Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00738/12.0BEPRT |
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Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 02/16/2023 |
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Tribunal: | TAF do Porto |
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Relator: | Irene Isabel Gomes das Neves |
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Descritores: | OMISSÃO DE PRONÚNCIA; IRS, DESCONSIDERAÇÃO DE CUSTOS; FACTURAÇÃO FALSA; |
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Sumário: | I. A nulidade da sentença por omissão de pronúncia tem lugar apenas quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do Tribunal sobre questões que deveria conhecer, o que, de acordo com o disposto no artigo 608º, nº2 do CPC [aplicável ex vi artigo 2º, al. e) do CPPT], significa que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas, cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. II. Não constando da LGT nem do CPPT norma definidora do prazo para a revogação e anulação administrativas dos atos tributários, cumpre acolher as regras constantes dos artigos 165° a 174° do Código de Procedimento Administrativo (CPA), pelo que é incontroverso ser de aplicar o artigo 136º e ss. do CPA, que directamente regulam a revogação dos actos administrativos [sendo que o CPA constitui legislação complementar e subsidiária ao direito tributário — arts. 2º, al. c), da LGT e 2º, al. d), do CPPT]. III. face ao disposto na citada alínea a) n° 2 do artigo 58º do CPTA (prazo de um ano para a impugnação de actos anuláveis), a AT dispunha desse prazo para o fazer, pelo que o despacho que revogou o anterior despacho de deferimento é tempestivo. IV. Resultando a correcção da matéria tributável declarada do facto de a AT ter considerado que as facturas emitidas por determinada empresa que documentavam custos não correspondiam a operações reais, motivo por que, mediante o processo geralmente denominado de “correcções técnicas”, desconsiderou tais custos e acresceu à matéria tributável declarada o montante daquelas facturas, à AT compete fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação no sentido da correcção do lucro tributável, competindo ao contribuinte o ónus da prova da existência dos factos que alegou como fundamento do seu direito de ver tais montantes relevados negativamente no rendimento tributável.* * Sumário elaborado pela relatora (art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil) |
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Votação: | Unanimidade |
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Decisão: | Negar provimento ao recurso. |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. «AA» (Recorrente) notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 25 de agosto de 2022, a qual julgou totalmente improcedente a impugnação judicial por si deduzida, e que visou o despacho de indeferimento de Recurso Hierárquico referente à liquidação oficiosa de IRS do ano de 2004, no valor de € 210.287,28, acrescido de juros compensatórios e demais encargos no valor de € 31.963,66, tendo sido fixado o valor da presente causa em €243.766,18, inconformado vem dela interpor o presente recurso jurisdicional. Alegou, formulando as seguintes conclusões: «a- Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pela MªJuiza do TAF do Porto que considerou improcedente o pedido de anulação do ato tributário, pela improcedência dos fundamentos aduzidos: – Definitividade da situação tributaria, na base na decisão de procedência de recurso hierárquico proferido, (e, depois revogada), – Falta de fundamentação do acto tributário – Erro de facto e direito do acto tributário que implicaria a sua inexistência ou ilegalidade. Não pode o contribuinte concordar com os fundamentos, conclusões e omissões. b- Acto de prévio deferimento do Recurso Hierárquico sobre a matéria Estamos perante um acto decisório que revoga um acto, também, decisório, anteriormente praticado, que deferiu o Recurso Hierárquico apresentado, pelo que, em caso algum, poderia cair na previsão do regime do artº 79º da LGT, que se refere á revogacão de actos tributários de liquidação ou relacionado com outras obrigações tributárias. b.1- Os art.s 163º e 168º, do CPA, referem-se á anulação administrativa e não á revogação administrativa, cujos condicionalismos são regulados no art. 167º do mesmo normativo, cumprindo referir que, já a versão vigente, ao tempo, previa, no artº 140º, o regime previsto na referida al. a), com menção ao prazo no art. 141º, que, no caso, deveria ser o previsto no CPPT, já que estamos no domínio do processo tributário. c- Há, pois, que concluir, que – produzindo e criando na esfera do Impugnante um efeito jurídico estável e consistente, e uma óbvia confiança legitima que deveria ser protegida – pela definitividade da situação tributária, na base na decisão de recurso hierárquico, que esta questão determina questões concretas controversas que importa resolver. Emerge, deste modo, nulidade por omissão de pronúncia a sentença proferida pois não conheceu todas as questões que devia conhecer, não as resolvendo conforme era alegado e peticionado. Erro de facto e direito do acto tributário que implicaria a sua inexistência ou ilegalidade. e. Atenta a forma unânime, concordante, circunstanciada, (ainda que não concreta e pormenorizada em termos identificativos das facturas), se expressaram as testemunhas inquiridas, conforme discriminado na sentença, deveria ter sido considerado como provado que houve lugar ás operações de compra e venda de mercadoria entre o Impugnante e os fornecedores, tituladas pelas faturas em causa nos autos. Deveria ter sido, ao menos, dado como facto provado que todos os fornecedores forneceram, por mais de uma vez, material de sucata ao Impugnante. f- ASSIM, baseando-se toda a decisão no pressuposto de que não houve lugar a qualquer transação comercial entre as identificadas pessoas, ressalta o consequente vicio de julgamento que se invoca e cumpre reparar. Com efeito, a errada consideração de um pressuposto ou circunstância fundamentadora, acarreta necessariamente uma falha em toda a cadeia lógico-dedutiva, a inquinar a decisão, que, por certo, outra seria não fora a inexata suposição. g- Concluiu a Meritíssimo Juíza a quo, estar demonstrada enunciação de indícios fortes e consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada, de que as operações referidas nas facturas são simuladas e que, por isso, são insusceptíveis de ser levadas a custos no apuramento da matéria coletável. h- Não é verdade. É notório que a Administração Tributária não recolheu indícios que legitimam a sua actuação no sentido de não aceitar as facturas em causa nos autos, ou seja, não cumpriu com o ónus que sobre si impendia no sentido de fundamentar a liquidações impugnadas, as quais estão, assim, feridas de ilegalidade, impondo-se determinar a anulação das liquidações impugnadas, por força da anulação da decisão recorrida. Foram violados, por isso, violadas as normas sucessivamente enunciadas, impondo a reparação da decisão de que se recorre. Ressalta, assim, nos termos alegados, a ilegalidade do acto praticado, devendo ser anulado, por procedência do presente recurso que deverá ordenar a anulação da douta sentença proferida.» 1.2. A Recorrida Fazenda Pública, notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações. 1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 234 SITAF, no sentido da improcedência do recurso. 1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso. Questões a decidir: As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: Da nulidade por omissão de pronúncia, conforme artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, alegando, em síntese, que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre questões ou pretensões que devia apreciar, cuja apreciação lhe foi colocada; Se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto por errónea valoração da prova, e erro de julgamento da matéria de direito ao considerar legal o despacho revogatório do deferimento expresso proferido no âmbito do Recurso Hierárquico e, no mais, em que declara que não ocorre a inexistência do acto tributário. 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto 2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1.ª instância e respectiva fundamentação: «1. O impugnante, «AA», exerce a atividade de comércio, por grosso, de sucatas e de desperdícios metálicos, para o que se encontra registado no CAE 50100 para o “Comércio de veículos automóveis” – cf. relatório de inspeção tributária, página 5, constante de fls. 16 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos; 2. Pela Ordem de Serviço ...14 foi credenciada uma ação de inspeção ao impugnante, que se iniciou em 14.10.2008 e terminou em 20.02.2009, teve âmbito de ação parcial de IRS e IVA e extensão aos exercícios de 2004 e 2005 – facto que resulta do relatório de inspeção tributária, constante de fls. 16 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos; 3. No início do procedimento inspetivo informou o impugnante não poder apresentar a sua contabilidade por lhe ter sido furtada, tendo esclarecido, quando notificado para fornecer informação sobre a reorganização da contabilidade: “Tais questões devem ser entendidas, respondidas ou explicadas pelas respostas anteriores, ainda que pelo facto de não ser possível responder-lhes. No caso concreto, o declarante participou às autoridades policiais um furto no qual foi incluída (provavelmente por se encontrar numa mala que ostentava pelo aspeto exterior interesse quanto ao conteúdo) toda a documentação comercial básica como, além dela documentação meramente de suporte à gestão da empresa (ex: documentos de transporte). O declarante, como sabe ser do seu interesse, não pretendeu, nem pretende, deixar de apresentar quaisquer elementos desde que os possua. Aliás, não pode deixar de reprovar e protestar pela forma como é colocada esta (e também outras) questão.” – facto que resulta do relatório de inspeção tributária, páginas 6 e 7, constante de fls. 16 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos; 4. Considerado o facto 3., a AT apurou: “Não existindo uma apresentação formal e completa da escrita, foi-nos comunicado que o gabinete de contabilidade responsável pela execução da referida escrita dispunha dos registos contabilísticos em suporte informático. Testada a conformidade destes registos em relação aos valores declarados junto da Administração Tributária, não se detetaram divergências para além daquela que adiante se dará nota (ver correções em sede de IVA). Quer isto dizer que, salvaguardada a exceção antes mencionada, os valores declarados revelaram-se conformes aos valores presentes nos aludidos registos contabilísticos em suporte informático. Perante a situação antes descrita, concluiu-se que era possível determinar de forma direta a matéria tributável, apesar da já referida falta de apresentação formal e completa da escrita. Assim sendo, a determinação do rendimento da categoria B, auferido pelo senhor «AA», nos anos de 2004 e 2005, far-se-á de acordo com o disposto na alínea b) do n.º1 do artigo 28º do CIRS” – facto que resulta do relatório de inspeção tributária, página 8, constante de fls. 16 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos; 5. Para operar as correções em causa apuraram os Serviços de Inspeção Tributária: “3.1.2 Por infração ao disposto no n.º1 do artigo 23º do Código do IRC conjugado com o artigo 32º do código do IRS: 3.1.2.1 Operações contabilizadas Em resultado dos procedimentos inspetivos adotados, verificou-se que, com referência aos anos de 2004 e de 2005, a entidade inspecionada contabilizou faturas emitidas pelos seguintes sujeitos passivos de IVA: «C , unipessoal, Lda.» (...) «D, Limitada» (...); «EE» (...) A este propósito veja-se o anexo n.º1, constituído por extratos contabilísticos respeitantes aos movimentos no “Diário de Compras”. Notas: i) Os extratos anexados ao presente documento respeitam aos períodos (meses), em que foram contabilizadas faturas emitidas por, pelo menos, um dos três fornecedores antes identificados; ii) Neste “Diários” são lançadas a débito o valor acumulado mensal das “Compras” e “IVA dedutível” respeitante a essas mesmas “Compras”. A crédito é lançado o valor de cada fatura com IVA incluído, por contrapartida da movimentação das contas abertas em nome dos fornecedores em questão Nos anexos n.º 2 a 5 estão presentes arrolamentos das faturas contabilizadas, cujos valores se resumem nos dois quadros que se seguem (quadro 1 e quadro 2) i) Valor dos bens mencionados nas faturas
3.1.2.2.1 Brazicuta – Comércio de Sucatas, Unipessoal, Limitada A empresa «C , unipessoal, Lda.» (...) foi objeto de uma ação inspetiva da qual resultou como conclusão essencial (...): “De tudo quanto ficou exposto, fica comprovado que a atividade declarada pela «C , unipessoal, Lda.» é uma atividade aparente, fictícia, e que a mesma foi constituída e utilizada por «FF», como se de um verdadeiro Sujeito Passivo se tratasse, para participar, como empresa “substituta”, colocada ficticiamente entre os originários transmitentes e os verdadeiros adquirentes, ou como mera emitente de faturas falsas, sem nenhuma transação real subjacente, no circuito comercial e/ou documental de sucata, servindo unicamente o objetivo de, com intuitos fraudulentos, titular, por substituição, transações para as quais não foi emitido o respetivo documento, e conferir o direito á dedução a jusante do IVA indicado como liquidado em documentos de vendas falsas, emitidos em seu nome, que, por via dos documentos de compras falsas que contabilizou para as justificar, não foi entregue nos cofres do estado (...)” (...) 3.1.2.2.2 «D, Limitada» A sociedade «D, Limitada» (...) foi objeto de uma ação inspetiva da qual resultou como conclusão essencial (...): “Tudo isto são fortes indícios de que a atividade comercial desenvolvida pela «D, Limitada» era, na prática, nula ou residual. Atendendo aos que se passa no setor da sucata, o objetivo de simular estas transações seria, possivelmente, o de proporcionar a uma empresa, sua cliente, cliente do seu cliente ou ainda mais avançada neste circuito, a possibilidade de (simular) “vender” sucata para outro país da União Europeia de forma a permitir reembolsos de IVA” (...) 3.1.2.2.3 «EE» (...) 3.1.2.2.3.2 Situação detetada em anterior ação inspetiva O senhor «EE» foi objeto de uma ação inspetiva (...) cuja extensão coincidiu com os anos de 2002 e 2003, da qual resultou como conclusão essencial, (...): Por tudo o que se referiu anteriormente, nomeadamente: A omissão aos registos contabilísticos de todas as faturas emitidas; A inexistência de qualquer documento de suporte das aquisições de sucata; A regularização voluntária efetuada por algumas empresas suas clientes Concluímos que as faturas emitidas para as empresas (...) e «AA», não correspondem a verdadeiras vendas e serviços prestados, tratando-se de meras operações simuladas (...)” (...) 3.1.2.2.3.7 Síntese conclusiva Tendo em consideração o teor da informação disponível respeitante (...) «EE», nomeadamente: A atividade foi cessada com efeitos reportados a 31.12.2003 (para efeitos de IVA e IRS); Não deu cumprimento a nenhuma das obrigações emergentes da emissão das faturas em questão, sejam elas de índole declarativa ou de pagamento; Procedeu à entrega das declarações de rendimentos previstas no art.57º do CIRS, respeitantes aos anos de 2004 e 2005, não constando dessas declarações quaisquer rendimentos da categoria B (rendimentos empresariais e profissionais). Declara que, a partir do último trimestre do ano de 2003, não estabeleceu qualquer relação comercial com (...) «AA», diretamente ou por intermédio de terceiros; Recusa-se a identificar os alegados fornecedores das mercadorias que anteriormente faturou, não apresentando qualquer evidência de que tais compras possam ter existido; O emitente e o adquirente identificado nas faturas, foram ambos objeto de anteriores ações inspetivas no âmbito das quais se extraiu a conclusão que as transmissões efetuadas por (...) «EE» ao (...) «AA», não correspondem a efetivas transmissões de bens; Conclui-se que está reunido um conjunto de indícios sérios e credíveis de que as operações comerciais tituladas por faturas alegadamente emitidas pelo (...) «EE», faturas essas contabilizadas por «AA», não correspondem à realidade. (...) 3.1.2.4 Análise dos esclarecimentos recolhidos Os esclarecimentos solicitados à entidade inspecionada procuraram fazer um levantamento do contexto comercial em que teriam ocorrido as transações documentadas pelas faturas emitidas pelos três fornecedores em questão [«EE»; «C , unipessoal, Lda.» (...) e «D, Limitada» (...)]. Foram assim selecionados os aspetos de que se passa a dar nota: 3.1.2.4.1 Integração na carteira de fornecedores Foi pedido à entidade inspecionada que indicasse de que modo (...) «EE» e as sociedades «C , unipessoal, Lda.» (...) e «D, Limitada» (...) passaram a fazer parte da sua carteira de fornecedores. Passa a citar-se a resposta obtida “por contacto e conhecimentos comerciais granjeados” (fim de citação). Porque a resposta obtida, de tão vaga e genérica nada esclarecia, voltou a colocar-se a mesma questão. (...). Cita-se o esclarecimento obtido “Já respondida (...)”. (...) «AA» optou por reiterar a generalidade que antes havia adiantado. Nada é dito que seja específico dos intervenientes em questão. (...). Em síntese, apesar da insistência, nada foi esclarecido. 3.1.2.4.2 Iniciativa dos fornecimentos Tendo-se pedido ao (...) «AA» que indicasse quem tomou a iniciativa para os fornecimentos faturados pelos três fornecedores em questão (...) informou que (...) “A iniciativa foi aleatória e recíproca, em função da oportunidade” (...). A resposta é destituída de sentido, isto porque, desde logo, aquilo que se pediu foi a indicação de quem tomou a iniciativa para um conjunto de fornecimentos muito concreto. Não se pediu, portanto, que fosse informado se na génese dessa iniciativa existiu algum fenómeno de cariz aleatório que tenha determinado quem tomou a iniciativa. A este propósito, chama-se a atenção para o facto da entidade inspecionada, nos anos de 2004 e 2005, depender dos três fornecedores em questão em mais de 70% do total das compras efetuadas. Com um peso relativo destes fornecedores tão grande, necessariamente que algum padrão de comportamento se deveria ter definido. Note-se ainda que o desenvolvimento, com um caráter de regularidade mínima, da atividade levada a cabo pela entidade inspecionada, pressupõe que seja acautelada a regularidade e segurança nas fontes de aprovisionamento, donde resultaria, necessariamente, a adoção de procedimentos, ainda que informais (...) (...) Em síntese, o senhor «AA» revela-se incapaz ou sem vontade de indicar quem teve o impulso negocial para os fornecimentos em questão, à semelhança do verificado no que diz respeito ao modo de integração de fornecedores na respetiva carteira. 3.1.2.4.3 Fixação dos preços Nos esclarecimentos solicitados também foi abordada a questão dos preços praticados. Concretamente, solicitou-se que fosse indicado de que modo foram fixados os preços das mercadorias adquiridas, nomeadamente, se os preços praticados foram aqueles que se aplicaram à generalidade dos fornecedores ou se foram negociados os preços específicos para os fornecedores em questão. Passa a citar-se a resposta obtida: “em regra, os preços fixaram-se de acordo com as condições do mercado (variação intensa, na sucata, da oferta e procura, logo do preço)” Mais uma vez, porque a resposta obtida, de tão vaga e genérica, nada esclarecia, voltou a colocar-se a mesma questão, para que, novamente, ficasse claro a insuficiência da resposta obtida e o interesse na recolha de uma resposta elucidativa. (...) A informação que fomos recolhendo em sucessivas inspeções realizadas a operadores deste setor (comércio por grosso de sucatas e de desperdícios metálicos), permite-nos afirmar que, no biénio em questão, os preços conheceram sucessivas variações, sendo, no entanto, evidente a tendência para o crescimento. As imagens que seguem dão uma perspetiva gráfica da evolução dos preços praticados por um outro operador do setor. Nota – a escolha do operador cujos preços vão ser tomados como referência assenta no facto de se tratar de uma entidade com um volume de negócio considerável, além de se tratar de um dos poucos operadores de referência a nível regional. Analisadas as imagens, pode verificar-se com facilidade que a evolução dos preços evidencia duas caraterísticas: Trata-se de preços efémeros, no sentido de que vigoram por um curto período de tempo; A alteração dos preços é significativa, ou seja, registam-se consideráveis variações relativas aos preços, quer se considerem para este efeito os preços próximos em termos temporais, quer se considere a globalidade dos preços. O quadro 3 dá nora da amplitude dos preços que serviram de base à dedução dos gráficos antes citados. (Dão-se por integralmente reproduzidos os gráficos constantes de páginas 131 e 132 do RIT, referentes a “Preços – Alumínio Perfil – 2004” e “Preços – Alumínio Carter – 2005”) Quadro n.º3
Importa também fazer uma descrição sucinta dos intervenientes e explicar de que forma as caraterísticas de cada um levaram a um maior afastamento ou aproximação dos preços de referência (por exemplo se os parceiros comerciais em questão, por dificuldades financeiras continuadas se dispunham a vender por preços mais baixos com a contrapartida da diminuição do prazo de pagamento). Importaria ainda esclarecer se os produtos normalmente oferecidos por cada um dos fornecedores levavam a um maior afastamento ou aproximação dos preços de referência (note-se que se trata de sucata e não de produtos com uma homogeneidade de caraterísticas que leve a uma fixação dos preços à partida). Importaria ainda esclarecer se a forma e o tempo de pagamento tiveram repercussões na determinação do preço. Importaria ainda esclarecer se o tempo ou modo de entrega determinavam o preço. Enfim, o que importaria era identificar as condicionantes na formação dos preços de um conjunto muito concreto de negócios e não de afirmações genéricas próprias de um mercado abstrato e académico. Em síntese e uma vez mais, o senhor «AA» revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer o modo de fixação de preços, à semelhança do verificado no que diz respeito ao impulso negocial para os fornecimentos e ao modo de integração dos fornecedores na respetiva carteira. 3.1.2.4.4. Existência de encomendas Também foi pedido ao senhor «AA» que esclarecesse se as compras efetuadas aos três fornecedores em questão, foram objeto de encomenda prévia e, em caso afirmativo, se tais encomendas foram reduzidas a escrito e por quem. Passa a citar-se a resposta obtida. “Raramente, neste setor e na fase de intermediação, há redução a escrito”. (...) Porque o esclarecimento prestado não passa de uma afirmação genérica, que, relativamente ao que de concreto foi perguntado, não dá resposta, voltou a colocar-se a mesma questão, para que, novamente, ficasse claro a insuficiência da resposta obtida. Perante o reiterar da questão, o senhor «AA» não apresentou qualquer resposta. Para além da repetição da pergunta, colocaram-se novas questões que pretendiam, mais uma vez, aprofundar e clarificar, o que de vago e genérico antes tinha sido respondido. Pediu-se, assim, ao senhor «AA» que esclarecesse (...) se pretendia com isso dizer que, nos negócios em questão, só ocasionalmente foram elaboradas encomendas, ou que nunca foram elaboradas, ou ainda, se alguma vez foram reduzidas a escrito. Passa a citar-se a resposta obtida. “Não possui elementos de suporte, face ao ocorrido, para poder garantir que nunca foram objeto de redução a escrito”. (...) Estava assim (...) «AA» em condições de esclarecer se adotou o procedimento de formalizar por escrito as suas encomendas. Estava também em condições de esclarecer se os seus parceiros comerciais lhe exigiam esse procedimento. Estava também em condições de esclarecer se encomendou a uma tipografia que lhe fosse impresso um bloco de “Notas de Encomenda”, ou se adquiriu um programa informático que lhe permitia imprimir essas mesmas “Notas de encomenda”. Enfim, podia esclarecer o que lhe foi perguntado, mas não o fez. Na generalidade que adiantou, (...) «AA» refere-se ainda a uma “fase de intermediação”. Pediu-se ao referido senhor que esclarecesse o que pretendia significar com tal expressão. Passa a citar-se a resposta obtida “fase em que se situa o contribuinte”, (...). Mais uma vez, (...) «AA» não esclarece o alcance das suas próprias afirmações. Sintetizando, o senhor «AA», uma vez mais, revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer se as compras efetuadas aos três fornecedores em questão foram objeto de encomenda prévia, à semelhança do verificado no que diz respeito ao impulso negocial para os fornecimentos, ao modo de integração dos fornecedores na respetiva carteira e ao modo de fixação dos preços. 3.1.2.4.5 Quantidades transacionadas Um outro aspeto abordado nos esclarecimentos solicitados, foi a questão das quantidades transacionadas. Pediu-se a (...) «AA» que esclarecesse se as quantidades adquiridas resultam primordialmente das quantidades oferecidas pelos fornecedores, ou se, pelo contrário, tais quantidades foram uma consequência das encomendas realizadas anteriormente. (...) resposta obtida. “verifica-se, na prática, uma multiplicidade de situações que não excluem a sugerida” (...). Mais uma vez a resposta oferecida é uma generalidade que nada esclarece. Para além disso é destituída de sentido. (...) (...) Evidentemente que se as quantidades transacionadas são algo que corresponde principalmente ao que é oferecido ou se, pelo contrário, corresponde ao que é procurado, é um conhecimento que se adquire ao longo de sucessivas negociações, principalmente se tais negociações se referem a mais de 50% do total das compras, como é o caso do senhor «EE», no ano de 2004. (...) Uma vez mais e em síntese, o senhor «AA» revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer se as quantidades adquiridas resultam primordialmente das quantidades oferecidas pelos fornecedores, ou se, pelo contrário, tais quantidades foram uma consequência das encomendas realizadas anteriormente (...). 3.1.2.4.6 Pesagem das mercadorias O comércio por grosso de sucatas e de desperdícios metálicos faz-se a granel, daqui decorrendo, como aspeto decisivo da atividade desenvolvida, a pesagem das mercadorias transacionadas. Pediu-se à entidade inspecionada que esclarecesse se a receção das mercadorias originou, de imediato ou em momento próximo, a pesagem das mesmas e, em caso afirmativo, se foi emitido um documento de pesagem. (...) resposta obtida “A pesagem ocorre sempre (exceto leilões), com a emissão do respetivo talão que, após liquidação e pagamento da mercadoria, vai para o lixo” (...). Face à resposta obtida pediu-se ao senhor «AA» que esclarecesse (...) resposta obtida “A pesagem ocorria, em regra, na proximidade possível dos locais de carregamento. Os talões eram emitidos pelo(s) titular(es) da(s) balanças”. (...). (...) Desde logo uma primeira decorrência, as mercadorias não foram pesadas nos locais de carregamento, mas sim na “proximidade possível”. Acontece que a pesagem só oferece credibilidade se for presenciada pelas partes intervenientes. O que daqui resulta é que a entidade inspecionada, necessariamente, teria de estar presente nesses mesmos locais. (...). 3.1.2.4.7 Origem das mercadorias Nos esclarecimentos solicitados também se abordou a questão da origem das mercadorias. Pediu-se assim (...) que indicasse, face ao aspeto das mercadorias adquiridas, a sua origem provável, (...) resposta obtida “Multiplicidade de situações insuscetível de síntese e cuja resposta só pode ser fiável contactando os fornecedores” (...). Temos então, para além da multiplicidade antes alegada (dupla e destituída de sentido), uma nova multiplicidade, esta agora relativa à origem das mercadorias. (...) Tendo a entidade inspecionada argumentado com a “multiplicidade de situações” que a impediria de identificar a origem das mercadorias, foi-lhe pedido que indicasse, para cada um dos três fornecedores em questão, as três principais situações verificadas. (...) resposta: “Prejudicada a resposta pela dita multiplicidade e pela ausência mais uma vez invocada de elementos de suporte à escrita mercê do ocorrido” (...). Volta (...) a argumentar com a inexistência de uns documentos que não se entende quais possam ser. Evidentemente que a origem das mercadorias se deduz pelo exame às mesmas e não pela leitura de um documento que não se sabe qual possa ser. Registe-se ainda, novamente, que esta outra “multiplicidade” também é dupla, isto de acordo com o que é informado, uma vez que se estenderia aos três fornecedores. Nota: Esta “dificuldade” na indicação da provável origem das mercadorias deverá ser articulada com o facto de os três fornecedores em questão não apresentarem um único fornecedor credível para as mercadorias que alegadamente transacionam e que, em parte, teriam vendido à entidade inspecionada. Uma vez mais e sintetizando, (...) «AA» revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer a origem provável das mercadorias que adquiriu aos três fornecedores em questão (...). 3.1.2.4.8 Identificação do interlocutor negocial Também foi pedido (...) que identificasse as pessoas com quem foram acordados os termos que enformaram as aquisições. (...) resposta obtida. “gerentes ou outros responsáveis que assim se apresentavam” (...). (...) Sintetizando, (...) «AA» revela-se incapaz ou sem vontade de identificar as pessoas com que foram acordados os termos em que se efetuaram as aquisições efetuadas aos três fornecedores em questão, (...). 3.1.2.4.9 Entregas parcelares de mercadorias (...) pediu-se, assim, à entidade inspecionada que esclarecesse se a entrega das mercadorias adquiridas se verificou na data que consta das faturas e se foi feita de uma só vez, ou se, pelo contrário, foram feitas entregas parcelares. (...) resposta obtida. “Crê-se que por vezes foram parcelares” (...). (...) a entidade inspecionada não esclarece se a entrega das mercadorias adquiridas se verificou na data que consta das faturas. Não sabe se existiram ou não entregas parcelares, limita-se a crer que possam ter existido (...). (...) na hipótese de terem existido entregas parcelares, indicasse os procedimentos adotados, nomeadamente no que diz respeito à pesagem, à faturação e à emissão de documentos comprovativos. (...) a resposta obtida: “Os procedimentos eram idênticos, respeitando a faturação e demais documentação as regras e a prática comercial” (...). Mais uma vez a entidade inspecionada responde com generalidades sem qualquer conteúdo, ao que de concreto lhe foi perguntado. (...) Sintetizando, (...) revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer se existiram ou não entregas parcelares, limitando-se a informar que possam ter existido (...). 3.1.2.4.10 Transporte de mercadorias Nos esclarecimentos solicitados abordou-se a questão do transporte das mercadorias. (...). Passa a citar-se a resposta obtida “Umas vezes o fornecedor, outras, o comprador. Foram emitidos documentos e arquivados (consulta prejudicada pelos factos participados em sede própria)” (...). Porque o esclarecimento prestado não passa de uma formação vaga, que não dá resposta ao que de concreto foi perguntado, voltou-se a colocar a mesma questão (...). (...) resposta obtida “Já respondida em 09.12.2008. Lembra-se, mais uma vez, a situação particular que impede maior minúcia ou detalhe no esclarecimento” (...). Para além da repetição da pergunta, colocaram-se novas questões que pretendiam, mais uma vez, aprofundar e clarificar o que de vago e genérico antes tinha sido respondido. Tendo (...) «AA» afirmado que quem fez o transporte foi “umas vezes o fornecedor, outras, o comprador”, foi-lhe pedido que, para cada um dos três fornecedores, indicasse quem fez o transporte na maior parte das vezes. (...) resposta obtida “Maioria das vezes os fornecedores” (...). (...) nos casos em que procede à aquisição deste tipo de bens (sucata), por regra a quem incumbe o transporte dos mesmos. (...) resposta obtida “A prevalência é do fornecedor” (...). Pediu-se que fossem indicadas as circunstâncias que determinaram quem realizava o transporte dos bens. (...) resposta obtida: “A oportunidade/disponibilidade de uma ou outra coisa” (...). (...) não tendo antes a entidade inspecionada querido estabelecer se existiu, ou não, uma regra na fixação de quem realizava os transportes, percebe-se agora que não existiu regra alguma (...). Esta ausência de uma norma é contrária a regras comerciais generalizadamente adotadas, para além de, por exemplo, nas entregas parcelares representar um evidente embaraço. Também se solicitou que, no caso em que o transporte foi efetuado pela entidade inspecionada, fosse indicado se as mercadorias foram examinadas numa ocasião anterior a esses mesmos transportes. (...) resposta obtida: “Raramente, a menos que o transporte fosse pelo comprador e fosse ao local”, (...). (...) solicitou-se (...) que esclarecesse se, para a fixação dos preços das mercadorias, era indiferente quem realizava o transporte. (...) resposta obtida: “Normalmente o preço não variava em função dessa circunstância” (...). Também se solicitou à entidade inspecionada, na eventualidade de ter efetuado alguns dos transportes das mercadorias adquiridas, que identificasse os locais onde foram efetuados os carregamentos, o tipo de mercadorias que foram carregadas em cada um desses locais, assim como os fornecedores envolvidos. (...) resposta obtida: “o notificado procedeu a carregamentos, entre outros locais, em Ponte de Lima; Valença; Braga, Taipas (Guimarães), Albergaria-a-Velha, etc.. Carregou-se mercadoria diversa, sendo os fornecedores os constantes e sugeridos na notificação” (...). Prevendo a possibilidade de (...) «AA» ter disponibilizado aos fornecedores viaturas para que fosse efetuado o transporte das mercadorias adquiridas (...) resposta obtida: “As viaturas constam do imobilizado da empresa notificada. Os fornecedores os indicados na notificação. não houve cobrança de transporte quando efetuado pelo notificado” (...). Por último (...) foi questionado acerca das compras de mercadorias cujo transporte foi efetuado pelo fornecedor (...) resposta obtida “nalguns casos sim, noutros não. No caso de algumas empresas só vinha o motorista. Viaturas eram pesadas e ligeiras (3.500kg)” (...). (...) Sintetizando, de acordo com o testemunho de (...) «AA», no transporte das mercadorias, contrariamente a uma prática comercial generalizadamente adotada, não teria existido uma regra que tutelasse a quem incumbia o transporte. Teria também negociado os preços das mercadorias sem cuidar de saber a quem pertenceria o encargo do transporte, embora este não seja despiciendo. Apesar de lhe ter sido expressamente solicitado, a entidade inspecionada dispensou-se de indicar, para cada um dos locais de carregamento, os fornecedores e o tipo de mercadorias envolvidas. Também não indicou se os transportes que efetuou respeitam a entregas parciais. Em nenhum dos aspetos relacionados com o transporte das mercadorias, (...) «AA», foi capaz de identificar uma regra ou um procedimento que inequivocamente tenha sido adotado. Em suma, o referido senhor revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer inequivocamente os contornos em que se teriam efetuado os transportes (...) 3.1.2.4.11 Receção das faturas Um outro aspeto abordado nos esclarecimentos solicitados, foi a questão da entrega das mercadorias. Pediu-se, assim, (...) que esclarecesse se, nos casos das compras de mercadorias cujo transporte foi efetuado pelo fornecedor, as faturas correspondentes a tais compras acompanharam as mercadorias ou se foram rececionadas num momento diferente. (...) resposta obtida: “Uma e outra situação se verificaram” (...). Perante o laconismo da resposta obtida, pediu-se à entidade inspecionada que esclarecesse (...) resposta obtida: “na maior parte das vezes, em todos os casos, vinha só a guia primeiro, algumas vezes a venda a dinheiro” (...). Também se pediu (...) que esclarecesse como foram entregues as faturas nos casos em que estas não acompanharam as mercadorias (...) resposta obtida. “Situações diversas, sendo difícil de estabelecer a regra” (...). De acordo então com as respostas obtidas, os fornecedores em questão, na maior parte das vezes, entregavam as mercadorias acompanhadas de uma guia. As faturas seriam entregues num momento diferente. (...) o facto de as faturas serem entregues pessoalmente, ou por qualquer outro meio, seria algo que a entidade inspecionada não poderia olvidar. Estava, portanto, a entidade inspecionada em condições de, perentoriamente, esclarecer se existiu uma regra quanto à receção das faturas. Não o fez, limitou mais uma vez a admitir uma multiplicidade de situações, o mesmo é dizer que os quatro intervenientes nos negócios em questão (o adquirente e os três fornecedores), afinariam pelo mesmo padrão, que é o da inexistência de um padrão de procedimento. Sintetizando, (...) revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer os termos segundo os quais se teria processado a entrega das faturas, embora claramente admita que, por regra, a entrega destes documentos não coincidiu com a entrega das mercadorias (...). 3.1.2.4.12 Pagamento das mercadorias 3.1.2.4.12.1 Meios utilizados e momento de pagamento Nos esclarecimentos solicitados também se abordou a questão do pagamento das mercadorias. Antes de tudo pediu-se (...) que indicasse, para cada uma das faturas os documentos equivalentes contabilizados, o meio utilizado para o respetivo pagamento. (...) resposta obtida: “Habitualmente cheques, mas também numerário” (...). (...) voltou a inquirir-se a entidade inspecionada a este propósito (...) resposta obtida: “Já respondido 9.12.08, sendo que, face aos factos ocorridos, não é possível fornecer maior detalhe, sem prejuízo da autorização bancária concedida” (...). NOTA: supondo que (...) quando se refere aos “factos ocorridos” pretende referir-se ao furto que vitimou a sua contabilidade, chama-se a atenção para o facto da entidade inspecionada não relevar contabilisticamente as movimentações das contas bancárias. Assim sendo não se compreende de que forma o alegado furto diminuirá a capacidade de (...) esclarecer esta questão. Para além da identificação dos meios, colocaram-se outras questões relativamente ao pagamento das mercadorias (...) resposta obtida: “as situações em várias, conforme montantes envolvidos, o grau de confiança existente, a necessidade maior ou menos de recebimento ou a maior ou menor liquidez momentânea do fornecedor/comprador” (...). (...) voltou a colocar-se a mesma questão (...) resposta obtida: “Já respondida em 9.12.08. Multiplicidade de situações que só na posse dos elementos administrativos perdidos poderiam permitir outra minúcia” (...) (...) Resumindo, tendo (...) «AA» identificado cinco fatores que teriam determinado o momento em que se verificou o pagamento das mercadorias adquiridas aos três fornecedores em questão [montantes envolvidos (i); grau de confiança existente (ii); necessidade maior ou menor de recebimento (iii); liquidez momentânea do fornecedor (iv); liquidez momentânea do comprador (v)], foi-lhe solicitado que esclarecesse em que medida cada um desses fatores teria determinado o momento do pagamento. (...) a entidade inspecionada não esclareceu a influência de um único dos cinco fatores que antes admitiu terem determinado o momento do pagamento. 3.1.2.4.12.2 Adiantamentos Ainda no âmbito do pagamento das mercadorias, solicitou-se (...) que esclarecesse se o pagamento foi precedido pela entrega de adiantamentos e, em caso afirmativo, em que ocasião foi feita a compensação desses adiantamentos. (...) resposta obtida: “Algumas vezes ocorreu, sendo a compensação efetuada aquando da liquidação/pagamento final” (...). Mais uma vez, para superar o caráter manifestamente vago da resposta obtida, solicitou-se à entidade inspecionada (...) resposta obtida: “Só é seguro afirmar perentoriamente tal ocorrência, face aos constrangimentos documentais, relativamente a «EE»” (...). NOTA: novamente não se percebe que “constrangimentos documentais” possam ser estes, uma vez que, por um lado, a entidade inspecionada não releva contabilisticamente a movimentação de contas bancárias e, por outro lado, a contabilização do pagamento das mercadorias é sempre feita por contrapartida da conta “Caixa” e pelo valor global de cada fatura ou agregando os valores de várias faturas. Também se pediu que, para cada um dos três fornecedores em questão, fossem indicadas as razões que levaram à ocorrência desses adiantamentos. (...) resposta obtida: “As situações em causa, de caráter excecional, ficavam a dever-se a dificuldades de tesouraria aventadas pelo (s) beneficiário(s)” (...). (...) No que diz então respeito à ocorrência de adiantamentos, a entidade inspecionada admite, sem margem para dúvidas, que existiram no que concerne ao senhor «EE», admitindo ainda que possam também ter sido feitos outros adiantamentos. Quanto às suas razões para a ocorrência dos adiantamentos, a entidade inspecionada dispensa-se de as indicar. Apesar de se tratar de uma situação de óbvio melindres, as partes envolvidas teriam adotado um inverosímil procedimento que consistiu na ausência de um suporte documental para esses mesmos adiantamentos, isto porque, de acordo com as respostas recolhidas, não teriam sido emitidos recibos. 3.1.2.4.13 Variação nos montantes anuais adquiridos Um outro aspeto abordado nos esclarecimentos solicitados, foi a questão da variação dos montantes anuais adquiridos. (...) (...) Neste contexto de acentuadas e importantíssimas variações pediu-se (...) que indicasse as razões que levaram às citadas variações. (...) resposta obtida: “tal deve-se às condições de mercado e do produto (compra-se a quem venda melhor e não a quem tem melhor cara), mas também à confiança que o tempo da relação permite fortalecer” (...). (...) pediu-se à entidade inspecionada que identificasse as condições do mercado e as condições do produto que, (...) teriam levado à drástica diminuição das compras efetuadas à empresa «C , unipessoal, Lda.» (...) verificada nos anos de 2005 e de 2005. (...) resposta obtida: “tal facto será particularmente explicado pela suspensão de atividade que tal firma e o seu agente deixaram de ter durante algum tempo (crê-se que terá estado ausente no estrangeiro), bem como pelas dificuldades transitórias do negócio em geral que terão eventualmente coincidido, acrescidamente e mercê de ação inspetiva que questionava a credibilidade fiscal de tal fornecedor, entendeu-se por melhor evitar relações comerciais com o mesmo” (...). (...) as últimas compras efetuadas pela entidade inspecionada à empresa «C , unipessoal, Lda.» (...) data de junho de 2004. (...) «AA» foi objeto de uma ação inspetiva que decorreu no segundo semestre de 2005. Do relatório elaborado em consequência desta ação inspetiva não consta qualquer reserva a eventuais compras efetuadas à citada empresa. Assim sendo, a única razão que a entidade inspecionada inequivocamente admite ter tudo para a diminuição e cessação das aquisições, não se mostra congruente com os factos a que deveria respeitar. (...) também se pediu (...) que identificasse as condições de mercado e das condições do produto que teriam levado ao enorme aumento das compras efetuadas a (...) «EE». (...) resposta obtida: “razões de negócios (qualidade da oferta, natureza da procura, preço, etc)” (...). Sintetizando, (...) «AA» revela-se incapaz ou sem vontade de esclarecer as razões que levaram às variações nos montantes anuais adquiridos, particularmente no que concerne às aquisições efetuadas a «EE» (...). 3.1.2.4.14 Conhecimento respeitante a instalações e equipamentos dos fornecedores Também se pediu (...) que informasse se alguma vez visitou as instalações afetas à atividade de cada um dos três fornecedores em questão (...) resposta obtida: “Sim. Normais, em sintonia com a atividade exercida e, por isso, caraterizadas pelos típicos instrumentos de trabalho (balanças, prensas, etc..)” (...) (...) solicitou-se que fossem identificados os locais visitados afetos à atividade de cada um dos três fornecedores em questão. (...) resposta obtida: “Valença e Ponte de Lima («EE»); Albergaria e antes em Talhadas, Sever do Vouga («C , unipessoal, Lda.» e «D, Limitada»). Em Valença o armazém funcionava a céu aberto. Como já se explicou, e não é demais reiterar, frequentemente, os fornecimentos partiam dos locais onde os questionados fornecedores tinham as mercadorias sem que as mesmas fossem aos seus armazéns, daí que não identifique tais locais como sendo igualmente instalações dos mesmos, face a tal convicção” (...). A este propósito recorda-se que através de ações inspetivas realizadas aos fornecedores em questão, verificou-se que a empresa «C , unipessoal, Lda.» (...) e «D, Limitada» (...) não dispunham de quaisquer instalações ou equipamentos. Quanto ao senhor «EE», ele próprio identifica como locais de armazenagem da sucata, um terreno em Valença (onde armazena ferro e chapa) e um armazém situado no Lugar ..., ... (onde armazena a sucata de cobre e alumínio). Quer isto dizer que a entidade inspecionada atribui aos fornecedores em questão instalações cuja existência eles próprios não reconhecem. A única coincidência dos depoimentos refere-se ao terreno de Valença, alegadamente utilizado pelo senhor «EE». Acontece que é o próprio fornecedor que afirma não armazenar aí as mercadorias que o senhor «AA» comercializa (sucata não ferrosa). (...) Também se pediu que fosse indicado o tipo de instalações (terreno aberto, terreno vedado, espaço aberto mas coberto, armazém fechado..) (...) resposta obtida: “Respondido em parte na anterior. Quanto à «C , unipessoal, Lda.» e «D, Limitada», funcionava em armazém fechado (não se sabe a que título, propriedade, arrendamento, empréstimo, etc..)” (...). Concluindo, enquanto que nos demais aspetos sobre o que foi questionado. (...) «AA» revela-se incapaz ou sem vontade de os esclarecer, no que diz respeito às instalações e equipamentos que os fornecedores disporiam, o referido senhor atribui-lhes capacidades que os próprios não reconhecem. 3.1.2.4.15 Caraterização da atividade desenvolvida Para além dos aspetos relacionados com as aquisições efetuadas aos três fornecedores em questão, solicitou-se à entidade inspecionada que descrevesse a atividade desenvolvida nos seus aspetos principais, nomeadamente se tal atividade é de natureza essencialmente comercial (os bens comercializados não sofrem alteração digna de realce), ou se, pelo contrário, essa atividade tem natureza mais industrial (os bens comercializados são objeto de alguma transformação, materializada na separação, escolha, limpeza e constituição de lotes homogéneos de bens). (...) resposta obtida: “A essência da atividade é comercial, mas pressupõe alguma alteração, melhor, depuração/triagem/separação (por exemplo separando o plástico do metal ou procedendo ao enfardamento dos alumínios e cobre), como se constatou in loco na ação inspetiva, propiciando (em muitos casos) uma adequada e homogénea apresentação do(s) produto(s)”. 3.1.2.4.16 Conclusão A propósito das aquisições efetuadas ao senhor «EE» e às empresas «C , unipessoal, Lda.» (...) e «D, Limitada» (...) pediu-se a (...) «AA» que esclarecesse os seguintes aspetos: impulso negocial para os fornecimentos; Modo de integração dos fornecedores na respetiva carteira; Modo de fixação dos preços; Existência de encomendas prévias; Proximidade das quantidades adquiridas em relação às quantidades oferecidas ou às quantidades procuradas; Origem provável das mercadorias adquiridas; Identificação das pessoas com quem foram acordados os termos em que se efetuaram as aquisições; Existência de entregas parcelares; Contornos em que se teriam efetuado os transportes; Receção das faturas; Momento em que se verificou o pagamento das mercadorias adquiridas; Razões para a ocorrência de adiantamentos; Razões que levaram às variações nos montantes anuais adquiridos; Em relação a todos estes aspetos (...) «AA» revela-se incapaz, ou sem vontade, de os esclarecer. 3.1.2.5 Conclusão Através das ações inspetivas que tiveram como objeto as sociedades «C , unipessoal, Lda.» (...) e «D, Limitada» (...), concluiu-se que: No que diz respeito à primeira das duas empresas, deu-se como comprovado que a atividade por si declarada é aparente, fictícia; No que concerne às faturas de vendas emitidas pela segunda empresa, existiam fortes indícios de que a atividade comercial desenvolvida pela «D, Limitada» era, na prática, nula ou residual Ponderada a informação existente, relativa a (...) «EE», constatou-se a existência de um conjunto de indícios que levam à conclusão de que as operações comerciais tituladas por faturas alegadamente emitidas pelo referido senhor, faturas essas contabilizadas como compras pelo senhor «AA», não correspondem à realidade. Existindo já, por recolha junto das três entidades antes identificadas, um conjunto de indícios sérios e credíveis de que as operações comerciais tituladas por faturas por elas emitidas não correspondiam à realidade, foi objetivo essencial da ação inspetiva que agora se informa, analisar o relacionamento entre as referidas entidades e (...) «AA». Como resultado desta análise pretendia-se extrair uma concussão acerca da correspondência, ou da sua falta, entre as compras contabilizadas e efetivas aquisições de bens. Conforme antes se deixou expresso, (...) «AA» revelou-se incapaz, ou sem vontade, de esclarecer a generalidade dos aspetos que teriam caraterizado o contexto comercial em que teriam ocorrido as transações documentadas pelas faturas emitidas pelos três fornecedores em questão, nomeadamente: impulso negocial para os fornecimentos (i); modo de integração dos fornecedores na respetiva carteira (i); modo de fixação dos preços (iii); à existência de encomendas prévias (iv); proximidade das quantidades adquiridas em relação às quantidades oferecidas ou às quantidades procuradas (v); origem provável das mercadorias que adquiriu (vi); identificação das pessoas com quem foram acordados os termos em que se efetuaram as aquisições (vii); existência de entregas parcelares (viii); contornos em que se teriam efetuado os transportes (ix); receção das faturas (x), momento em que se verificou o pagamento das mercadorias adquiridas (xi); razões para a ocorrência de adiantamentos (xii); razões que levaram às variações nos montantes anuais adquiridos (xii). Em conclusão, a incapacidade ou a falta de vontade patenteada pelo senhor «AA» em esclarecer o contexto comercial em que teriam ocorrido as transações em questão, conjugada com a inexistência de elementos essenciais da contabilidade, inexistência essa que não foi suprida pelo referido senhor, nem este sequer se dignou esclarecer se, pelo menos, tentou suprir tal inexistência, apesar de lhe ter sido expressamente pedido que o fizesse, não leva à invalidação do conjunto de indícios sérios e credíveis recolhidos junto dos emitentes das faturas em questão. Antes pelo contrário, acrescenta novo indícios de que as transmissões facturadas pelo senhor «EE» e pelas sociedades «C , unipessoal, Lda.» (...) e «D, Limitada» (...), não corresponderam a efetivas transmissões de bens, logo não poderiam ter sido consideradas como custo fiscal, uma vez que, de acordo com o disposto no n.º1 do artigo 23º do código do IRC (aplicável por força do disposto no artigo 32º do Código do IRS), apenas se consideram como custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. 3.1.2.6. Correções Da não consideração como custo das compras identificadas no quadro n.º1, tendo em conta a forma de determinação do rendimentos da categoria B (lucro tributável), resultam correções ao rendimento coletável no exato montante dessas compras conforme se resume no quadro que se segue:
– Cf. relatório de inspeção tributária, constante de fls. 16 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos, documento para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais; 6. Notificada a entidade inspecionada para o exercício do direito de audição, exerceu tal direito, sendo que, considerando o teor daquele, a Administração Tributária, fundamenta a sua posição do seguinte modo: “(...) Não tendo (...) «AA» contrariado os factos relatados nem enquadramento legal adotado (...) quanto aos argumentos eles resumem-se à falsa imputação ao Projeto de Relatório de Inspeção Tributária de uma conclusão que dele não consta (...). Poderá a entidade inspecionada verificar, através de uma leitura medianamente atenta do citado projeto que nunca ali se deixou expressa a aventada conclusão. Evidentemente que, no domínio das possibilidades, um operador económico pode sempre cessar a atividade que antes declarou pretender exercer e, ainda assim, desenvolver essa atividade e emitir as respetivas faturas. Mais do que admissão de uma possibilidade académica. O que importa reter é a existência de um conjunto de indícios sérios e credíveis de que as operações comerciais tituladas por faturas alegadamente emitidas pelo senhor «EE», faturas essas contabilizadas como compras pelo senhor «AA», não correspondem à realidade. Quanto aos factos novos (...) Não pode deixar de se notar que os únicos alegados factos novos respeitam a situações que corroboram a inexistência de condições para o exercício da atividade por parte dos fornecedores em questão. Estes, de acordo com o testemunho da entidade inspecionada, não lhe apresentaram uma mercadoria que tivessem em armazém e para a qual procurassem comprador, conforme seria expectável para um operador económico credível. Antes pelo contrário. As mercadorias estariam algures. Em Grijó ou em Águeda e na posse de outros. Esta situação das compras carregadas nas instalações daqueles que abastecem os fornecedores da entidade inspecionada (fornecedores de fornecedores) é um absurdo comercial. Evidentemente que se a entidade inspecionada contactasse com a origem das mercadorias, o que seria expectável é que esta, depois de um primeiro contacto, passasse a fazer estas compras diretamente, apropriando-se assim da margem comercial dos seus dispensáveis fornecedores. Não tendo (...) «AA» contrariado os factos relatados no Projeto de Relatório de Inspeção Tributária nem enquadramento legal aí adotado, nem apresentado factos ou argumentos novos que sustentem a proclamada efetividade das transmissões em questão, aproveitou o referido senhor o seu direito de audição para ultrapassar a incapacidade ou a falta de vontade que antes demonstrou, no que diz respeito ao esclarecimento dos aspetos que teriam caraterizado o contexto comercial em que teriam ocorrido as transações documentadas pelas faturas emitidas pelos três fornecedores em questão? Esclareceu pelo menos um dos treze aspetos antes elencados? Nem um. Tendo em consideração o teor da pronúncia da entidade inspecionada, não nos parece que devam ser alteradas as conclusões que constam do Projeto de Relatório de Inspeção Tributária” – cf. relatório de inspeção tributária, constante de fls. 16 e seguintes do processo administrativo apenso aos autos, documento para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais; 7. Sobre este relatório recaiu parecer do Chefe de Equipa, datado de 18.03.2009, com o seguinte teor: “Confirmo as correções de natureza aritmética efetuadas em sede de IRS (...) com referência aos anos de 2004 e 2005, nos montantes a seguir discriminados: 2004: IRS 538.963,96(...) 2005: IRS – 91.357,73€ (...)” – cf. parecer constante de fls. 16 do processo administrativo apenso aos autos, para o qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; 8. Sobre aquele RIT e parecer (factos 6., 7. e 8) recaiu despacho de concordância do Chefe de Divisão, datado de 18.03.2009 – cf. despacho constante de fls. 16 do processo administrativo apenso aos autos, para o qual se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; 9. Nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 4 a 7, frente e verso, do processo administrativo apenso aos autos, documento para cujo integral teor se remete para todos os efeitos legais, o aqui impugnante deduziu Reclamação Graciosa pedindo a declaração de inexistência ou nulidade do ato tributário de liquidação oficiosa de IRS do ano de 2004, com os respetivos juros; 10. Para efeito de decisão da Reclamação Graciosa id. em 9., foi elaborado projeto e despacho de indeferimento do pedido, onde se argumenta, relativamente à alegada falta de fundamentação das liquidações, que “apesar de notificado o reclamante não apresentou a contabilidade, com tudo o que a mesma tem de incluir. (...) Nas declarações que apresentou à Administração Fiscal, respeitante aos anos de 2004 e de 2005, concretamente, as declarações anuais de informação contabilística e fiscal, prevista no art. 113º do CIRS e, as declarações de rendimentos a que se refere o art. 57º do mesmo diploma legal, o aqui reclamante considerou os montantes referidos nos quadros 1 e 2 de fls. 24. Alterando os valores que nessas declarações deveriam constar. (...) Assim, e face ao descrito, Tendo a Administração Fiscal constatado, através de inspeção à contabilidade do reclamante, a existência de faturas que discriminou e que, devido a vários elementos, objetivos e ponderosos, considerou falsas por não corresponderem a operações efetivamente realizadas, competia ao aqui reclamante, provar a realização de cada uma das transações a que cada uma dessas faturas se referia, até porque ao deduzir o IVA (...), tem obrigação de fazer prova dos factos constitutivos do mesmo. O mesmo se aplicando em sede de imposto sobre o rendimento, dado que os montantes se encontram viciados. In casu A Administração Fiscal carreou para os autos factos concretos, objetivos e fortemente indiciadores de que as operações enquadradas nos registos disponibilizados, não titulam operações reais, está a mesma legitimada a efetuar as correções que entender, desconsiderando os custos nelas existentes para efeitos de determinação do lucro tributável. Cabia ao contribuinte o ónus de provar a materialidade das operações, o que não se verificou, pela sua falta de colaboração e, contrariamente ao que pretende fazer crer em sede de petição de procedimento gracioso. Está devidamente fundamentada a atuação dos serviços de inspeção da DDF ... e, sustentada a liquidação adicional de imposto, existindo facto tributário, sendo o mesmo legal, bem como as liquidações em reclamação.” Pronunciou-se, ainda, sobre a caducidade do direito à liquidação, concluindo: “em resposta ao thema decidendum, que não se verifica a caducidade do direito de liquidar em relação ao ano de 2004. Não colhe aqui o instituto da caducidade e, muito menos, da forma colocada (...)” – veja-se projeto de despacho constante de fls. 236 do apenso de Reclamação Graciosa, numeração do processo físico, para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais; 11. Notificado o reclamante para o exercício do direito de audição, faculdade que se absteve de usar, foi a Reclamação Graciosa indeferida, nos termos constantes do despacho e parecer constantes de fls. 246 do apenso de Reclamação Graciosa, para os quais se remete e cujo integral teor se dá por reproduzido para todos os efeitos legais; 12. Nos termos e com os fundamentos constantes de fls. 2 e seguintes do apenso de Recurso Hierárquico, para cujo integral teor se remete e que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, o impugnante interpôs Recurso Hierárquico; 13. Para decisão daquele Recurso Hierárquico (facto provado n.º12) foi elaborada informação, da qual se destaca: “Quanto à caducidade da liquidação relativa ao ano de 2004 (...) 7. No caso em apreço, os atos inspetivos iniciaram-se em 2008.10.14 e terminaram em 2009.02.20, pelo que, de conformidade com o preceituado no n.º1 do art. 46º da LGT, o prazo de caducidade suspendeu-se com a notificação a contribuinte efetuada em 2008.10.14 da ordem de serviço, até 2009.20.20 data em que terminou a inspeção, ou seja, o prazo de caducidade suspendeu-se por 129 dias. 8. Assim sendo, o direito de liquidar o imposto relativo ao ano de 2004 terminava em 2009.05.09 e, como a liquidação em causa tem data de registo de 2009.05.11, considera-se que o Sujeito Passivo foi validamente notificado da mesma em 2009.05.14 (no 3º dia útil posterior ao do registo ou no 1º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil (...)), pelo que, foi ultrapassado o direito de liquidar imposto relativamente ao ano de 2004. 9. Relativamente às faturas não consideradas como custos por não consubstanciarem qualquer transação comercial (...) as correções efetuadas estão devidamente sustentadas e fundamentadas através do relatório (...) e o recorrente não apresenta argumentos válidos que contrariem as correções efetuadas. 10. Efetivamentem foram reunidos indícios suficientes que as faturas emitidas por «EE» (...) e pelas sociedades «C , unipessoal, Lda.» (...) e «D, Limitada» (...), não correspondiam a efetivas transmissões de bens, tratando-se de simulação de negócios. 11. Ora, conforme se demonstrou no relatório (...) o recorrente revelou-se incapaz ou sem vontade de esclarecer a generalidade dos aspetos que teriam caraterizado o contexto comercial em que teriam ocorrido as transações documentadas pelas faturas emitidas pelos fornecedores em questão (...). 12. (...) a Administração Tributária satisfez plenamente o ónus da prova que lhe cabia, demonstrando a convergência dos pressupostos legais da sua atuação, comprovando, com um grau de probabilidade elevada, que as transmissões em causa não corresponderam a efetivas transmissões de bens, logo não poderiam ser consideradas como custo fiscal, nos termos do disposto no n.º1 do art. 23º do CIRC, aplicável por força do disposto no art. 32º do CIRS. (...) 14. (...) as alegações do recorrente estão desapoiadas de elementos documentais, testemunhais ou outras, que as suportem, não sendo, portanto, suscetíveis, por si só, de por em causa os factos que suportam a liquidação ora reclamada não podendo, por conseguinte, proceder. C. Conclusão (...) deve o presente Recurso Hierárquico ser deferido relativamente à liquidação de IRS do ano de 2004 (...)” – cf. informação constante de fls. 23 a 27 do apenso de Recurso Hierárquico para cujo integral teor se remete e o qual se dá por reproduzido para todos os efeitos legais; 14. Sobre o Recurso Hierárquico (facto provado n.º12) e atendendo à informação elaborada (facto provado n.º13), incidiu parecer da diretora de serviços, com o teor: “confirmo, propondo-se o deferimento do recurso relativamente ao ano de 2004 e indeferimento relativamente ao ano de 2005” – cf. parecer constante de fls. 22 verso do apenso de Recurso Hierárquico, para cujo teor se remete e que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; 15. Considerado o parecer id. em 14., pela Subdiretora Geral da Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (Divisão de Administração II), foi lavrado despacho de 05.01.2011, pelo qual se decidiu: “defiro o Recurso Hierárquico relativamente ao ano de 2004 e indefiro quanto ao ano de 2005, com os fundamentos invocados” – cf. despacho constante de fls. 22 verso do apenso de Recurso Hierárquico, para cujo teor se remete e que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; 16. Pelo ofício n.º ...03 de 09.02.2011, remetido por correio registado com A/R, registo com o n.º ..., foi o impugnante notificado, na pessoa do seu Ilustre Mandatário, do despacho id. em 15 – cf. notificação constante de fls. 29 e 30, numeração do suporte físico, do apenso de Recurso Hierárquico, para os quais se remete e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais; 17. No seguimento do despacho id. em 15., em 07.12.2011 foi lavrada informação complementar, da qual, além do mais, consta: “3. (...) constata-se que o procedimento inspetivo encerrou-se em 6 de abril de 2009, com a notificação do relatório de inspeção (assinatura do AR), pelo que tendo o mesmo sido iniciado em 14 de outubro de 2008, tal não se verifica, uma vez que o prazo de caducidade esteve suspenso durante os 147 dias que durou a ação inspetiva realizada ao Sujeito Passivo (cf. n.º1 do art. 46º da LGT), pelo que este foi validamente notificado da liquidação em causa e dentro do prazo de caducidade. 4. Assim sendo, propomos que o despacho exarado em 2011.01.05 pela Subdiretora-Geral do IR, que recaiu na informação n.º ...10, seja revogado, no que toca ao deferimento do IRS do ano de 2004, e de acordo com as instruções divulgadas pela Circular n.º 13/99, de 8 de julho e no n.º2 do art. 103º do CPA, é dispensada a notificação ao recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 60º da Lei Geral Tributária.” – cf. informação complementar constante de fls. 38 do apenso de Recurso Hierárquico, para cujo integral teor se remete e a qual se dá por reproduzida para todos os efeitos legais; 18. Obtido parecer de concordância sobre a informação id. em 17, em 07.12.2011, pela Subdiretora-Geral, por subdelegação de competências foi lavrado despacho: “Revogo o meu despacho de 05.01.2011 na parte relativa ao IRS do ano de 2004, indeferindo em consequência o Recurso Hierárquico referente àquele ano, face aos normativos invocados na informação” – cf. despacho constante de fls. 37 do apenso de Recurso Hierárquico, para o qual se remete e cujo integral teor se dá por reproduzido. 19. Este despacho (facto provado n. º18) foi notificado ao impugnante, através do mandatário constituído, pelo ofício n.º ...9, em 21.12.2011 – cf. fls. 39, 40 e 41 do apenso de Recurso Hierárquico; 20. Em 20.03.2012 deu entrada neste Tribunal Administrativo e Fiscal ... a Petição Inicial que deu origem à presente impugnação – cf. comprovativo de entrega de documento constante de fls. 1 dos autos, numeração referente ao processo físico. Factos não provados Não se provaram as relações comerciais tituladas pelas faturas emitidas por cada um dos emitentes em causa nos autos («EE», «C , unipessoal, Lda.» e «D, Limitada»). Motivação A convicção deste Tribunal fixação da factualidade provada serviu-se dos documentos juntos aos autos, os quais não foram impugnados, entre os quais e contam, o relatório de inspeção tributária bem como as informações prévias e despachos de indeferimento da Reclamação Graciosa e do Recurso Hierárquico; bem como, ainda, o despacho que revogou parcialmente a decisão que recaiu sobre o Recurso Hierárquico, designadamente na parte relativa ao IRS do ano de 2004. No que concerne ao teor do relatório de inspecção tributária há a considerar que consubstancia um documento autêntico, nos termos do art. 371º, n.º 1 do Código Civil, para o que é determinante ser exarado por funcionário da administração tributária, no âmbito e exercício das suas funções, razão pela qual o mesmo tem força probatória plena relativamente aos factos afirmados como sendo praticados pela administração tributária ou com base na percepção dos seus órgãos e que apenas pode ser ilidida nos termos da lei (artigos 363º e seguintes do Código Civil e 546º e seguintes do Código de Processo Civil). Os factos contidos no RIT consubstanciam a percepção do inspetor no âmbito do procedimento inspetivo e aqueles que não forem impugnados devem ser valorados em conjugação com os restantes elementos de prova segundo as regras da experiência comum. A convicção do Tribunal na consideração dos factos não provados, a pretendida prova da substância das faturas utilizadas pelo impugnante na sua contabilidade e desconsideradas pela Administração Tributária no culminar da ação inspetiva, alicerçou-se no facto das testemunhas inquiridas não terem logrado convencer o Tribunal sobre a materialidade das aquisições a «EE», «C , unipessoal, Lda.» e «D, Limitada», as quais o Impugnante considerou como custo. Nesta conformidade, verificamos que a testemunha «GG» , afirmou ter trabalhado para o Impugnante o que aconteceu sempre sem carácter regular (por vezes umas semanas seguidas, outras alturas até podia estar 3 semanas sem ir, outras vezes trabalhava umas manhãs ou tardes), refere-se sempre mais ao ano de 2005 (exercício em causa no âmbito do processo em que ocorreu a inquirição), mas refere que desde 2002 ou 2003 ia quando o impugnante lhe pedia, sempre com caráter esporádico. Relativamente a «EE», disse conhece-lo, identificando-o como fornecedor do impugnante, concretizou que chegou a ir carregar a Valença, Ponte de Lima, Guimarães. Relativamente a Valença, disse que este fornecedor tinha um armazém “com sucata lá dentro”, descrevendo esta instalação, como um terreno a céu aberto e um coberto onde era guardado o cobre, informações manifestamente vagas que nada esclarecem sobre a forma de armazenamento ou capacidade para o mesmo; ou fornecendo, ainda, mais informação sobre localização do designado armazém. Fez, ainda, menção à existência de uma carrinha pick up e às vezes um camião, utilizados para realizar o transporte, este tanto era conduzido pelo fornecedor como por um terceiro. Disse, ainda, que iam, a testemunha e o patrão, no caso o impugnante, carregar aos armazéns do fornecedor («EE»), ou outras vezes aos clientes daquele, os quais ele indicava Apesar de se referir a transportes e a fornecedores, este depoimento revelou-se genérico e insuficiente, não conseguindo a testemunha concretizar, minimamente, as concretas operações comerciais em causa nos presentes autos, datas (desde logo a testemunha nunca se refere ao ano de 2004), locais, quantidades, preços e pagamentos de forma a lograr convencer o Tribunal do efetivo fornecimento e pagamento da sucata a que se reportam as faturas desconsideradas pela AT. Não nos é possível afirmar, com segurança, que no ano de 2004, o impugnante se abasteceu junto deste fornecedor, «EE», na medida das faturas por este emitidas e relevadas na contabilidade pelo impugnante. Por sua vez, a testemunha «NN», atualmente reformado e que foi cliente do Impugnante durante mais de 15 anos, afirmou que lhe comprava sucata. Disse conhecer «EE», «C , unipessoal, Lda.» (sociedade que associa ao “...”) e a «D, Limitada», mas que nunca negociou com nenhum destes. Afirmou ter visto «EE» no armazém do Impugnante, mas nunca presenciou negociações entre este e o impugnante, desconhecendo, assim, preços praticados e condições de negócios. Sendo certo que também este depoimento incide sobre o período de 2005. Assim, este depoimento revelou-se genérico não conseguindo a testemunha especificar as concretas operações comerciais em causa nos presentes autos, especificamente datas, locais, quantidades, preços e pagamentos de forma a convencer o Tribunal do efetivo fornecimento e pagamento da sucata a que se reportam as facturas desconsideradas pela AT relativas ao ano de 2004. Por seu turno a testemunha «HH», empresário no ramo das sucatas, afirmou conhecer «EE» por vê-lo nas instalações do Impugnante, mas nunca negociou com ele. Declarou apenas saber que «EE» tinha negócios com o Impugnante, mas não sabe em que anos é que estas relações comerciais ocorreram, o que é manifestamente insuficiente para criar a convicção sobre a efectiva realização das operações comerciais em causa nos presentes autos. Quanto a «II», sucateiro, afirmou conhecer o Impugnante por estabelecer relações comerciais com ele, disse que por vezes ia ao armazém do impugnante e que «EE» estava lá, apesar do que não soube concretizar qualquer operação comercial, designadamente aquelas que estão em causa nos presentes autos, fornecendo datas, locais, quantidades, preços e pagamentos assim logrando convencer o Tribunal do efetivo fornecimento e consequente pagamento da sucata a que se reportam as faturas lançadas pelo impugnante na contabilidade e desconsideradas pela AT. Por fim, «JJ», irmão do Impugnante, declarou saber que «EE» era sucateiro, fornece e adquire sucata, e sabe que vendia sucata ao irmão, onde o viu algumas vezes, nas instalações do Impugnante a descarregar, não sabe, contudo, concretizar qualquer operação comercial concreta, fornecendo datas, locais, quantidades, preços e pagamentos assim logrando convencer o Tribunal do efetivo fornecimento e consequente pagamento da sucata a que se reportam as facturas desconsideradas pela AT. Pelo exposto, considerado o teor dos depoimentos prestados nos autos, em conjugação pelo apurado em sede de procedimento inspetivo, e atendendo, ainda, às normais regras da experiência, concluímos, necessariamente, que a prova produzida não foi capaz de criar a convicção sobre a efetiva realização das operações comerciais em causa nos presentes autos, nos termos alegados pelo impugnante.» 2.2. De direito O Recorrente («AA») insurge-se contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto de 25.08.2022 que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida, que visou a anulação do despacho de indeferimento de Recurso Hierárquico, datado de 07.12.2011, referente à liquidação oficiosa de IRS do ano de 2004, no valor de € 210.287,28, a que acrescem juros compensatórios e demais encargos, no valor de € 31.963,66. Liquidação essa, emitida na sequência da desconsideração pela AT das facturas emitidas por «EE», “«C , unipessoal, Lda.»” e “«D, Limitada»” do exercício fiscal de 2004, as quais foram relevadas pelo impugnante na sua contabilidade. O Recorrente alicerçou a sua Impugnação, invocando, em suma, (i) da falta de sustentação para o procedimento a que houve lugar após o despacho de deferimento do RH no que concerne à liquidação em causa nos autos (IRS de 2004), (ii) e da ilegalidade da liquidação por erro sobre os pressupostos de facto, consubstanciado na inexistência de facto tributário. O Tribunal a quo conhecendo dos vícios que identificou, considerou que “ não se coloca a questão da definitividade do ato de deferimento do Recurso Hierárquico, relativamente à liquidação de IRS de 2004, tendo o ato revogatório sido praticado dentro do prazo legalmente fixado para o efeito, não enferma este ato de qualquer ilegalidade”, e que do quadro indiciário referido no relatório de inspecção, não merece censura a conclusão da AT, no sentido de que as facturas em causa não se reportam a transacções reais e que o Impugnante não fez a prova, que se lhe impunha, de que adquiriu os bens titulados pelas facturas e que os mesmos lhe foram fornecidos pelo emitente das mesmas. Concluindo, assim, que os valores relevados contabilisticamente pela Impugnante relativos às facturas emitidas a seu favor por “«C , unipessoal, Lda.»”, “«D, Limitada»” e “«EE»” no ano de 2004 “titulam operações reais, motivo pelo qual não merece censura a atuação da AT em desconsiderar os custos declarados pelo Impugnante e, consequentemente, corrigir o lucro tributável declarado, procedendo à correspondente liquidação de IRS”. A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, invocando, no essencial, que a sentença recorrida enferma de (i) nulidade por omissão de pronúncia, conforme artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, alegando, que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre questões ou pretensões que devia apreciar, cuja apreciação lhe foi colocada; (ii) erro de julgamento da matéria de facto por errónea valoração da prova, e erro de julgamento da matéria de direito Importa apreciar se a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia e, se padece dos erros de julgamento de valoração da matéria de facto e de direito que lhe são imputados pelo Recorrente. 2.2.1. Da Nulidade por omissão de Pronúncia Analisadas as conclusões formuladas pelo ora Recorrente e motivação do recurso jurisdicional em apreço, constata-se que a mesma ataca a sentença impugnada, imputando-lhe nulidade por omissão de pronúncia, conforme artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, alegando, tout court, que o Tribunal a quo “(...) não pronunciou sobre questões ou pretensões que devia apreciar, cuja apreciação lhe foi colocada./ Com efeito, as pretensões que os litigantes submeteram à apreciação do Tribunal e as respectivas causas de pedir, com pressupostos em que as partes fundam a sua posição na controvérsia. Não restam dúvidas que esta questão determina questões concretas controversas que importa resolver. / Emerge, deste modo, nulidade por omissão de pronúncia a sentença proferida pois não conheceu todas as questões que devia conhecer, não as resolvendo conforme era alegado e peticionado.” (vide conclusão d- Falta de fundamentação (omissão de pronúncia) e corpo das alegações item b-) Vejamos. Nos termos do disposto no artigo 125º nº 1 do CPPT, constituem causas de nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão, a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer. A nulidade por omissão de pronúncia tem lugar apenas quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do tribunal sobre questões que deveria conhecer, o que, de acordo com o disposto no artigo 608º, nº2 do CPC [aplicável ex vi artigo 2º, al. e) do CPPT], significa que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas, cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Portanto, a apontada nulidade só ocorre nos casos em que o tribunal “pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão sobre a qual devesse tomar posição, inclusivamente não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento. No entanto, mesmo que entenda não dever conhecer de determinada questão, o tribunal deve indicar as razões por que não conhece dela, pois, tratando-se de uma questão suscitada, haverá omissão de pronúncia se nada disser sobre ela” (vide, Jorge Lopes de Sousa, in CPPT, anotado e comentado, volume II, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, pág. 363. Neste sentido, entre muitos outros, podem ver-se os acórdãos do STA de 13.07.11 e de 20.09.11, proferidos nos recursos nºs 0574/11 e 0268/11, respectivamente). E, como se refere no acórdão do STA de 11.03.2015, proferido no âmbito do proc. nº 01035/12, “a nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixar de apreciar questão que devia conhecer (artigos 668.º, n.º 1, alínea d) e 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil revogado, aplicável no caso sub judice). (…) Numa correta abordagem da questão importa ainda ter presente, como também vem sublinhando de forma pacífica a jurisprudência, que esta obrigação não significa que o juiz tenha de conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes hajam produzido. Uma coisa são as questões submetidas ao Tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa para fazer valer o seu ponto de vista. Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.” Em reforço deste entendimento, cumpre salientar o expendido no acórdão do STA de 12.06.2018 [processo n.º 0930/12.7BALSB] “(…) 24. Caraterizando a arguida nulidade de decisão temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2, CPC]. 25. Com efeito, o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos/pretensões pelas mesmas formulados, ressalvadas apenas as matérias ou pedidos/pretensões que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se haja tornado inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões. 26. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada a parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio (…)”. Munidos destes ensinamentos e jurisprudência, em jeito de súmula, temos que: «O conceito de questões abrange tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem» (cf. Jorge Lopes Sousa, in CPPT Anotado, 6.º Ed., vol. II, p. 363). A este propósito, refere-se que «as questões que o tribunal deve apreciar e decidir são apenas aquelas que contendem directamente com a substanciação da causa de pedir, do pedido e das exceções, não se confundindo com as considerações, argumentos, motivos, razões ou juízos de valor produzidos pela parte (e, portanto, quanto a estas últimas, o tribunal não só não tem de ser pronunciar, como nenhuma consequência daí advirá se o não fizer, nomeadamente, não configurando tal situação uma omissão de pronúncia)» (cf. Helena Cabrita, in A sentença cível, Fundamentação de facto e de direito, Almedina, 2019, p. 235). «O conhecimento de todas as questões não significa que o tribunal tenha de conhecer de todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes e só a falta de conhecimento de questões constitui nulidade por omissão de pronúncia» (cf. Jorge Lopes de Sousa, in ob cit, p.364). Cientes de tais princípios e uma vez compulsada a petição inicial (nomeadamente os seus 27 itens) e a sentença sob recurso, contata-se que não vislumbramos ocorrer qualquer omissão de pronúncia, tarefa que espigamos por nós, perante a afirmação genérica, sem qualquer conteúdo concreto, que decorre das alegações de recurso do Recorrente, o qual não identifica em concreto o substracto da questão que colocou e em que termos, o misso, havia sido por si invocada na sua petição inicial e cujo conhecimento tenha sido preterido pelo tribunal a quo, tarefa que nos propomos clarificar, ciente da alusão desprovida do mais de “falta de fundamentação”. Ora, no caso dos autos, analisando os artigos 3.º a 23.º da petição da impugnação judicial deduzida não se apresenta como defensável a tese de que o Recorrente tenha alegado a falta de fundamentação da liquidação adicional de IRS. Na verdade, todo o discurso argumentativo aí aduzido tende a servir de suporte apenas à invocação dos erros nos pressupostos em que os serviços da inspecção incorreram determinantes das correcções meramente aritméticas aplicadas à matéria tributável, apresentando e colocando em causa os factos-índices carreados e esgrimindo factos a conduzir ao probatório mediante a competente prova, sobre o transporte, modos de pagamento, ostentação financeira, conducente a atestar da efectivação das transacções comerciais postas em causa, concluindo “(...) que a Administração, como lhe competia, não avança um só facto certo que, com suficiente razoabilidade e justificação, lhe permita concluir pela incerteza da materialidade das operações – a compra da sucata pelo reclamante – baseando-se em factores exógenos e laterais e, essencialmente, em elementos da entidade ou pessoas emitentes das facturas ..., isto é, limita-se a analisar a contabilidade, declarações e actuação das entidades emitentes, como se o impugnante pudesse ou devesse controlar o comportamento das pessoas com quem contacta ou contrata...Desprezando, sem suficiente justificação ou razão, as explicações do Impugnante relativamente a actos e documentos que lhe diziam respeito ... não curando, minimamente, de apurar da veracidade de tias declarações/explicações, tanto mais, que daí se deveria inferir decisivamente a convicção da falaciosidade dos documentos em apreço.” e, prossegue “Por tudo, carece – na forma especifica apontada – de fundamentação suficiente, expressa e inequívoca, o acto tributário impugnado, sendo a consequência da fundamentação insuficiente, a falta de fundamentação...”. Mais acresce, o que vem reforçado no pedido formulado a final da petição no sentido de que não emerge sustentação na liquidação adicional que se impugna, ressaltando, a inexistência do facto tributário ou ilegalidade do acto tributário, sem que haja qualquer alusão a respeito da nulidade da liquidação por falta de fundamentação de facto e de direito. Para uma arguição consequente e efectiva do vício de falta de fundamentação da liquidação não basta a invocação de forma vaga, desprovida de alegação factual e sem atinência à liquidação em causa nos autos do princípio da “obrigação legal de fundamentar a decisão, tal como se exige no artigo 77.º da LGT (art.º 4.º da impugnação). Por outras palavras, apesar de aludir expressamente a nulidade por omissão à falta de fundamentação, em momento algum contextualizou e argumentou a avocada falta de fundamentação, pois todo o seu inconformismo e argumentação redunda na não aceitação do percurso seguido pelos Serviços de Inspecção Tributária e os índices levados em consideração para concluir que não ocorreram as transacções com os fornecedores referenciados. Mais se diga, que aquilo que o Impugnante aclama de falta de fundamentação redunda em não aceitação, pois todo o seu discurso que antecede tal afirmação tem como prerrogativa abalar a credibilidade dos índices constantes do RIT. E, tendo a sentença sob recurso proferido julgamento sobre a legalidade da liquidação por erro sobre os pressupostos de facto de direito, apreciando e valorando a prova constante dos autos, conhecendo do esgrimido na petição, ficamos na dúvida, sobre qual a questão em concreto, por si alegada, cujo conhecimento foi omitido, perguntamos nós?? Pois que, como já referimos em sede de recurso não alcançamos em que medida a “falta de fundamentação” havia sido suscitada e contextualizada em sede de petição, e brincando com as palavras, diríamos não encontramos a questão fundamentada de modo a ser merecedora de apreciação de forma individualizada. Por outras palavras de que modo o por si alegado em sede de petição inicial não foi relevado em sede de julgamento, pois que por nós temos, que a sentença sob recurso considerou as questões que lhe foram colocadas, não estando o Tribunal a quo obrigado a relevar todos os argumentos usados pelas partes, nomeadamente uma ilação jurídica desprovida de argumentos. Diríamos que pouco importa a roupagem atribuída, sob pena de no limite bastar-se às partes a simples alegação de vícios aos actos em sede de impugnação, sem mais, para que sobre o julgador recaísse a obrigação do conhecimento de todas elas, porque simplesmente foram aludidas. Como assim, analisada a petição inicial e, a sentença recorrida, não divisamos em que medida a “questão fundamentação insuficiente” foi omitida. A sentença não é omissa mesmo que não tome conhecimento de toda a argumentação e circunstancialismo invocado para sustentar os vícios imputados ao acto impugnado, in casu, inexistência do facto tributário por estarmos perante transacções reais, sem prejuízo de tal constituir erro de julgamento. Na decisão recorrida a Mmª Juiz a quo equacionou e apreciou as questões jurídicas controvertidas, ou seja, da legalidade do despacho revogatório emitido e da questão da legalidade das liquidações impugnadas na óptica dos erros nos pressupostos das correcções operadas, que lhes era imputado. Por isso, tendo conhecido das questões para que fora solicitada a sua intervenção, embora se admita sem referenciar aferir das correcções pela óptica da falta de fundamentação formal, a ela atendeu na sua substância ao conhecer dos indícios e valorando a prova constante dos autos, não cometeu, a sentença proferida, o suscitado vício de omissão de pronúncia. Consequentemente, inexiste a apontada nulidade. 2.2.2. Do erro de direito – da legalidade do despacho revogatório Quanto a esta questão alega o recorrente, que ao estarmos “(...) perante um acto decisório que revoga um acto, também, decisório, anteriormente praticado, que deferiu o Recurso Hierárquico apresentado, pelo que, em caso algum, poderia cair na previsão do regime do artº 79º da LGT, que se refere á revogação de actos tributários de liquidação ou relacionado com outras obrigações tributárias. Os art.s 163º e 168º, do CPA, referem-se á anulação administrativa e não á revogação administrativa, cujos condicionalismos são regulados no art. 167º do mesmo normativo, cumprindo referir que, já a versão vigente, ao tempo, previa, no artº 140º, o regime previsto na referida al. a), com menção ao prazo no art. 141º, que, no caso, deveria ser o previsto no CPPT, já que estamos no domínio do processo tributário. Há, pois, que concluir, que – produzindo e criando na esfera do Impugnante um efeito jurídico estável e consistente, e uma óbvia confiança legitima que deveria ser protegida – pela definitividade da situação tributária, na base na decisão de recurso hierárquico, anteriormente, proferido, não permitindo o acto que aqui se impugna.” A este propósito, sustentava o Recorrente a decisão impugnada é aquela que revogou a decisão proferida em sede de Recurso Hierárquico que sustentava o despacho proferido em 05.01.2011, por ter entendido a AT que, face à redação do art. 45º, n. º4 da LGT o prazo de caducidade relativo ao imposto relativo ao exercício de 2004, ainda não se tinha esgotado, ponderou-se na sentença sob recurso o seguinte: «O impugnante insurge-se, apenas, sobre a possibilidade de revogação do despacho de deferimento de Recurso Hierárquico, na parte relativa à liquidação de IRS do exercício de 2004, não questionando a questão de mérito desta decisão da AT, em concreto sobre a verificação, ou não da caducidade do direito à liquidação, esgota a sua argumentação na (im)possibilidade de revogação de uma decisão, que considera definitiva. Impõe-se, assim, averiguar se a AT pode, legitimamente, revogar a decisão por si proferida, já notificada ao contribuinte, ou se a tal se opõe o seu caráter definitivo. De acordo com a factualidade provada temos que [factos provados n.º 14 e 15] em 05.01.2011 a AT proferiu despacho de deferimento de Recurso Hierárquico relativamente à liquidação de IRS de 2004, notificado ao impugnante [facto provado n.º 16] por ofício de 09.02.2011. Não constando dos autos comprovativo de entrega desta notificação, tem-se por notificado o impugnante em 14.02.2011, terceiro dia útil seguinte ao envio da carta em 09.02.2011 (quarta-feira), art. 249º, n.º1 do Código de Processo Civil. Em 07.12.2011 a AT emite novo despacho revogando aquele por si proferido em 05.01.2011, decisão esta que incidiu sobre a sua decisão de procedência de Recurso Hierárquico relativamente à liquidação de IRS de 2004, improcedendo, agora, o mesmo [facto provado n. º18]. Esta nova decisão, ato revogatório, foi notificada ao impugnante em 21.12.2011 [facto provado n.º 19]. Importa assim definir a validade daquele ato revogatório. Relativamente a esta possibilidade já se pronunciaram os tribunais superiores, designadamente o Supremo Tribunal Administrativo, concretamente na decisão que seguiremos de 15.03.2017, no processo 0449/14, relatado por Casimiro Gonçalves e disponível em www.dgsi.pt. Esta decisão formula a questão a decidir nos seguintes termos, os quais se revelam em tudo semelhantes à questão a decidir nos presentes autos: “qual é o prazo de revogação de decisão de deferimento de reclamação graciosa interposta contra um acto de liquidação de IRS, na qual foi deferida a pretensão dos contribuintes: trata-se, no essencial, de apreciar a legalidade da decisão do DF de ... que, revogando anterior decisão em que se deferira a pretensão dos contribuintes, veio a deferir apenas parcialmente essa pretensão (a primitiva decisão deferindo a pretensão dos impugnantes fora proferida em sede de reclamação graciosa apresentada contra o acto de liquidação de IRS).”. No caso dos autos importa saber qual é o prazo de revogação de uma decisão de deferimento (ainda que parcial a revogação incidiu unicamente sobre a parte que havia procedido) de Recurso Hierárquico; importa assim descortinar da legalidade da decisão de revogação da anterior decisão onde havia procedido a pretensão dos contribuintes relativamente à liquidação de IRS de 2004, que agora, pelo despacho revogatório, veio a improceder. Discorrendo sobre a possibilidade legal de revogação de atos administrativos em matéria tributária, bem como no que concerne ao regime legal aplicável, diz o identificado acórdão: “A possibilidade legal de revogação dos actos administrativos em matéria tributária está prevista no art. 79º da LGT (a revogação é um acto que faz cessar ou elimina os efeitos de um acto anterior, com fundamento na sua inconveniência ou invalidade, estando o respectivo regime previsto nos arts. 138º a 146º do CPA). Todavia, não constando da LGT nem do CPPT norma definidora do prazo para tal revogação, é incontroverso que hão-de acolher-se as regras constantes dos arts. 136º e ss. do CPA, que directamente regulam a revogação dos actos administrativos [sendo que o CPA constitui legislação complementar e subsidiária ao direito tributário — arts. 2º, al. c), da LGT e 2º, al. d), do CPPT (Cfr., por todos, o ac. desta Secção do STA, de 15/5/2013, proc. nº 0566/12; bem como Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge de Sousa, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4ª ed., 2012, anotação 1 ao art. 79º, p. 724 e Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária, anotada, Editora Rei dos Livros, pág. 350, nota 7.)].” Atualmente o regime da anulabilidade dos atos administrativos está regulada no art. 163º do CPA, no que aos autos importa no n. º4, norma que nos diz: “Os atos anuláveis podem ser anulados pela Administração nos prazos legalmente estabelecidos.”. Sendo que o art. 168º do CPA dispondo sobre os condicionalismos aplicáveis à anulação administrativa, fixa no seu n. º2 o prazo de um ano, a contar da data da sua emissão, para a anulação administrativa de um ato constitutivo de direitos. Assim, o ato de revogação do ato administrativo de deferimento de Recurso Hierárquico, está subordinado às referidas normas do CPA, pelo que a AT dispõe de um ano, a contar da data da emissão do ato revogado para a emissão deste segundo ato, de natureza revogatória. Pelo exposto, tendo o ato inicial sido emitido em 05.01.2011 (facto provado n. º15) e notificado ao contribuinte em 14.02.2011 (facto provado n.º 16), sendo que o ato revogatório data de 07.12.2011 (facto provado n. º18), temos que não se encontrava, então, ultrapassado o prazo de um ano de que dispunha a AT para a sua revogação. Assim, porque não se coloca a questão da definitividade do ato de deferimento do Recurso Hierárquico, relativamente à liquidação de IRS de 2004, tendo o ato revogatório sido praticado dentro do prazo legalmente fixado para o efeito, não enferma este ato de qualquer ilegalidade, tal como pretendido pelo impugnante.» Dessa forma concluindo que a actuação da administração tributária nessa matéria se mostrava correcta. Também é esse o nosso entendimento. Com efeito, revemo-nos na fundamentação aduzida na sentença, a qual apoiada de jurisprudência firmada do STA, não nos merece qualquer reparo, não colhendo a tese do Recorrente de afastar aplicação do regime previsto no CPA, nos termos em que foi efectuada. 2.2.3. Do erro de julgamento de facto O Recorrente começa por imputar à sentença recorrida o erro de julgamento de facto, na sua modalidade de erro na apreciação da prova, que consiste no “erro de avaliação” do concreto meio de prova, ou seja, “um erro sobre que factos estão representados por um dado meio de prova” (cf. PINTO, Rui – Manual do Recurso Civil. Volume I. Lisboa, AAFDL editora, 2020, pág. 31), no caso, na prova testemunhal por si apresentada. Alega que “Atenta a forma unânime, concordante, circunstanciada, (ainda que não concreta e pormenorizada em termos identificativos das facturas), se expressaram as testemunhas inquiridas, conforme discriminado na sentença, deveria ter sido considerado como provado que houve lugar ás operações de compra e venda de mercadoria entre o Impugnante e os fornecedores, tituladas pelas faturas em causa nos autos. Deveria ter sido, ao menos, dado como facto provado que todos os fornecedores forneceram, por mais de uma vez, material de sucata ao Impugnante./ ASSIM, baseando-se toda a decisão no pressuposto de que não houve lugar a qualquer transação comercial entre as identificadas pessoas, ressalta o consequente vicio de julgamento que se invoca e cumpre reparar. Com efeito, a errada consideração de um pressuposto ou circunstância fundamentadora, acarreta necessariamente uma falha em toda a cadeia lógico-dedutiva, a inquinar a decisão, que, por certo, outra seria não fora a inexata suposição.” (cf. conclusões e- e f-) Podemos, pois, concluir que para além de errada apreciação dos factos dados como provados que redunda em erro de julgamento de direito, avoca o Recorrente que deveria ser levado ao probatório “que houve lugar ás operações de compra e venda de mercadoria entre o Impugnante e os fornecedores, tituladas pelas faturas em causa nos autos” e, de que “todos os fornecedores forneceram, por mais de uma vez, material de sucata ao Impugnante.” Porém, o Recorrente não cumpre o ónus de especificação que sobre si impendia, nos termos do disposto no artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT, e que encontra a sua razão de ser na necessidade imperiosa de garantir o direito ao contraditório, por um lado, e por outro, de salvaguardar “a rigorosa delimitação do objeto do recurso, até porque o sistema consagrado não permite recursos genéricos contra a matéria de facto” (cf. Geraldes, António Abrantes, Pimenta, Paulo, e Sousa, Luís Filipe Pires de – Código de Processo Civil Anotado. Vol. I. 2.ª edição, reimpressão. Coimbra: Almedina, 2020, págs. 797-798). Assim, pretendendo o Recorrente questionar a apreciação de prova testemunhal, que se encontra gravada, impunha-se-lhe que indicasse com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, ou que procedesse à transcrição dos excertos que considera relevantes, tendo esta omissão por consequência inexorável a imediata rejeição do seu recurso neste segmento - cf. alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º do CPC, aplicável ex vi artigo 281.º do CPPT. Assim sendo, e porque o Recorrente não cumpre o ónus de especificação que lhe era imposto nos termos do disposto do art. 640.º do CPC, aplicável ex vi art. 281.º do CPPT, não cumpre proceder a qualquer alteração ou aditamento ao probatório consignado na sentença, cumprindo tão só a este Tribunal ad quem aferir do eventual erro na apreciação e valoração da matéria de facto e consequentemente, no julgamento de direito e nas soluções jurídicas preconizadas na sentença. 2.2.4. Do erro de direito Prosseguindo, se bem interpretamos a motivação do recurso e suas conclusões, o Recorrente questiona o cumprimento do ónus da prova da Administração Tributária, que, entende, não terá sido alcançado. Para tanto, alega, que “Concluiu a Meritíssimo Juíza a quo, estar demonstrada enunciação de indícios fortes e consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada, de que as operações referidas nas facturas são simuladas e que, por isso, são insusceptíveis de ser levadas a custos no apuramento da matéria coletável. / Não é verdade. É notório que a Administração Tributária não recolheu indícios que legitimam a sua actuação no sentido de não aceitar as facturas em causa nos autos, ou seja, não cumpriu com o ónus que sobre si impendia no sentido de fundamentar a liquidações impugnadas, as quais estão, assim, feridas de ilegalidade, impondo-se determinar a anulação das liquidações impugnadas, por força da anulação da decisão recorrida” (cf. conclusões g- e h-). Em causa está uma liquidação adicional de IRS, da categoria B, e correspondentes juros compensatórios, fundada na desconsideração de gastos (na terminologia da época, “custos”) deduzidos pelo Recorrente, titulados por faturas desconsideradas pela AT nos termos do disposto nos n.ºs 2 e 3 do art. 19.º do CIVA, por se ter entendido que as mesmas tinham subjacentes operações (transmissões de bens) simuladas, assim se considerado não estarem reunidos os pressupostos previstos no art. 23.º do CIRC, em conjugação com o disposto no art. 32.º do CIRS, para a respetiva aceitação. Atento o inconformismo do Recorrente, cumpre atentar ao regime do ónus da prova nesta matéria e sua repartição, referindo-se desde já que a sentença recorrida não incorre em qualquer erro de direto, efetuando uma correta interpretação do regime legal aplicável. De facto, e como tem sido confirmado e reiterado consistentemente pela jurisprudência dos nossos tribunais superiores, para que a AT proceda à correção do lucro tributável por desconsideração dos custos suportados por faturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efetivamente realizado as operações nelas descritas, deverá abalar a presunção de veracidade da declaração do imposto e dos respetivos documentos de suporte (cf. art. 75.º da LGT), sendo que para tanto a prova que lhe cabe produzir não tem de ser directa e dogmática, no sentido de evidente e intocável, antes pode resultar de circunstâncias colaterais e indirectas que, atentas a idoneidade dos respectivos meios de suporte e as regras da experiência comum, indiciem, segundo padrões de avaliação e aferição pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, um determinado resultado como o mais legitimamente atendível. Ora, esta constatação é inteiramente transponível para as situações, como a que está em causa nos presentes autos, em que o contribuinte pretende exercer o direito de deduzir “custos” fiscais no apuramento do lucro tributável para efeitos de IRC, no caso, para efeitos de IRS, por estarem em causa rendimentos da categoria B (cf. neste sentido os Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo proferidos em 16.03.2016, no proc. n.º 0400/15; de 19.10.2016, no proc. n.º 0511/15; de 16.11.2016, no proc. n.º 0600/15, e de 27.02.2019, no proc. 01424/05.2BEVIS 0292/18). Concretizando, “[n]o que concerne à prova que compete à Administração, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientemente indiciadores a que o Tribunal possa concluir, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência, pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”, sendo certo que, e ao contrário do que parece pretender a Recorrente, a AT poderá nessa tarefa, como é aqui o caso “lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado” (cf. entre outros os acórdãos proferidos pelo TCAS de 25.05.2017, no proc. 08666/15, e de 14.02.2019, no proc. 509/09.0BELRA). Cumpre ainda referir, de que, nas situações em que a AT desconsidera facturas com o fundamento de que “são falsas” (o que se verifica in casu) se aplicam as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, quais sejam, firmada na jurisprudência dos nossos tribunais superiores, de que compete à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade, feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção (neste sentido, entre muitos outros, acórdãos do STA, de 24.04.2002, Recurso nº 102/02; de 23.10.2002, Recurso nº 1152 /02; de 09.10.2002, Recurso nº 871/02; de 20.11.2002, Recurso nº 1483/02; de 30.04.2003, Recurso nº 241/03; de 14.01.2004, Recurso nº 1480/03 e do TCAN, acórdão de 24.01.2008, Processo 01834/04BEVIS, de 24.01.2008, processo n.º 2887/04BEVIS, de 27.01.2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18.03.2011, processo n.º 456/05BEPNF). No caso concreto, a Administração Tributária alicerçou a liquidação em sede de IRS na existência de facturas emitidas pelos “fornecedores” «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE», desconsiderado o valor nelas oposto como custo fiscal por falta de prova da efectividade das transacções comerciais decorrentes das mesmas, vertendo no relatório a fundamentação de tal desconsideração. Sendo que, tratando-se de contabilidade baseada em facturação que apenas pretende dar um crédito de aparência a negócios ou operações simuladas, a Administração Tributária não está obrigada a fazer a prova dessa simulação e muito menos provar a falsidade dos documentos, apenas lhe cabendo o ónus de prova dos indícios objectivos, sólidos e consistentes que colocam em causa a presunção de veracidade dos documentos (cfr. art.º 75.º, n.º 1, da LGT) e que traduzem uma muito elevada probabilidade dos documentos não titularem operações que correspondam à realidade. Cumpre ainda atentar, como é pacificamente aceite pela jurisprudência, que não é imperioso que a Administração efectue uma prova directa da simulação, como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxilio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quando aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova“– cfr. Alberto Xavier, in “Conceito e natureza do Acto Tributário”, pág. 154. E suma, à Administração Tributária apenas compete provar os indícios sérios da intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração (animus decipiendi), do acordo entre o declarante e o declaratário, com o intuito de enganar o Estado (animus nocendi) - (cfr. artigo 241.º, n.º 1, do Código Civil) -, subjacentes às operações acima referidas, sem que tenha de se colocar na posição de quem invoca a simulação, com o ónus de a provar segundo a regra do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil. Aliás, a dificuldade de prova directa do acordo simulatório leva a jurisprudência a admitir que a mesma pode resultar de factos que o indiciem ou façam presumir (cfr. entre outros o acórdão do pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 16.03.2016, proferido no âmbito do processo 400/15). Como se refere no acórdão do TCA Norte, de 23 de novembro de 2012 (processo n.º 1523/05.0BEVIS), “no que concerne à prova que compete à Administração – na repartição do ónus da prova de que demos nota supra-, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” (expressão de Castro Mendes citado por Saldanha Sanches), pela elevada probalidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”. Nesta tarefa, poderá Administração lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não tem necessariamente que advir exclusivamente de elementos do próprio contribuinte fiscalizado. Munidos do enquadramento jurídico gizado quanto ao ónus da prova aplicável, cumpre aferir se por via dos factos apurados em sede inspectiva, AT fez prova da verificação de indícios que lhe permitiam concluir que as questionadas facturas dos emitentes «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE» do exercício de 2004 não tiveram subjacentes quaisquer operações económicas realizadas entre ele e o Recorrente. Ora, no que diz respeito aos factos indiciadores decorrentes do RIT a sentença sob recurso de modo cáustico, detalhado e com elevada incidência numa análise critica dos factos recolhidos em abundância pelos SIT, aferindo da conduta e colaboração do sujeito passivo durante a inspecção, concluiu que os mesmos se revelam adequados ao cumprimento do ónus da prova que lhe cabia, o que o Recorrente não logrou abalar, na medida que não efetuamos qualquer alteração à decisão da matéria de facto, não vemos motivo para nos afastarmos do que aí ficou decidido, aderindo in totum aos fundamentos da sentença que aqui recuperamos, por via da sua transcrição: «Na situação dos autos, resulta do probatório, além do mais, que: a) O Impugnante declarou perante a AT dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal; b) iniciado o procedimento inspetivo em causa nos presentes autos foi solicitada ao Impugnante a apresentação dos elementos integrante desta contabilidade (registos e documentos de suporte); c) em resposta, o Impugnante comunicou não dispor da contabilidade por lhe ter sido furtada; d) foi, por isso realizada nova notificação para proceder à organização da escrita, bem como para a apresentação da contabilidade depois de reorganizada, fixando-se para o efeito o prazo máximo que a lei prevê; e) o Impugnante não procedeu à reorganização e apresentação da contabilidade, no prazo fixado; f) foi, assim, notificado para esclarecer as razões da apresentação dos livros obrigatórios da escrita, registos auxiliares e respectivos documentos de suporte relativos aos anos de 2004 e 2005; g) o Impugnante respondeu remetendo para a resposta “não existem tais documentos pela razões apresentadas em sede própria” (sempre a referência ao furto da documentação contabilística); h) Foi pedido esclarecimento a esta resposta; i) Tendo o Impugnante informado que “tais questões devem ser entendidas, respondidas ou explicadas pelas respostas anteriores, ainda que pelo facto de não ser possível responder-lhes. No caso concreto, o declarante participou às autoridades policiais um furto onde se incluiu (provavelmente por se encontrar numa mala que ostentava pelo aspecto exterior interesse quanto ao conteúdo) toda a documentação comercial básica como, além dela, documentação meramente de suporte à gestão da empresa (como, por exemplo, os documentos de transporte). O declarante, como sabe ser do seu interesse, não pretendeu, nem pretende, deixar de apresentar quaisquer elementos, desde que os possua. Aliás, não pode deixar de reprovar e protestar pela forma como é colocada esta (e também outras) questão”; j) foi comunicado aos SIT que o gabinete de contabilidade responsável pela execução da escrita do Impugnante dispunha dos registos contabilísticos em suporte informático; k) foi testada a conformidade dos registos contabilísticos em suporte informático em relação aos valores declarados junto da AT extraindo-se do RIT que “não se detectaram divergências para além daquela que adiante se dá nota (ver correcções em sede de IVA). Quer isto dizer que, salvaguardada a excepção antes mencionada, os valores declarados revelaram-se conformes aos valores presentes nos aludidos registos contabilísticos em suporte informático”; l) os SIT não examinaram as faturas emitidas por «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE»; m) tendo concluído que a não exibição da contabilidade da entidade inspecionada resultou um considerável empobrecimento da informação disponível. Não foi assim possível testar a coerência dos documentos emitidos a propósito das transmissões facturadas por «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE» e contabilizadas por «AA». Temos assim que o Impugnante não supriu a falta dos livros obrigatório de escrita, registos auxiliares e respectivos documentos de suporte relativos ao ano de 2004, não, por isso, tendo os SIT examinado as facturas emitidas por aquelas três entidades, «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE», atendendo àquela factualidade. Relativamente a pagamentos, resulta do relatório (facto provado n.º5) que “chama-se a atenção para o facto da entidade inspecionada não relevar contabilisticamente as movimentações de contas bancárias. ...”, omissão esta que dificulta, se não inviabiliza mesmo, o controlo por parte do AT (correspondência entre a movimentação bancária e a respectiva operação comercial). Pelo exposto, incumbia sobre o impugnante a obrigação de reconstituir a contabilidade (neste sentido, Acórdão do TCA Norte de 17.03.2016, proc. n.º 06178/12, disponível em www.dgsi.pt), contudo, este limitou-se a reiterar que a contabilidade havia sido furtada, nada fazendo no sentido de preencher as lacunas resultantes daquela falta. Ora, não obstante o alegado furto impunha-se, naturalmente, ao impugnante, responsável pela elaboração da contabilidade e da sua apresentação, que envidasse esforços para aquela reconstituição (designadamente, pedido de segundas vias ou alegar eventual impossibilidade de as obter) ou esclarecer os motivos pelos quais não a realizava, o que não sucedeu. Como se afirma no Acórdão do TCA Norte de 17.03.2016, proc. n.º 06178/12, em situação análoga (incêndio) “perante a ocorrência de um incêndio que destruiu a contabilidade do Impugnante relativa aos anos que foram objecto de inspecção, não parece curial (nem tão-pouco decorre da lei ou dos princípios que norteiam a actividade administrativa) que, para efeitos de justificar o direito à dedução do IVA, se cometa à AT a obrigação de reconstituir a contabilidade, quando – e isto é importante – notificado para tal, e para exibir os documentos relevantes, o sujeito passivo nada fez”. Deste modo e atento o disposto pelo art. 75º, n.º 2, a) da LGT quando as declarações, contabilidade ou escrita revelarem omissões, erros, inexactidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo cessa a presunção de veracidade, que resulta do n.º1 do mesmo preceito. Assim, faltando os documentos de suporte das transacções do ano 2004 (custos indocumentados) cabe ao impugnante o ónus de prova da materialidade das transacções tituladas pelas facturas desconsideradas pela AT. Não merece, por isso, censura a actuação da AT quando concluiu que as transmissões facturadas por «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE» ao aqui impugnante não poderiam ser consideradas como custo, nos termos do art.º 23.º, n.º 1 do CIRC ex vi art.º 32.º do CIRS, o que resulta da conjugação dos seguintes factos: (i) Informação recolhida em anteriores ações inspetivas realizadas aos emitentes de faturas, tais como «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE»; (ii) Esta foi sistematizada consideradas as instalações afetas (incongruências entre locais de carga e descarga); testemunhos recolhidos em sede de ação inspetiva; meios de transporte das mercadorias e análise da capacidade para a realizar, a qual se revelou manifestamente insuficiente, consideradas as elevadas quantidades (várias toneladas) e a disparidade de locais, de carga e descarga (distantes entre si); anómala relação entre as grandezas declaradas, concretamente uma desproporcionada relação entre inputs e outputs, mais precisamente entre o custo das mercadorias vendidas e as vendas de mercadorias espelhada nos indicadores margem bruta na venda de mercadorias e margem bruta I; o emitente «EE» recusou identificar os supostos fornecedores de tais mercadorias; inverosimilhança do modo de pagamento adotado para os fornecimentos realizados; inexistência ou inexatidão de documentos de transporte relativos às entregas de mercadorias que a entidade inspecionada afirma terem acontecido; incongruências detetadas na articulação entre a numeração e a datação das faturas emitidas por «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE»;; incongruência dos esclarecimentos prestados pela entidade inspecionada relativamente a todos os itens que lhe foram propostos; (iii) Declarações de «EE» no sentido de ter cessado as relações comerciais com o Impugnante no último trimestre do ano 2003; (iv) Esclarecimentos pedidos ao aqui Impugnante tendo este sido incapaz de esclarecer os seguintes aspetos: impulso negocial para os fornecimentos, modo de integração dos fornecedores na respectiva carteira, modo de fixação dos preços, existência de encomendas prévias, proximidade das quantidades adquiridas em relação às quantidades oferecidas ou às quantidades procuradas; origem provável das mercadorias adquiridas; identificação das pessoas com quem foram acordados os termos em que se efectuaram as aquisições; existência de entregas parcelares; contornos em que se teriam efectuado os transportes; recepção das facturas; momento em que se verificou o pagamento das mercadorias adquiridas; razões para a ocorrência de adiantamentos; razões que levaram às variações nos montantes anuais adquiridos; (v) Inexistência de elementos essenciais da contabilidade, falta que não foi suprida pelo sujeito passivo, apesar de lhe ter sido pedido que o fizesse e da sua apresentação se compreende entre as suas obrigações. Vejamos, então, se o impugnante alegou e demonstrou que as transacções tituladas pelas faturas por si relevadas em sede contabilística, foram realmente concretizadas, nos termos constantes dos custos declarados à AT, ou seja, que os fornecimentos de sucata, alegadamente realizadas pelos seus fornecedores «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE», foram concretizados e são, por isso, reais. Em termos rigorosos, verificamos que o impugnante nem sequer alegou os factos essenciais à sua prova e demonstração - datas, valores, quantidades, locais, pagamentos, movimentos bancários, correspondência entre estes movimentos e os pagamentos ou adiantamentos de cada uma das operações comerciais postas em causa pelo RIT. Na realidade, verificamos que, em sede impugnatória, o impugnante se limita a alegar, sempre de forma vaga que se reputa de genérica, que as faturas titulam negócios reais. É, assim, insuficiente alegar, por ser manifestamente genérico, que por vezes ia acompanhado pelos pessoal das mesmas (patrões ou empregados) a casa de terceiros buscar a mercadoria que tais empresas a tinham adquirido e que entretanto lhe vendiam quase sempre utilizando um camião marca ... ..-..-BU (salva falta de memória) sem concretizar datas, valores, quantidades, locais de carga e descarga e pagamentos [note-se que nos presentes autos está em causa a facturação emitida por «C , unipessoal, Lda.» («FF»), «D, Limitada» («FF») e «EE» e não de «OO» e «LL», pelo que a respectiva alegação (art. 13º da PI) é manifestamente inócua]. De todo o modo, resulta do probatório que, não obstante este défice de alegação, a prova produzida foi no sentido de que o impugnante não logrou demonstrar que «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE» forneceram e o aqui impugnante pagou a sucata a que se reportam as faturas desconsideradas pela AT, o que se deve aos depoimentos genéricos e vagos no que toca a estes fornecimentos, sendo certo que, os depoimentos das testemunhas foi prestado relativamente ao exercício de 2005, cujo aproveitamento se deu a requerimento do impugnante, nada esclarecem em concreto quanto às datas de fornecimentos, valores, quantidades, locais e pagamentos, ocorridos no ano de 2004. Se estes depoimentos foram considerados insuficientes relativamente ao exercício de 2005 (veja-se decisão do processo de impugnação 1130.11.9BEPRT) onde se considerou não ter ficado demonstrado que suportou os respectivos custos, à luz do disposto no art.º 23.º, n.º 1 do CIRC, por maioria de razão tal não ocorre também no caso das alegadas transações do ano de 2004, as quais não foram, por forma alguma, demonstradas nos autos. Nesta conformidade, criticamente analisada a prova produzida nos presentes autos, sendo que o impugnante, que nunca apresentou a contabilidade tal como se lhe impunha, ainda que recuperada, do ano de 2004, reduziu a sua atividade probatória à inquirição de testemunhas, sendo que, relativamente a esta prova, se limitou a requerer o aproveitamento dos depoimentos prestados no processo de impugnação 1130.11.9BEPRT, onde estavam em causa factos, ainda que resultado da mesma ação inspetiva, referentes ao ano de 2005; sendo que relativamente à factualidade subjacente às faturas utilizadas referentes a alegadas transações do ano de 2004, não foi feita rigorosamente qualquer prova. Entende-se, assim, que o Impugnante não logrou demonstrar que as facturas em causa, emitidas por «C , unipessoal, Lda.», «D, Limitada» e «EE», referentes ao ano de 2004, titulam operações reais, motivo pelo qual não merece censura a atuação da AT em desconsiderar os custos declarados pelo Impugnante e, consequentemente, corrigir o lucro tributável declarado, procedendo à correspondente liquidação de IRS.» (fim de citação) Há assim que concluir que a sentença sob recurso não padece do erro de julgamento de direito que lhe é imputado, tendo efetuado um correcto percurso lógico na interpretação e aplicação ao caso concreto das regras do ónus da prova, improcedendo o recurso quanto a esta questão. 2.3. Conclusões I. A nulidade da sentença por omissão de pronúncia tem lugar apenas quando se verifica uma violação dos deveres de pronúncia do Tribunal sobre questões que deveria conhecer, o que, de acordo com o disposto no artigo 608º, nº2 do CPC [aplicável ex vi artigo 2º, al. e) do CPPT], significa que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas, cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. II. Não constando da LGT nem do CPPT norma definidora do prazo para a revogação e anulação administrativas dos atos tributários, cumpre acolher as regras constantes dos artigos 165° a 174° do Código de Procedimento Administrativo (CPA), pelo que é incontroverso ser de aplicar o artigo 136º e ss. do CPA, que directamente regulam a revogação dos actos administrativos [sendo que o CPA constitui legislação complementar e subsidiária ao direito tributário — arts. 2º, al. c), da LGT e 2º, al. d), do CPPT]. III. face ao disposto na citada alínea a) n° 2 do artigo 58º do CPTA (prazo de um ano para a impugnação de actos anuláveis), a AT dispunha desse prazo para o fazer, pelo que o despacho que revogou o anterior despacho de deferimento é tempestivo. IV. Resultando a correcção da matéria tributável declarada do facto de a AT ter considerado que as facturas emitidas por determinada empresa que documentavam custos não correspondiam a operações reais, motivo por que, mediante o processo geralmente denominado de “correcções técnicas”, desconsiderou tais custos e acresceu à matéria tributável declarada o montante daquelas facturas, à AT compete fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação no sentido da correcção do lucro tributável, competindo ao contribuinte o ónus da prova da existência dos factos que alegou como fundamento do seu direito de ver tais montantes relevados negativamente no rendimento tributável. 3. DECISÃO Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida na ordem jurídica. Custas pelo Recorrente. Porto, 16 de fevereiro de 2023 Irene Isabel das Neves Ana Paula Santos Margarida Reis |