Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00568/08.3BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:11/09/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:IRS;
MAIS VALIA;
VALOR DE AQUISIÇÃO;
Sumário:
I. O ganho sujeito a IRS é, constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição [al. a) do nº 1 do artigo 10º) do CIRS], este calculado de acordo com o disposto nos artigos. 46º e seguintes do Código do IRS.

II. No caso da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, se o bem imóvel houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.

III. Para ilidir a presunção contida no artigo 46º, nº 1, do CIRC, é possível ao contribuinte recorrer ao processo de impugnação judicial, para lograr provar que o preço declarado é o efetivamente praticado ou, como no caso, o preço simulado que invoca em sede de audiência.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO

1.1. A Fazenda Pública (Recorrente), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto datada de 13.10.2015, pela qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação judicial contra a liquidação adicional de IRS e juros compensatórios relativa ao exercício de 2003, no montante de € 6.789,66 após acerto de contas, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida da liquidação de IRS e respetivos juros compensatórios relativa ao ano fiscal de 2003, na sequência de procedimento interno de alteração dos rendimentos declarados.
B. Constitui fundamento da impugnação o erro nos pressupostos de facto e de direito dos atos tributários impugnados, porquanto o preço pelo qual a fração da matriz predial urbana da freguesia e concelho ..., teria sido vendida pelos impugnantes em 14.08.2003 foi de € 99.759,58 como declarado no procedimento de alteração dos rendimentos, e não € 112.500,00, como computado no lançamento da liquidação impugnada.
C. Decidiu a final o Tribunal a quo, não obstante assinalar que “os Impugnantes confessaram nesta sede que o valor declarado não é o real”, e que “dúvidas não subsistem que o valor declarado não corresponde ao valor real pelo imóvel foi alienado” que “a factualidade que resultou provada (…) também infirmou as ilações da AT quanto ao montante de € 112.500,00”, uma vez que os impugnantes teriam comprovado que o valor real pelo qual o imóvel foi vendido ascendeu a € 99.759,58, quer pelo montante dos cheques que serviram de pagamento, quer pelas declarações proferidas pela compradora.
D. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, por entender que a sentença em causa procede a uma errónea valoração da matéria de facto evidenciada no processo sub judice, que determinou uma errónea subsunção dos factos ao direito aplicável, em termos que afetam irremediavelmente a sua validade substancial.
E. No que concerne ao julgamento da matéria de facto com interesse para a decisão final, ressalvado o devido respeito, cumpre suprir a insuficiente seleção da matéria de facto provada na indicação dos factos, que a Fazenda Pública propugna sejam retificados, nos termos do art. 640º do CPC, de acordo com o exposto no desenvolvimento destas alegações, que aqui se dá por reproduzido,
F. Posto isto, um exame crítico da prova produzida na impugnação em apreço faz concluir não ter sido feita prova suficiente de factos que pusessem em causa a legalidade da liquidação.
G. Os impugnantes, tendo declarado a alienação da fração da matriz predial de ... pelo valor de € 77.300,00, depois de chamados a prestar esclarecimentos sobre os rendimentos declarados na sequência do pagamento pela adquirente da sisa e correspondentes juros compensatórios devidos pela aquisição da fração pelo valor de € 112.500,00, reconheceram expressamente a existência de simulação relativa no contrato de compra e venda e afastando a aplicação da presunção prevista no nº1 do art. 75°, n°1, da LGT, e passaram a invocar o valor de € 99.759,58 como preço efetivo de venda.
H. Perante o exposto, a AT verificou elementos sérios que demonstram, que o montante do preço de venda da fração não teve o quantitativo declarado na escritura, mas sim outro, superior, no valor de € 112.500,00, através de indícios sólidos donde se pode extrair ter existido simulação no preço, preenchendo assim o ónus da prova que recaía sobre a mesma, nos termos do nº1 do art. 74º da LGT, de facto constitutivo do direito à liquidação adicional de IRS de 2003 por tal preço superior.
I. Os parcos elementos probatórios trazidos pelos impugnantes não preenchem ónus de prova da errada quantificação da matéria tributável em IRS, não permitem formar uma convicção séria no sentido da errada quantificação da matéria tributável da liquidação impugnada.
J. Se, como salienta a sentença, a adquirente declarou que e era de experiência comum que, à data dos factos em questão, era usual o empréstimo pelos bancos de montantes superiores ao valor mutuado, e se essa foi a situação dos contratos formalizados pela escritura de 14.08.2003, em relação ao qual os outorgantes identificaram, em diversos momentos, três (€ 77.300,00, € 99.759,58, e € 112.500,00) valores como sendo o preço praticado, não se vislumbra que prova inquestionável tenha sido feita no processo judicial em causa de que esse preço se deva fixar como sendo de € 99.759,58.
K. A dúvida que implicaria a anulação da liquidação impugnada não pode, considerar-se fundada se assenta, singelamente, nos cheques que se apresentaram, que não provam que o preço da compra e venda do imóvel se ficou pela soma do seu valor, e numa declaração com a data de 07.02.2007, assinada pela adquirente do imóvel, que não identifica quem a solicitou à adquirente nem para que fim, que não foi apresentada no procedimento que levou à liquidação do imposto ora impugnado, e não se coaduna com o pagamento por parte da sua subscritora da sisa devida pela aquisição tendo por base o valor de € 112.500,00.
L. Na ótica da Fazenda Pública, o facto de o preço de venda inicialmente declarado ter sido confessadamente simulado, e de o preço que nesta impugnação se pretende seja considerado não ter sido invocado desde logo pelos impugnantes justifica fundadas suspeitas, não dissipadas, de falta de aderência à realidade do preço que se pretende seja considerado.
M. Em face do exposto, entende a Fazenda Pública que os recorridos impugnantes não lograram fazer prova que a realidade do preço de venda do imóvel cifrava-se no valor de € 99.759,58, pelo que se impõe concluir pela legalidade dos atos tributários em causa, pelo que a sentença recorrida se não pode manter na ordem jurídica.
Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências.»

1.2. Os Recorridos («AA» e «BB»), notificados da apresentação do presente recurso, apresentaram contra-alegações, que concluíram do seguinte modo:
«(...)
A - Os recorridos, ora alegantes, pugnam pela improcedência do recurso apresentado pela Fazenda Pública, porquanto, bem andou o Douto Tribunal "a quo" que julgou parcialmente procedente a impugnação por eles deduzida e posta em crise nos autos;
B - Porquanto, a Douta Sentença recorrida, estribou-se bem, no nosso modesto entendimento no conjunto da prova produzida em audiência de julgamento, bem como a demais prova, de onde, resultou claro e inequívoco que o preço da compra e venda da fracção autónoma inscrita na matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo ...31º, designada pela "letra P", teve o preço de € 99.759,58 (noventa e nove mil, setecentos e cinquenta e nove euros e cinquenta e oito cêntimos).
C - Não padecendo a Douta Sentença recorrida, de vício susceptível de revogação, porquanto não padece de qualquer erro de valoração da matéria de facto e muito menos que dessa eventual errónea apreciação da matéria de facto pudesse advir uma errónea subsunção dos factos ao Direito aplicável, de sorte a afetar a sua validade substancial;
D - Não restando dúvida alguma de que o montante recebido pelos impugnantes/recorridos, e que resultou do contrato de compra e venda que está na base da liquidação impugnada foi, apenas e tão só, de € 99.759,58 (noventa e nove mil, setecentos e cinquenta e nove euros e cinquenta e oito cêntimos) e, de € 112.500,00 (cento e doze mil quinhentos euros) cujo recebimento visa a ATA imputar-lhes;
E - Tendo, por isso mesmo, na nossa modesta opinião, a Douta Sentença recorrida feito a exata apreciação da matéria de facto, ressalva feita à data de emissão do cheque de € 20.000,00, que efetivamente não foi aquela em que o Tribunal recorrido dá como provada, antes sim, sendo aquela que da fotocópia do cheque daquele valor se entra junto à declaração de fls. 45 dos autos.
F - Sendo que, de mero lapso se trata, sem que dela se possa extrair o que dela pretende a Fazenda Pública, no que tange a divergência entre os € 99.759,58 recebidos pelos impugnantes a titulo do preço da venda do imóvel que esteve na base da liquidação impugnada e os € 99.000,00 a que se reporta a Sentença recorrida.
G - Pelo que, como é bem de ver, tratam-se de meros lapsos que, como se sabe, são passíveis de correção por mero Despacho e mesmo supridos oficiosamente pelo Tribunal Decidente,
H - Quanto ao demais, quanto a Douta Sentença recorrida, no que tange à questão da prova, tem a ela inerente, a livre apreciação do Juiz.
J - E, de uma simples leitura da Douta Decisão sindicada, resulta, de forma cristalina, a fundamentação de facto expendida pelo Tribunal recorrido a as razões em que se fundou na valoração dos respetivos depoimentos e demais prova que teve em consideração, não merecendo, assim; qualquer reparo a proficiente e bem elaborada Sentença recorrida.
J - Seja como for, se assim bem vemos a questão, em nada interferem no sentido decisório os apontados lapsos e desse modo, impõe-se a improcedência do recurso e a consequente confirmação do decidido em 1ª instância.
L - Acresce a todo o exposto, a nosso ver, que decorreu já o prazo de prescrição consagrado na lei e, se mais não for, igualmente, por este motivo, tem a pretensão da Administração Tributária de soçobrar.
Nestes Termos, mantendo-se a Decisão recorrida e negando-se provimento ao recurso, com as demais consequências legais, far-se-á a mais Elementar JUSTIÇA.».

1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 229 SITAF, no sentido da improcedência do recurso:
«A Fazenda Pública vem interpor recurso da sentença da Mmª Juiz do TAF do Porto, que, no âmbito de impugnação judicial de liquidação adicional de IRS do ano de 2003, a julgou parcialmente procedente.
«AA» e mulher «BB» impugnaram a referida liquidação adicional, alegando a errada quantificação do facto tributário, por o valor de venda de um imóvel urbano, que efectuaram, ter sido de 99.759,58€ e não por 112.500,00€, conforme consta da escritura de compra e venda.
O Tribunal deu como provada a factualidade de fls. 130 e segs., para cuja leitura remetemos.
Entendeu a Mmª Juiz, em resumo, que "dúvidas não subsistem que o valor declarado não corresponde ao valor real pelo qual o imóvel foi vendido" e que conforme o que foi provado, através da soma dos valores dos cheques emitidos por «CC», compradora do imóvel, esse valor foi de 99.759,58€, assim julgando parcialmente provada a impugnação na parte em que excede esse valor.
É desta decisão que foi interposto recurso, não se olvidando que o seu âmbito é definido pelas conclusões extraídas pela recorrente das respectivas alegações.
«AA» e mulher «BB» contra-alegaram.
Alega a Fazenda Pública, em síntese, que a sentença enferma de erro de facto e direito, por o julgador ter efectuado uma errónea apreciação da factualidade, por estar evidenciado, por escritura pública, que o valor de aquisição foi de 112.500,00€ e sobre esse valor a adquirente liquidou a respectiva SISA, pelo que, deveria ter concluído pela legalidade dos actos tributário em questão.
Citando o Ac. do TCA Sul de 31/10/2013 no processo 06531/13 in www.dgsi.pt:
"O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação " sub judice" que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida."
A questão a decidir é de saber, no caso em apreço, qual o valor real pelo qual o referido imóvel foi vendido.
No caso concreto, a recorrente se pretendia impugnar a decisão no tocante à matéria de facto, devia ter efectuado tal em relação à prova testemunhal de acordo com o que dispõe o CPC no artigo 640°.
No caso em apreço, o depoimento das testemunhas foi gravado, v. fls. 102 e seg..
Pelo exposto, ao não dar cumprimento ao que estipula a lei, o Tribunal de recurso não pode sindicar a matéria de facto quanto a esse particular.
Os recorridos juntaram ao processo cópia dos cheques emitidos pela compradora e que o valor nele inscrito totaliza 99.759,58 (v. n°s 2°, 3° e 4° da matéria provada).
A compradora «CC», referiu que à época era usual o empréstimo pelos Bancos de montantes superiores ao valor mutuado.
Aliás consta de escritura que a compradora e o marido se confessam devedores ao Banco 1... da importância de 112.500,00€, que receberam a título de empréstimo," destinando-se a quantia de setenta e sete mil e trezentos euros a ser aplicada na procedente compra e o remanescente à realização de obras de beneficiação no referido imóvel..." v. fls. 67 do PA apenso. (v. n°1 dos factos provados)
Em face da prova recolhida nos autos, em nosso entender, concluiu bem o julgador, que houve simulação quanto ao valor de venda do imóvel, sendo o valor real o de 99.759,58€ e que foi explicado o motivo de constar da escritura um valor superior.
Constam da sentença as razões de facto e / ou de direito em que esta assentou. A Mmª Juiz analisou a prova e fundamentou a decisão, em nosso parecer, merecedora de confirmação, não se verificando os invocados vícios.»

1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: se a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e subsequente erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:
1. Em 14.08.2003 foi outorgado documento denominado “Compra e venda e Mútuo com Hipoteca” entre «AA» e mulher «BB» como primeiros outorgantes e «CC» e marido «DD» como 2ºs outorgante e «EE» em representação do Banco 1..., SA, daí constando o seguinte “(…) Declarou o primeiro outorgante que vende ao segundo outorgante o seguinte: Fracção autónoma, designada pela letra “P”, (…) inscrito na matriz urbana sob o artigo ...31 (…) Que esta venda é feita pelo preço de setenta e sete mil e trezentos euros, quantia já recebida (…) Declararam os segundos outorgantes: Que, se confessam devedores ao Banco 1..., SA que o terceiro outorgante representa, da importância de cento e doze mil e quinhentos euros, que do mesmo banco receberam a título deste empréstimo, destinando-se a quantia de setenta e sete mil e trezentos euros a ser aplicada na precedente compra e o remanescente à realização de obras de beneficiação no referido imóvel, ao abrigo do Regulamento do Crédito à Habitação para o sector Bancário. (…)” – cfr. fls. 40 a 44 dos autos.
2. Em 14.08.2003 foi emitido por «CC» o cheque n.º ...97 do Banco 1... no montante de €2.459,58 – cfr. fls. 28 dos autos.
3. Em 14.08.2003 foi emitido por «CC» o cheque n.º ...03 do Banco 1... no montante de €77.300,00 – cfr. fls. 30 dos autos.
4. Em 14.08.2003 foi emitido por «CC» o cheque n.º ...30 do Banco 1... no montante de €20.000,00 – cfr. fls. 31 dos autos.
5. «CC» proferiu em 7.02.2007 declaração com o seguinte teor: “(…) comprou a fracção autónoma inscrita na matriz predial urbana da freguesia ... sob o artigo ...31º, designada pela “Letra P” aos senhores «AA» e esposa «BB», pelo preço de €99.759,58 (…) e não de €112.500,00. (…) Foi precisamente o valor aposto nos cheques (€20.000,00+€2.459,58+€77.300,00=€99.759,58 equivalentes a 20.000.000$00 (…) o valor acordado e fixado como o valor de aquisição da referida fracção. (…)” – cfr. fls. 45 dos autos.
6. A Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e a Despesa da Direcção de Finanças ... emitiu em 13.11.2007 informação propondo a alteração dos rendimentos dos Impugnantes considerando mais-valia o montante de € 15.716,42, por considerar que o imóvel a que se alude em 1. foi vendido pelo montante de €112.500,00 – cfr. fls. 39 e 40 do processo administrativo (PA) junto aos autos.
7. Notificados os Impugnantes para audição prévia, exerceram o direito de audição – cfr. fls. 33 e 34 dos autos.
8. Em 26.11.2007 a Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e a Despesa da Direcção de Finanças ... emitiu informação com o seguinte teor: “(…)
1 - Análise de Facto e de Direito
Em 10/03/2005 o contribuinte acima identificado apresentou uma declaração mod. 3 de IRS de substituição, tendo declarado no anexo G a alienação da fracção P do prédio inscrito sob o artigo ...31 da freguesia e concelho ... pelo valor de € 77.300.00. tendo também declarado o valor de aquisição de 41.150,83 reportado a Junho de 1989.
Tendo por base o registo do CN de ... de 8/14/2003 verificou se que o valor real do contrato foi de € 112500 e não 112500. Por este facto a adquirente do prédio «CC», com o NIF ...24 pagou em 14/6/2007 pela Sisa nº ..7/2007.. o valor correspondente ao valor de aquisição de 112.500,00. 2- Determinação das Mais Valias
Face ao que foi anteriormente exposto, vão estes Serviços propor a alteração do conjunto de rendimentos líquidos nos termos previstos nos artºs 65° e 66° do Código de IRS, considerando Mais Valia o montante de 15.716,43 €, 15.716,83 determinadas de acordo com o disposto nos artigos 43° a 51° do mesmo diploma legal, considerando o valor de aquisição.de 112.500.00. conforme mapa anexo. (…)” – cfr. fls. 24 e 25 do PA junto aos autos.
9. Na sequência do descrito em 8. foi emitida em 30.11.2007 a liquidação n.º ...08 – cfr. fls. 12 do PA junto aos autos.
10. Em 3.12.2007 foi emitida a compensação n.º ...72 no valor de €6,789,66 – cfr. fls. 13 do PA junto aos autos.

Factos não provados
Não se mostram provados outros factos, além dos supra referidos.

Motivação da decisão de facto
O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados [cfr. artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT)], também são corroborados pelos documentos juntos, cfr. predispõe o artigo 76º n.º 1 da LGT e artigo 362º e seguintes do Código Civil e ainda na prova testemunhal produzida.
Com efeito, foi a análise crítica e conjugada de todos os meios de prova conjugada que, à luz da experiência, sedimentaram a convicção do Tribunal.
«CC», empresária e adquirente do imóvel em questão nos presentes autos foi questionada a todos os factos vertidos na petição inicial.
O depoimento da testemunha foi sério, coerente e credível.
Declarou que na época a simulação de preço nas escrituras era usual e permitido pelos Bancos. Ademais, afirmou que o valor pago foi de €99.00,00 tendo posteriormente pago SISA por valor superior por aconselhamento do seu advogado, porque o marido há data já havia falecido e ainda por receio de complicações no emprego.
«FF», empresário na mediação imobiliária há cerca de 3 anos, trabalhou na sociedade [SCom01...] – Sociedade de Imediação Imobiliária de 1998 a 2012.
Apesar do seu testemunho ter sido credível e sério, não demonstrou deter conhecimento directo dos factos a que foi questionado, nomeadamente do valor de venda do imóvel e valor escriturado.
«GG», Director Financeiro da [SCom02...], onde o Impugnante é Administrador, foi questionado a toda a matéria de facto constante do articulado inicial.
Apesar do Tribunal não ter qualquer razão para não considerar o depoimento sério e credível, o conhecimento que demonstrou deter dos factos advém do que lhe foi dito pelo Impugnante atento o relacionamento profissional que têm há 30 anos, não tendo presenciado qualquer negociação e/ou pagamento.
Assim, atendendo a que o fim prosseguido pelos depoimentos é o testemunho de factos pessoais ou de que se deva ter conhecimento (cfr. artigo 454º do CPC), não pode o Tribunal relevar e/ou valorar o depoimento destas testemunhas («FF» e «GG»), na medida em que no que respeita à matéria em questão nos presentes autos, valor real da aquisição do imóvel, não resultou demonstrado que as testemunhas tivessem conhecimento directo de tal facto.»
2.1.2. Aditamento oficioso /correção à matéria de facto
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º, ex vi artigo 2º, alínea e) e 281.º do CPPT, importa completar oficiosamente o probatório, uma vez que da prova produzida resulta provado e com relevo para uma cabal percepção, e bem assim corrigir a menção de data cuja indicação da confrontação com o documento mencionado se apresenta incorrecta.
Correção
Verificada a existência de lapso na indicação da data da emissão de ordem de pagamento por via de cheque – vide cópia do mesmo constante de fls. 31 dos autos físicos, o item 4. do probatório passa a ter a seguinte redacção:
4. Em 07.07.2003 foi emitido por «CC» o cheque n.º ...30 do Banco 1... no montante de €20.000,00 – cfr. fls. 31 dos autos.
Aditamento
11.Em 14.04.2004 os Impugnantes apresentaram a declaração de rendimento para efeitos do IRS de 2003, sem que dele constasse o competente anexo G – cf. pág. 58 do processo administrativo;
12. Em 14.06.2007, na sequência de notificação do Serviço de Finanças ..., a adquirente «CC» fez o pagamento da SISA e correspondente juros compensatórios devidos pela aquisição da fracção P do artigo ..31 da matriz predial de ... pelo valor de € 112,500,00 – cfr. pág. 44 a 46 do processo administrativo;
2.2. De direito
Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida da liquidação de IRS e respetivos juros compensatórios relativa ao ano fiscal de 2003, na sequência de procedimento interno de alteração dos rendimentos declarados.
Como decorre dos autos e do probatório, os Recorridos/impugnantes, conforme consta de documente outorgado, denominada de “Compra e venda e Mútuo com Hipoteca” venderam a «CC» e marido, a fracção melhor identificada no probatório, no qual consta declarado o valor da venda pelo preço de €77.300,00 e a confissão de dívida dos compradores para com a instituição bancária ali identificada no valor de € 112.500,00, aí se mencionando que a diferença entre valores se destina à realização de obras de beneficiação no referido imóvel.
Os Recorridos/impugnantes apresentaram em 14.04.2005 a declaração de rendimentos para efeitos do IRS de 2003, sem que dele constasse o competente anexo G. Sendo que em 10.03.2005 apresentaram declaração de substituição, tendo declarado no anexo G a alienação da fracção pelo valor de € 77.300.00. tendo também declarado o valor de aquisição de 41.150,83 reportado a junho de 1989.
A Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e a Despesa da Direcção de Finanças ... emitiu em 13.11.2007 informação propondo a alteração dos rendimentos dos Impugnantes considerando mais-valia o montante de € 15.716,42, por considerar que o imóvel foi vendido pelo montante de €112.500,00.
Após ao exercício de resposta pelos Impugnantes, a Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o Rendimento e a Despesa da Direcção de Finanças ... determinou a alteração do conjunto de rendimentos líquidos nos termos previstos nos artigos 65° e 66° do Código de IRS, considerando Mais Valia o montante de 15.716,43 €, valor esse determinado de acordo com o disposto nos artigos 43° a 51° do mesmo diploma legal e considerado o valor de aquisição de €112.500.00., em 30.11.2007, foi emitida a liquidação n.º ...08 e em 03.12.2007 a compensação no valor de €6,789,66.
Constitui fundamento da impugnação o erro nos pressupostos de facto e de direito do acto tributário impugnado, nomeadamente por errada quantificação, assente no fundamento de que o preço pelo qual a fracção foi vendida em 14.08.2003 foi de € 99.759,58 como declarado em sede de audiência prévia no procedimento de alteração dos rendimentos, e não € 112.500,00, como computado no lançamento da liquidação impugnada.
Decidiu a final o Tribunal a quo, que “Realizada a prova por parte da AT dos pressupostos fáctico - jurídicos, recai sobre o sujeito passivo de imposto o ónus da prova da veracidade das declarações por si efectuadas.”, e se bem que “os Impugnantes confessaram nesta sede que o valor declarado não é o real”, e que “dúvidas não subsistem que o valor declarado não corresponde ao valor real pelo imóvel foi alienado” que “a factualidade que resultou provada (…) também infirmou as ilações da AT quanto ao montante de € 112.500,00”, assente de que os Recorridos/impugnantes comprovaram que o valor real pelo qual o imóvel foi vendido ascendeu a € 99.759,58.
Com este entendimento se não conforma a Recorrente (AT).
Como em inúmeros arestos o tem salientado a jurisprudência dos tribunais superiores, o objecto do recurso jurisdicional é constituído pela sentença recorrida, à qual devem ser imputados erros de julgamento ou eventuais causas de nulidade e o âmbito do recurso jurisdicional é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação a elaborar em cumprimento de ónus legal (artigo 639º, do CPC).
Com esse alcance, ressalta das conclusões da alegação que a Recorrente imputa à sentença erro de julgamento, de facto e de direito, ao não aceitar o valor presuntivamente alcançado pela AT e considerar que o preço foi efectivamente o posteriormente indicado pelos Recorridos de € 99.759,58.
Vejamos, então.
Da análise conjugada do disposto nos artigos 639.º e 640.º do CPC, decorre que os recursos para os Tribunais Centrais tanto podem envolver matéria de direito como de facto, sendo este último o meio adequado e específico legalmente imposto ao recorrente que pretenda manifestar divergências quanto a concretas questões de facto decididas pelo tribunal de 1.ª instância que realizou o julgamento, o que implica o ónus de suscitar a revisão da correspondente decisão.
Estando em causa a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, o artigo 640.º do CPC impõe ao recorrente, sob pena de rejeição, além do mais, a especificação dos concretos meios probatórios que imponham decisão diversa da recorrida e, tratando-se de meios probatórios gravados, a indicação com exatidão das passagens da gravação em que se funda o recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
A impugnação deduzida pela Recorrente reporta-se, na sua essência, a dois vectores, no que concerne ao julgamento da matéria de facto, a saber, (i) de que “cumpre suprir a insuficiente seleção da matéria de facto provada na indicação dos factos, que a Fazenda Pública propugna sejam retificados, nos termos do art. 640º do CPC, de acordo com o exposto no desenvolvimento destas alegações, que aqui se dá por reproduzido” (conclusão E. das alegações) e, (ii) do errado exame crítico da prova produzida na impugnação assente na insuficiência de factos, para ter sido considerado o valor de preço proclamado pelos Recorridos.
Perscrutadas as alegações, diga-se que o défice instrutório plasmado pelo Recorrente se reconduz aos factos aditados sob os itens 11. e 12., pelo que a pretensão deduzida aqui se dá por satisfeita. Neste particular apenas cumpre salientar que com o aditamento oficioso se pretende reconduzir para o probatório, factos constantes do processo administrativo que estabelecem uma melhor e cabal percepção da dinâmica factual que antecede o acto impugnado e de todos os elementos na posse da entidade decisora.
Quanto ao vector (ii) cumpre tecer algumas considerações, até porque em suma é nele que assenta o circuito condutor do eventual erro de julgamento de direito, susceptível de revogar o decidido, como veremos.
O erro de julgamento recai sobre um elemento dos dois componentes que estruturam a decisão jurisdicional: a fundamentação de facto e a fundamentação de direito. O denominado erro de facto, por contraposição ao erro de direito, pode resultar de errada apreciação do material probatório que a ocorrer se estende a fixação da materialidade fáctica relevante para a decisão e/ou conduzir a uma desacertada interpretação dessa materialidade.
Como assertivamente se elucida, no acórdão do TCA Sul de 10.07.2014, proferido no âmbito do processo n.º 7813/14, “No primeiro caso o erro consubstancia-se numa indevida utilização da livre convicção, erro esse que deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: um, (i) o de circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem de erro de julgamento; outro, (ii) fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.”
Assim, quando a selecção dos factos não é colocada em questão em sede de recurso, mas apenas se coloca a ênfase impugnatória na subsunção dos factos ao direito aplicável tendo em vista uma solução jurídica diferente da decretada, o erro que se suscita não é um erro na apreciação da prova, mas sim um erro de julgamento de direito.
No caso vertente a recorrente AT coloca a ênfase na errada valoração da prova dada como provada, no que concerne aos itens 2. a 5., dos cheques emitidos pela compradora aos recorridos na qualidade de vendedores da fração e, na declaração escrita da compradora de que o preço da fração por si comprada aos Recorridos é o do somatório dos cheques “preço de €99.759,58 (…) e não de €112.500,00. (…) Foi precisamente o valor aposto nos cheques (€20.000,00+€2.459,58+€77.300,00=€99.759,58”.
Ora, segundo o princípio da livre apreciação da prova, o tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. E, somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g. força probatória plena dos documentos autênticos - cf. artigo 371º, do Código Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cf. artigo 607º, nº.5, do CPC, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; vide Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Posto isto, aditado que foi oficiosamente ao probatório o consignado em sede de alegações pela Recorrente, cumpre tão só a este Tribunal ad quem, aferir do eventual erro na apreciação e valoração da matéria de facto e consequentemente, no julgamento de direito e na solução jurídica preconizada na sentença.
Vejamos.
A sentença recorrida na motivação da matéria de facto, e no que aqui importa, julgou nos seguintes termos: « O Tribunal considerou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados [cfr. artigo 74º da Lei Geral Tributária (LGT)], também são corroborados pelos documentos juntos, cfr. predispõe o artigo 76º n.º 1 da LGT e artigo 362º e seguintes do Código Civil e ainda na prova testemunhal produzida.
Com efeito, foi a análise crítica e conjugada de todos os meios de prova conjugada que, à luz da experiência, sedimentaram a convicção do Tribunal. «CC», empresária e adquirente do imóvel em questão nos presentes autos foi questionada a todos os factos vertidos na petição inicial. O depoimento da testemunha foi sério, coerente e credível. Declarou que na época a simulação de preço nas escrituras era usual e permitido pelos Bancos. Ademais, afirmou que o valor pago foi de €99.00,00 tendo posteriormente pago SISA por valor superior por aconselhamento do seu advogado, porque o marido há data já havia falecido e ainda por receio de complicações no emprego.
(...) Assim, atendendo a que o fim prosseguido pelos depoimentos é o testemunho de factos pessoais ou de que se deva ter conhecimento (cfr. artigo 454º do CPC), não pode o Tribunal relevar e/ou valorar o depoimento destas testemunhas («FF» e «GG»), na medida em que no que respeita à matéria em questão nos presentes autos, valor real da aquisição do imóvel, não resultou demonstrado que as testemunhas tivessem conhecimento directo de tal facto.»
Prosseguindo, a decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de direito:
«Assim, não vem questionado o enquadramento legal, mas tão só a factualidade subjacente à tributação por força da verificação de mais-valias por determinado valor. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 43º do Código do Imposto sobre o rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) em vigor à data dos factos “o valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes”, sendo estabelecido nos normativos seguintes as regras de aferição dessas mais valias.
Ora, considerando que a Administração Tributária (AT) actuou no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, incumbe-lhe o ónus de provar que se verificam os pressupostos fáctico-jurídicos fundamentadores da sua actuação, recaindo sobre esta o ónus de demonstrar a factualidade que a levou a desconsiderar o valor de compra declarado pelos Impugnantes.
Isto é, a AT poderá emitir liquidação adicional quando os elementos apurados permitam formar a séria convicção sobre a existência do facto tributário não declarado (total ou parcialmente) pelo sujeito passivo de imposto, no cumprimento do princípio da verdade material, conforme estatui o artigo 50º do CPPT e artigo 58º nº 1 da LGT.
Face ao que determina o princípio da verdade declarativa, plasmado no artigo 75º da LGT, a factualidade coligida pela AT tem de ser capaz de abalar a presunção de veracidade das declarações apresentadas pelos sujeitos passivos de imposto.
Com efeito, quem tem a seu favor uma presunção legal está dispensado da prova do facto presumido, conforme prescrevem os artigos 349º e 350º nº 1 do Código Civil.
Realizada a prova por parte da AT dos pressupostos fáctico - jurídicos, recai sobre o sujeito passivo de imposto o ónus da prova da veracidade das declarações por si efectuadas. No caso presente, a AT considerou que o valor da efectiva transacção do bem imóvel correspondia ao valor pelo qual os compradores se consideraram devedores ao Banco 1..., S.A., posição reforçada pelo facto da adquirente, quando interpelada pela AT, ter pago SISA pelo valor de aquisição de €112.500,00.
Com efeito e como resulta coligido no probatório, ponto 1), os Impugnantes declararam ter alienado o sobredito imóvel por €77.300,00, tendo os adquirentes declarado ficarem devedores ao Banco 1... pelo montante de €112.500,00 e posteriormente pago SISA pelo valor correspondente àqueles €112.500,00 (cfr. ponto 8) do acervo probatório).
Assim, não pode de todo considerar-se que as ilações extraídas pela AT são desprovidas de fundamento, até porque, o valor real da transacção não corresponde ao valor mencionado na escritura uma vez que os Impugnantes confessaram nesta sede que o valor declarado não é o real.
Com efeito, as provas apresentadas em Tribunal direccionam-nos nesse sentido, no entanto, não na ordem dos €112.500,00.
Senão vejamos.
Como resulta provado, pontos 2) a 4) da factualidade assente, foram emitidos à data da escritura (14.08.2003) três cheques que perfazem o montante de €99.759,58.
Ademais, tal como «CC» afirmou e face à experiência comum, à data dos factos em questão nos presentes autos, era usual o empréstimo pelos Bancos de montantes superiores ao valor mutuado.
Tal ilação é permitida ao julgador, na medida em que de um facto conhecido pode-se firmar um facto desconhecido, são as denominadas presunções, previstas no artigo 349.º do Código Civil, servindo-se o julgador, para esse fim, de regras da experiência da vida, segundo o padrão do "homem médio".
As presunções judiciais representam assim processos mentais do julgador, numa dedução decorrente de factos conhecidos e "são afinal o produto das regras de experiência: o juiz, valendo-se de certo facto e de regras de experiência conclui que aquele denuncia a existência doutro facto. Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode utilizar o juiz a experiência da vida, da qual resulta que um facto é consequência de outro" (cfr. A. Lopes Cardoso, in Revista dos Tribunais, 86.º-112).
Por outro lado, e conforme facto instrumental que resultou da instrução da causa, enunciado na motivação da matéria de facto por referência ao testemunho da compradora «CC», o montante pago a título de SISA por valor superior decorreu de aconselhamento do seu advogado, porque o marido há data já havia falecido e ainda por receio de ter problemas no seu emprego.
Assim, dúvidas não subsistem que o valor declarado não corresponde ao valor real pelo qual o imóvel foi alienado. Mas, se a factualidade que resultou provada logrou confirmar que o valor declarado em escritura não foi o real, também infirmou as ilações da AT quanto ao montante de €112.500,00.
Com efeito e apesar da simulação verificada e aqui comprovada, os Impugnantes comprovaram que o valor real pelo qual o imóvel foi vendido ascendeu a €99.000,00, quer pelo montante dos cheques que serviram de pagamento (cfr. ponto 2) a 4) do probatório), quer pelas declarações proferidas pela compradora, logrando justificar o porquê de ter procedido ao pagamento da SISA pelo valor de €112.500,00.» (fim de transcrição; destacados nossos)
Alega a Recorrente se, “(...) como salienta a sentença, a adquirente declarou que e era de experiência comum que, à data dos factos em questão, era usual o empréstimo pelos bancos de montantes superiores ao valor mutuado, e se essa foi a situação dos contratos formalizados pela escritura de 14.08.2003, em relação ao qual os outorgantes identificaram, em diversos momentos, três (€ 77.300,00, € 99.759,58, e € 112.500,00) valores como sendo o preço praticado, não se vislumbra que prova inquestionável tenha sido feita no processo judicial em causa de que esse preço se deva fixar como sendo de € 99.759,58”, concluindo que os impugnantes não lograram a prova de que o preço de venda do imóvel de cifrou naquele valor.
Que dizer?
De acordo com o disposto no n. º1 do artigo 10.º do CIRS, “Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais ou profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário
b) (…)”
O ganho sujeito a IRS é constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, sendo caso disso (al. a) do n.º 4 do mesmo artigo 10.º do CIRS).
Por sua vez, o art.º 43.º do CIRS determina-se que “1 - O valor dos rendimentos qualificados como mais-valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos seguintes.
2 – (…).”
No que concerne ao valor da realização estatui a alínea f) do artigo 44.º do mesmo diploma, aqui aplicável, para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS, considera-se valor de realização o valor da respetiva contraprestação.
Na determinação do valor de realização obtido com a alienação, estabelecia o então artigo 46.º do CIRS: “Valor de aquisição a título oneroso de bens imóveis
1 - No caso da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, se o bem imóvel houver sido adquirido a
título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.
2 - Não havendo lugar à liquidação da sisa, considera-se o valor que lhe serviria de base,
caso fosse devida, determinado de harmonia com as regras próprias daquele imposto.” (na redacção dada pelo Decreto-Lei 198/2001, de 03 de julho).
Prevendo a lei qual o método a seguir no cálculo da mais-valia nas situações de aquisição a título oneroso, não restava à AT outro caminho que não o da consideração, como valor de aquisição, do valor que serviu para efeitos de liquidação da SISA, cumprindo salientar que a AT está vinculada na sua actuação ao princípio da legalidade – artigo 8.º, n. º2, da LGT.
Ora, sendo uma norma que reveste a natureza de presunção quanto ao valor por que a operação sujeita a tributação foi realizada, ter-se-á que ter presente que o artigo 73º da LGT determina “as presunções consagradas em normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”, o que se compreende, no que tange à tributação rendimento, à luz dos princípios capacidade contributiva e da tributação do rendimento real, que têm consagração no artigo 104º da CRP e no artigo 4º, n. º1, da LGT.
Daí que não resulte legalmente admissível, em sede de IRS, a consagração de presunções absolutas de rendimento, sob pena de se mostrarem violados o princípio da capacidade contributiva (cf. José Casalta Nabais, inO Dever Fundamental de Pagar Impostos”, Almedina, Coimbra, 1998, págs. 497/498).
Nesta medida, cumpre interpretar os normativos do CIRS em apreço, no sentido de ser permitido ao contribuinte afastar a presunção contida no artigo 46º quanto ao valor da transmissão e, consequentemente, a presunção de existência de rendimento superior ao declarado, permitindo-se ao contribuinte a demonstração de que o rendimento real foi outro, que não o valor de referência que é dado pelo valor da SISA liquidada.
Aliás, actualmente não resulta qualquer dúvida quanto à possibilidade de o contribuinte proceder à demonstração de que o preço efectivo da transmissão foi outro, porventura menor, que o valor resultante mormente da avaliação patrimonial do prédio para os efeitos previstos no artigo 73º da LGT e no artigo 64º do CPPT.
Em situações deste tipo, está-se perante a aplicação de presunções contidas em normas de incidência objetiva (conceito em que se englobam as normas sobre determinação da matéria tributável de natureza substantiva, como é jurisprudência assente do TC), pelo que os interessados podem ilidi-las, ao abrigo do disposto no artigo 73° da LGT, e fazer uso do procedimento de ilisão de presunções previsto no artigo 64° do CPPT; é admissível ilidir as presunções implícitas porque o que se pretende «sempre» é tributar rendimentos reais e não inexistentes e é por esta razão, de se querer «sempre» tributar valores reais, que o artigo 73° da LGT permite «sempre» ilidir presunções.
Perante o exposto, temos por assente que o artigo 46.º do Código do IRS, ao prever que o valor de aquisição a considerar nas situações em que o bem imóvel tenha sido adquirido a título oneroso deve consistir no valor que serviu para efeitos de liquidação da SISA, consagra uma presunção implícita, necessariamente ilidível ao abrigo do princípio da tributação pelo rendimento real e da capacidade contributiva.
Assim, e considerando o disposto no artigo 73.º da LGT – nos termos do qual “as presunções consagradas em normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário”, cumpre analisar se, no caso dos autos, os recorridos, atenta a matéria de facto dada como provada, lograram ilidir a referida presunção.
Ora, de acordo com a factualidade assente, resulta provado que, a 14 de agosto de 2003, os Recorridos, outorgaram documento de compra e venda nos termos do qual declararam ter alienado o sobredito imóvel por € 77.300,00, tendo os adquirentes declarado ficarem devedores ao Banco 1... pelo montante de €112.500,00 [sendo €77.300,00 a ser aplicado na compra e o remanescente à realização de obras de beneficiação no referido imóvel] e posteriormente que adquirente mulher pagou a SISA liquidada pelo valor correspondente àqueles €112.500,00.
Afasta a sentença recorrida o valor decorrente da SISA paga €112,500,00 por duas ordens de razão: a primeira porque estamos perante um negócio simulado; a segunda porque, os factos reconduzem ao valor apresentado pelos recorridos em sede de audiência prévia € 99.759,58, valor esse que perfaz o somatório dos três cheques emitidos, a que acresce o depoimento da compradora (vide motivação do julgamento de facto).
Desde logo, atenta a posição assumida pelo tribunal a quo, que alude ao artigo 349º do Código Civil, impõem a este Tribunal ad quem, aferir de uma eventual violação de regras de direito probatório material, [que colidam com uma apreciação critica da própria prova e sua subsunção jurídica] mais precisamente da limitação decorrente do artigo 394.º, n.º 2 do Código Civil (CC), que manda aplicar a regra da inadmissibilidade da prova por testemunhas (prevista no n.º 1 do referido preceito para quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares nele previstos) à prova do acordo simulatório e do negócio dissimulado quando invocados pelos simuladores, o que, a verificar-se, consubstancia verdadeiro erro de aplicação de direito (Neste sentido, cf., por todos, o Ac. do STJ de 03.12.2015, p. 1297/11.6TBPBL.C1. S1(Relator: Abrantes Geraldes)).
Vejamos.
Estabelece o artigo 394.º, do CC, o seguinte:
1. É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objeto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos artigos 373.º a 379.º, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores.
2. A proibição do número anterior aplica-se ao acordo simulatório e ao negócio dissimulado, quando invocados pelos simuladores.
3. O disposto nos números anteriores não é aplicável a terceiros”.
Por outro lado, prevê o artigo 240.º do CC:
1. Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado.
2. O negócio simulado é nulo.
Tal como decorre deste último preceito legal o negócio simulado assenta nos seguintes elementos: «(i) uma divergência intencional entre a vontade real e a vontade declarada; (ii) um acordo simulatório entre declarante e declaratário; (ii) a intenção de enganar terceiros» (2)
Esclarece a propósito Luís A. Carvalho Fernandes (in, Teoria Geral do Direito Civil II, Fontes, Conteúdo e Garantia da Relação Jurídica, 5.ª edição - revista e actualizada, Lisboa, 2017, Universidade Católica Editora, págs. 310-311):
«Por simulação entende-se o acordo (ou conluio) entre o declarante e o declaratário, no sentido de celebrarem um negócio que não corresponde à sua vontade real e no intuito de enganarem terceiros.
A análise desta noção revela que, para haver simulação, devem ocorrer simultaneamente os seguintes elementos:
a) divergência entre a vontade real e a declarada;
b) acordo ou conluio (pactum simulationis) entre as partes.
c) intenção de enganar terceiros (animus deciplendi)».
Deste modo, a criação desta aparência de negócio é o resultado de um acordo prévio entre os simuladores.
Assim, sendo a divergência entre a vontade declarada e a vontade real o elemento mais distintivo da simulação, o acordo simulatório constitui um elemento diferenciador da simulação, no âmbito dos vícios do negócio, não bastando uma das partes manifestar uma intenção que não corresponda à sua vontade real, exigindo-se uma sintonia entre todos os contraentes , ou seja, que a divergência seja comum a todas as partes (Cf., A. Barreto Menezes Cordeiro, Código Civil Comentado, I – Parte Geral, Coordenação António Menezes Cordeiro, CIDP, Almedina, 2020, p. 713).
Por outro lado, basta o intuito de enganar terceiros, não sendo necessário o querer prejudicá-los. Assim, a simulação pode classificar-se em inocente e fraudulenta consoante vise apenas enganar alguém – os contraentes são motivados por um animus decipiendi – ou também prejudiciar (ao animus decipiendi acresce um animus nocendi), ainda que, regra geral, a simulação seja fraudulenta: as partes não pretendem apenas criar uma falsa aparência para o exterior; têm, ainda, como fim imediato, retirar benefícios, em prejuízo de terceiros, prossegue o mesmo autor.
Já atendendo ao tipo de divergência verificada, a simulação pode classificar-se em absoluta ou relativa, sendo que na primeira o pactum simulationis dirige-se à celebração de um negócio que as partes não querem, na realidade, celebrar esse negócio nem qualquer outro, enquanto na simulação relativa o negócio simulado encobre outro ato (que é dissimulado).
Mas volvemos, depois deste breve introito, ao citado artigo 394º do CC, mais concretamente o segmento normativo ali contido relativo à simulação. E, de acordo com o teor literal do preceito transcrito, é proibida a prova por testemunhas seja para demonstrar o acordo simulatório, seja o negócio dissimulado, quando quem argui a simulação são os próprios simuladores.
Temos que a exclusão da prova testemunhal, neste caso, se justifica pela necessidade de um grau de segurança acrescido para a demonstração de determinados factos [Neste sentido, Luís Filipe Pires de Sousa, Prova Testemunhal, 2016, Almedina, pág. 199, a propósito das limitações legais ao uso da prova testemunhal em processo civil; e Rita Gouveia, Comentário ao Código Civil, Parte Geral, UCP, pág. 891], sendo óbvio que não se alcança essa segurança com uma prova meramente informante, como é aquela que resulta dos depoimentos de testemunhas que fizeram parte do “esquema” [Neste sentido, Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, Direito Processual Civil, Vol. II, 2015, Almedina, pág. 301]. Igual limitação, de resto, é aplicável às presunções judiciais (artigo 351.º, do Código Civil).
Contudo, a temperar a mencionada restrição de prova, tem prevalecido na doutrina e jurisprudência a orientação de que o n.º 2 do artigo 394.º do CC não veda a possibilidade de os simuladores provarem o acordo simulatório e o negócio dissimulado com base num princípio de prova escrita contextualizada ou complementada por prova testemunhal ou por presunção judicial, ou seja, admitem que se utilize prova testemunhal desde que, a montante, surja um “princípio” ou “começo” de prova que crie uma convicção que as testemunhas se limitam a sedimentar.
Ou seja, a existência de documentos que por si reúnam indícios credíveis de que terá ocorrido simulação, abrindo-se assim a “porta” à produção de prova testemunhal que se apresenta como complementar daquela outra.
Neste contexto, têm defendido, de modo praticamente uniforme, a doutrina e jurisprudência que se deve fazer uma interpretação restritiva do n.º 2, do artigo 394.º do CPC [vide entre outros, os acórdãos do STJ de 04.06.2019, Processo n.º 2375/11.7TBVFR.P1.S1, 03.07.2018, Processo n.º 3057/11.5TBPVZ-C.P1.S3, de 26.02.2015, Processo n.º 3194/08.3TBPTM.E1.S1, os acórdãos da Relação do Porto de 23.10.2007, Processo n.º 0723902, da Relação de Guimarães de 12.11.2013, Processo n.º 243/1999.G1, da Relação de Évora de 26.03.2015, Processo n.º 2986/11.0TBFAR.E1].
É certo, que não é consentida a prova da simulação apenas por testemunhas ou declarações de parte, pois que a lei o proíbe, nem sequer admitindo, por essa via, a prova de factos determinantes de presunções judiciais, que a lei, também não consente, mas, com relevo in casu, podemos afirmar que é admitido que os simuladores provem por esses meios o acordo simulatório e o negócio dissimulado a partir de um princípio de prova escrita contextualizada ou complementada por prova testemunhal, ou seja, admite-se que se utilize prova testemunhal desde que, a montante, surja um “princípio” ou “começo” de prova que crie uma convicção que as testemunhas se limitam a sedimentar [Neste sentido, em sede doutrinárias podemos entre outros citar Luís A. Carvalho Fernandes, in ob.cit., loc. cit., António Menezes Cordeiro, in Tratado de Direito Civil II, Parte Geral, 4ª edição, Almedina, págs. 908 e 909, e Menezes Cordeiro, in Da Simulação no Direito Civil, Almedina, pág.137].
Como discorre da sentença sob recurso, o Tribunal a quo atendeu ao depoimento da adquirente da fracção, que considerou confirmar a tese dos impugnantes, que apesar do valor do empréstimo ser superior o preço correspondeu ao valor dos cheques emitidos e que pagou a SISA pela totalidade por ter sido aconselhada a isso pelo seu advogado, nos termos e com os fundamentos enunciados na motivação da decisão de facto constante da decisão recorrida, da soma da cópia dos cheques juntos ao procedimento e com base na experiência comum e na normalidade das coisas.
Ora, não nos revemos no assim decidido.
Se é certo que a face a experiência comum, à data dos factos em questão, era usual o empréstimo pelos Bancos de montantes superiores aos mutuados, certo que também a experiência nos diz que isso acontecia, entre outras, por três ordens de razão, (i) uma é que a divergência ente o preço e o mútuo era forçado pelo alienante para dissimularem os rendimentos, sendo que os adquirentes tinha que obter o mútuo pelo real preço que tinham que entregar, outra, (ii) em que o alienante e adquirente simulavam o preço sendo que a diferença entre o preço e o mútuo correspondia a obras e melhoramentos implementados no bem e, por último (iii) as situações em que os adquirentes visavam uma “bolha de ar” económica em que a diferença entre o preço e o mútuo tinha como fim decorar o apartamento, comprar um carro ou fazer fase a outro tipo de despesas.
Ora, a razão avançada pela adquirente, é de que “era usual “, cremos ser muito pouco para lograr ilidir o que consta do documento, sendo que não podemos de modo algum fazer tábua rasa do que no mesmo se afirma que a diferença entre o preço e mútuo, o ali mencionado remanescente, se destinava à realização de obras de beneficiação no referido imóvel. Ora a ser assim, como declarado na escritura, porque não lograram os Recorridos por via da adquirente a prova de que o remanescente foi utilizado para benfeitorias na respectiva fracção.
Assim como não colhe como facto instrumental susceptivel de afastar a presunção estabelecida no n.º 1 do então artigo 46º do IRS o testemunho da adquirente de que “o montante pago a título de SISA por valor superior decorreu de aconselhamento do seu advogado, porque o marido há data já havia falecido e ainda por receio de ter problemas no seu emprego.”.
Por último, não colhe a soma dos valores dos cheques irem de encontro à tese dos Recorridos de que o preço foi de €99.759,58, pois que não foi dado como provado que não tenha ocorrido qualquer outra forma de pagamento entre alienantes e adquirentes, ou mesmo que tenham sido emitidos mais cheques, prova que não seria assim tão difícil, atendo a entrada do empréstimo em determinada conta bancária dos adquirentes, cumpria apenas a prova das ordens de pagamento efectuadas contemporâneas que abarcaram o mútuo em questão.
Prevendo a lei qual o método a seguir no cálculo da mais-valia nas situações de liquidação de SISA pela transmissão do imóvel, em que cumpre atender aquele valor para efeito de valor de aquisição (n.º 1 do artigo 46º do CIRS), não restava à AT outro caminho que não o da consideração, como valor de aquisição, do valor tido em consideração para efeitos de liquidação da SISA, cumprindo salientar que a AT está vinculada na sua actuação ao princípio da legalidade – art.º8.º, n.º2, da LGT e, não tendo os Recorridos logrado ilidir essa presunção, cumpre revogar a decisão recorrida o que se decidirá a final.

2.3. Conclusões
I. O ganho sujeito a IRS é, constituído pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição [al. a) do nº 1 do artigo 10º) do CIRS], este calculado de acordo com o disposto nos artigos. 46º e seguintes do Código do IRS.
II. No caso da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º, se o bem imóvel houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa.
III. Para ilidir a presunção contida no artigo 46º, nº 1, do CIRC, é possível ao contribuinte recorrer ao processo de impugnação judicial, para lograr provar que o preço declarado é o efetivamente praticado ou, como no caso, o preço simulado que invoca em sede de audiência.

3. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida, e em substituição julgar acção improcedente.
Custas pelos recorridos, nesta sede e em 1ª instância.

Porto, 9 de novembro de 2023

Irene Isabel das Neves
Carlos Fernandes
José Coelho