Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00120/17.2BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:06/09/2022
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:APOSENTAÇÃO ANTECIPADA VERSUS CONTAGEM TEMPO SERVIÇO, RESPONSABILIDADE CIVIL - PEDIDO APOSENTAÇÃO ANTECIPADA:
RECONSTITUIÇÃO SITUAÇÃO ACTUAL HIPOTÉTICA
Sumário:1 . Referindo expressamente o requerimento que a A. endereçou à ARS Norte, IP que pretende “Declaração de Tempo de Serviço para efeitos de pedido de Aposentação”, não sugestionando qualquer pedido de aposentação antecipada, tendo, em sua substituição, sido remetido à A, já preenchido, sem as pertinentes instruções e que foi então entregue nos serviços da ARSNorte, IP, que não qualquer pedido de aposentação antecipada., sendo que apenas o requerimento que expressamente e sem qualquer dúvida solicita à CGA a aposentação antecipada da A. é o que foi enviado à CGA, no qual a A. não teve qualquer intervenção directa e mesmo indirecta, sendo ainda manifesto que o impresso enviado, via Web, através do Portal “CGA Directa” não permite sequer qualquer assinatura por parte do beneficiário/interessado/requerente, antes sendo autenticado pelos serviços, utilizando um código de utilizador e chave de acesso, mostra-se verificada uma actuação ilícita e culposa por parte dos serviços da ARSNorte,IP.

2 . Não vindo positivado, demonstrado factual e objectivamente a impossibilidade de integração/recolocação no anterior serviço, donde a A, saiu unicamente em virtude da indevida aposentação antecipada, não se podendo ignorar que as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades, como resulta do disposto, quer na CRP - art.º 205.º, n.º 2, quer no CPTA - art.º 158.º, n.º1 – a reconstituição actual hipotética, importa o regresso da A. ao mesmo serviço.*
* Sumário elaborado pelo relator
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:

I
RELATÓRIO

1 . A ADMINISTRAÇÃO REGIONAL de SAÚDE do NORTE, IP, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, de 8 de Outubro de 2019, que, julgando procedente a acção administrativa interposta pela A./recorrida AA..., enfermeira e residente na Rua (…), exarou o seguinte dispositivo:
"a) Condena a Entidade Demandada a pagar à Autora a quantia de € 16.837,67, acrescida do montante correspondente aos suplementos e compensações previstos no art.º 31º do Decreto-lei n.º 297/2007, de 22.08, relativos ao período de 1.02.2015 a 31.08.2015;
b) Condena a Entidade Demandada a colocar a Autora no local em que se encontrava a exercer funções antes da Aposentação, na USF (...);
c) Condena a Entidade Demandada a pagar à Autora a quantia correspondente aos suplementos e compensações previstos no art.º 31º do Decreto-lei n.º 297/2007, de 22.08, relativos ao período de 1.09.2015 até à referida colocação na USF (...)".
*
2 . No final das suas alegações, a recorrente “ARSNorte, IP” formulou as seguintes conclusões:
A decisão em matéria de facto está afetada de incompletude, por preterição de materialidade relevante, vg ao desconsiderar que o facto segundo o qual «a assistente técnica da ARSN, IP prestou colaboração à autora no preenchimento dos documentos remetidos à CGA e não inseriu qualquer dado a remeter que não tivesse sido fornecido pela autora»;
O depoimento conforme aos documentos, ou seja, a prova testemunhal quando em harmonia com a prova documental, deve erigir-se em prova idónea e relevar adequadamente, em detrimento da que resulta de declarações de parte; a consideração e relevância desta matéria impõe a alteração da decisão quanto à condenação tomada.
Em face daquele depoimento (Gravação Audiências 12-07-2019 13-52-22 Testemunha BB... minutos 1:04:21 a 1:33:40), impunha-se, em rigor e consciência ética, dar como assentes, não apenas os factos dos nºs 1 a 7 da matéria, mas também o facto acima enunciado, assente nos raciocínios de verosimilhança documentados, a saber: i) A autora indicou o NIB o que só faz sentido para quem espera vir a registar o meio de recebimento do abono que vier a ser fixado pela futura pensão; ii) 2º Os impressos eram claros quanto à alternativa «Pensão ou Contagem de tempo»;
Inexiste fundamento de «funcionamento anormal dos serviços» da ARSN, IP quando, para além de tal não ocorrer objetivamente, conforme se extrai da conclusão 1ª, se achar identificada a autoria dos factos passíveis de serem imputados a título de responsabilidade civil extracontratual;
E de se achar demonstrado documentalmente que os requerimentos preenchidos pela interessada – a autora – não foram alterados na sua harmonia, de pedidos de «Pensão ou de contagem de tempo de serviço»;
E de a eventual tramitação do procedimento «sem assinatura» da interessada constituir uma deficiência apenas imputável à CGA e nunca à ARSN, IP que não é quem ultima a instrução da decisão e a profere;
A condenação na reintegração na USF (...) não é legalmente viável por contender com as regras próprias das USF’s, ao invés do regresso ao ACES da ARSN, IP, esse sim legalmente adequado;
Ao ter julgado como o fez, violou a douta sentença recorrida as normas do artigo 7º nº 3 e 4 da Lei nº 67/2007, de 31-12, por admitir estar-se perante uma situação de «funcionamento anormal de serviço».
E termina "Termos em que e nos melhores de direito, deverá ser admitido o presente recurso e na atendibilidade das suas conclusões, revogada a douta sentença recorrida,
Assim se fazendo Justiça!"
*
3 . A A./Recorrida, AA..., apresentou contra alegações, concluindo do seguinte modo:
I – Resulta da prova produzida - quer dos documentos juntos aos autos quer dos depoimentos prestados em audiência de julgamento -, que a Recorrida, aquando do preenchimento da folha de rosto do formulário MOD CGA 01 versão 2.4., nunca, em momento algum, ali apôs a finalidade “pensão” nem a opção “antecipada” como surge no requerimento que foi, pelos serviços da Recorrente, submetido no portal on line da CGA, tal como não preencheu nenhum dos dados constantes das demais páginas desse requerimento;
II – Nessa medida, se o requerimento submetido via web tem inscritos dados que não constam da folha de rosto do formulário preenchido pela Recorrida, bem como uma série de outros sobre os quais esta não foi tida ou achada, não é possível concluir-se, como pretende a Recorrente, que no requerimento não foram inseridos dados não fornecidos pela Recorrida;
III – Como bem se observa na sentença recorrida, não obstante o formulário MOD CGA 01 versão 2.4 fazer referência à necessidade de leitura das “instruções”, a Recorrente não fornece instruções do que quer que seja a quem ali se apresenta com o objectivo de requerer contagem de tempo de serviço ou pensão de aposentação, razão pela qual não pode aquela pretender que os seus trabalhadores se achem instruídos no sentido de saber que campos do formulário devem preencher para um ou outro daqueles fins;
IV – Nada na sentença recorrida leva a concluir que se entende que a evidente falha no funcionamento da ARSN é apontada, em concreto, à trabalhadora BB..., mas antes que ou ela ou outro qualquer trabalhador do Serviço de Recursos Humanos da Recorrente terá submetido, via web, um requerimento de pensão de aposentação, alterando campos preenchidos pela Recorrida na respectiva folha de rosto e aditando-lhe uma série de outros, sem a ouvir sobre essas alterações e sem, aliás, colher a sua assinatura, no sentido de validar a informação ali aposta;
V – É a própria Recorrente, aliás, que, no ofício que remete à CGA em 15.01.2015, assume que houve falha dos seus serviços na interpretação da vontade da Recorrida;
VI – Tendo em conta a legislação especial por que se regem às USF, não existe, ao contrário do que pretende a Recorrente, liberdade desta para, sem mais, pôr e dispor dos membros das equipas multiprofissionais das USF, os quais apenas são substituídos nos casos e sob as condições especificamente previstas no Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de Agosto;
VII – Mesmo que a lei conferisse à Recorrente uma tal margem de manobra – o que não se concede –, o certo é que a Recorrida foi desligada daquela unidade por um acto ilícito – a sua aposentação – e não por força de qualquer acto de gestão da Recorrente, pelo que não se vislumbra como, em sede de reconstituição da situação actual hipotética, não pode e deve voltar a ser integrada naquele serviço, com as consequências daí decorrentes, nomeadamente remuneratórias2.
*
Também a Caixa Geral de Aposentações – CGA - apresentou contra alegações, no final das quais formulou as seguintes conclusões:
A. Analisado o recurso interposto pela ARS Norte, impõe-se à CGA apresentar as presentes Contra-Alegações na medida em que é manifesto que aquela entidade persiste em procurar imputar a outros as responsabilidades por um procedimento anómalo que teve origem no seio da própria ARS Norte.
B. Para tanto, argumenta a ARS-Norte que a tramitação do procedimento «sem assinatura» da interessada constitui “…uma deficiência apenas imputável à CGA e nunca à ARSN, IP que não é quem ultima a instrução da decisão e a profere” (cfr. 6.ª Conclusão do Recurso da ARS-Norte)
C. Estamos claramente perante uma situação que raia os limites da litigância de má-fé por parte da ARS-Norte.
D. De facto, como a ARS Norte bem sabe – tem a obrigação de o saber – os pedidos de aposentação submetidos via web, através do CGA Directa, não são assinados mas valem como tal pois são autenticados pelos Serviços mediante a introdução do respetivo código de utilizador e chave de acesso na página de Autenticação do portal, o que sucedeu na presente situação (cfr. 7 dos Factos Assentes).
E. Nesse pedido submetido via web (cfr. 7 dos Factos Assentes), a ARS Norte procedeu à identificação completa da utente; especificou a modalidade de aposentação pretendida; referiu se a subscritora tinha ou não descontos para o regime geral de segurança social; preencheu os dados fiscais, a forma de pagamento da pensão e o respetivo IBAN (e o cotitular autorizado).
F. Acresce que foi a própria ARS Norte que, por ofício de 2015-03-23, veio pedir à CGA que “…seja considerado sem efeito o pedido de aposentação que deu entrada nesses serviços, a 29-12-2014…” (cfr. 14 dos Factos Assentes) ali assumindo ”…a existência de divergências entre o que a interessada pretendia e o que foi interpretado por estes serviços…” (cfr. 15 dos Factos Assentes)
G. Pelo que, quanto a este particular, é absolutamente censurável a linha argumentativa utilizada pela ARS Norte para sustentar o seu recurso, sendo que, conforme se prescreve na Sentença recorrida, foi a ARS Norte que, interpretando mal a vontade da Autora, deu causa ao procedimento administrativo de atribuição de pensão que correu termos na CGA.
E termina "Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve
ser negado provimento ao recurso interposto pela ARS Norte e confirmada a douta decisão recorrida, com as legais consequências".
*
4 . O Digno Magistrado do M.º P.º neste TCA, notificado nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, nada disse.
*
5 . Sem vistos, mas com envio prévio do projecto aos Ex.mos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
*
6 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA, bem como, a título subsidiário, da ampliação do âmbito do recurso, peticionada pela recorrida Infraestruturas de Portugal, SA., deduzida nas contra alegações.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1 . MATÉRIA de FACTO
1 . São os seguintes os factos fixados na decisão recorrida:

1. Até 01.02.2015, a Autora exerceu as funções inerentes à categoria profissional de Enfermeiro, mediante contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, na USF (…), Unidade de Saúde Familiar de Modelo B;
2. Por requerimento datado de 4.12.2014, a Autora solicitou à Entidade Demandada uma “Declaração de Tempo de Serviço para efeitos de pedido de Aposentação” – cf. fls. 2 do processo administrativo junto pela Entidade Demandada;
3. No dia 18.12.2014, por no requerimento referido no ponto anterior não ter sido utilizado o modelo oficial, foi remetido à Autora, preenchido e entregue nos serviços da Entidade Demandada, requerimento de “Pensão ou Contagem de Tempo”, Mod CGA 01, versão 2.3, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

cf. requerimento, a fls. 2 do processo administrativo junto pela Entidade Demandada;

4. O campo 1.3 do requerimento referido no ponto anterior relativo à “Finalidade”, em que consta indicado “Aposentação”, assim como, o campo 1.4, em que consta o NIB, foram preenchidos pela Autora;
5. Aquando do preenchimento do requerimento, não foi fornecido à Autora as respetivas instruções de preenchimento;

6. O requerimento em questão não se encontra assinado pela Autora;
7. Com referência ao requerimento acima referido, a Entidade Demandada submeteu, em 29.12.2014, via web, através do portal “CGA Direta”, à CGA, requerimento de “Pensão ou de Contagem de Tempo”, com o seguinte teor:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

cf. “print”, a fls. 1 do processo administrativo junto pela CGA;

8. Por despacho de 15.01.2015 do órgão competente da CGA, foi reconhecido o direito à aposentação da Autora e fixado o valor da respetiva pensão em € 529,92 – cf. ofício, a fls. 5 do processo administrativo junto pela Entidade Demandada;

9. Por ofício datado de 10.02.2015, a Entidade Demandada informou o ACES Grande Porto IX - Espinho/Gaia que a Antora fica desligada do serviço por motivo de aposentação com efeitos a partir de 1.02.2015 – cf. ofício, a fls. 7 do processo administrativo junto pela Entidade Demandada;
10. A Entidade Demandada, por ofício de 10.02.2019, informou a Autora de que fica desligada do serviço a partir de 1.02.2015 – cf. ofício, a fls. 8 do processo administrativo da Entidade Demandada;
11. No Diário da República n.º 66, II série, de 6.04.2015, foi publicada a aposentação da Autora – cf. cópia de DR, a fls. 18 do processo administrativo junto pela Entidade Demandada;
12. Por requerimento datado de 29.01.2015, dirigido à CGA, a Autora solicita que seja revisto o processo de aposentação, no qual fez constar, entre o mais, que “informaram-me que podia esperar pela contagem do tempo de serviço e que me informariam do montante da reforma antes de ser concluído o processo” – cf. requerimento, a fls. 22 do processo administrativo junto pela CGA;
13. Por ofício de 16.02.2015, a CGA informou a Autora que o solicitado no ponto anterior não pode ter seguimento, com fundamento na impossibilidade do requerente desistir do pedido de aposentação depois de proferido despacho a reconhecer o direito a aposentação voluntária – cf. ofício, a fls. 23 do processo administrativo junto pela CGA;
14. Por ofício de 23.03.2015, a Entidade Demandada solicita à CGA que seja considerado sem efeito o pedido de aposentação que deu entrada a 29.12.2014 e que seja anulada a decisão de aposentação da Autora – cf. ofício, a fls. 13 do processo administrativo junto pela Entidade Demandada;
15. No ofício referido no ponto anterior consta, além do mais, que “[a]ssim, constata-se a existência de divergências entre o que a interessada pretendia e o que foi interpretado por estes serviços, ao que acresce o facto incontornável de o requerimento / nota biográfica não ter sido assinado pela Sra. Enf.ª (…)” – cf. ofício, a fls. 13 do processo administrativo, junto pela Entidade Demandada
16. Em 17.08.2015, os serviços da CGA elaboraram informação na qual fizeram constar, entre o mais, que “[a] Administração Regional de Saúde do Norte enviou a esta Caixa o pedido de aposentação sem que a interessada tivesse manifestado a sua vontade em aposentar-se e sem que ela tivesse assinado o respetivo requerimento, pelo que, parece ser de revogar o despacho, dando-se conhecimento ao Serviço e à interessada” – cf. informação, a fls. 69 do processo administrativo junto pela CGA;
17. Sobre a informação referida no ponto anterior foi proferido despacho de concordância em 17.08.2015 cf. despacho, a fls. 69 do processo administrativo junto pela CGA
18. Por ofício datado de 19.08.2015, a CGA deu conhecimento à Autora da comunicação remetida à Entidade Demandada, na sequência da decisão referida no ponto anterior, da qual consta o seguinte:
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

19. A Autora retomou o exercício de funções, ao serviço da Entidade Demanda, em 1.09.2015, tendo sido colocada no ACES Grande Porto (…);
20. Por ofício de 13.12.2015, a CGA comunicou à Autora do cancelamento da pensão, com efeitos a 1.05.2015, instando-a a pagar a quantia de € 2.790,00 – cf. ofício, a fls. 88 do processo administrativo junto pela CGA;
21. No Serviço de Finanças de Espinho foi instaurado em nome da Autora processo de execução fiscal para cobrança da quantia de € 2.790,00, acrescido de juros vencidos de € 26,85 – cf. citação, a fls. 25 do processo físico;
22. No âmbito do processo de execução fiscal referido no ponto anterior foi penhorada a viatura matrícula (...) – cf. ofício, a fls. 26 do processo físico;
23. No âmbito do processo de execução fiscal, em 16.05.2016, foi paga a quantia de € 2.965,45 – cf. guia, a fls. 27 do processo físico;
24. A Autora auferia em janeiro de 2015 a remuneração base de € 2.228,02, acrescidas de suplementos e compensações a que se refere o art.º 31º do Decreto-Lei n.º 297/2007, de 22.08 – cf. ofício a fls. 21 e talões de vencimento a fls. 83 e segs. do processo físico;

25. No período compreendido entre 1.02.2015 e 1.05.2015, a Autora auferiu uma pensão provisória de € 1.661,94;
26. A Autora encontrou-se num estado emocional de angústia, ansiedade, medo e irritabilidade em consequência do despacho a que se refere o ponto 9) supra.


2 . MATÉRIA de DIREITO

No caso dos autos, tendo em consideração, a sentença recorrida e as alegações apresentadas pela recorrente ARSNorte, IP, maxime, as suas conclusões, supra transcritas, importa saber se aquela fez correcta aplicação das normas legais aplicáveis atenta a factualidade provada, também supra descrita, ou melhor, importa, num primeiro momento, avaliar se se impõe o aditamento de novos factos, com pretende a Recorrente ARSN, IP
Depois – verificados os demais requisitos da responsabilidade civil aquiliana, concretamente, o requisito da ilicitude de da culpa -, questionando-se apenas na parte dos danos o que se refere à decisão que condena a entidade demandada, ora recorrente jurisdicional, na colocação da A./Recorrida no local em que se encontrava a exercer funções antes da aposentação, ou seja, na USF (...), verificar, além do mais, se esta componente decisória, em reconstituição da situação actual hipotética, se mostra correcta.
**
Comecemos, logicamente, pela
matéria de facto.
Antes, porém, de entrarmos na análise específica e crítica das provas levadas em consideração para se obterem os factos provados, importa que clarifiquemos alguns conceitos inerentes a esta matéria, de molde a balizarmos, tanto quanto possível, a sindicância possível e adequada, no que concerne à modificação da matéria de facto, dada como provada, pela 1.ª instância, ainda que com base na jurisprudência dos Tribunais Superiores da jurisdição administrativa, quer do STA, quer deste TCA, os quais já lapidaram, com rigor, esta matéria e com os quais concordamos e já temos incluído noutras decisões por nós relatadas.
*
Assim, refere, a este propósito o Ac. do STA, de 19/10/2005, in Rec. 0394/05 “O Tribunal de recurso só deve modificar a matéria de facto quando a convicção do julgador, em 1ª instância, não seja razoável, isto é, quando seja manifesta a desconformidade dos factos assentes com os meios de prova disponibilizados nos autos, dando-se assim a devida relevância aos princípios da oralidade, da imediação e da livre apreciação da prova e à garantia do duplo grau de jurisdição sobre o julgamento da matéria de facto”.
*
No mesmo sentido, vai o Ac. do mesmo Tribunal, de 14/3/2006, in Rec. 01015/06, que refere que “A garantia de duplo grau de jurisdição em matéria de facto (art. 712º C.P.Civil) deve harmonizar-se com o princípio da livre apreciação da prova (art. 655º/1 do C.P.Civil).
Assim, tendo em conta que o tribunal superior é chamado a pronunciar-se privado da oralidade e da imediação que foram determinantes da decisão em 1ª instância e que a gravação/transcrição da prova, por sua natureza, não pode transmitir todo o conjunto de factores de persuasão que foram directamente percepcionados por quem primeiro julgou, deve aquele tribunal, sob pena de aniquilar a capacidade de livre apreciação do tribunal a quo, ser particularmente cuidadoso no uso dos seus poderes de reapreciação da decisão de facto e reservar a modificação para os casos em que a mesma se apresente como arbitrária, por não estar racionalmente fundada, ou em que for seguro, segundo as regras da ciência, da lógica e/ou da experiência comum que a decisão não é razoável.
Tudo a aconselhar um especial cuidado por parte do tribunal superior no uso dos seus poderes de reapreciação dos pontos controvertidos da matéria de facto (cfr., neste sentido, os acórdãos deste Supremo Tribunal, de 2003.06.18 – rec- nº 1188/02 e de 2004.06.22 – rec. nº 1624/03).
Sob pena de pôr em causa os princípios da oralidade e da livre convicção que informam a nossa lei processual civil, o tribunal de recurso deve reservar a modificação da decisão de facto para os casos em que a mesma seja arbitrária por não se mostrar racionalmente fundada ou em que for evidente, segundo as regras da ciência, da lógica e /ou da experiência que não é razoável a solução da 1ª instância”.
*
Salientamos, ainda, (face às normas do CPTA) acerca desta matéria, o que se escreveu no Ac. deste TCA Norte, de 8/3/2007, in Proc. 00110/06, a saber :
Decorre do regime legal vertido nos arts. 140.º e 149.º do CPTA que este Tribunal conhece de facto e de direito sendo que na apreciação do objecto de recurso jurisdicional que se prende com a impugnação da decisão de facto proferida pelo tribunal “a quo” se aplica ou deve reger-se, na ausência de regime legal especial, pelo regime que se mostra fixado em sede da legislação processual civil nesta sede.

Assim, pese embora tal regime e situações diversas temos, todavia, que referir que os poderes conferidos no art. 149.º, n.º 2 do CPTA não afastam os poderes de modificação da decisão de facto por parte deste Tribunal ao abrigo do art. 712.º do CPC por força da remissão operada pelos arts. 01.º e 140.º do CPTA porquanto o TCA mantém os poderes que assistem ao tribunal de apelação no âmbito da fixação da matéria de facto quando esta constitui objecto ou fundamento de recurso jurisdicional.

É que a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova por parte do julgador que se mostra vertido no art. 655.º do CPC, sendo certo que, na formação da convicção daquele quanto ao julgamento fáctico da causa, não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, mas também factores não materializados, visto que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação e/ou na respectiva transcrição.
Na verdade, constitui dado adquirido o de que existem inúmeros aspectos comportamentais dos depoentes que não são passíveis de ser registados numa simples gravação áudio. Tal como já era apontado pelo Juiz Cons. Eurico Lopes Cardoso os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe e como tal apreendidos ou percepcionados por outro Tribunal que pretenda fazer a reapreciação da prova testemunhal, sindicando os termos em que a mesma contribuiu para a formação da convicção do julgador, perante o qual foi produzida (cfr. BMJ n.º 80, págs. 220 e 221).
Como tal, o juiz, perante o qual foram prestados os depoimentos, sempre estará numa posição privilegiada em termos de recolha dos elementos e sua posterior ponderação, nomeadamente com a devida articulação de toda a prova oferecida, de que decorre a convicção plasmada na decisão proferida sobre a matéria de facto.
Em conformidade, a convicção resultante de tal articulação global, evidencia-se como sendo de difícil destruição, principalmente quando se pretende pô-la em causa através de indicações parcelares, ou referências meramente genéricas que o impugnante possa fazer, como contrárias ao entendimento expresso.
Com efeito e como tem vindo a ser entendimento jurisprudencial consensual o depoimento de uma testemunha é formado por um complexo de situações e factos em que sobressai o seu porte, as suas reacções imediatas, o sentido dado à palavra e à frase, o contexto em que é prestado o depoimento, o ambiente gerado em torno da testemunha, o modo como é feito o interrogatório e surge a resposta, tudo contribuindo para a formação da convicção do julgador.
Segundo a lição que se extrai dos ensinamentos do Prof. Enrico Altavilla "(…) o interrogatório como qualquer testemunho, está sujeito à crítica do juiz, que poderá considerá-lo todo verdadeiro ou todo falso, mas poderá também aceitar como verdadeiras certas partes e negar crédito a outras" (in: "Psicologia Judiciária", vol. II, Coimbra, 3ª ed., pág. 12).
Como já defendia o Prof. J. Alberto dos Reis “… É já hoje lugar-comum a nota de que tanto ou mais do que o que o depoente diz vale o modo por que o diz, é que se as declarações contam, contam também as reticências, as hesitações, as reservas, enfim a atitude e a conduta do declarante no acto do depoimento ...” (in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. IV, pág. 137).
Daí que a convicção do tribunal se forma de um modo dialéctico, pois, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras provas produzidas nos autos, importa atender também à análise conjugada das declarações produzidas e dos depoimentos das testemunhas, em função das razões de ciência, da imparcialidade ou falta dela, das certezas e ainda das lacunas, das contradições, das hesitações, das inflexões de voz, da serenidade, dos “olhares de súplica” para alguns dos presentes, da "linguagem silenciosa e do comportamento", da própria coerência de raciocínio e de atitude demonstrados, da seriedade e do sentido de responsabilidade evidenciados, das coincidências e inverosimilhanças que transpareçam no decurso da audiência de julgamento entre depoimentos e demais elementos probatórios.
Ao invés do que acontece nos sistemas da prova legal em que a conclusão probatória está prefixada legalmente, nos sistemas da livre apreciação da prova, como o nosso, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto da discussão em sede de julgamento, com base apenas no juízo que se fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
Note-se, contudo, que este sistema não significa puro arbítrio por parte do julgador.
É que este, pese embora, livre, no seu exercício de formação da sua convicção, não está isento ou eximido de indicar os fundamentos onde aquela assentou por forma a que, com recurso às regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquele processo de formação da convicção sobre a prova ou não prova daquele facto, permitindo, desta feita, sindicar-se o processo racional da própria decisão.
Aliás, a nossa lei processual determina e faz impender sobre o julgador um ónus de objectivação da sua convicção, através da exigência da fundamentação da matéria de facto (da factualidade provada e da não provada), devendo aquele analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (cfr. art. 653.º, n.º 2 do CPC).
É que não se trata de um mero juízo arbitrário ou de simples intuição sobre veracidade ou não de uma certa realidade de facto, mas antes duma convicção adquirida por intermédio dum processo racional, objectivado, alicerçado na análise critica comparativa dos diversos dados recolhidos nos autos na e com a produção das provas e na ponderação e maturação dos fundamentos e motivações, sendo que aquela convicção carece de ser enunciada ou explicitada por expressa imposição legal como garante da transparência, da imparcialidade e da inerente assunção da responsabilidade por parte do julgador na administração da justiça.
À luz desta perspectiva temos que se a decisão do julgador, devidamente fundamentada, for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.
Aliás e segundo os ensinamentos do Prof. M. Teixeira de Sousa ”(…) o tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através da fundamentação, o juiz passa de convencido a convincente (…)” (in: “Estudos sobre o novo Processo Civil”, pág. 348).
…Mercê do que vimos expondo ao tribunal de recurso apenas e só é dado alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos excepcionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e essa mesma decisão”.
**
Feitas estas considerações dogmáticas acerca da matéria, revertamos ao caso concreto dos autos.
Para tanto, relembra-se a motivação fáctica do julgador do TAF do Porto que, presidindo à audiência de julgamento, elaborou a sentença.
Consta, assim, da respectiva Motivação:
O Tribunal formou a sua convicção através da análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, conforme acima indicado em relação aos pontos do elenco dos factos provados, bem como da posição das partes relativamente aos factos constantes dos articulados por elas apresentados.
No que se refere à prova por declarações de parte da Autora, embora prestado de forma emocionada, o seu depoimento espontâneo logrou convencer o Tribunal de que preencheu os campos relativos à “finalidade” e ao NIB do requerimento a que alude o ponto 3) da matéria de facto provada, assim como, não lhe foram fornecidas as respetivas instruções de preenchimento do requerimento.
No mais, os depoimentos das testemunhas CC... e DD…, tio e nora da Autora, prestaram um depoimento credível sobre as circunstâncias emocionais em que a Autora se encontrou na sequência da aposentação. Já as testemunhas EE… e FF…, funcionárias da Entidade Demandada, com um depoimento desinteressado e credível, auxiliaram o Tribunal na formação da convicção dos factos que se extraem dos documentos juntos aos autos, mormente do respetivo processo administrativo”.
Efectivada uma reanálise da prova, incluindo a testemunhal, pese embora se concorde com a factualidade provada supra transcrita e mesmo com a sua suficiência – que a ARSNorte, IP contrariatemos de referir que se impunha uma motivação mais extensa, no que se refere às testemunhas apresentadas pela ARSNorte, nomeadamente quanto à convicção criada pelo depoimento da testemunha BB..., assistente técnica dos Recurso Humanos e que atendeu a A., sendo que esta testemunha se mostra essencial para, em confronto com as Declarações de parte da A./Recorrida – este mais fundamenado pelo Sr. Juiz - , aferir do que se terá passado na situação concreta dos autos.
No entanto, o aditamento pretendido pela recorrente, concretamente, i) A autora indicou o NIB o que só faz sentido para quem espera vir a registar o meio de recebimento do abono que vier a ser fixado pela futura pensão” e ii) Os impressos eram claros quanto à alternativa «Pensão ou Contagem de tempo»”, mais se pode considerar uma proposição conclusiva que fáctica, pois que se mostra provado que foi a A. que, no documento constante do ponto 3 dos factos provados, escreveu “Aposentação” e escreveu o seu NIB, conforme se exara também no ponto 4 e é quanto basta
Qual a real, objectiva vontade da A. em todo o processo é a conclusão que se tem de tirar de toda a prova, seja ela documental, seja pessoal, que não as conclusões pretendidas pela recorrente.
Deste modo, sem prejuízo da valoração dos depoimentos por parte do julgador, mesmo a entender-se que o depoimento da testemunha BB... se mostra demasiado focado em determinados aspectos ---- apenas se lembrando de alguns pontos com seja, a insistência no pedido de aposentação --- entendemos que não podemos aditar os factos tal como pretendidos pela ASRNorte, pela sua conclusividade.
Como se disse, as conclusões terão de ser retiradas criticamente da análise/conjugação de todo o acervo de prova, documental e testemunhal – as existentes nos autos --- e não apenas do facto, dado como provado – aliás, assumido pela A: no seu depoimento de parte – de que o NIB foi preenchido pela A. e quanto à clareza dos impressos, sem as devidas instruções, convenhamos.
**
Assim, nesta parte, improcede a argumentação/pedido da recorrente ARSNorte, IP.

***
Quanto ao alegado inexistente fundamento do “funcionamento anormal dos serviços da ARSN, IP, também carece de razão a recorrente – cf. conclusão 4.ª das alegações recursivas.
Basta relembrar a fundamentação, a este respeito assertivamente, pela sentença recorrida a este ponto:
Vertendo para o caso em apreço, está em causa uma atuação material da Entidade Demandada, mormente, o tratamento conferido ao requerimento apresentado pela Autora, a que se refere o ponto 3) do probatório, ao submeter, via web, à CGA, um pedido de “pensão antecipada” em nome da Autora, cf. documento a que se refere o ponto 4) dos factos provados.
Importa começar por notar que a falta de assinatura do documento apresentado pela Autora nos serviços da Entidade Demandada não releva para o desfecho da presente lide, porquanto, a Autora não nega a autoria do seu preenchimento, mormente na parte que se refere à finalidade do pedido, nem, tampouco, que foi quem o entregou nos serviços.
O Estatuto de Aposentação, estabelecido pelo Decreto-lei n.º 498/72, de 9.12, ao abrigo do qual foi reconhecido o direito da Autora à aposentação, prevê, no seu art.º 36º, n.º 1, duas formas de aposentação, voluntária ou obrigatória, que se distinguem pelo facto da primeira ter lugar a requerimento do subscritor – nos casos em que a lei a faculta –, ao passo que a segunda tem lugar por determinação da lei ou de imposição de autoridade competente.
Por outro lado, a aposentação voluntária tanto pode ter lugar quando o subscritor preenche os requisitos previstos no art.º 37º, n.º 1, contendentes com a idade e o n.º de anos de serviço, como pode ter lugar antes da verificação desses requisitos, desde que, em qualquer caso, reúnam as condições do art.º 37º-A, n.º 1 – menos idade, mas com um mínimo de anos de serviço.
Em todo o caso, a aposentação voluntária só pode verificar-se mediante requerimento apresentado pelo subscritor. Ou seja, o procedimento tendente à aposentação de funcionário apenas pode ter lugar caso haja uma manifestação de vontade nesse sentido, expressa em requerimento apresentado para o efeito.
Assim, o que releva nos presentes autos é aferir qual a real vontade manifestada pela Autora junto dos serviços da Entidade Demandada, através dos requerimentos apresentados junto da Entidade Demandada.
web, à CGA, um pedido de “pensão antecipada” em nome da Autora, cf. documento a que se refere o ponto 4) dos factos provados.
Importa começar por notar que a falta de assinatura do documento apresentado pela Autora nos serviços da Entidade Demandada não releva para o desfecho da presente lide, porquanto, a Autora não nega a autoria do seu preenchimento, mormente na parte que se refere à finalidade do pedido, nem, tampouco, que foi quem o entregou nos serviços.
O Estatuto de Aposentação, estabelecido pelo Decreto-lei n.º 498/72, de 9.12, ao abrigo do qual foi reconhecido o direito da Autora à aposentação, prevê, no seu art.º 36º, n.º 1, duas formas de aposentação, voluntária ou obrigatória, que se distinguem pelo facto da primeira ter lugar a requerimento do subscritor – nos casos em que a lei a faculta –, ao passo que a segunda tem lugar por determinação da lei ou de imposição de autoridade competente.
Por outro lado, a aposentação voluntária tanto pode ter lugar quando o subscritor preenche os requisitos previstos no art.º 37º, n.º 1, contendentes com a idade e o n.º de anos de serviço, como pode ter lugar antes da verificação desses requisitos, desde que, em qualquer caso, reúnam as condições do art.º 37º-A, n.º 1 – menos idade, mas com um mínimo de anos de serviço.
Em todo o caso, a aposentação voluntária só pode verificar-se mediante requerimento apresentado pelo subscritor. Ou seja, o procedimento tendente à aposentação de funcionário apenas pode ter lugar caso haja uma manifestação de vontade nesse sentido, expressa em requerimento apresentado para o efeito.
Assim, o que releva nos presentes autos é aferir qual a real vontade manifestada pela Autora junto dos serviços da Entidade Demandada, através dos requerimentos apresentados junto da Entidade Demandada.
Para tal desiderato sobressai o teor do requerimento a que se refere o ponto 2) dos factos provados, na sequência do qual, e por não ter sido utilizado o modelo oficial previsto para o efeito, a Entidade Demandada remeteu à Autora para preenchimento e entrega o requerimento referido no ponto 3) do probatório.
Naquele requerimento primeiramente apresentado à Entidade Demandada, elaborado através de um processador de texto, a Autora solicita, expressamente, uma “Declaração de tempo de Serviço para efeitos de pedido de Aposentação”. Ora, atento aos termos utilizados, a um declaratário normal está vedada a possibilidade de interpretar o requerido como um pedido para que seja reconhecido o direito à aposentação, mas tão só uma declaração de tempo de serviço, ainda que para posteriores efeitos de aposentação.
Por outro lado, volvidos quatro dias, a Autora preenche, a solicitação da Entidade Demandada, nos serviços desta, pelo próprio punho, o requerimento normalizado, em cujo cabeçalho consta “Requerimento de Pensão ou de Contagem de Tempo”, no qual indica como finalidade do pedido “Aposentação”.
É certo que, nesse requerimento, a finalidade do pedido indicado pela Autora não foi nem “Pensão” nem “Contagem de Tempo”, apesar se serem essas as finalidades constantes na identificação do requerimento, mas sim “Aposentação”. Mas tal aposição pela Autora não basta para que se conclua que a Autora pretendia que lhe fosse reconhecido o direito à aposentação.
É que, por um lado, também o requerimento do ponto 2) dos factos provados refere que a contagem do tempo de serviço é para efeitos de aposentação, sem que tal signifique, como se referiu, que a Autora pretendia a aposentação imediata.
Por outro lado, se é certo que a Autora não indicou no requerimento do ponto 3) dos factos provados qualquer uma das finalidades sugeridas pelo nome do requerimento – “pensão” ou “contagem de tempo” – a verdade é que inexistem nos autos quaisquer elementos que sugiram, segundo as regras da experiência, uma mudança nas intenções da Autora no decurso dos quatro dias que mediaram o primeiro do segundo requerimento.
Por outro lado, ainda, de notar que está em causa o preenchimento de um requerimento normalizado, efetuado durante um atendimento, sem o fornecimento das respetivas instruções de preenchimento, ao que não será alheia a circunstância da finalidade aposta pela Autora – “Aposentação” – ter sido convertida em “Pensão”, aquando da inserção do requerimento no portal on line da CGA.
Releva, ainda, nesta parte, a posição assumida pela Entidade Demandada junto da CGA, no sentido da existência de divergências entre o que a Autora pretendia e o que foi interpretado pelos serviços [cf. facto provado 16)].
Do exposto resulta que a Entidade Demandada tratou indevidamente os requerimentos apresentados pela Autora como pedido de pensão antecipada, apesar de esta não ter apresentado requerimento nesse sentido, como é exigido.
Apesar de não ter manifestado a vontade para que lhe fosse reconhecido o direito à pensão antecipada, a verdade é que a Autora foi efetivamente aposentada antecipadamente, sem o querer, em violação do seu direito ao trabalho.
E foi pela autuação da Entidade Demandada que tal ocorreu. Não fora a submissão no portal da CGA de pedido de pensão antecipada, por parte dos serviços da Entidade Demandada – a que aquela deu o respetivo seguimento, despachando em conformidade – e a Autora não teria passado à situação de aposentada.
Mas uma vez que não está alegado nos autos a autoria pessoal da submissão no portal da CGA de pedido de pensão antecipada da Autora, é à presente situação aplicável a ilicitude prevista no n.º 2 do art.º 9º do RRCEE, ou seja, a ofensa do direito da Autora resultante de funcionamento anormal do serviço, a que se referem os n.ºs 3 e 4 do art.º 7º do mesmo diploma.
Para se verificar a ilicitude na atuação da Entidade Demandada, geradora do dever de indemnizar, é necessário aferir se, atendendo às circunstâncias e a padrões médios de resultados, era razoável exigir à Entidade Demandada que não submetesse no portal da CGA um pedido de pensão antecipada em nome da Autora, de molde a evitar os alegados danos produzidos com a sua aposentação.
A resposta não pode deixar de ser afirmativa.
Aquando do desencadear, pela Entidade Demandada, do procedimento tendente à aposentação de funcionário, pelas consequências que daí advêm para a vida do mesmo, é razoável exigir aos serviços que o tramitem apenas quando seja essa a vontade do interessado.
Esta exigência de uma vontade manifestada é tanto maior quanto se está perante uma “pensão antecipada”, impondo-se à entidade administrativa que apenas submeta à CGA um pedido de pensão antecipada quando tiver elementos que não deixem margem para qualquer dúvida de que é essa a vontade do funcionário.
É de entender assim, não só porque, neste caso, o trabalhador ainda está em idade “ativa”, e como tal, em condições de continuar a trabalhar, mas também porque, conforme se prevê no art.º 37º-A do Estatuto de Aposentação, a possibilidade dos subscritores da CGA requererem a aposentação antecipada, independentemente de submissão a junta médica, está sujeita à redução do valor da pensão a que se referem os n.ºs 2 e 3 do referido artigo, dependente do número de meses de antecipação em relação à idade normal de acesso à pensão de velhice, com a aplicação do coeficiente de 0,5% por cada mês antecipado.
Ou seja, nos casos de aposentação antecipada, aplicável quando o subscritor da CGA não reúne as condições previstas para a aposentação voluntária a que se referem os art.º 37º, n.º 1, e 39º do Estatuto de Aposentação, é esperada uma redução do valor da pensão a que o subscritor teria direito, caso reunisse a idade normal de reforma (cf. art.º 37º, n.º 1), que será tanto maior quanto o número de meses que faltem até esta se completar.
Assim sendo, é de exigir à entidade pública que apenas submeta um pedido de pensão antecipada junto do portal da CGA quando reunir elementos que revelem, inequivocamente, que é essa a vontade do funcionário, tanto mais que, proferido despacho que reconheça o direito do funcionário à aposentação, este já não pode desistir do pedido, de acordo com o n.º 6 do art.º 39º do Estatuto da Aposentação.
Como acima exposto, os requerimentos entregues pela Autora nos serviços da Entidade Demandada não consubstanciam um pedido de pensão antecipada.
Os deveres objetivos de cuidado a que está adstrita impunham à Entidade Demandada, mesmo que considerasse dúbia a finalidade da Autora aposta no requerimento normalizado – quer porque não corresponde a qualquer uma das duas finalidades do requerimento: “pensão” ou “contagem de tempo”, quer porque antes havia solicitado “contagem de tempo de serviço para efeito de aposentação” –, que encetasse os procedimentos necessários ao esclarecimento da finalidade do pedido, fazendo-o constar do procedimento em causa, de modo a evitar a produção de danos decorrentes da aposentação antecipada da Autora.
O que à Entidade Demandada não é admitido, procedendo com o zelo exigível, é que, à mingua de qualquer esclarecimento adicional por parte da Autora, converta o segundo requerimento apresentado em consequência do primeiro, em que é indicado como finalidade a “Aposentação” em requerimento de “Pensão Antecipada”.
Através da sua atuação, a Entidade Demandada levou a que a Autora se encontrasse na situação de aposentada, contra aquela que era a sua vontade, devendo, por isso ser responsabilizada pelos danos daí advenientes, à luz dos art.º 7º, n.ºs 3 e 4, do RRCEE.
Em face do exposto, tem-se por verificado o pressuposto da ilicitude, no âmbito da responsabilidade exclusiva da administração por funcionamento anormal do serviço, a que se reporta o art.º 7º, n.ºs 3 e 4, do RRCEE”.
Na verdade, ainda que a ARSNorte nunca não tenha imputado directamente a responsabilidade a qualquer seu funcionário em concreto, mesmo à assistente técnica BB..., também da prova produzida não resulta que a actuação ilícita e culposa seja directamente imputável, no seu todo, a um determinado funcionário, concretamente à referida funcionária, pois que – cremos – não resulta dos autos quem foi que preencheu e remeteu, submeteu, via Web, através do portal “CGADirecta” o requerimento transcrito n ponto 7 dos factos provados.
Assim, nenhuma crítica à decisão do TAF Porto.
*
Quanto à conclusão no que se refere ao preenchimento dos requisitos cumulativos – ilicitude e culpa – também a decisão se mostra totalmente assertiva, sem necessidade de despiciendas lucubrações.
Apenas se lembra que o requerimento que a A. endereçou ao Sr. Presidente do Conselho Directivo da ARS Norte – o primeiro e que despoletou todo o procedimento – refere expressamente que pretende “Declaração de Tempo de Serviço para efeitos de pedido de Aposentação” – cfr. ponto 2 dos factos provadosque, obviamente, não sugestiona qualquer pedido de aposentação antecipada, sendo que apenas não foi aceite porque existe impresso oficial adequado, tendo, em sua substituição, sido remetido à A, já preenchido, sem as pertinentes instruções (cfr. ponto 6 dos factos provados) e que foi então entregue nos serviços da ARSNorte, IP – cfr. ponto 3 da factualidade provada – destinado a “Requerimento de Pensão ou de Contagem de Tempo”, que não qualquer pedido de aposentação antecipada.
Depois, o requerimento que expressamente e sem qualquer dúvida solicita à CGA a aposentação antecipada da A. é o que consta do ponto 7 dos factos provados no qual a A. não teve qualquer intervenção directa e mesmo indirecta.
Concluindo, nenhuma dúvida se nos suscita acerca da actuação ilícita e culposa dos serviços da entidade demandada.
**
Quanto à imputação de responsabilidades à CGA, enquanto interveniente acessória nos autos - cfr. conclusão 6.ª das alegações – a irrazoabilidade da alegação é tão evidente que não importa grandes considerações, aliás, objecto de adequada resposta por parte da CGA, em sede de contra alegações, pois que é manifesto que o impresso enviado, via Web, através do Portal “CGA Directa” não permite sequer qualquer assinatura por parte do beneficiário/interessado/requerente, antes sendo autenticado pelos serviços, utilizando um código de utilizador e chave de acesso.
**
Quanto à condenação na reintegração da A., enquanto enfermeira, na USF (...), onde exercia funções aquando da sua aposentação antecipada indevida e derivada da actuação ilícita da ARSNorte - cfr. conclusão 7.ª das alegações – também não merece críticas a decisão do TAF do Porto, sendo consequente da reconstituição actual hipotética da A., sendo que não vem sequer positivado, demonstrado factual e objectivamente, essa impossibilidade de integração/recolocação, não se podendo ignorar que as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades, como resulta do disposto, quer na CRP - art.º 205.º, n.º 2, quer no CPTA - art.º 158.º, n.º1 Preceitua o art.º 158.º do CPTA, sob a epígrafe " Obrigatoriedade das decisões judiciais" que:
"1 - As decisões dos tribunais administrativos são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer autoridades administrativas".
, ao preceituarem que as decisões judiciais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades.
***
Concluímos, deste modo, pela total improcedência do recurso e consequente manutenção da sentença recorrida, sendo que,
quanto ao demais decidido, nada vem questionado perante este Tribunal de recurso.

III
DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e, em consequência, manter a decisão recorrida.
*
Custas pela recorrente.
*
Notifique-se.
DN.

Porto, 9 de Junho de 2022

Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho