Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00265/13.8BEVIS
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/18/2020
Tribunal:TAF de Viseu
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:EMPRESA MUNICIPAL; REQUISIÇÃO; CEDÊNCIA DE INTERESSE PÚBLICO; MANUTENÇÃO ESTATUTO DE ORIGEM; TRABALHO EXTRAORDINÁRIO.
Sumário:1-A mobilidade, através de requisição, dos trabalhadores da Administração Local que em 31.12.2008 se encontrassem a exercer funções em empresa municipal, converteu-se automaticamente na situação jurídico-funcional de cedência de interesse público.

2-Os trabalhadores requisitados em empresa municipal que aquando da transição para a modalidade jurídico-funcional de cedência de interesse público, operada ope legis em 01.01.2009, beneficiassem da existência de acordo celebrado antes da conversão, ao abrigo do regime de mobilidade que então lhes era aplicável, que lhes assegurasse o estatuto de origem, mantêm esse estatuto.

3- O trabalho extraordinário só pode ser prestado quando o órgão ou serviço tenha de fazer face a acréscimos eventuais e transitórios de trabalho e não se justifique a admissão de trabalhador, ou em caso de motivo de força maior ou quando o mesmo se torne indispensável para prevenir ou reparar prejuízos graves para o órgão ou serviço, ficando no entanto sujeito aos limites de duração média do trabalho previstos na lei.

4- A sujeição dos trabalhadores da administração local na situação jurídico- funcional de cedência de interesse público em empresa municipal, a um horário de trabalho de 8 horas diárias e 40 horas semanais, quando os mesmos tinham direito a que lhes fosse aplicado o horário de trabalho da função púbica de 7 horas diárias e 35 horas, embora traduza um excesso de horas de trabalho face ao que lhes devia ser exigido, não configura trabalho extraordinário.*
* Sumário elaborado pela relatora
Recorrente:STAL
Recorrido 1:T., EM
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Condenação à Prática Acto Devido (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam os Juízes Desembargadores Da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
1.1. STAL – SINDICATO NACIONAL DOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO LOCAL, com sede na Rua (…), contribuinte fiscal n.º (…), em representação e defesa dos seus associados, A., com a categoria de Assistente Técnica, residente em (…); M., com a categoria de Assistente Operacional (Auxiliar Técnico de Balneoterapia), residente em (…); M., com a categoria de Assistente Operacional (Auxiliar Técnico de Balneoterapia), residente em (…) e J., com a categoria de Assistente Operacional (Operador de Estações Elevatórias), residente em (…); todos trabalhadores da Câmara Municipal de (...), integrando o quadro de pessoal da mesma, a exercer funções na empresa municipal T., E.E.M.. moveu a presente ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido contra o MUNICÍPIO DE (...), com sede no Largo (…) e contra a T., E.E.M., com sede na Praça (…), peticionando que a presente ação seja julgada procedente por provada e em consequência:
a)- Seja declarado que a omissão de decisão dos requerimentos formulados pelos AA juntos a esta PI como docs. nºs 33 a 36, viola o disposto nos arts. 163º e 212º da Lei nº 59/2008 de 11/9;
b)- Seja a R T., E.E.M. condenada a deferir os requerimentos ora juntos como docs. n.ºs 33 a 36;
c)- Serem os RR condenados solidariamente a compensar o trabalho extraordinário supra identificado prestado pelos associados do A nos seguintes termos:
- À associada A. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 211h00m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 5.309,89;
- À associada M. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 227h00m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 4.245,52; - À associada M. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 224h00m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 6.043,33;
- Ao associado J. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 240h30m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 7.576,72;
d)- Serem os RR condenados solidariamente a pagar aos mesmos associados do A, juros de mora sobre as importâncias identificadas na alínea anterior deste petitório a contar da sua citação até efetivo e integral pagamento;
e)- Serem os RR condenados a repor o horário de trabalho que é legalmente estabelecido aos associados do A de 7 horas diárias e 35 horas semanais, nos termos do artigo 126º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09.
Para tanto, alegou, em síntese, que os seus associados são todos trabalhadores da Câmara Municipal de (...) e que se encontram a exercer funções na T., em regime de requisição e de comissão de serviço, por força da celebração do “Protocolo de Transição de Pessoal celebrado entre a Câmara Municipal de (...) e T., E.M.”, homologado em 09.03.2004;
Nesse protocolo ficou estabelecido na cláusula V que se mantém «o regime de horário de duração do horário de trabalho em vigor para a Administração Local, designadamente nas modalidades de trabalho extraordinário, noturno e em dias de descanso e feriados», pelo que os seus associados se encontram obrigados ao cumprimento do horário de trabalho que respeite o limite máximo de duração legalmente previsto no artigo 126.º, n.º1 da Lei 58/2008, de 11/09.
Sucede que, a partir de Agosto de 2008, a T. impôs aos seus associados um horário de 8 horas diárias e 40 horas semanais, em violação dos artigos 126.º, n.º1 e 135.º, n.º1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09;
Por essa razão, os seus associados têm prestado, desde então para cá, uma hora de trabalho extraordinária por dia, o qual deve ser compensado, com a atribuição de descanso compensatório previstos no art.º 163.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 59/08, de 11/09 e com o acréscimo remuneratório previsto no art.º 212.º da citada lei, correspondente a 50% da remuneração;
No dia 23/05/2012 os seus associados dirigiram à Ré requerimentos solicitando o pagamento das horas extraordinárias em falta, a reposição do horário de trabalho de 7 horas diárias e 35 horas semanais, não tendo sido proferida nenhuma decisão, pelo que se encontram reunidos os requisitos para lhe ser imposto o deferimento da pretensão deduzida.
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1.2. Citado, o Município de (...) apresentou a contestação de fls. 88 a 94 (processo físico), pugnando para pela sua ilegitimidade passiva e, caso assim não se entenda, pela improcedência da ação.
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1.3. Citada, a T. (...), E.M.SA apresentou a contestação de fls. 105 a 120, suscitando a exceção dilatória da incompetência material do TAF para julgar o objeto da presente ação e em sede de impugnação, pugnou pela improcedência da ação por manifesta falta de fundamento, requerendo a sua absolvição dos pedidos formulados, com todas as consequências legais. Mais informou da inexistência de processo administrativo.
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1.4. Notificado, o autor pronunciou-se sobre as exceções suscitadas nos termos do requerimento de fls. 214 a 219, pugnando pela sua improcedência, concluindo como na petição inicial.
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1.5. Notificou-se a Ré T., ordenando-se-lhe a junção aos autos dos elementos documentais referentes ao trabalho suplementar prestado pelos representados do Autor, designadamente, recibos de vencimentos e registos de ponto, no período em causa nos autos.
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1.6. Por requerimento de fls. 257 a 394, a Ré T. juntou aos autos os recibos de vencimento e registos de ponto dos representados do autor.
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1.7. Proferiu-se despacho a notificar o Autor para esclarecer a situação invocada pelo Município notando que os vencimentos auferidos pelos seus associados são superiores ao auferidos na Câmara Municipal, indicando qual era o vencimento dos seus associados na CMSPS e qual passou a ser na Empresa Municipal T., E.E.M..
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1.8. O autor respondeu:
(i) que não foi possível aos seus associados obterem informação de quais foram as suas remunerações no último mês em que trabalharam na Câmara Municipal de (...) e quais foram as remunerações que passaram a auferir desde logo quando passaram a exercer funções na empresa T., E.E.M., uma vez que já não têm em seu poder os respetivos recibos;
(ii) que seja a Câmara Municipal de (...) notificada para informar qual foi a última remuneração que foi paga aos seus associados antes de começarem a trabalhar na empresa Municipal T., E.E.M., e esta notificada para informar qual foi a primeira remuneração que lhes pagou quando nela passaram a exercer funções vindos da Câmara Municipal de (...).
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1.9. Ordenou-se a notificação da Câmara Municipal de (...) para informar, qual a última e a primeira remuneração dos identificados associados do Autor na CMSPS e a Empresa Municipal T., E.E.M., para informar qual foi a primeira remuneração que lhes pagou quando para ela passaram a exercer funções vindos da CMSPS.
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1.9. O Município e a T. prestaram as informações de fls. 418 a 420.
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1.10. O autor pronunciou-se nos termos de fls. 425.
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1.11. Proferiu-se despacho saneador de fls. 428 a 430, no qual se julgou improcedente a exceção da incompetência em razão da matéria e procedente a exceção da ilegitimidade do Município de (...), e considerou-se que o estado do processo permitia, sem mais indagações, apreciar o pedido e conhecer do mérito da causa, pelo que se ordenou a notificação das partes nos termos do art. 91.º, n.º 4 do CPTA para, querendo, apresentarem alegações escritas, prerrogativa que apenas o autor usou.
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1.12. O TAF de Viseu proferiu decisão que julgou a ação improcedente, constando da mesma o seguinte segmento decisório:
«Pelo exposto, julga-se improcedente a presente ação administrativa especial e, em consequência, absolve-se a entidade demandada dos pedidos formulados pelo Autor.
Sem custas, atenta a isenção de que beneficia o autor.
Registe e notifique.»
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1.13. Inconformado com o assim decidido, o autor interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida, apresentando as seguintes conclusões:

«A) A douta sentença recorrida julgou a presente ação improcedente e absolveu a Recorrida dos pedidos formulados pelo Recorrente.
B) Tendo em conta os factos provados e especificamente a prova documental, o Recorrente não pode concordar com a argumentação expendida na douta sentença recorrida e consequentemente com o que na mesma foi decidido.
C) A douta sentença recorrida decidiu-se pela improcedência da presente ação por julgar que não tinha sido celebrado entre a CM e a EM qualquer acordo ou protocolo que regule a manutenção do estatuto dos trabalhadores cedidos, nos termos do disposto no art. 18º, nº 1 do Decreto-Lei nº 209/2009, de 03/09, pelo que se encontra suspenso o estatuto de origem dos trabalhadores associados do Recorrente, não lhes sendo portanto aplicável o disposto no art. 126º, nº 1 da Lei nº 59/2008, de 11/09.
D) O Recorrente permite-se discordar do assim doutamente decidido porque resultou provada a celebração de um protocolo que regulou o estatuto dos trabalhadores cedidos, concretamente o “Protocolo de Transição de Pessoal celebrado entre a Câmara Municipal de (...) e T. E.M.”, o qual se encontra junto aos autos.
E) Protocolo esse que visou a definição das regras a observar nos processos de requisição, destacamento ou comissão de serviço relativos a pessoal do quadro da Câmara Municipal de (...) para a empresa municipal T. (...) E.M..
F) Protocolo que na alínea h) da cláusula V previu expressa e especificadamente que se mantinha o “regime de duração do horário de trabalho em vigor para a Administração Local, designadamente nas modalidades de trabalho extraordinário, nocturno e em dias de descanso e feriados”.
G) Com efeito, o, determina o seguinte:
H) O nº 2 do art. 18º do Decreto-Lei nº 209/2009, de 03/09 determina que a manutenção do estatuto de origem dos trabalhadores que a 01/01/2009 se encontravam em situação de mobilidade para entidade excluída do âmbito de aplicação objetivo da Lei n.º 12­A/2008, de 27/02, como é o caso dos associados do Recorrente, depende do acordo celebrado entre as partes ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão.
I) A manutenção do estatuto de origem depende de acordo celebrado entre as partes ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão da mobilidade em cedência de interesse público por efeito do disposto no art. 103º da Lei nº 12-A/2008 conjugado com o art. 18º do DL nº 209/2009.
J) O que sucedeu com o protocolo de 2004 junto à PI como doc. nº 9, que visou regular a transição dos trabalhadores associados do Recorrente.
K) Impunha-se concluir pela ilegalidade da atuação da Recorrida e pela manutenção do estatuto de origem dos associados do Recorrente, por isso mesmo resultar do protocolo celebrado ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão (requisição) ocorrida com efeitos a 01/01/2009 por força do disposto no art. 103º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02 conjugado com o art. 18º do DL nº 209/2009, 03/09, normas essas que foram objeto de errada interpretação pela douta sentença recorrida, assim as violando.
L) A douta sentença proferida não podia dar como provado o facto 20 da matéria de facto (20) Não foi celebrado qualquer acordo ou protocolo entre a Câmara Municipal de (...) e a T. que regule a manutenção do estatuto dos trabalhadores cedidos), nem poderia ter decidido que por isso o estatuto de origem dos trabalhadores associados do Recorrente se encontrava suspenso, julgando assim não lhes ser aplicável o disposto no art. 126º, nº 1 da Lei nº 59/2008, de 11/09 e, consequentemente julgando improcedente a presente ação.
M) Impunha-se julgar que, não se encontrando suspenso o estatuto de origem dos associados do Recorrente, aos mesmos era aplicável o regime legal da Lei nº 59/2008, de 11/09, designadamente o seu art. 126º, nº 1, e bem assim os arts. 135º, nº 1, 163º, nºs 1 e 2 e 212º.
N) Os associados do Recorrente encontravam-se obrigados ao cumprimento de um horário de trabalho que respeitasse o limite máximo de duração legalmente previsto no artigo 126º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09, de 7 horas por dia e 35 horas por semana, o sucedeu de 2004 a agosto de 2008, data a partir da qual a Recorrida lhes impôs um horário laboral de 8 horas diárias e 40 horas semanais, em clara violação aos artigos 126º, n.º 1 e 135º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09.
O) Por efeito de tal alteração, desde agosto de 2008 até à presente data, os associados do Recorrente, ininterruptamente, vêm prestando 1 hora de trabalho extraordinário por dia – conforme mapas anexos aos Requerimentos juntos à PI como docs. n.ºs 33 a 36 reportados aos anos de 2008 e 2009 –, a qual não se lhes encontra a ser remunerada.
P) Num total de 67 horas de trabalho extraordinário desde agosto a dezembro de 2008 e de 87,5 horas desde março a dezembro de 2009 e bem assim ao longo dos anos de 2010, 2011 e 2012, obrigando os associados do Recorrente à prestação de um total de 3 615 horas de trabalho extraordinário até à data de entrada da PI em juízo.
Q) Trata-se de trabalho extraordinário por ter sido prestado fora do horário normal de trabalho e que deve ser compensado com a atribuição de descanso compensatório previsto no art. 163º nºs 1 e 2 da Lei nº 59/08 de 11/9, ou seja correspondente a 25% das horas de trabalho extraordinário realizado e com o acréscimo remuneratório previsto no art. 212º da mesma lei, correspondente a 50% da remuneração.
R) Devendo tal trabalho extraordinário prestado até à data da entrada da PI ser compensado relativamente a cada um dos trabalhadores associados do Recorrente nos seguintes termos: À associada A. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 211h00m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 5.309,89, à associada M. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 227h00m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 4.245,52, à associada M. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 224h00m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 6.043,33 e ao associado J. atribuindo-lhe o descanso compensatório de 240h30m e pagando-lhe o acréscimo remuneratório de € 7.576,72.
S) Por determinação superior e em obediência a esta, estes trabalhadores prestaram trabalho fora e para além do seu horário normal de trabalho e portanto extraordinário, o qual lhes foi exigido e aceite pela Recorrida além dos limites legalmente previstos e cuja compensação se recusa a efetuar.
T) Impõe-se ainda que a Recorrida seja obrigada a pagar juros de mora sobre tais quantias e a repor o horário de trabalho que é legalmente estabelecido aos associados do Recorrente de 7 horas diárias e 35 horas semanais.
U) No dia 23/05/2012 os associados do Recorrente dirigiram à Recorrida T. requerimentos individuais solicitando o pagamento das horas extraordinárias em falta, desde agosto de 2008 àquela data, nos termos do artigo 212º da Lei n.º 59/2008, de 11/09, e bem assim a reposição do horário de trabalho de 7 horas diárias e 35 horas semanais, nos termos do artigo 126º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09, juntos à PI como docs. nºs 33 a 36, sobre os quais a Recorrida não proferiu qualquer decisão.
V) Deve a Recorrida ser condenada a compensar o trabalho extraordinário prestado, o que é imposto pelos referenciados arts. 163º e 212º da Lei nº 59/08 de 11/09, que a douta sentença recorrida violou.
W) Violou também o art. 59º da Constituição da República Portuguesa cuja alínea a) do seu nº 1 prevê que todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade.
X) Trata-se de trabalho que tem de ser compensado/remunerado nos termos sobreditos sob pena de se ter que admitir a prestação de trabalho sem direito à respetiva remuneração.
Y) Ao decidir como decidiu a douta sentença violou o disposto no art. 18º do DL nº 209/2009, de 03/09, bem como o art. 103º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02 e bem assim o art. 126º, nº 1 e os arts. 135º, nº 1, 158º, 159º, 163º, nºs 1 e 2, 210º e 212º a 215º, todos da Lei nº 59/2008, de 11/09, e ainda o art. 59º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que de tais normas efetuou uma errada interpretação.»
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1.14. A Ré T. contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:

«1- Inexiste qualquer contradição entre o afirmado em 5 dos factos provados que resulta de documento junto aos autos e o julgado provado em 19 e 20, já que,
2- As alterações legislativas introduzidas pelo DL nº 12-A/2008 que ditam a suspensão ope legis do estatuto de origem dos representados do recorrente só não se aplicariam se, nesse momento ou posteriormente, tivesse havido acordo expresso entre o Município, a recorrida e os trabalhadores, nesse sentido.
3- É manifesto que inexistindo qualquer acordo simultâneo ou posterior à criação desse instrumento de mobilidade - cedência de interesse público - , não se pode cair na previsão do nº 2 do art. 18º mas na regra do seu nº 1.
4- A douta sentença recorrida faz uma correcta enunciação dos factos julgados provados, fundamentando esse seu julgamento e
5- Aplica-lhes correctamente o direito, não merecendo qualquer censura.»
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1.15. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público, não emitiu parecer.
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1.16. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
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II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2.1. Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.2. Assentes nas enunciadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem resumem-se a saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento quanto à matéria de direito por ao decidir como decidiu ter violado o disposto no art. 18º do DL nº 209/2009, de 03/09, bem como o art. 103º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02 e bem assim o art. 126º, nº 1 e os arts. 135º, nº 1, 158º, 159º, 163º, nºs 1 e 2, 210º e 212º a 215º, todos da Lei nº 59/2008, de 11/09, e ainda o art.º 59º da Constituição da República Portuguesa, efetuando uma errada interpretação de tais normas.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
A.DE FACTO
3.1. A 1.ª Instância deu como provados os seguintes factos:
«1) O STAL é uma associação sindical constituída pelos trabalhadores nele filiados que, independentemente do seu vínculo, tipo de regime ou de contrato, exerçam atividade profissional na Administração Pública, Local ou Regional, nas empresas públicas ou concessionárias de serviços públicos ou em quaisquer entes públicos ou privados que se encontrem investidos em poderes de autoridade na prossecução de fins públicos ou prossigam atividades de utilidade pública local, regional ou inter-regional.
2) Os trabalhadores A., com a categoria de Assistente Técnica; M., com a categoria de Assistente Operacional (Auxiliar Técnico de Balneoterapia); M., com a categoria de Assistente Operacional (Auxiliar Técnico de Balneoterapia) e J., com a categoria de Assistente Operacional (Operador de Estações Elevatórias) são associados do STAL, tendo emitido declaração de interesse e consequentemente de não oposição para que este mesmo Sindicato proponha a presente ação - cfr. docs. n.ºs 1 a 8 juntos com a petição inicial.
3) Os trabalhadores associados supra identificados, cujo rendimento anual auferido não é superior a 200 UC, são representados pelos serviços jurídicos do STAL, prestados gratuitamente, factos que os isentam do pagamento de quaisquer custas, conforme o preceito do art. 4º, nº 1, alínea h) do Regulamento das Custas Processuais, para além do que decorre da al. f) do mesmo artigo.
4) Os trabalhadores associados do sindicato ora A, doravante designados AA, são trabalhadores da Câmara Municipal de (...), encontrando-se integrados nas categorias supra referenciadas, integrando o mapa de pessoal da mesma, através de contrato de trabalho por tempo indeterminado.
5) Os AA encontram-se a exercer funções na empresa municipal T., E.E.M. em regime de requisição e de comissão de serviço, por efeito da celebração do “Protocolo de Transição de Pessoal celebrado entre a Câmara Municipal de (...) e T. E.M.” homologado em reunião de Câmara de 09/03/2004 – cfr. doc. nº 9 junto com a petição inicial.
6) À R T., E.E.M. compete, com a participação do R Município as funções inerentes à gestão do quadro de pessoal, ao pessoal em regime de requisição ou comissão de serviço, existindo responsabilidade solidária por parte deste último R, designadamente no que toca ao processamento de remunerações e trabalho extraordinário, conforme Cláusula V, al. c) do referido “Protocolo de Transição de Pessoal celebrado entre a Câmara Municipal de (...) e T. E.M.” – cfr. doc. nº 9 junto com a petição inicial.
7) Conforme resulta da cláusula I do mesmo, “(o) presente protocolo visa a definição das regras a observar tendo em vista os processos de requisição, destacamento ou comissão de serviço que venham a ocorrer relativos a pessoal do quadro da Câmara Municipal de (...) para a empresa municipal T. (...) E.M.”;
8) O R MUNICÍPIO DE (...), na cláusula V desse mesmo protocolo, confere à R T., E.E.M., com a participação da Câmara Municipal, as funções inerentes à gestão do quadro de pessoal, por delegação de competências quanto ao pessoal que integra o quadro da autarquia mas se encontra a exercer funções naquela empresa municipal.
9) A partir de agosto de 2008 a R T. impôs um horário laboral de 8 horas diárias e 40 horas semanais.
10) No dia 23/05/2012 os AA dirigiram à R T. requerimentos individuais solicitando o pagamento das horas extraordinárias em falta, desde agosto de 2008 àquela data, nos termos do artigo 212º da Lei n.º 59/2008, de 11/09, e bem assim a reposição do horário de trabalho que é legalmente estabelecido aos AA de 7 horas diárias e 35 horas semanais, nos termos do artigo 126º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09, acompanhados dos respetivos documentos a eles anexos – cfr. docs. nºs 33 a 36 juntos com a petição inicial.
11) A R T. não proferiu qualquer decisão sobre tais requerimentos que nesse sentido lhe foram dirigidos pelos AA;
12) Todos os outros trabalhadores da Ré T. cumpriam – em Agosto de 2008 - o horário de 40 horas.
13) Em ano de transição de estatuto, a Ré, por deliberação de 7/08/2008, Acta nº 104/2008, promoveu, entre outros:
- M. a coordenadora do serviço do balneário Rainha D. Amélia, do que resultou um acréscimo de remuneração de €53.38/mês, refletindo-se tal aumento na quantia de 373,66€ (7 meses) no ano de 2008 e de 769,02€ no ano de 2009 (14 x 54,93) relativamente ao vencimento da categoria de assistente técnica de balneoterapia que detinha, nessas data, na Câmara Municipal de (...) – cfr. doc.4 junto com a contestação da Ré T..
14) Todos os associados do Autor receberam, a título de subsídio de alimentação nos anos aqui em discussão – 2008 e 2009 – a quantia de 5€/dia, quando, em 2008 pelo estatuto remuneratório da Câmara de São Pedro do Sul receberiam, em 2008 4,11€/dia e em 2009 4,27€/dia – cfr. docs. 10 a 12, 16 a 18, 23 e 24, juntos com a P.I.
15) Em Abril de 2010, pela Câmara Municipal de (...), foi solicitada informação sobre a situação destes trabalhadores, com o seguinte teor:
(texto integral do documento na sentença; imagem)
16) Pela Diretora do DAG foi prestada a seguinte informação:
(texto integral do documento na sentença; imagem)
17) Pela CCDR do Centro foi prestada a seguinte resposta:
(texto integral do documento na sentença; imagem)
18) Foi solicitado pela Ré T. e emitido parecer pelo Dr. L.datado de 23/05/2009 – cfr. doc. 5 junto com a contestação da Ré T..
19) Os associados do autor trabalhadores da Câmara Municipal de (...) estão a exercer funções na Empresa Municipal T. enquadrados na figura de cedência de interesse público, nos termos do artigo 58.º da Lei n.º 12-A/2008, com efeitos desde 01.01.2009.
20) Não foi celebrado qualquer acordo ou protocolo entre a Câmara Municipal de (...) e a T. que regule a manutenção do estatuto dos trabalhadores cedidos.»
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III.B.DE DIREITO
b.1 Da violação do disposto no art.º 18º do DL nº 209/2009, de 03/09,art.º 103º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02, artigos 126º, nº 1, 135º, nº 1, 158º, 159º, 163º, nºs 1 e 2, 210º e 212º a 215º, todos da Lei nº 59/2008, de 11/09, e art. 59º da Constituição da República Portuguesa.
3.2. O Tribunal a quo julgou a ação instaurada pelo Autor em representação das suas associadas improcedente, com fundamento no facto de não ter sido celebrado entre a Câmara Municipal de (...) e a Empresa Municipal T. nenhum acordo ou protocolo que regulasse a manutenção do estatuto dos trabalhadores cedidos, nos termos do disposto no art.º 18º, nº 2 do Decreto-Lei nº 209/2009, de 03/09, pelo que se encontra suspenso o estatuto de origem dos trabalhadores associados do Apelante, não lhes sendo portanto aplicável o disposto no artº. 126º, nº 1 da Lei nº 59/2008, de 11/09, concluindo, assim, que o regime de horário de trabalho que lhe era aplicável era o vigente na apelada.
O apelante discorda do assim decidido, argumentando que resultou provada a celebração de um protocolo que regulou o estatuto dos trabalhadores cedidos, concretamente o “Protocolo de Transição de Pessoal celebrado entre a Câmara Municipal de (...) e T. E.M.”, o qual se encontra junto aos autos, que definiu as regras a observar nos processos de requisição, destacamento ou comissão de serviço relativos a pessoal do quadro da Câmara Municipal de (...) para a empresa municipal T. (...) E.M, em cuja alínea h) da cláusula V desse Protocolo se previu expressa e especificadamente que se mantinha o “regime de duração do horário de trabalho em vigor para a Administração Local, designadamente nas modalidades de trabalho extraordinário, nocturno e em dias de descanso e feriados”.
Assim, considerando que nos termos do disposto no nº 2 do artº. 18º do Decreto-Lei nº 209/2009, de 03/09, a manutenção do estatuto de origem depende de acordo celebrado entre as partes ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão da mobilidade em cedência de interesse público por efeito do disposto no art.º 103º da Lei nº 12-A/2008 conjugado com o art. 18º do DL nº 209/2009, no caso, existindo o referido acordo, aos associados do autor é aplicável o estatuto de origem, do qual resulta que o horário de trabalho é de 7 horas diárias e 35 semanais, e não de 40 horas semanais como lhes foi imposto pela apelada.
Deste modo, impunha-se ao Tribunal a quo que tivesse concluído pela ilegalidade da atuação da apelada e pela manutenção do estatuto de origem dos associados do apelante, por isso mesmo resultar do protocolo celebrado ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão (requisição) ocorrida com efeitos a 01/01/2009 por força do disposto no art. 103º da Lei nº 12-A/2008, de 27/02 conjugado com o art. 18º do DL nº 209/2009, 03/09, normas essas que foram objeto de errada interpretação pela decisão recorrida, assim as violando.
E não se encontrando suspenso o estatuto de origem dos seus associados, o apelante conclui que lhes era aplicável o regime legal da Lei nº 59/2008, de 11/09, designadamente o seu art.º 126º, nº 1, e bem assim os artigos 135º, nº 1, 163º, nºs 1 e 2 e 212º, pelo que os mesmos encontravam-se obrigados ao cumprimento de um horário de trabalho que respeitasse o limite máximo de duração legalmente previsto no artigo 126º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09, de 7 horas por dia e 35 horas por semana, e não de 8 horas diárias e 40 horas semanais.
Em face do exposto, a questão primordial a dilucidar está em saber se os associados do apelante se encontravam ou não obrigados a cumprir um horário de trabalho que respeitasse o limite máximo de duração legalmente previsto no artigo 126º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09, de 7 horas por dia e 35 horas por semana. Caso se conclua positivamente, saber se o excesso de horas de trabalho que prestaram em função do cumprimento do horário de trabalho que lhes foi fixado pela apelada, de 8 horas diárias e 40 semanais, constitui trabalho extraordinário, com todas as legais consequências daí decorrentes, designadamente, em termos remuneratórios e de descanso compensatório.
Vejamos se assiste razão ao Apelante.
Conforme se extrai dos factos assentes, os associados do apelante ingressaram na apelada em 01/04/2004, em regime de requisição e entre essa data e agosto de 2008, o horário que cumpriram foi o do seu estatuto de origem, ou seja, de 7 horas diárias de trabalho e 35 horas semanais.
A partir de agosto de 2008, a apelada impôs aos associados do apelante um horário laboral de 8 horas diárias e 40 horas semanais.
Mais se provou que entre a Câmara Municipal de (...) (CMSPS) e a empresa municipal T., aqui apelada, em 2004, foi celebrado um protocolo relativo à transição de pessoal daquela câmara municipal para esta empresa municipal, observando o disposto no artigo 37.º da Lei n.º 58/98, de 18 de agosto (Lei das Empresas Municipais, Intermunicipais e Regionais), que sob a epígrafe “Estatuto do pessoal” dispunha que:
«1 - O estatuto do pessoal baseia-se no regime do contrato individual de trabalho, sendo a contratação colectiva regulada pela lei geral.
2 - Sem prejuízo do que se dispõe nos números seguintes, o pessoal das empresas está sujeito ao regime geral da segurança social.
3 - Os funcionários da administração central, regional e local e de outras entidades públicas podem exercer funções nas empresas em regime de comissão de serviço, requisição ou destacamento, por períodos no mínimo anuais, sucessivamente renováveis.
4 - Enquanto se mantiverem na situação referida no número anterior, os funcionários mantêm todos os direitos inerentes ao lugar de origem, designadamente o direito à carreira e à segurança social, considerando-se, para todos os efeitos, o período de comissão de serviço, requisição ou destacamento como tempo de serviço efectivamente prestado no lugar de origem.
5 - O pessoal previsto no n.º 3, em regime de comissão de serviço ou requisição, pode optar pelas remunerações do lugar de origem ou pelas correspondentes às funções que desempenhe nas empresas, a suportar por estas.
6 - O pessoal do quadro dos serviços municipalizados que venham a ser objecto de transformação em empresas, nos termos da presente lei, pode optar entre a integração no quadro da empresa ou no quadro do município respectivo, nos termos estabelecidos em protocolo a celebrar entre o município e a empresa, não podendo ocorrer, em qualquer caso, perda de remuneração ou de qualquer outro direito ou regalia.
7 - As comissões de serviço, as requisições ou os destacamentos feitos ao abrigo do presente artigo não determinam a abertura de vaga no quadro de origem.»
Compulsado o referido protocolo, refere-se na cláusula I, expressamente, que o mesmo visava «a definição das regras a observar tendo em vista os processos de requisição, destacamento ou comissão de serviço que venham a ocorrer relativos a pessoal do quadro da Câmara Municipal de (...) para a empresa municipal T (...), E.M.».
Mais consta do referido protocolo, quanto a remunerações, que «Os funcionários requisitados, ou em comissão de serviço, podem optar pelas remunerações do lugar de origem ou pelas correspondentes às funções e tabela salarial que vier a ser aprovada pela T.…» (vide cláusula II, n.º 3).
Relativamente à integração nos quadros da T., previu-se na cláusula IV, n.º1 do referido protocolo que «O pessoal da Câmara Municipal pode optar, nos termos legais, pela integração do quadro da T.…sem perda de remuneração ou de qualquer outro direito ou regalia…», prevendo-se no n.º2 da mesma cláusula que « Para o exercício do direito de opção no número anterior, a T. …elaborará uma proposta de contrato individual de trabalho sem termo …da qual constará, para além da categoria e carreira previstas no estatuto do pessoal, a respetiva remuneração. Horário de trabalho em vigor para a administração local e do demais direitos e regalias...».
Por fim, na Cláusula V, alínea h) estabeleceu-se quanto ao horário de trabalho que o regime de duração do horário de trabalho é o «em vigor para a Administração Local, designadamente nas modalidades de trabalho extraordinário, noturno e em dias de descanso e feriados.»
A apelada foi criada como empresa municipal ao abrigo do disposto na Lei nº 58/98 de 18 de agosto, diploma que foi revogado pela Lei n.º 53-F/2006, de 29 de dezembro que aprovou um novo regime jurídico do setor empresarial local, estipulando-se no n.º2 do seu artigo 34.º que «2 - Às empresas de natureza municipal e intermunicipal constituídas nos termos da Lei n.º 58/98, de 18 de Agosto, existentes à data da entrada em vigor da presente lei, aplica-se o regime previsto no número anterior.»
Decorre do n.º1 do art.º45.º, dessa Lei, sob a epígrafe “ Estatuto do Pessoal”, que « O estatuto do pessoal das empresas é o regime do contrato individual de trabalho», prevendo-se no art.º 46.º, sob a epígrafe “ Comissões de Serviço” que:
«1 - Os funcionários e agentes da administração central, regional e local, incluindo dos institutos públicos, podem exercer funções nas entidades do sector empresarial local em regime de afetação específica ou de cedência especial, nos termos da legislação geral em matéria de mobilidade.
2 - Podem ainda exercer funções nas entidades do sector empresarial local os trabalhadores de quaisquer empresas públicas, em regime de cedência ocasional, nos termos previstos no Código do Trabalho.
3 - O pessoal do quadro dos serviços municipalizados que venham a ser objeto de transformação em empresas, nos termos da presente lei, pode optar entre a integração no quadro da empresa ou no quadro do município respetivo, nos termos estabelecidos em protocolo a celebrar entre o município e a empresa, não podendo ocorrer, em qualquer caso, perda de remuneração ou de qualquer outro direito ou regalia. »
Sucede que, com a entrada em vigor da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, também denominada Lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações, desde 1 de janeiro de 2009, passaram a aplicar-se aos trabalhadores da Administração Pública os instrumentos de mobilidade geral (cedência de interesse público e mobilidade interna) previstos nos artigos 58.º a 65.º da LVCR, dispondo-se no art.º 58.º dessa Lei, que:
«1 - Há lugar à celebração de acordo de cedência de interesse público quando um trabalhador de entidade excluída do âmbito de aplicação objetivo da presente lei deva exercer funções, ainda que a tempo parcial, em órgão ou serviço a que a presente lei é aplicável e, inversamente, quando um trabalhador de órgão ou serviço deva exercer funções, ainda que no mesmo regime, em entidade excluída daquele âmbito de aplicação.
2 - O acordo pressupõe a concordância escrita do órgão ou serviço, do membro do Governo respetivo, da entidade e do trabalhador
e implica, na falta de disposição em contrário, a suspensão do estatuto de origem deste.
3 - A cedência de interesse público sujeita o trabalhador às ordens e instruções do órgão ou serviço ou da entidade onde vai prestar funções, sendo remunerado por estes com respeito pelas disposições normativas aplicáveis ao exercício daquelas funções.

(…)
13 - O acordo de cedência de interesse público para o exercício de funções em órgão ou serviço a que a presente lei é aplicável tem a duração máxima de um ano, excepto quando tenha sido celebrado para o exercício de um cargo ou esteja em causa órgão ou serviço, designadamente temporário, que não possa constituir relações jurídicas de emprego público por tempo indeterminado, casos em que a sua duração é indeterminada.
(…)».

Com a LVCR ( art.º 58.º), através do acordo de cedência de interesse público, os trabalhadores de uma entidade abrangida por esta Lei, podem passar a exercer funções numa outra entidade não abrangida pelo seu âmbito de aplicação, configurando o acordo de cedência de interesse público uma mobilidade externa por oposição à mobilidade interna operada entre órgãos e serviços da Administração Pública.
É o caso das entidades do setor empresarial local, nas quais os trabalhadores com relação de emprego público podem exercer funções por acordo de cedência de interesse público (art.º 46.º da Lei n.º 53-F/2006, de 29.12, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 64-A/2008, de 31.12).
No que respeita à duração da mobilidade externa, se a mobilidade dos trabalhadores se processar para uma outra entidade não abrangida pelo âmbito de aplicação da LVCR, a regra é que a mobilidade não tem prazo, salvo se for convencionado prazo no acordo de cedência.
Quanto às consequências, a mobilidade externa determina a suspensão da relação de emprego público de origem, salvo disposição em contrário das partes, conforme se extrai do disposto no n.º2 do art.º 58.º, in fine.
Quanto à conversão das anteriores situações de mobilidade, o art.º 102.º da LVCR estabeleceu a seguinte disciplina:
«1-Os atuais trabalhadores em situação de mobilidade para, ou de, entidade excluída do âmbito de aplicação objetivo da presente lei transitam para a situação jurídico-funcional de cedência de interesse público.
2 - Considera-se termo inicial da cedência referida no número anterior a data da entrada em vigor do diploma referido no n.º 5 do artigo 118.º»
.
Por sua vez, no n.º 5 do art.º 118.º da mesma Lei determina-se que «Os artigos 58.º a 65.º, 93.º, 102.º e 103.º produzem efeitos na data definida no diploma que proceder a alterações à Lei n.º 53/2006, de 07 de Dezembro».
Ou seja, nos termos das citadas disposições legais, o momento em que se opera a transição dos trabalhadores que se encontravam a exercer funções em entidades excluídas do âmbito de aplicação da LVCR ( única situação que nos interessa para a economia dos presentes autos) para a situação jurídico-funcional de cedência de interesse público, só se verificaria no momento em que entrassem em vigor as futuras alterações à Lei n.º 53/2006, de 07.12, diploma que prevê o regime comum da mobilidade entre serviços dos funcionários e agentes da Administração Pública. O mesmo se passa relativamente aos artigos 58.º a 65.º relativos (aos novos) instrumentos de mobilidade; ao artigo 93.º, relativo aos trabalhadores que se encontrem em substituição em cargo dirigente, que transitam para a modalidade adequada de mobilidade interna, e ainda com o artigo 103.º, todos da LVCR.
Entretanto, a Lei 64-A/2008, de 31 de dezembro, que aprovou o orçamento de Estado para 2009, além de ter procedido a algumas alterações à Lei 53/2006, determinou, no n.º4 do art.º 32 que: « São revogados os artigos 3.º a 10.º e 34.º, as alíneas c) e d) do n.º do artigo 39.º e o artigo 41.º da Lei n.º 53/2006, de 7 de Dezembro, alterada pela Lei n.º 11/2008, de 20 de Fevereiro». E no n.º 5 do art.º 37.º estabeleceu que: «Os artigos 58.º a 65.º, 93.º, 102.º e 103.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, entram em vigor em 1 de janeiro de 2009».
Note-se ainda que por força do art.º 33.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31.12, foi também alterado o art.º 46.º da Lei n.º 53-F/2006, de 29.12, passando a ter a seguinte redação:
«1 - Os trabalhadores com relação jurídica de emprego público podem exercer funções nas entidades do sector empresarial local por acordo de cedência de interesse público, nos termos da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro.
2 - Podem ainda exercer funções nas entidades do sector empresarial local os trabalhadores de quaisquer empresas públicas, em regime de cedência ocasional, nos termos previstos no Código do Trabalho.
3 - O pessoal dos serviços municipalizados que tenham sido ou venham a ser objeto de transformação em empresas pode optar entre a integração na empresa ou no município respetivo, nos termos estabelecidos em protocolo a celebrar entre o município e a empresa, não podendo ocorrer, em qualquer caso, perda de remuneração ou de qualquer outro direito ou regalia.

4 - O pessoal referido no número anterior que tenha ficado integrado no município e que exerça funções nas entidades do sector empresarial local nos termos do n.º 1 pode optar pela manutenção do estatuto de origem.»
2 - A redação dada pelo número anterior ao artigo 46.º da Lei n.º 53-F/2006, de 29 de dezembro, produz efeitos desde a data de entrada em vigor da Lei n.º 58/98, de 18 de agosto.
3 - O disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 46.º da Lei n.º 53-F/2006, de 29 de Dezembro, é aplicável ao pessoal que, nos termos da lei, tenha sido ou seja afeto, através de qualquer instrumento de mobilidade, às empresas concessionárias de serviço público das autarquias». (este normativo foi posteriormente revogado pela Lei n.º 50/2012, de 31 de agosto).

A LVCR (Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro) prevê, no n.º 2 do artigo 3.º, a sua aplicação, com as necessárias adaptações, à administração autárquica, designadamente no que respeita às competências em matéria administrativa dos respetivos órgãos.
O diploma que ulteriormente procedeu a essa adaptação, foi o Decreto-Lei n.º 209/2009, de 03 de setembro.
Com particular relevo para a situação em discussão nos presentes autos, o artigo 18.º desse diploma legal, sob a epigrafe “Conversão das situações de mobilidade” determinou que:
«1- Os trabalhadores que a 1 de Janeiro de 2009 se encontravam em situação de mobilidade para, ou de, entidade excluída do âmbito de aplicação objetivo da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, transitaram, por força do artigo 102.º da mesma lei e sem outras formalidades, para a situação jurídico-funcional de cedência de interesse público.
2-A manutenção do estatuto de origem dos trabalhadores referidos no número anterior depende do acordo celebrado entre as partes ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão.».
Voltando ao caso em análise, perante o quadro legal aplicável e que acabamos de enunciar, que, aliás, é o mesmo que foi considerado pela decisão recorrida, é apodítico que por força da LVCR, concretamente, do disposto no artigo 102.º da LVCR, art.º 37.º, n.º5 da Lei 64-A/2008, de 31.12 e art.º 18.º, n.º1 do D.L. n.º 209/2009, os associados do apelante que se encontravam em situação de mobilidade na apelada, entidade excluída do âmbito de aplicação objetivo daquela LVCR, transitaram automaticamente, ou seja, ope legis, para a situação jurídico-funcional de cedência de interesse publico, tratando-se de uma situação de conversão legal da mobilidade.
Quanto à manutenção do estatuto de origem nos termos do disposto no artigo 18.º, n.º2 do D.L. n.º 209/ 2009, a 1.ª Instância considerou que « não existe celebrado entre a CM e a EM qualquer acordo ou protocolo que regule da manutenção do estatuto dos trabalhadores cedidos em regime de cedência de interesse público e aqui representados pelo Autor, é de aplicar o regime praticado pela cessionária Empresa Municipal, logo o regime de horário de trabalho em vigor naquela, o qual é de 40 horas semanais, nos termos da legislação laboral em vigor».
Será assim?
No que concerne à Administração Local, recorde-se, decorre do disposto no art.º 18.º, n.º1 do DL 209/2009 que « Os trabalhadores que a 1 de Janeiro de 2009 se encontravam em situação de mobilidade para, ou de, entidade excluída do âmbito de aplicação objetivo da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, transitaram, por força do artigo 102.º da mesma lei e sem outras formalidades, para a situação jurídico-funcional de cedência de interesse público» e, bem assim, no que respeita à manutenção do estatuto de origem desses trabalhadores, que aquela «depende do acordo celebrado entre as partes ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão»( cfr. n.º 2, do citado artigo 18.º).
Ora, no caso, antes da conversão da situação jurídico-funcional dos associados do apelante em cedência de interesse público, que aconteceu em 01 de janeiro de 2009, aqueles encontravam-se requisitados na apelada, situação que mantiveram até ao dia 31 de dezembro de 2008.
Conforme se apurou e vem dado como provado, entre a Câmara Municipal de (...) e a Empresa Municipal, aqui apelada, foi celebrado em 2004 um protocolo que teve precisamente como objetivo definir as regras a observar tendo em vista os processos de requisição, destacamento ou comissão de serviço que viessem a ocorrer relativos a pessoal do quadro da CM para a empresa municipal, aqui apelada.
Nos termos desse protocolo, concretamente, da alínea h) da cláusula V, deixou-se expresso que aos associados do apelante era aplicável o horário de trabalho vigente na Administração Local, não existindo a este respeito, qualquer tipo de prejuízo face ao estatuto de origem.
Logo, salvo o devido respeito por opinião diversa, antes da conversão da situação jurídico-funcional dos associados do apelante em cedência de interesse público, existia um acordo, que fora celebrado entre a CM e a EM, no qual se estabeleceu que os associados do apelante mantinham o direito ao horário de trabalho de 35 horas semanais.
Assim, não podemos subscrever a decisão sob recurso quando na mesma se professa que «não existe celebrado entre a CM e a EM qualquer acordo ou protocolo que regule da manutenção do estatuto dos trabalhadores cedidos, nomeadamente que regule, entre outras, as matérias de horário de trabalho» e que, em consequência « conjugando as disposições legais e a falta de acordo/protocolo se conclui que aos trabalhadores cedidos em regime de cedência de interesse público e aqui representados Autor, é de aplicar o regime praticado pela cessionária Empresa Municipal, logo o regime de horário de trabalho em vigor naquela, o qual é de 40 horas semanais, nos termos da legislação laboral em vigor».
De igual modo, não colhe a tese da apelada sustentada nas suas conclusões de recurso, segundo a qual, as alterações legislativas introduzidas pelo DL nº 12-A/2008 que ditam a suspensão ope legis do estatuto de origem dos representados do apelante só não se aplicariam se, nesse momento ou posteriormente, tivesse havido acordo expresso entre o Município, a recorrida e os trabalhadores, nesse sentido, pelo que, inexistindo qualquer acordo simultâneo ou posterior à criação desse instrumento de mobilidade - cedência de interesse público - , não se pode cair na previsão do nº 2 do artº. 18º mas na regra do seu nº 1.
O n.º 2 do art.º 18.º do DL 209/2009, refere expressamente que a manutenção do estatuto de origem desses trabalhadores depende do acordo celebrado entre as partes ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão».
A literalidade da citada norma é inequívoca ao referir que a manutenção do estatuto de origem dos trabalhadores depende da existência de acordo celebrado antes da conversão, como resulta do facto de se tratar de um acordo celebrado ao abrigo do regime de mobilidade aplicável antes de os trabalhadores terem passado à situação jurídico- funcional de cedência de interesse público. O texto da norma não consente que dele se extraía uma interpretação de acordo com a qual o acordo aí mencionado seja simultâneo ou posterior à criação desse novo instrumento de mobilidade para o qual os trabalhadores transitam ope legis. Se assim fosse, o legislador não teria inserido na norma a expressão “antes da conversão”, claramente indicativa da referência a um acordo pré-existente, celebrado previamente à criação do referido instrumento de mobilidade e, por isso, ao abrigo do regime aplicável à mobilidade dos mesmos antes daquela conversão automática em cedência de interesse público. Como se sabe, o interprete não pode colher da norma uma interpretação que não tenha na sua letra um mínimo de suporte, e muito menos pode sustentar uma interpretação que fira a letra da lei, tanto quanto é certo que se presume que o legislador soube expressar corretamente a sua vontade ( art.º 9.º, n.º3 do C.Civil).
Assim, o disposto no n.º2 do art.º 18.º do D.L. 209/2009, assegura a manutenção do estatuto de origem desde que exista acordo celebrado entre as partes ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão da mobilidade em cedência de interesse público, o que sucedeu com o protocolo de 2004, que visou regular a mobilidade dos trabalhadores associados do Recorrente.
Em face do exposto, impera concluir pela manutenção do estatuto de origem dos associados do apelante, por isso mesmo resultar do protocolo celebrado ao abrigo do regime do instrumento de mobilidade aplicável antes da conversão (requisição) ocorrida com efeitos a 01/01/2009, pelo que, o regime de horário de trabalho aplicável aos associados do apelante há-de ser o que vigorar, a cada momento, para os funcionários da Administração Pública.
Em agosto de 2008, data em que o horário de trabalho dos associados do apelante foi alterado pela apelada, de 7 horas diárias e 35 horas semanais para 8 horas diárias e 40 horas semanais, estava ainda em vigor o Decreto-Lei n.º 259/98, de 18/08, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 169/2006, de 17/08 diploma que estabelecia as regras e os princípios gerais em matéria de duração e horário de trabalho na Administração Pública. Só a partir de 01/01/2009, é que entrou em vigor a Lei n.º 59/2008, de 11.09 (vide art.º 23).
O art.º 7.º do referido Decreto-Lei n.º 259/98, sob a epígrafe “Duração semanal do trabalho” dispunha o seguinte:
1 - A duração semanal do trabalho nos serviços abrangidos pelo presente diploma é de trinta e cinco horas.
2 - O disposto no número anterior não prejudica a existência de regimes de duração semanal inferior já estabelecidos, nem os que se venham a estabelecer mediante despacho conjunto do membro do Governo responsável pelo serviço e do membro do Governo que tiver a seu cargo a Administração Pública.”
De acordo com o artigo 13.º, n.º1 do D.L. n.º 259/98, de 18/08 Entende-se por horário de trabalho a determinação das horas do início e do termo do período normal de trabalho diário ou dos respectivos limites, bem como dos intervalos de descanso”.
Como dissemos, só em 01 de janeiro de janeiro de 2009, é que entrou em vigor a Lei n.º 59/2009, cujas disposições legais são invocadas pelo apelante, as quais, porém, apenas são convocáveis para o período posterior à sua entrada em vigor.
Esta nova legislação, estabeleceu, no art.º 126.º, n.º 1 que “O período normal de trabalho não pode exceder sete horas por dia nem trinta e cinco horas por semana”, estabelecendo-se no art.º 135.º da mesma Lei que:
1- Não podem ser unilateralmente alterados os horários individualmente acordados;
2- Todas as alterações dos horários de trabalho devem ser fundamentadas e precedidas de consulta aos trabalhadores afetados, à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais e ser afixados no órgão ou serviço com antecedência de sete dias, ainda que vigore um regime de adaptabilidade.
(…)”.
Ora, estando os associados do apelante obrigados ao cumprimento de um horário de trabalho que respeitasse o limite máximo de duração de 35 horas semanais nos termos do artigo 7.º do D.L. 259/98 e, a partir de 01.01.2009, ainda com a limitação de, para além das 35 horas semanais, o período normal de trabalho diário não exceder as 7 horas por dia, por força do disposto no art.º 126.º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, de 11/09, resulta dos factos apurados, que esse limite semanal de 35 horas apenas foi cumprido no período que decorreu entre 2004 e agosto de 2008, data a partir da qual a apelada lhes impôs um horário laboral de 8 horas diárias e 40 horas semanais.
Logo, é inegável que a partir de agosto de 2008 os associados do apelante prestaram 5 horas semanais de trabalho para além do horário estabelecido no art.º 7.º do DL 259/98, que se manteve após 01.01.2009, decorrente da prestação diária de 8 horas de trabalho.
A questão está agora em saber se o trabalho prestado dentro do horário de trabalho previamente fixado pela apelada aos associados da autora, mas que ainda assim ultrapasse a carga horária máxima prevista para a Administração Pública deve ser qualificado como trabalho extraordinário para efeitos da respetiva compensação, ou seja, se as cinco horas de trabalho semanal, resultantes da prestação diária de 8 horas de trabalho durante cinco dias por semana, no período em causa nos autos, constitui ou não trabalho extraordinário.
Nos termos do n.º1 do art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 259/98 “ Considera-se extraordinário o trabalho que for prestado:
a) Fora do período normal de trabalho diário;
b) Nos casos de horário flexível, para além do número de horas a que o trabalhador se encontra obrigado em cada um dos períodos de aferição ou fora do período de funcionamento normal do serviço.
2 - Não há lugar a trabalho extraordinário no regime de isenção de horário e no regime de não sujeição a horário de trabalho”.
A prestação de trabalho extraordinária estava sujeita às condicionantes estabelecidas no n.º 1 do artigo 26.º do DL 259/98, de 18 de Agosto, no qual se consignava que “Só é admitida a prestação de trabalho extraordinário quando as necessidades do serviço imperiosamente o exigirem, em virtude da acumulação anormal ou imprevista do trabalho ou da urgência na realização de tarefas especiais não constantes do plano de atividades e, ainda, em situações que resultem de imposição legal.
Por outro lado, nos termos do artigo 27.º desse diploma, sob a epígrafe “Limites ao trabalho extraordinário”, com as alterações introduzidas pelo DL n.º 169/2006, de 17/08, estabeleceu-se que:
“1- O trabalho extraordinário não pode exceder duas horas por dia, nem ultrapassar cem horas por ano.
2- A prestação de trabalho extraordinário não pode determinar um período de trabalho diário superior a nove horas.
3 – Os limites fixados nos números anteriores podem, no entanto, ser ultrapassados:
a) Em casos especiais, regulados em diploma próprio, a negociar com as associações sindicais;
b) Quando se trate de motoristas, telefonistas e outro pessoal auxiliar que seja indispensável manter ao serviço.
c)Quando se trate de pessoal administrativo ou auxiliar que preste serviço nos gabinetes dos membros do Governo ou equiparados e de pessoal da Presidência da República destacado para, normal ou eventualmente, prestar apoio ao Gabinete do Presidente da República;
d) Em circunstâncias excecionais e delimitadas no tempo, mediante autorização do membro do Governo competente ou, quando esta não for possível, mediante confirmação da mesma entidade, a proferir nos 15 posteriores à ocorrência.
4- Nos casos das alíneas b) e d) a não oposição dos trabalhadores vale como assentimento à prestação do trabalho.
5- Na administração local, os limites fixados nos nºs 1 e 2 do presente artigo podem ser ultrapassados quando se trate de pessoal administrativo ou auxiliar que preste apoio às reuniões ou sessões dos órgãos autárquicos, bem como motoristas, telefonistas e outro pessoal auxiliar e operário, cuja manutenção em serviço seja expressamente fundamentada e reconhecida como indispensável.
Também é de referir que nos termos previstos no n.º 5 do artigo 28.º do citado D.L. n.º 259/98, nos primeiros 8 dias do mês seguinte àquele em que foi realizado trabalho extraordinário o funcionário devia comunicar aos serviços o sistema de compensação por que tenha optado em relação ao mesmo.
Por fim, dispunha o artigo 34.º desse DL 259/98, de 18 de Agosto, sob a epígrafe “Autorização”, que:
“1 – A prestação de trabalho extraordinário e em dia de descanso semanal, descanso complementar e feriado deve ser previamente autorizada pelo dirigente do respetivo serviço ou organismo ou pelas entidades que superintendem nos gabinetes a que alude a alínea c) do n.º 3 do artigo 27.º
2 - Excetuam-se do disposto no número anterior, quanto aos feriados, os serviços que, por força da atividade exercida, laborem normalmente nesse dia.
3-Os funcionários e agentes interessados devem ser informados, salvo casos excecionais, com a antecedência de quarenta e oito horas, da necessidade de prestarem trabalho extraordinário e em dia de descanso semanal ou complementar e em feriado.
Este regime, a partir de 01.01.2009, passou a estar regulado na Lei n.º 59/2008, de 11.09, decorrendo do disposto no artigo 158.º da dita Lei que:
1 - Considera-se trabalho extraordinário todo aquele que é prestado fora do horário de trabalho.
2 - Nos casos em que tenha sido limitada a isenção de horário de trabalho a um determinado número de horas de trabalho, diário ou semanal, considera-se trabalho extraordinário o que seja prestado fora desse período.
3 - Quando tenha sido estipulado que a isenção de horário de trabalho não prejudica o período normal de trabalho diário ou semanal, considera-se trabalho extraordinário aquele que exceda a duração do período normal de trabalho diário ou semanal.
4- Não se compreende na noção de trabalho extraordinário:
a) O trabalho prestado por trabalhador isento de horário de trabalho em dia normal de trabalho, sem prejuízo do previsto no número anterior;
b) b) O trabalho prestado para compensar suspensões de actividade, independentemente da causa, de duração não superior a quarenta e oito horas seguidas ou interpoladas por um dia de descanso ou feriado, quando haja acordo entre a entidade empregadora pública e o trabalhador;
c) A tolerância de quinze minutos prevista no n.º 3 do artigo 126.º;
d) A formação profissional, ainda que realizada fora do horário de trabalho, desde que não exceda duas horas diárias.”
Tal como no regime pretérito e que supra tivemos ensejo de referir, a prestação de trabalho extraordinário continuou a estar sujeita a condicionantes, agora previstas no artigo 160.º da referida Lei, que sob a epígrafe “Condições da prestação de trabalho extraordinário” passou a dispor:
“1- O trabalho extraordinário só pode ser prestado quando o órgão ou serviço tenha de fazer face a acréscimos eventuais e transitórios de trabalho e não se justifique a admissão de trabalhador.
2- O trabalho extraordinário pode ainda ser prestado havendo motivo de força maior ou quando se torne indispensável para prevenir ou reparar prejuízos graves para o órgão ou serviço.
3- O trabalho extraordinário previsto no número anterior apenas fica sujeito aos limites decorrentes do n.º 1 do artigo 131.º”.
Por seu turno, nos termos do disposto no art.º 161.º da mesma Lei, o trabalho extraordinário previsto no n.º1 do artigo anterior fica sujeito, por trabalhador, a determinados limites, designadamente, cem horas de trabalho por ano, 2 horas por dia normal de trabalho ( n.º1), os quais podem ser ultrapassados desde que não impliquem uma remuneração por trabalho extraordinário superior a 60% da remuneração base do trabalhador, nas situações estabelecidas no n.º2 dessa norma e ainda alargado por força de instrumento de regulamentação coletiva ( n.º3).
Por fim, nos termos do artigo 212.º :
«1 - A prestação de trabalho extraordinário em dia normal de trabalho confere ao trabalhador o direito aos seguintes acréscimos:
a) 50 % da remuneração na primeira hora;
b) 75 % da remuneração, nas horas ou frações subsequentes.
2 - O trabalho extraordinário prestado em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, e em dia feriado confere ao trabalhador o direito a um acréscimo de 100 % da remuneração por cada hora de trabalho efetuado.
3 - A compensação horária que serve de base ao cálculo do trabalho extraordinário é apurada segundo a fórmula do artigo 215.º, considerando-se, nas situações de determinação do período normal de trabalho semanal em termos médios, que N significa o número médio de horas do período normal de trabalho semanal efetivamente praticado no órgão ou serviço.
4 - Os montantes remuneratórios previstos nos números anteriores podem ser fixados em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
5 - É exigível o pagamento de trabalho extraordinário cuja prestação tenha sido prévia e expressamente determinada.»
Decorre dos regimes jurídicos previstos no D. L. n.º 259/98 e na Lei 59/2008, que a existência de trabalho extraordinário não depende apenas da prestação de trabalho para além do período normal de trabalho, posto que, se assim fosse, o legislador não teria estabelecido condicionantes ou condições para a prestação de trabalho extraordinário. Quer do disposto no n.º 1 do art.º 26.º do D.L. n.º 259/98, quer do disposto no art.º 161.º, n.º 1 da Lei n.º 59/2008, resulta que o trabalho extraordinário, para ser qualificado como tal, não só tem de ser prestado para além do período normal de trabalho, como a sua exigência se subordina à satisfação de determinadas necessidades. Assim, no caso de ter sido prestado trabalho para além do período normal de trabalho, mas sem que a sua prestação tenha sido determinada pelas razões que o legislador enunciou nas referidas normas legais, a elas não se podendo reconduzir, esse trabalho assim prestado não pode ser configurado como trabalho extraordinário.
Em síntese, o trabalho suplementar deve ser fundamentado, porquanto só pode ser prestado quando o órgão ou serviço tenha de fazer face a acréscimos eventuais e transitórios de trabalho e não se justifique a admissão de trabalhador, ou em caso de motivo de força maior ou quando o mesmo se torne indispensável para prevenir ou reparar prejuízos graves para o órgão ou serviço, ficando no entanto sujeito aos limites de duração média do trabalho previstos na lei.
Ora, na situação vertente, como admite expressamente o apelado, os seus associados prestaram trabalho para além do período legal de trabalho a que tinham direito em função do horário de trabalho vigente para a Administração Pública, em resultado de uma decisão unilateral da apelada, que entendeu, que a partir de agosto de 2008, os associados do apelante estavam sujeitos ao cumprimento de um horário de trabalho de 8 horas diárias e 40 horas semanais.
Tal significa que a razão na origem da prestação de horas de trabalho para além do período de trabalho normal previsto para a função pública, por parte das associadas do apelante, resultou da aplicação de um horário de trabalho aos seus associados que não lhes podia legalmente ser aplicado.
A ser assim, mal se compreenderia que essas horas de trabalho prestadas para além do período normal de trabalho previsto para a função pública e a que os associados do apelante tinham direito que fosse o seu horário de trabalho, fossem tidas como trabalho extraordinário, uma vez que resultam de uma decisão da apelada tomada em matéria de fixação errada de horário de trabalho e não de uma decisão fundamentada em qualquer uma das situações previstas na lei como condicionantes da possibilidade de recorrer à prestação de trabalho extraordinário.
O Supremo Tribunal Administrativo, em acórdão de 13/02/2014, proferido no processo n.º 0110/13, em que foi relator o Senhor Conselheiro Bento São Pedro, embora a propósito da questão relativa a saber se o trabalho extraordinário prestado para além do limite legal de duração do mesmo é pago como tal, mas ainda assim com pertinência para a situação em equação neste autos, pronunciou-se nos seguintes termos: «(…) a obrigação de pagar trabalho extraordinário é uma obrigação “ex lege”, que só surge quando todos os pressupostos de facto descritos na previsão normativa se verifiquem.
Não interessa para o efeito saber se a Administração agiu lícita ou ilicitamente, com ou sem erro.
O que importa é averiguar se a situação de facto preenche a previsão normativa. Se a situação de facto não preenche a previsão normativa, cujo consequente é uma obrigação de pagar trabalho extraordinário, a obrigação não se constitui.
A conclusão é inevitável: o art. 30º do Dec. Lei 259/98, impede a constituição da obrigação de pagar trabalho extraordinário a partir de certo limite. Logo, o trabalho extraordinário prestado para além desse limite, não fez nascer essa obrigação de pagar».
E diremos nós, que se assim é quanto ao trabalho extraordinário prestado para além da duração do limite legal, por maioria de razão será de rejeitar o pagamento das horas de trabalho prestadas pelos associados do autor como trabalho extraordinário quando o mesmo não foi executado por nenhuma das razões que determinam a possibilidade de a entidade empregadora recorrer à prestação de trabalho suplementar, uma vez que, em tal situação, sequer podemos falar em trabalho extraordinário, mas apenas em trabalho prestado para além do período normal de trabalho a que os associados do apelante se deviam encontrar subordinados tendo em conta o horário de trabalho vigente para a função pública.
Diz-se ainda no referido acórdão do STA que «A conclusão a que chegamos não afasta a possibilidade do trabalhador ter direito a outra obrigação, isto é, a ser ressarcido pelos danos sofridos com a realização de trabalho que prestou, contra a sua vontade, e que não era obrigado a prestar (obrigação de indemnizar). Pode, efetivamente, ter havido um comportamento ilícito e culposo do réu gerador de um dano. Como pode ter havido consentimento do trabalhador (aliás o Município alega, na conclusão X ter havido manifestação de vontade do trabalhador em prestar esse trabalho) o que, a ser verdade configura uma causa de justificação afastando a ilicitude (art. 340º do CC). Não foi, todavia, com essa configuração que o Sindicato intentou a presente acção administrativa especial e, portanto, não fazia parte do objecto da acção e consequentemente deste recurso apreciar a existência, ou não, dos pressupostos da eventual responsabilidade civil. Tal como a acção foi intentada – acção para condenação à prática do acto devido – a mesma não pode deixar de ser julgada improcedente, na parte relativa à remuneração do trabalho extraordinário, na medida em que a respectiva obrigação “ex lege”, cujo cumprimento era pedido, não surgiu na ordem jurídica, por falta de um dos seus elementos constitutivos (o trabalho extraordinário não ter ficado nos limites em que a lei consente a sua remuneração)».
Também no Acórdão do STA, de 12/04/2018, processo n.º 0785/17 se afirma, a dado passo, que « … o trabalho extraordinário – ou suplementar – surge na lei com carácter excecional, a obrigação do seu pagamento é uma obrigação ex lege, que só se constitui quando todos os pressupostos de facto descritos na previsão legal se verifiquem, sendo que o «direito» ao descanso compensatório remunerado está, e repetimos, dependente da sua prestação efectiva, e o mesmo se diga do direito à remuneração de descanso compensatório não concedido – sobre este último aspecto ver AC STJ de 24.02.2010, Rº 401/08.»
Com interesse para este caso, veja-se o acórdão deste TCAN, de 29.11.2019, proferido no processo n.º 00739/09.5BEVIS, em que estava em causa uma ação administrativa especial intentada pelo Sindicato Nacional dos Bombeiros Profissionais, em representação dos seus associados contra um determinado Município, que a 1.ª Instância julgou improcedente por considerar que não obstante ter sido determinado aos bombeiros, trabalhadores da administração pública, um horário de trabalho pelo executivo camarário cuja carga semanal podia chegar, dependendo dos turnos, a 48 horas semanais, o excesso de horas que os referidos trabalhadores efetuam semanalmente ou em dias feriados, não poderão ser qualificadas como extraordinárias em termos de acréscimos remuneratórios, no qual se sumariou a seguinte jurisprudência:
“(…)
4.O facto de ter sido fixado aos bombeiros identificados, em determinado período, um horário com uma carga horária excessiva, não legitima, no entanto, a atribuição do acréscimo remuneratório a título de “horas extraordinárias” pela singela razão de que, em bom rigor, não houve trabalho prestado «fora do período normal de trabalho» fixado, o que significa que não ocorreu qualquer prestação de trabalho que possa ser qualificada de extraordinário.
5. Efetivamente, resulta do artigo 25º, nº1 alínea a), do Decreto-Lei nº259/98, de 18.08, que será «extraordinário o trabalho que for prestado: a) Fora do período normal de trabalho diário», sendo que os Bombeiros identificados se limitaram a cumprir o horário que, bem ou mal, lhes estava fixado.
6. O referido não esgotará, no entanto e necessariamente, outras hipóteses de responsabilização jurídica da Administração, que não pelo recurso ao recebimento de horas extraordinárias, em virtude da fixação de um horário que ultrapassava os limites aplicáveis à Administração Pública.» No mesmo sentido, citam-se ainda os Acórdãos deste TCAN, de 06.11.2015, proc. 01879/12.9BEBRG; de 17.06.2016, proc.00391/13.3BEVIS; de 10.02.2017 e proc.00860/13.5BEPRT.
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Ou seja, TCA Norte entendeu que não há trabalho extraordinário quando o mesmo é prestado nos limites do horário previamente fixado. Ainda que, como se refere no citado acórdão, ao decidir assim não se esgotam outras hipóteses de responsabilização jurídica do réu.
Esta jurisprudência surge em linha com o Acórdão do STA, de 25.02.2016, proferido no processo 038/15, onde se decidiu que “a ação tendente a compensar pecuniariamente o trabalho que excedeu um certo horário soçobra” se não foi ultrapassado o horário fixado.
Assim sendo, dir-se-á que, seja pelo prisma que enunciamos, seja com base na perspetiva perfilhada pela jurisprudência deste TCAN a propósito das situações que abordou relativamente à questão de saber se o trabalho em excesso prestado pelos bombeiros face ao período legal de trabalho vigente para a Administração Publica era trabalho extraordinário, concluindo-se que não se estava perante trabalho extraordinário, desde logo porque em bom rigor se tratava de trabalho prestado, ainda assim, ao abrigo do horário de trabalho estabelecido ( embora ilegalmente), não assiste aos associados do apelante o direito que reclamam ao pagamento de horas extraordinárias e à atribuição do descanso compensatório.
Termos em que improcedem os invocados fundamentos de recurso.
Em face do exposto impõe-se julgar improcedente a presente apelação e com os presentes fundamentos, confirmar a decisão recorrida.
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IV-DECISÃO

Nestes termos,
acordam, em conferência, os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e, com a presente fundamentação, confirmam a decisão recorrida.
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Sem custas dada a isenção de que beneficia o apelante.
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Notifique.
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Porto, 18 de dezembro de 2020.


Helena Ribeiro
Conceição Silvestre
Alexandra Alendouro