proferido o decretamento provisório desta providência cautelar nos termos e para os efeitos previstos no art.º131.º do CPTA”.

Embora a parte dispositiva da sentença se limite a “julgar procedente a providência com todas as consequências legais”, na exposição de direito, conclui-se deste modo: “Pelo exposto, julgo procedente a presente providência cautelar, com todas as consequências legais, designadamente, abster-se a Administração tributária de proceder a notificações a realizar à L… através da N…, S.A.”.
Como salta à evidência, a sentença não condenou para além do pedido ou em objecto diverso do pedido, condenou exactamente no que era pedido.

Improcede, pois, o alegado vício de nulidade da sentença por condenação em objecto diverso do pedido.

Imputa também a Recorrente à sentença o vício de nulidade previsto na alínea c) do n.º1 do art.º615.º, do CPC, por obscuridade que a torna ininteligível na medida em que figurando como entidade demandada a Direcção de Finanças do Porto, veio a condenar a Administração tributária no pedido, não se ficando afinal a saber se a condenação se projecta na esfera da Administração tributária ou só na da entidade demandada, limitando-se aos actos por esta entidade praticados.

Quem tem legitimidade para intervir no processo judicial tributário, em que se compreende a presente providência, é a Administração tributária – cf. art.º 9.º, n.ºs 1 e 4, do CPPT.

Estabelece o art.º10.º, n.º1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, supletivamente aplicável ao processo judicial tributário ex vi do art.º2.º, alínea c), do CPPT (segmentos pertinentes):

«1 - Cada acção deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida e, quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor.
2 - Quando a acção tenha por objecto a acção ou omissão de uma entidade pública, parte demandada é a pessoa colectiva de direito público ou, no caso do Estado, o ministério a cujos órgãos seja imputável o acto jurídico impugnado ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os actos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos.
3 - Os processos que tenham por objecto actos ou omissões de entidade administrativa independente, destituída de personalidade jurídica, são intentados contra o Estado ou a outra pessoa colectiva de direito público a que essa entidade pertença.
4 - O disposto nos dois números anteriores não obsta a que se considere regularmente proposta a acção quando na petição tenha sido indicado como parte demandada o órgão que praticou o acto impugnado ou perante o qual tinha sido formulada a pretensão do interessado, considerando-se, nesse caso, a acção proposta contra a pessoa colectiva de direito público ou, no caso do Estado, contra o ministério a que o órgão pertence.
(…)».

Em anotação ao referido artigo, escrevem Mário Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha, “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2005, a págs.76: “O n.º4 do presente artigo considera sanável ex lege a irregularidade resultante de a petição ter sido dirigida, não contra a pessoa colectiva pública ou o departamento ministerial, mas contra o próprio órgão administrativo que praticou o acto impugnado ou sobre o qual recaía o dever de praticar os actos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos”. E, mais adiante, escrevem os autores: “Sublinhe-se ainda que, na hipótese comtemplada neste n.º4, mesmo que subsista um erro quanto à identificação do órgão em causa, implicando que venha a ser citado um órgão diferente daquele que praticou ou devia ter praticado o acto, incumbe ao órgão indevidamente citado dar imediato conhecimento àquele que o deveria ter sido, caso em que a entidade demandada beneficia de um prazo suplementar de 15 dias para apresentar contestação e enviar o processo administrativo (art.º81.º, n.º2).


Tendo sido indicado como entidade demandada o Director de Finanças do Porto, órgão da Administração tributária (cf. art.º3.º do Decreto-Lei n.º118/2011, de 15 de Dezembro), a citação que a esse órgão foi dirigida considera-se regularmente feita à Administração tributária, que é quem detém legitimidade passiva para intervir no processo.

A legitimidade processual passiva não é do órgão da Administração tributária, é da Administração tributária.

Portanto, só pode entender-se que o Director de Finanças do Porto interveio processualmente em representação da Administração tributária e não da Direcção de Finanças do Porto.

Segue do exposto que a sentença não enferma de qualquer ininteligibilidade por obscuridade ao condenar a Administração tributária a abster-se de proceder a notificações à L… através da N…, S.A., precisamente porque, como se viu, não subsiste qualquer divergência entre a entidade que se considera a demandada e citada e a que veio a ser condenada na providência.

Também por este fundamento improcede a invocada nulidade da sentença.

A Recorrente imputa também à sentença erro de julgamento quanto à questão da legitimidade passiva, porquanto, diz, «a legitimidade processual passiva consiste numa qualidade posicional da parte face à causa, qualidade essa, no que respeita ao réu, que se verifica quando a procedência lhe venha a causar (para si não para outrem) uma desvantagem ou consequência – no segmento decisório “a desvantagem” ou condenação vem reportada a outrem (a “Administração Tributária”), que não tem aquela qualidade posicional face ao litígio».

Dispõe o n.º1 do art.º30.º, do CPC, aplicável ex vi do 2.º, alínea e), do CPPT, que “O autor é parte legítima quando tem interesse directo em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer”.

Diz o n.º2 daquele art.º30.º, que “O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da acção e o interesse em contradizer pelo prejuízo que dessa procedência advenha”.

A legitimidade consiste na posição das partes numa determinada acção. E, no que agora importa, a parte terá legitimidade como réu se for ela que juridicamente se pode opor à pretensão do autor, por ser a pessoa cuja esfera jurídica é directamente atingida pela providência requerida, caso venha a proceder.

Ora, já vimos que a legitimidade passiva no processo judicial tributário, em que se insere a presente providência, pertence à Administração tributária e que apesar de se ter indicado na petição como entidade demandada um órgão da Administração tributária – o director de finanças do Porto - , a irregularidade se considera sanável ex lege e se considera demandada e citada a própria Administração tributária (cf. artigos 1.º e 10.º, n.º4, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos). A intervenção processual daquele órgão só pode entender-se feita em representação da Administração tributária (que é a parte legítima no processo) e não da Direcção de Finanças do Porto.

E assim colocada a questão, é manifesto que não ocorre qualquer erro de julgamento quanto à questão da legitimidade passiva porque quem se considera demandado e veio aos autos contradizer foi quem acabou por ver repercutido na sua esfera jurídica os efeitos da condenação, ou seja, a Administração tributária.

O argumento de que o director de finanças não tem interesse directo em contradizer a providência na parte em que condenou (também) a Administração tributária a abster-se de praticar actos que não estão na esfera jurídica da Direcção de Finanças do Porto, não colhe de todo, porque tal pressupõe a legitimidade passiva do órgão em causa, qualidade processual que ele não tem, tendo-se limitado a assegurar a representação processual da entidade a que pertence.

Improcede também este segmento do recurso.

Prossegue a Recorrente assacando à sentença erro de julgamento quanto à verificação dos requisitos legais de que depende o decretamento da providência requerida.

Nos termos do n.º4 do art.º268.º, da CRP, “É garantido aos administrados tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas(sublinhado nosso).

Materializando a directiva constitucional, o Código de Procedimento e de Processo Tributário passou a prever, no domínio do processo judicial tributário, a possibilidade do recurso a providências cautelares por parte dos contribuintes – cf. art.º97.º, alínea i), daquele Código.

Todavia e como salienta Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., pág.672, são exíguos os termos em que as providências cautelares são admitidas no processo judicial tributário.

Estabelece o pertinente art.º147.º, do CPPT:
«Artigo 147.º
Intimação para um comportamento

1 - Em caso de omissão, por parte da administração tributária, do dever de qualquer prestação jurídica susceptível de lesar direito ou interesse legítimo em matéria tributária, poderá o interessado requerer a sua intimação para o cumprimento desse dever junto do tribunal tributário competente.

2 - O presente meio só é aplicável quando, vistos os restantes meios contenciosos previstos no presente Código, ele for o meio mais adequado para assegurar a tutela plena, eficaz e efectiva dos direitos ou interesses em causa.

3 - No requerimento dirigido ao tribunal tributário de 1.ª instância deve o requerente identificar a omissão, o direito ou interesse legítimo violado ou lesado ou susceptível de violação ou lesão e o procedimento ou procedimentos a praticar pela administração tributária para os efeitos previstos no n.º 1.

4 - A administração tributária pronunciar-se-á sobre o requerimento do contribuinte no prazo de 15 dias, findos os quais o juiz resolverá, intimando, se for caso disso, a administração tributária a reintegrar o direito, reparar a lesão ou adoptar a conduta que se revelar necessária, que poderá incluir a prática de actos administrativos, no prazo que considerar razoável, que não poderá ser inferior a 30 nem superior a 120 dias.

5 - A decisão judicial especificará os actos a praticar para integral cumprimento do dever referido no n.º 1.

6 - O disposto no presente artigo aplica-se, com as adaptações necessárias, às providências cautelares a favor do contribuinte ou demais obrigados tributários, devendo o requerente invocar e provar o fundado receio de uma lesão irreparável do requerente a causar pela actuação da administração tributária e a providência requerida» (sublinhado nosso).

Tal como salientado no acórdão do STA, de 01/09/2004, proferido no proc.º0799/04, são requisitos das providências referidas no art.º147.º, n.º6, do C.P.P.T., o «fundado receio de uma lesão irreparável do requerente a causar pela actuação da administração tributária» e a indicação pelo interessado da providência que pretende ver adoptada, que terá de ser adequada a afastar a lesão invocada. No mesmo sentido, pode ver-se o acórdão deste TCAN, de 14/06/2007, proferido no proc.º00342/07.4BEVIS.

Por outro lado, nos termos do n.º1 do art.º362.º do subsidiariamente aplicável Código de Processo Civil, “Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada assegurar a efectividade do direito ameaçado”.

Diz o seu n.º2 que “O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor”.

Sendo o requisito do periculum in mora transversal à concessão da tutela cautelar, quer no processo civil, quer no contencioso administrativo (cf. art.º120.º, n.º1 alíneas b) e c), do CPTA) e tributário, vejamos ele se verifica no caso sub judicio, destacando-se que, tal como exigido pelo n.º6 do art.º147.º do CPPT, no processo judicial tributário o “fundado receio” se tem de reportar a uma lesão irreparável do próprio requerente, não bastando que seja para ele de difícil reparação.

Alega a Requerente (ora Recorrida) no pedido que pretende com a presente providência acautelar o efeito útil da decisão judicial que vier a ser proferida na acção principal que pretende instaurar “para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária”, qual seja, o de ver reconhecido “não ter de receber, na sua morada e/ou na sua pessoa, quaisquer notificações por parte da Administração tributária dirigidas à L... e não ter o dever de as reencaminhar”.

E alegando factualidade integrativa do fundado receio de uma lesão irreparável a causar pela actuação administrativa, diz:


«31. Por um lado, não tendo (como se disse) qualquer obrigação de enviar ou de reencaminhar à L... as notificações remetidas pela Administração tributária para a morada da Requerente, a verdade é que não o deve fazer, sob pena de assumir (ainda que involuntariamente) uma qualificação como legal representante/ representante fiscal/ gestora de bens ou direitos da L..., quando – repete-se – nunca o foi e não o é.
32. E, por outro lado, ao não reencaminhar as referidas notificações dirigidas à L..., a Requerente vê-se na contingência de poder vir a ser demandada judicialmente por aquela empresa no sentido de ser responsabilizada por prejuízos que aquela possa vir a sofrer, decorrentes da preclusão de direitos e garantias processuais.
33. Caso que se tornou particularmente gravoso quando o projecto de relatório de inspecção tributária relativo ao pretenso IRC de 2009 e 2010 daquela L... prevê correcções à matéria tributária de montantes muito elevados».

E, mais adiante, refere o seguinte: «41. (…) tal situação… coloca o Requerente numa situação de indefinição e de elevadíssimo risco, nomeadamente face aos avultados valores em causa (os lucros tributários imputados pela Administração tributária à L... ascendem aos montantes de €15.918.010,28 em 2009 e de €8.710.522,01 em 2010.
42. Riscos, estes, que consubstanciam, de forma óbvia e manifesta face aos valores em causa, num fundado receio de uma lesão irreparável (mesmo fatal) para uma empresa com a dimensão da aqui Requerente, se acaso a L... vier a reagir contra a Requerente».

Tendo em conta os concretos factos alegados pela Requerente, entendemos, salvo o devido respeito, que não se verifica na requerida providência o requisito do periculum in mora.

Porquê? Porque o periculum in mora se tem de traduzir num fundado receio de que quando o processo principal chegue ao fim e sobre ele venha a ser proferida uma decisão de procedência (favorável ao Requerente), essa decisão se torne absolutamente inútil por virtude das circunstâncias entretanto ocorridas durante a pendência do processo principal (e que justamente se pretendem prevenir).

Ora, no caso dos autos, o que se passa é exactamente o contrário disso. O periculum in mora que a Requerente alega apenas sobrevém para ela de uma eventual decisão de improcedência do processo principal e são os efeitos de uma eventual decisão desfavorável que a Requerente pretende acautelar com a presente providência.

Ora, as providências estão construídas para acautelar o efeito útil de uma eventual decisão de procedência do processo principal, por isso que se exige em relação a elas o requisito do fumus boni juris (cf. art.º365.º, do CPC).

E no caso dos autos, o fundado receio de um prejuízo irreparável para a Requerente decorrente de uma eventual acção de responsabilidade da L... “em função da não entrega ou reenvio das notificações” feitas pela Administração tributária, só poderia resultar de uma improcedência do processo principal, concretamente, da acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária visando a declaração judicial “…de a Requerente não ter de receber, na sua morada e/ ou na sua pessoa, quaisquer notificações, por parte da Administração tributária, dirigidas à L... e não ter o dever de as reencaminhar…”.
Nem venha a Requerente dizer que pretende acautelar a preclusão do exercício de direitos processuais pela visada L..., que decorrem das notificações que, indevidamente lhe estão a ser feitas.

Porque se tais notificações estão, afinal, a ser feitas a quem não tem obrigação legal de as receber ou reencaminhar, como sustenta, então são ineficazes relativamente à entidade visada (cf. art.º36.º, do CPPT), não podendo consequenciar para ela qualquer preclusão de direitos e garantias processuais.

Com pertinência, tem a jurisprudência dos tribunais administrativos salientado que para o decretamento da tutela cautelar, tem o tribunal de descortinar indícios de que essa intervenção preventiva é necessária para impedir a consumação de situações que, de outro modo, resultariam com a demora do processo principal. Esse juízo judicial terá de ser baseado na análise de factos concretos que permitam a um terceiro imparcial concluir que a situação de risco é efectiva, não uma mera conjectura, probabilidade e, menos ainda, desnecessária – cf. Acórdão do TCA Sul, de 18/03/2010, proferido no proc.º05935/10.

Em suma, não se encontra preenchido o requisito do periculum in mora, posto que a Requerente não alega factos concretos que permitam perspectivar uma situação de prejuízo irreparável decorrente da procedência do processo principal, sendo inútil indagar da verificação dos restantes requisitos, por ficar logo comprometida a possibilidade de decretamento da providência requerida.


5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e indeferir a providência cautelar requerida.

Custas pela Recorrida.

Porto, 30 de Setembro de 2014
Ass. Vital Lopes
Ass. Fernanda Esteves
Ass. Ana Patrocínio