Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00824/12.6BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/28/2014
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:NOMEAÇÃO DE PATRONO
PRAZO INTERPOSIÇÃO ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
Sumário:I. O prazo de 30 dias previsto no n.º 1 do art.º 33.º da Lei 34/2004, de 29/7, é um prazo de natureza disciplinar, como decorre do n.º 3 do citado preceito legal.
II. Tal prazo é irrelevante para a contagem do prazo de interposição de acções administrativas especiais, que se consideram interpostas nas datas em que foram apresentados os pedidos de nomeação de patronos, nos termos do n.º 4 do referido preceito legal.
III. O prazo concedido ao patrono oficioso para intentar a acção ou o recurso, de 30 dias ou mais, pois é prorrogável por motivos justificados, é prazo meramente disciplinador, nunca funcionando em prejuízo do assistido, que requereu o apoio judiciário;
IV. O disposto nos ns. 4 e 5 do artigo 25.º da referida Lei não é aplicável aos casos de pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, feito antes da propositura das acções, para os quais apenas regula o n.º 4 do artigo 33.º, mas apenas aos casos de pedidos formulados na pendência das acções.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:FSG...
Recorrido 1:Instituto da Segurança Social, I.P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:
I
RELATÓRIO
1. FSG..., identif. nos autos, inconformado, veio interpor o presente recurso jurisdicional da decisão do TAF de Braga, datada de 29/96/2012, que, no âmbito da acção administrativa especial [onde peticionava que fosse "revogado o acto administrativo constante no Despacho da Directora da Unidade de Prestações e Atendimento do Instituto da Segurança Social - I.P. Centro Distrital de Viana do Castelo, datado de 15/12/2011, que fez cessar a pagamento da prestação social, revogando a decisão de concessão ao Autor da prestação do Rendimento Social de Inserção, de 15/07/2010, reconhecendo-se ao Autor o direito ao recebimento de todas as prestações entretanto vencidas e não pagas"], julgando procedente a excepção dilatória de caducidade do direito de acção, absolveu da instância o Réu/recorrido INSTITUTO da SEGURANÇA SOCIAL - IP - Centro Distrital de Viana do Castelo.
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2. No final das suas alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões:
"1ª- O Recorrente instaurou em 07/05/2012 uma acção administrativa especial, contra o Instituto de Segurança Social, IP, impugnando o despacho emitido pela Directora da Unidade de Prestações e Atendimento de Viana do Castelo, que revogou a decisão de concessão ao A. da prestação do RSI.
2ª- Foi a referida acção julgada improcedente, por extemporaneidade.
3ª- O Recorrente formulou pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono.
4ª- O pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, interrompe o prazo de interposição da acção, recomeçando o mesmo a correr a partir da data da nomeação de patrono.
5ª- Deve, assim, no entender do Recorrente aplicar-se aqui, por analogia, o artigo 24º, nº 4 e nº 5 da Lei nº 34/2004.
6ª- Facilmente se pode comprovar a data de entrada do requerimento de apoio judiciário, através do documento de deferimento do mesmo, uma vez que o mesmo refere expressamente “na sequência do pedido formulado por Vª Exª em 24/01/2012…”.
7ª- Além disso, foi junto também o comprovativo da nomeação de patrono, a partir de cuja data se deveria contar o prazo para interposição da acção administrativa.
8ª- Por outro lado, a Lei nº 34/2004, no seu artigo 33º, nº 4 prevê que a acção se considera proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono, normativo que deverá também ser aplicado, analogicamente, ao caso em análise.
9ª- A douta sentença recorrida viola, para além disso, os princípios constitucionais da igualdade e do acesso ao direito, plasmados nos artigos 13º e 20º da CRP".
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3. Notificadas as alegações apresentadas pelos recorrentes, supra referidas, nada disse o recorrido.
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4. A Digna Procuradora Geral Adjunta, neste TCA, notificada nos termos do art.º 146.º do CPTA, pronunciou-se fundamentadamente - fls. 106/109 - pela negação de provimento ao recurso, pronúncia que, notificada às partes - art.º 146.º n.º 2 do CPTA - veio merecer a discordância do recorrente - cfr. fls. 113/114.
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5. Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 5.º, 608.º, n.º 2, 635.º, ns, 3 a 5 e 639.º , todos do Código de Processo Civil - Lei 41/2013, de 26/6 - art.º 5.º, n.º1 - “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.
II
FUNDAMENTAÇÃO
1. MATÉRIA de FACTO
São os seguintes os factos fixados na sentença recorrida :
1. Por despacho de 15 de Dezembro de 2011, a Directora da Unidade de Prestações e Atendimento do Centro Distrital de Viana do Castelo, do Instituto da Segurança Social - I.P. declarou ser de manter a cessação do direito a prestação do rendimento Social de Inserção, relativamente ao Autor, FSG..., por não terem sido apresentados meios de prova que obstassem à proposta de decisão informada em 08/11/2011 (Cfr. fls. 52 a 62 do PA).
2. O Autor foi notificado do Despacho através de ofício com data de 23 de Dezembro de 2011 e expedido em 29 de Dezembro de 2011 (Cfr. fls. 63 do PA e Doe. n.º8 da Petição Inicial).
3. A petição inicial da presente acção foi intentada pelo Autor em 07 de Maio de 2012, (conforme data do registo neste Tribunal - fls. 3 do processo físico).
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Com interesse para a decisão dos autos e porque constam de documentos juntos, mostra-se ainda provada a seguinte factualidade - art.º 712.º do Cód. Proc. Civil:
4. Notificado do despacho, dito em 1, em 24/1/2012, o recorrente solicitou apoio jurídico, na modalidade (entre outras), de nomeação de patrono, o que lhe foi deferido - cfr. fls. 32 e 33 dos autos.
5. O advogado nomeado foi notificado da sua nomeação, por e-mail, em 20/3/2012 - cfr. fls. 31 dos autos.
2. MATÉRIA de DIREITO
Assente a factualidade apurada, cumpre, agora, entrar na análise do objecto do recurso jurisdicional, o qual se objectiva (atenta a fase processual), apenas em apreciar se a acção interposta se mostra extemporânea, porquanto apresentada além de três meses, contados da data de notificação ao A./recorrente do despacho impugnado, como entendeu o TAF de Braga.
A sentença recorrida entendeu que o disposto no art.º 24.º da Lei 34/2004 não tinha aplicação na situação em concreto, porque o pedido de apoio judiciário formulado pelo Autor, junto da Segurança Social, para nomeação de patrono, teve em vista, seguramente, a propositura da presente acção, pelo que não foi apresentado na pendência de acção judicial.
Mais referiu que, aquando da instauração da acção o A. não efectuou a junção aos autos de documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.
Assim, concluiu o TAF de Braga que a acção foi extemporaneamente apresentada pelo A./Recorrente.
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Argumenta o recorrente que o pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, interrompe o prazo de interposição da acção, recomeçando o mesmo a correr a partir da data da nomeação de patrono, pelo que deve aplicar-se aqui, por analogia, o art.º 24.º, n.º 4 e n.º 5 da Lei 34/2004, de 29/7.
Além disso - refere ainda - foi junto também o comprovativo da nomeação de patrono, a partir de cuja data se deveria contar o prazo para interposição da acção administrativa.
Acresce que o art.º 33.º n.º 4 da Lei 34/2004 prevê que a acção se considera proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono, normativo que deverá também ser aplicado, analogicamente, ao caso em análise.
Deste modo - conclui - a sentença recorrida viola, para além disso, os princípios constitucionais da igualdade e do acesso ao direito, plasmados nos arts. 13.º e 20.º da CRP.
Vejamos!
Não se questionado a aplicação do prazo de 3 meses para a instauração da acção - al. b) do n.º 2 do art.º 58.º do CPTA -, importa apenas verificar se o pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono importa a interrupção do respectivo prazo de caducidade do direito de acção e em que termos e nessa subsunção se a acção foi apresentada em tempo.
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Dispõe o art.º 24.º da 34/2004, de 29 de Julho (alterada pela Lei 47/2007, de 28 de Agosto):
"...
4 - Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.
5 - O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos:
a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação;
b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono".
Por sua vez, o art.º 33.º da mesma Lei preceitua:
"1 - O patrono nomeado para a propositura da acção deve intentá-la nos 30 dias seguintes à notificação da nomeação, apresentando justificação à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores se não instaurar a acção naquele prazo.
2 - O patrono nomeado pode requerer à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores a prorrogação do prazo previsto no número anterior, fundamentando o pedido.
3 - Quando não for apresentada justificação, ou esta não for considerada satisfatória, a Ordem dos Advogados ou a Câmara dos Solicitadores deve proceder à apreciação de eventual responsabilidade disciplinar, sendo nomeado novo patrono ao requerente.
4 - A acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono".
E o art.º 38.º dispõe que:
"Aos prazos processuais previstos na presente lei aplicam-se as disposições da lei processual civil".
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No caso dos autos, a factualidade relevante demonstra que:
- o recorrente foi notificado da decisão impugnada por ofício expedido em 29/12/2011;
- em 24/1/2012, requereu apoio judiciário, além do mais, na modalidade de nomeação de patrono e dispensa de pagamento dos respectivos honorários;
- por e-mail de 20/3/2012, foi o advogado nomeado notificado da nomeação pela Ordem dos Advogados;
- a presente acção deu entrada no TAF de Braga em 4/5/2012.
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Ora, não podemos deixar de considerar que a razão está com o recorrente.
Na verdade, tendo o recorrente requerido a concessão de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, dentro do prazo de recurso contencioso - 3 meses - pois que, na data deste pedido apenas haviam passado 22 dias desse prazo de 90 dias (3 meses), não poderia ser prejudicado pelo facto do advogado escolhido pela OA ter interposto a AAE depois dos 30 dias a que alude o n.º1 do art.º 33.º da Lei 34/2004, de 29/7 - LAJ -, sendo certo que este prazo tem apenas natureza disciplinar, em nada influindo no prazo de propositura da acção.
Assim, e nos termos previstos no n.º 4 desse art.º 33.º, a AAE considera-se proposta na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono, ou seja, em 24/1/2012 e, obvia e manifestamente, dentro do prazo de 3 meses, previsto no art.º 58.º, n.º 2, al. b) do CPTA.
Neste sentido, cfr., entre muitos, os Acds. do STA, de 2/3/2004, 4/3/2004, Proc. 136/04 e 135/04, respectivamente, do TCA-N, de 18/2/2011, Proc. 01231/09 e TCA-Sul, de 25/10/2012, Proc. 09183/12.
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Como se refere no Ac. do STA, de 2/3/2004, com inteira aplicação ao caso dos autos (ainda que com base na LAJ de 2000 - Lei 30-E/2000, de 20/12, mas sem alterações que importem interpretações diversas) "... tendo este (pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono) sido apresentado dentro do prazo para a interposição do recurso (o que é indiscutível em face da matéria de facto dada como provada e não questionada), dentro desse prazo se deve considerar interposto o recurso. Donde resulta que o mesmo é tempestivo.
Este regime é o que resulta claramente do preceito em análise, do qual se retiram, claramente, duas conclusões:
Primeira: que o advogado oficioso tem um prazo de 30 dias para propor a acção e se o não fizer terá de o justificar, nos termos referidos no n.º 2, sujeitando-se, se for caso disso, a procedimento disciplinar. Portanto, o referido prazo de 30 dias tem apenas natureza disciplinar, em nada influindo no prazo de propositura da acção.
Segunda: a acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono, conforme se estipula no n.º 3 e, portanto, independentemente de o advogado nomeado ter ou não cumprido o prazo previsto no n.º 1. - cfr. acórdão deste STA de 22/10/2 003, recurso n.º 1 592/02 e Salvador da Costa, O Apoio Judiciário, 4.ª edição, pág. 164).
De assinalar, ex abundantti, tendo em conta a fundamentação da sentença recorrida, que o disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 25.º da LAJ se aplica apenas aos pedidos formulados na pendência da acção, o que se não verificou no caso sub judice, pelo que, quanto a este, regula exclusivamente o n.º 3 do artigo 34.º....".
E ainda, como refere o Ac. deste TCA-N, de 18/2/2011, " ... o prazo concedido para o patrono oficioso intentar a acção ou recurso [artigo 33º da LAJ], que pode ser de 30 dias ou mais, dado ser prorrogável por motivos justificados " trata-se " ... como vem entendendo a jurisprudência, de prazo meramente disciplinador, cujo incumprimento injustificado gera apenas responsabilidade disciplinar do faltoso, nunca funcionando em prejuízo do assistido, que oportunamente requereu o apoio judiciário [entre outros, AC STA de 04.12.2003, Rº 01654, AC STA de 02.03.2004, Rº 0136/04, e AC STA de 04.03.2004, Rº 0135/04]".
*
Por todo o exposto e sem necessidade de outros considerandos, sendo manifesta a procedência do recurso, impõe-se a revogação da sentença recorrida.
III
DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em:
- conceder provimento ao recurso;
- revogar a sentença recorrida; e,
- ordenar a baixa dos autos à 1.ª instância para aí prosseguirem a sua tramitação se, entretanto, nada a tal obstar.
*
Sem custas.
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Notifique-se.
DN.
***
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pelo relator (cfr. art.º 131.º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil, “ex vi” do art.º 1.º do CPTA).
Porto, 28 de Março de 2014
Ass.: Antero Pires Salvador
Ass.: Carlos Carvalho
Ass.: Ana Paula Portela