Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00901/16.4BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/15/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Mário Rebelo
Descritores:PROCEDIMENTO DE INSPEÇÃO QUE EXCEDEU O PRAZO DE SEIS MESES.
Sumário:
1. O procedimento de inspeção inicia-se com a assinatura pelo Sujeito Passivo, obrigado tributário ou seu representante, da notificação da respetiva ordem de serviço (Art.º 51º/2 do RCPITA).
2. E deve ser concluído no prazo de seis meses, salvo as prorrogações legais.
3. Este prazo é de natureza meramente ordenadora, indicativa ou disciplinadora.
4. O decurso do prazo não implica, por si só, qualquer efeito invalidante sobre os actos de liquidação decorrentes das conclusões do procedimento de inspeção tributária. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:CDF, Lda.
Recorrido 1:Autoridade Tributária e Aduaneira
Votação:Unanimidade
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

RECORRENTE: CDF, Lda.
RECORRIDO: Autoridade Tributária e Aduaneira.
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pela MMª juiz do TAF do Porto que julgou improcedente a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IVA relativas aos períodos de 1212T, 1306T, 1309T no montante global de € 15.838,61.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
- Vai o presente Recurso interposto da douta sentença recorrida que julgou improcedente a impugnação interposta pela recorrente sobre as liquidações de IVA dos anos de 2012 e 2013, pelos seguintes motivos:
a. A douta sentença incorre em erro de julgamento, de facto e de direito;
b. Das provas junto aos autos, nomeadamente, do relatório de inspeção tributária, impunha uma decisão diversa da que se encontra vertida na douta sentença;
c. A douta sentença incorre em contradição entre a fundamentação e a decisão;
d. falta de fundamentação, erro na aplicação da lei aos factos, nomeadamente a legislação em vigor aplicável aos factos e à sua época, fazendo, inclusive menções a jurisprudência na qual se decidiram casos reportados aos anos de 2002 e 2003, quando, na verdade, estão em causa os anos de 2012-2013.
2- Decidiu a douta sentença recorrida que não se verifica a caducidade do direito à liquidação, considerando como provados os seguintes factos:
1) Com base na ordem de serviço n. °s 01201401286 de 06-05-2014 da DF Aveiro, iniciou-se ação inspetiva ao sujeito passivo "CDF, Lda" relativo a IVA dos anos de 2013 e 2013 - cfr. fls.1 a 24 do processo administrativo, aqui dadas como reproduzidas para os devidos efeitos legais;
3) A ação inspetiva iniciou-se a 29-05-2014, com a assinatura por BOP da Ordem de Serviço referidas em 1) — cfr. fls. 11 do processo administrativo, aqui dadas como reproduzidas;
4) Da descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas em sede de IVA consta do relatório de inspeção ponto III a fls 18 e seguintes do processo administrativo, aqui dadas como reproduzidas;
5) A 09-07-2014 foi concluída a acção inspectiva - cfr. fls. 11 do PA., aqui reproduzidas;
6) A 08-07-2014, foi elaborado relatório final, tendo dos procedimentos levados a cabo no decurso da ação inspetiva externa resultado alterações dos elementos 3 declarados em sede de IVA, para os anos de 2012 e 2013 - cfr. fls. 11 a 24 do PA., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
7) Em 21-10-2014 foi a Impugnante notificada do relatório de Inspeção Tributário —fls 8 do PA de reclamação Graciosa apenso aos autos;
(...)
9) Na sequência do procedimento de Inspeção foram emitidas as liquidações adicionais de IVA, elaboradas em 17-01-2015, com os n. °s 2015 0027010813862, 2015 0027010813863 e 2015 0027010813627, referentes ao 4.° trimestre de 2012 e 2.° e 3.° trimestres de 2013, no valor total de 15 838,61, a que corresponderam as notas de cobrança n.° 2015 1189202, 2015 1189248 e 2015 1189250, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 30.03.2015 —fls 1 do PA apenso aos autos;
3- Todavia, resulta dos autos que a recorrente foi notificada das liquidações de IVA, supra identificados, nos termos das cópias que junta e dá por reproduzidas para os legais efeitos (Cfr. Docs. 1 a 3 juntos com a p.i.).
4- Ao contrário do que resulta do ponto 1) da decisão de facto, como resulta do teor do RIT (pág. 4 do RIT, a fls. dos autos), o procedimento de inspeção tributária teve o seu início no dia 25.03.2014.
5- No entanto, e como resulta do ponto 6) DOS FACTOS PROVADOS, a recorrente só foi notificada do Relatório de Inspeção Tributária no dia 21/10/2014, através do ofício n.° 58882/0506 da Direção de Finanças do Porto (Cfr. também Docs. 7 e 8 juntos com a p.i).
6- Assim, desde o início do procedimento de inspeção e o seu término (que culminou com a notificação do Relatório de inspeção tributária ao sujeito passivo) decorreram mais de 6 meses.
7- E esta circunstância é violadora do disposto no artigo 36° n° 2 do RCPIT, que institui o prazo de 6 meses para que o procedimento se conclua, de modo contínuo.
- O procedimento de inspeção deveria ter sido concluído até ao dia 25/09/2014 e não houve qualquer prorrogação do prazo para concluir o procedimento de inspeção.
9- Nos termos do disposto no artigo 51.° RCPIT o procedimento de inspeção fica concluído com a elaboração e notificação do Relatório de inspeção, nos termos do disposto no artigo 62.° do RCPIT.
10- E à semelhança dos prazos fixados, por lei, para que os sujeitos passivos possam atacar a legalidade dos atos tributários, também este prazo, fixado para a A.T., deve de ser cumprido, sob pena de caducidade do procedimento de inspeção e do direito à liquidação do imposto, por via do aludido artigo 36.° n.° 2 do RCPIT.
11- Não se trata de um prazo com eficácia meramente interna ou disciplinar, mas de um prazo com eficácia perentória que determina a caducidade do procedimento de inspeção, uma vez ultrapassado, e que tem por consequências:
a) A caducidade e a falta da credenciação dos funcionários da Autoridade Tributária (ex vi artigo 46.° n.° 1 e 2 do RCPIT).
b) A caducidade do direito à liquidação com a consequente anulação das liquidações de IVA reclamadas.
12- Mas mesmo que não se entendesse deste modo, ao ultrapassarem-se os prazos legais da duração do procedimento inspetivo, o Relatório Final dessa inspeção sempre carece de falta de fundamentação, sendo, por isso, um ato NULO.
13- Em face do exposto, sendo ineficaz o procedimento, não poderia tomar-se em consideração toda a atividade inquisitória praticada e as conclusões vertidas, no âmbito do mesmo, pelo que, salvo melhor entendimento, o ato de liquidação está ferido de ilegalidade por preterição de formalidades legais, violação de lei e falta de fundamentação, e assim se deveria concluir na douta sentença recorrida.
14- Em face do exposto, em face do teor do RIT, nomeadamente o constante na pág. 4 deste documento, deveria ter-se dado por provado que o procedimento inspetivo teve o seu início em 25/03/2014.
15- Por outro lado, a fundamentação expendida pela douta sentença recorrida, para concluir pela não verificação da caducidade, é remetida para a JURISPRUDÊNCIA dos Acórdãos do STA de 7/12/2005 e de 2/02/2006, recursos n.°s 993/05 e 769/06 (cfr. pág. 8 da douta sentença) e, ainda o Acórdão Pleno de Secção do CT do STA de 7/05/2003, proferido no processo n.° 065/02, transcrito, em grande parte, nas pág.s 9 a 14 da douta sentença recorrida.
16- Todavia, os factos que aí estão em causa reportam-se aos anos de 2002 e 2003 (nos presentes autos está em causa o IVA dos anos de 2012 e 2013), sendo certo que a redação em vigor no período a que aqueles acórdãoes se reportam já não estava em vigor à data das liquidações sub iudice, nomeadamente a redação do artigo 45.° n.° 5 da LGT, entretanto eliminado pela Lei n.° 32-B/2002 de 30 de Dezembro.
17- Pelo que a fundamentação expendida para declarar a não verificação da caducidade não é a adequada e incorre em erro de interpretação da lei e do direito, face ao período temporal a que se reporta esta impugnação.
18- Em face do exposto, deve a douta sentença recorrida ser objeto de anulação ou revogada, concluindo-se por via de ter sido ultrapassado o prazo do procedimento de inspeção, pela caducidade do direito á liquidação ou nulidade do ato, por falta de credenciação dos inspetores e a sua falta de fundamentação.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, com o douto suprimento de V/Ex.as, Venerandos senhores Doutores Juízes desembargadores, deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado e, por consequência, revogar-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue totalmente procedente a impugnação relativa às liquidações de IVA dos anos de 2012 e 2013.
ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!!!
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CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.
PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela improcedência do recurso e confirmação da sentença recorrida.
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II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou no julgamento de facto e de direito ao julgar improcedente a impugnação deduzida contra as liquidações de IVA acima referenciadas.
Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.
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III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:
1) Com base na ordem de serviço n.°s 01201401286 de 06-05-2014 da DF Aveiro, iniciou-se ação inspetiva ao sujeito passivo "CDF, Lda" relativo a IVA dos anos de 2013 e 2013 - cfr. fs.1 a 24 do processo administrativo, aqui dadas como reproduzidas para os devidos efeitos legais;
2) A ação inspetiva iniciou-se a 29-05-2014, com a assinatura por BOP da Ordem de Serviço referidas em 1) — cfr. fls. 11 do processo administrativo, aqui dadas como reproduzidas;
3) Da descrição dos factos e fundamentos das correções meramente aritméticas em sede de IVA consta do relatório de inspeção ponto III a fls 18 e seguintes do processo administrativo, aqui dadas como reproduzidas;
4) A 09-07-2014 foi concluída a acção inspectiva - cfr. fls. 11 do PA., aqui reproduzidas;
5) A 08-07-2014, foi elaborado relatório final, tendo dos procedimentos levados a cabo no decurso da ação inspetiva externa resultado alterações dos elementos declarados em sede de IVA, para os anos de 2012 e 2013 - cfr. fls. 11 a 24 do PA., cujo teor se dá por integralmente reproduzido;
6) Em 21-10-2014 foi a Impugnante notificada do relatório de Inspeção Tributário — fls 8 do PA de reclamação Graciosa apenso aos autos;
7) Em 07-05-2015 o aqui Impugnante veio apresentar Reclamação Graciosa — fls 2 do PA de reclamação Graciosa apenso aos autos;
8) Em 05-01-2016 foi proferido despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa — lis 27 do PA de reclamação Graciosa apenso aos autos;
9) Na sequência do procedimento de Inspeção foram emitidas as liquidações adicionais de IVA, elaboradas em 17-01-2015, com os n.°s 2015 0027010813862, 2015 0027010813863 e 2015 0027010813627, referentes ao 4.° trimestre de 2012 e 2.° e 3.° trimestres de 2013, no valor total de € 15 838,61, a que corresponderam as notas de cobrança n.° 2015 1189202, 2015 1189248 e 2015 1189250, cuja data limite de pagamento voluntário ocorreu em 30.03.2015 — lis 1 do PA apenso aos autos;
10) A presente Impugnação deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal via site em 06-04-2016 — fls 2 dos autos;
Factos não provados:
Inexistem, com relevância para a boa decisão a causa.
Fundamentação da matéria de facto:
A decisão da matéria de facto provada, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos constantes no Processo Administrativo apenso, nomeadamente no relatório de inspeção e os respetivos anexos, e Processo de Reclamação Graciosa, referidos em cada uma das alíneas do elenco dos factos provados, os quais não foram impugnados e que, dada a sua natureza e qualidade, mereceram a credibilidade do tribunal. Considerando, ainda, o tribunal o disposto no art.° 76.° da LGT, em conjugação com o princípio da livre apreciação da prova.
ADITAMENTO OFICIOSO DE FACTOS (ao abrigo do disposto no art. 662º do CPC):
11. Consta do Relatório de Inspeção efetuada à Impugnante o seguinte quadro (fls. 4):
N.º DespachoDI201400208
Lugar do Procedimento de Inspeção (artigo 13º do RCPIT)Externo.
Início da ação inspetiva- Notificação da Ordem de Serviço (n.ºs 1 e 2 do art.º 51º do RCPIT)2014-03-25
12. E a seguir a este quadro, escreveu-se no mesmo RIT o seguinte:
“Face às situações detetadas a coberto do despacho antes identificado, que serão descritas ao longo do presente relatório, foi proposta, a 2014-05-02, a abertura da ordem de serviço externa, que mereceu parecer favorável do Chefe de Divisão a 2014-05-05”
*
IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A impugnante foi sujeita a ação de fiscalização externa credenciado pela OI 201401286, que incidiu sobre os exercícios de 2012 e 2013 concluindo pela correção por correção aritmética e correções com recurso a métodos indiretos, nos dois exercícios.
O Contribuinte discordou e reclamou graciosamente alegando que o procedimento de inspeção foi levado a cabo com preterição de formalidades legais, falta de fundamentação e violação de lei, no erradamente, do disposto nos artigos 36º n.º 2, 46º n.º 1 do RCPIT e artigo 77º da LGT.
Desde o início da inspeção (25/3/2014) até à sua notificação em 21/10/2014 decorreram mais de seis meses, sem que tenha havido qualquer prorrogação do prazo para a sua conclusão, não sendo de aplicar o disposto no art.º 26º da Lei n.º 75-A/2014 de 30/9, uma vez que esta só enterrou em vigor no dia 1/10/2014.
A Reclamação foi indeferida por despacho de 30 de dezembro de 3015.
Inconformado, deduziu impugnação judicial com os mesmos fundamentos que, por sentença de 6/12/2017, foi julgada totalmente improcedente.
A sentença refletiu sobre a alegada caducidade do direito à liquidação e concluiu que esta se não verificou pois, de acordo com a prova, a ação inspetiva teve início com a notificação ocorrida em 29/5/2014 e terminou em 21/10/2014. Ou seja, não excedeu o prazo de seis meses para a sua realização.
E quanto à falta de fundamentação e vício de violação de lei a sentença relembrou a “total ausência de factos consubstanciadores dos vícios apontados, apenas referências aos referidos vícios...”. Por não vislumbrar quaisquer factos que suportem o vício de violação de lei, limitou-se a refletir sobre a alegada falta de fundamentação, concluindo que a mesma se não verifica.
Recorrendo para este TCA, reitera a Impugnante que o procedimento de inspeção tributária teve o seu início em 25/3/2014, pelo que apenas tendo sido notificada do Relatório em 21/10/2014, decorreram mais de seis meses, circunstância que é violadora do disposto no art. 36º/2 do RCPIT. Uma vez ultrapassado o prazo de inspeção, as consequências são a caducidade, a falta de credenciação dos funcionários da AT e a caducidade do direito à liquidação.
Mas mesmo que assim se não entenda, a ultrapassagem dos prazos legais de duração do procedimento inspetivo, o Relatório final dessa inspeção sempre carece de falta de fundamentação, sendo por isso um acto nulo.
Além disso, acrescenta, os acórdãos em que a sentença se baseia referem-se a factos dos anos de 2002 e 2003 reportando-se a uma legislação que não estava em vigor na data das liquidações impugnadas, nomeadamente a redação do art.º 45º n.º 5 da LGT, entretanto eliminado pela Lei n.º 32-B/2002 de 30 de dezembro.
Desta breve síntese, podemos concluir que o Recorrente imputa à sentença erro de julgamento de facto por considerar que a inspeção teve o seu início no dia 25/3/2014 e não 29/5/2014 como consta da sentença. E tendo sido notificada do RIT apenas em 21/10/2014 decorreram mais de seis meses desde o início da inspeção até à sua conclusão o que implica caducidade por falta de credenciação dos funcionários da Autoridade Tributária e caducidade do direito à liquidação com a consequente anulação das liquidações impugnadas.
Não defende o Recorrente que a liquidação tenha sido notificada mais de quatro anos contados a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou o a exigibilidade do imposto (art.º 45º/1-4 LGT), mas sim que ocorreu caducidade do procedimento de inspeção que, no dizer da Recorrente, se prolongou por mais de seis meses sem prorrogação.
O procedimento inspeção inicia-se com a assinatura pelo Sujeito Passivo, obrigado tributário ou seu representante, da notificação da ordem de serviço (Art.º 51º/2 do RCPITA).
Consta do Relatório, e foi aditado aos factos provados, que a coberto do despacho DI201400208 o início da ação inspetiva ocorreu em 25/3/2014.
No quadro seguinte, que fundamentou o facto provado n.º 2 da sentença, consta que a coberto da OI20140128 o início da ação inspetiva – Notificação da ordem de serviço, assinada por BOP, teve lugar em 29/5/2014.
Apesar do exposto, a Impugnante/Recorrente não foi sujeita a duas ações de inspeção com o mesmo objeto: uma iniciada em 25/3/2014 e outra em 29/5/2014. O Impugnante/Recorrente não diz isso, nem tal resulta dos autos. O que a AT esclarece, no parecer que antecedeu o indeferimento da Reclamação Graciosa, é que o despacho DI201400208 (assinado em 25/3/2014) teve “...como objectivo a consulta, recolha e cruzamento de dados em resultado de uma ação inspectiva à “PML, Lda, (...) fornecedora de serviços da impugnante”.
Não se sabe qual a amplitude da consulta, recolha e cruzamento de dados, podendo estar-se efetivamente perante actos materiais de inspeção 1).
Mas ainda que assim seja, o decurso do prazo de seis meses para conclusão do procedimento de inspeção (salvo as prorrogações legalmente previstas) não acarreta “...por si só, qualquer efeito invalidante sobre os actos de liquidação decorrentes das conclusões do procedimento de inspeção tributária, pelo que se afigura de natureza meramente ordenadora, indicativa ou disciplinadora” 2)
Por isso, mesmo que o procedimento inspetivo tivesse ultrapassado o prazo de seis meses para a sua conclusão, sem a prorrogação legal, a única consequência da caducidade da inspecção, é a cessação do efeito suspensivo da liquidação, “contando-se o prazo desde o seu início”.
Com efeito, nos termos do artigo 46º/1 da LGT, “o prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da acção de inspecção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo do seu início, caso a duração da inspecção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação”.
Por conseguinte, eliminando para a caducidade o período compreendido entre 25/3/2014 (data em que o Recorrente alega ter sido iniciada a inspeção) e a data da notificação das liquidações (cujo prazo de pagamento voluntário ocorreu em 30/3/2015) bem vemos que não ocorreu qualquer caducidade do direito à liquidação, contado nos termos do art. 45 da LGT.
E seria esta a única “sanção” para a ultrapassagem do prazo de seis meses para a conclusão do procedimento de inspeção. Ou seja, excedendo-se o prazo de seis meses para conclusão do RIT, sem haver prorrogação (art. 36º/3 RCPIT), a sanção legal é a inutilização da suspensão do prazo de caducidade a que houve lugar e neste caso, “...tudo se passa como se não tivesse ocorrido qualquer suspensão desse prazo, contando-se desde o seu início, sem qualquer pausa” 3).
É esta a única sanção legal para a ultrapassagem do prazo legal de inspeção, sem prorrogações. Ao contrário do que advoga o Recorrente, tal ultrapassagem não implica falta de credenciação dos funcionários da Autoridade Tributária, falta de fundamentação do Relatório de inspeção e muito menos caducidade do direito à liquidação – excepto se se tiver excedido o prazo de 4 anos previsto no art. 45º da LGT, o que manifestamente não é o caso.
E também é esta a interpretação que se colhe da lei e que a jurisprudência tem sufragado, sem que se conheça qualquer nota dissonante sobre o assunto (os acs referidos no Ac. do STA n.º 0709/14 de 25-02-2015 são disso exemplo).
De resto, o n.º 7 do art. 36º do RCPIT aditado pela Lei n.º 756-A/2014, de 30 de setembro, corrobora, em letra de lei, tal interpretação ao estatuir que o decurso do prazo do procedimento de inspeção determina o fim dos atos externos de inspeção, não afetando, porém, o direito à liquidação dos tributos.
Adicionalmente, a Recorrente defende que a sentença incorre em contradição entre a fundamentação e a decisão, falta de fundamentação e erro na aplicação da lei aos factos.
Depreendemos que o Recorrente se refere à nulidade da sentença prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC (e 125º/1 do CPPT), nos termos do qual é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão, sem esclarecer nem densifica o qual é a contradição entre a fundamentação e a decisão.
Todavia, este vício terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adotada 4), e não vemos que isso tenha ocorrido na sentença sob recurso.
No tocante à falta de fundamentação o Recorrente esclarece que ela resulta da invocação em abono da tese da sentença, de acórdãos que se reportam a uma lei que não estava em vigor na data a que se reportam as liquidações. Mas tal invocação não contamina a sentença com o vício de falta de fundamentação, mas sim, quando muito, com o vício de erro de julgamento de direito que, mercê da confirmação que nos merece, também não se verifica.
Pelo exposto se conclui que o recurso não merece provimento, sendo de confirmar a sentença recorrida que bem julgou improcedente a impugnação.
***
V DECISÃO.
Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.
Porto, 15 de novembro de 2018.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Cristina da Nova
Ass. Bárbara Tavares Teles
-*-
1) Ac. do STA n.º 0914/13 de 05-11-2014 - Relator: CASIMIRO GONÇALVES
Sumário: I - O procedimento de inspecção externa inicia-se com a assinatura, pelo sujeito passivo ou obrigado tributário, da ordem de serviço ou do despacho que a determinou, devendo ser-lhe entregue uma cópia (art.º 51.º n.ºs 1 e 2 do RCPIT).
II - De acordo com o disposto no art.º 44.º do RCPIT o procedimento de inspecção é previamente preparado (a preparação prévia consiste na recolha de toda a informação disponível sobre o sujeito passivo ou obrigado tributário em causa, incluindo o processo individual arquivado nos termos legais na DGI, as informações prestadas ao abrigo dos deveres de cooperação e indicadores económicos e financeiros da actividade), programado e planeado tendo em vista os objectivos a serem alcançados (a programação e planeamento compreendem a sequência das diligências da inspecção tendo em conta o prazo para a sua realização previsto no presente diploma e a previsível evolução do procedimento).
III - Actos materiais do procedimento externo de inspecção são, essencialmente, os que visem e impliquem a directa observação da realidade tributária do sujeito passivo, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias ou a prevenção das infracções tributárias (n.º 2 do art.º 2º do RCPIT), aí se integrando os que se substanciem em exame de documentos, consulta de sistemas informáticos (als. b) e al. c) do n.º 1 do art.º 29.º do RCPIT), recolha de documentos que possa subsumir-se na previsão dos art.ºs 55.º e 56.º, também do RCPIT), a inventariação de bens ou, ainda, a tomada de declarações (nos preditos termos) a sujeitos passivos e outros intervenientes.
Não são de integrar no conceito de acto material do procedimento externo de inspecção, prévios pedidos de elementos a entidades terceiras (com quem o sujeito passivo mantém relações profissionais e económicas) operados ao abrigo do princípio da colaboração (n.º 2 do art.º 31.º e n.º 4 do art.º 59.º da LGT e al. b), do n.º 3, do art.º 29.º do RCPIT), se tais elementos não são directamente objecto de qualquer análise ou apreciação.
IV - O n.º 1 do art.º 49 do RCPIT aplica no âmbito tributário o princípio da comunicação previsto no art.º 55.º do CPA e à luz deste normativo, a falta de comunicação do início de procedimento oficioso não gera invalidade se, não obstante a mesma, se demonstrar que o interessado teve conhecimento do procedimento (e do respectivo objecto) a tempo de nele poder intervir.

2) In RCPITA Anotado, Coordenação Prof.ª Doutora Glória Teixeira e Mestre Patrícia Anjos Azevedo (Lex it”, pp. 43.)
e acórdão do STA n.º 0709/14 de 25-02-2015 Relator: ARAGÃO SEIA
Sumário: I - O procedimento de inspecção parcial ou univalente não pode ser prorrogado - artigos 14.º, n.º1, e 36.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária.
II - Tal prorrogação determina a caducidade da inspecção.
III - Esta não sequência necessariamente, a se, a ilegalidade da liquidação mas apenas a cessação do efeito suspensivo da própria inspecção, pelo que corre, então, desde o início, o prazo de caducidade da liquidação - artigo 46.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária.
IV - Tal interpretação, nos termos da qual e em síntese, a inobservância dos prazos legalmente definidos para a inspecção apenas relevam directamente em sede de caducidade da liquidação, não ofende os princípios constitucionais da legalidade, proporcionalidade e imparcialidade.

3) Assim, José Maria Fernandes e outros, in "Lei Geral Tributária" anotada, Almedina, 2015, pp. 422.

4) Ac. do TCAS n.º 07435/14 de 30-04-2014 (Relator: JOAQUIM CONDESSO)