Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02492/16.7BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:12/07/2018
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL; CADUCIDADE; NO ARTIGO 2º, N.º8, DO DECRETO-LEI N.º 59/2015, DE 21.04.
Sumário:
Tendo cessado o contrato de trabalho do autor em 07.04.2015 só em 07.04.2016 terminaria o prazo para reclamar os créditos laborais junto do Fundo de Garantia Salarial, pelo que o pedido, formulado em 11.08.2015, é claramente tempestivo à luz do disposto no artigo 2º, n.º8, do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.04, o mesmo é dizer que padece do vício de violação de lei, por desrespeito desta norma legal, o acto que indeferiu tal pedido com fundamento na caducidade do direito. *
*Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Fundo de Garantia Salarial
Recorrido 1:JFPF
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:
Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer em que pugna pelo não provimento do recurso
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Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO
Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

O Fundo de Garantia Salarial veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador-sentença, de 29.05.2018, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou (parcialmente) procedente a acção administrativa que JFPF moveu contra o ora Recorrente.
Invocou para tanto, e em síntese, que a decisão da 1ª Instância deve ser revogada porquanto desrespeitou o artigo 2º, nº 8, do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21.04, estabelece um prazo de caducidade dos requerimentos para pagamento de créditos devidos pela cessação do contrato de trabalho, prazo já decorrido à data da apresentação do requerimento apresentado pelo Autores indeferidos pelo acto administrativo impugnado e que mesmo à luz do anterior regime legal previsto no artigo 319º nº 3 da Lei nº 35/2004, de 29.07 o prazo de caducidade também já havia decorrido à data da apresentação de tais requerimentos. Invoca ainda que não foi preterida a audiência prévia dos Autores.
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O Recorrido contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida.
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O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer em que pugna também pelo não provimento do recurso.
O Recorrido respondeu ao parecer do Ministério Público, acompanhando tal parecer.
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Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:
A. O requerimento do Autora foi apresentado ao Fundo de Garantia Salarial em 24.03.2016, altura em que se encontrava em vigor o novo diploma legal regulador do FGS, Decreto-Lei 59/2015, de 21.04, que entrou em vigor no dia 04.05.2015.
B. Assim, o referido requerimento do Autora foi apreciado à luz deste diploma legal.
C. Este diploma previa um prazo de 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho para que seja apresentado junto dos serviços da Segurança Social o requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho.
D. De resto, já o anterior regime legal, previsto na Lei 35/2004, de 29.07, estabelecia no seu artigo 319.º, n.º 3, um prazo para a apresentação do requerimento para pagamento de créditos emergentes pela cessação do contrato de trabalho, que era de 3 meses antes do termo do prazo de prescrição, ou seja, 1 ano a contar da cessação do contrato de trabalho.
E. Deste modo se verifica que sempre existiu um prazo para apresentação dos requerimentos ao Fundo de Garantia Salarial, sendo que o actual regime prevê um prazo de caducidade findo o qual cessa o direito de os ex-trabalhadores das empresas insolventes requererem o pagamento dos créditos ao Fundo.
F. Prazo este que, na situação concreta, também está ultrapassado à luz do anterior diploma legal Lei 35/2004, de 29.07.
G. Não tendo aqui aplicação o artigo 297.º do Código Civil, uma vez que à luz dos dois diplomas já se encontra terminado o prazo para apresentação do requerimento ao Fundo de Garantia Salarial, pois só cabe chamar à colação o disposto neste artigo quando estamos perante situações em que os prazos se iniciem ou já se encontrem em curso à data da entrada em vigor da lei nova.
H. Sendo aplicável o novo regime, de acordo com o artigo 3.º do Decreto-Lei 59/2015, de 21.04, e consequentemente o prazo de caducidade nele previsto, temos de considerar como estando legalmente esgotado o prazo para a apresentação dos requerimentos ao Fundo, à luz do diploma Decreto-lei 59/2015, de 21.04 que entrou em vigor no dia 04.05.2015.
I. É nosso entendimento que a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel não andou bem ao ordenar ao anular o ato impugnado.
Conclui, pedindo, o provimento do presente recurso, a revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que mantenha a decisão de indeferimento proferida pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial.
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II – Matéria de facto.
A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:
1. O Autor começou a trabalhar para a sociedade “GTT, Lda.” no ano de 2000 – cfr. Requerimento e Critérios de Pesquisa, a fls. 5, 6 e 7 do processo administrativo apensado ao suporte físico dos autos, respectivamente.
2. Foram emitidos em nome do Autor “Certificado[s] De Incapacidade Temporária Para o Trabalho” para o período entre 10.03.2014 e 12.09.2015 – cfr. Certificados, a fls. 16 a 21 do processo administrativo apensado aos autos físicos.
3. No dia 21.11.2014 foi apresentado “Processo judicial de insolvência” da sociedade “GTT, Lda.” no Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, 2ª Secção, J1, que recebeu o número 2356/14.9T8VNG e teve sentença no dia 07.04.2015 – cfr. anúncio, a fls. 26 do processo administrativo apensado aos autos físicos.
4. No dia 14.07.2015, Inácio Peres declarou “na qualidade de Administrador de Insolvência nomeado” no processo acabado de referir que o Autor:
“Reclamou créditos, peticionando sobre a sociedade insolvente um crédito no montante global de 16.777,19 € (dezasseis mil, setecentos e setenta e sete euros e dezanove cêntimos) correspondente a:
- Proporcionais subsídio de férias;
- Proporcionais subsídio de Natal;
- Indemnização / compensação por cessação de contrato de trabalho;
- Emergente da violação do contrato de trabalho.
– cfr. declaração, a fls. 4 do suporte físico dos autos.
5. No dia 11.08.2015, o Autor apresentou “Requerimento –Pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho”, no valor de 16.777,19 €, onde consta como “Data de cessação do contrato de trabalho” “2015/04/10” – cfr. requerimento, a fls. 5 e 6 do processo administrativo apensado ao suporte físico dos autos, que se dá por integralmente reproduzido.
6. No dia 15.03.2016, foi proposto o indeferimento do pedido do Autor acabado de referir, com o seguinte fundamento:
«O requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do art.º 2.º do Dec.-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril».
– cfr. informação, de fls. 88 a 90 do processo administrativo apensado ao suporte físico dos autos, que se dá por integralmente reproduzida.
7. No dia 17.06.2016 foi depositada, na caixa de correio do Autor, a carta com a comunicação da decisão acabada de referir.
8. Em 28.06.2016, o Autor enviou aos serviços do Réu “requerimento de: a) Audiência prévia – Fundo de Garantia Salarial” – cfr. requerimento, de fls. 87 a 80 do processo administrativo apensado ao suporte físico dos autos, que se dá por integralmente reproduzido.
9. No dia 02.06.2016 foi dado, pelo Presidente do Réu, despacho concordante sobre a proposta referida em 6), constando da informação que lhe subjaz que:
“foi instaurada ação de insolvência da entidade empregadora […] os requerimentos não foram apresentados no prazo previsto no n.º 8 do artigo 2º do Anexo ao Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de Abril, na decorrência do que o FGS não assegura o pagamento dos créditos requeridos.”
– cfr. informação, de fls. 91 do processo administrativo apensado ao suporte físico dos autos, que se dá por integralmente reproduzida.
10. A petição inicial da presente acção foi apresentada no dia 21.10.2016 – cfr. comprovativo de entrega de documento, a fls. 2 do suporte físicos dos autos.
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III - Enquadramento jurídico.
O Recorrido apresentou junto dos serviços competentes do Fundo de Garantia Salarial, requerimento para pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, ao abrigo do regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial, em 11.08.2015.
Por despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial o requerimento do Recorrido foi indeferido, com o fundamento de que o mesmo não preenchia o requisito imposto pelo n.º 8 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.04, uma vez que o requerimento não havia sido apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
O Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.04 - lei reguladora do Fundo de Garantia Salarial - fixa no artigo 2.º, nº 8, do seu anexo um prazo de caducidade de um ano contado a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
Determina o artigo 3º do Decreto-Lei n.º nº 59/2015, de 21.04 que ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado em anexo ao presente Decreto-Lei, os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor.
O requerimento do Autor foi apresentado em 11.08.2015, depois, portanto, de 04.05.2015, data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.04 – artigo 5º do mesmo diploma legal -, pelo que, por força do artigo 3º do mesmo diploma, o prazo de caducidade previsto no novo diploma legal é aplicável ao caso.
Defende o Recorrente que “o contrato de trabalho do A. terminou no dia 04.08.2014”.
Sucede que em parte nenhuma da matéria de facto provada encontra eco esta afirmação.
Pelo contrário, apenas se apresenta como facto susceptível de determinar a cessação do contrato de trabalho a declaração judicial de insolvência da entidade patronal, de 07.04.2015 – facto provado sob o n.º 3.
Tendo cessado o contrato de trabalho em 07.04.2015 só em 07.04.2016 terminaria o prazo para reclamar os créditos laborais junto do Fundo de Garantia Salarial, pelo que o pedido, formulado em 11.08.2015, é claramente tempestivo à luz do disposto no artigo 2º, n.º8, do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21.04, ao contrário do que consta do acto impugnado.
Já anterior legislação regulamentadora do Fundo de Garantia Salarial estabelecia requisitos temporais para apresentação do requerimento junto do Fundo de Garantia Salarial, dispondo o artigo 319.º da Lei 35/2004, de 29.07, no seu n.º 3, que o Fundo de Garantia Salarial só assegurava o pagamento dos créditos que lhe fossem reclamados até 3 meses antes da respectiva prescrição.
A prescrição está prevista no artigo 337º nº 1 do anexo da Lei nº 7/2009, de 12.02, que aprovou a revisão do Código do Trabalho que dispõe:
O crédito do empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
O contrato de trabalho do Autor cessou, como já se referiu, não em 04.08.2014, como defende o Recorrente, mas em 07.04.2015, com a declaração judicial de insolvência da entidade patronal do Recorrido, pelo que prescreveriam os créditos salariais em 07.04.2016 e, assim, caducaria o direito a reclamar esses créditos junto do Fundo de Garantia Salarial três meses antes, ou seja, em 07.01.2016.
Assim o pedido, formulado em 11.08.2015, é claramente tempestivo também à luz do disposto 319.º da Lei 35/2004, de 29.07, no seu n.º 3.
Pelo que, quer à face da lei antiga, quer à face da lei vigente, o pedido de pagamento de créditos salariais formulado pelo Autor junto do Fundo de Garantia salarial foi apresentado em tempo.
Do que se concluir que o acto impugnado padece da ilegalidade que lhe é imputada, tal como decidido.
Não merece, pois, provimento o presente recurso jurisdicional, impondo-se manter a decisão recorrida, nos seus precisos termos.
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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantêm a decisão recorrida.
Sem custas por delas estar isento o Recorrente.
Porto, 07.12.2018
Ass. Rogério Martins
Ass. Luís Garcia
Ass. Alexandra Alendouro