Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
| Processo: | 02481/19.0BELSB |
| Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
| Data do Acordão: | 12/18/2020 |
| Tribunal: | TAF de Mirandela |
| Relator: | Rogério Paulo da Costa Martins |
| Descritores: | CONCURSO; PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS; EXCLUSÃO DE PROPOSTA; ASSINATURA MANUSCRITA; ASSINATURA DIGITAL; SÓCIO GERENTE; PODERES DE REPRESENTAÇÃO; APRESENTAÇÃO DE PROPOSTAS; AUDIÊNCIA PRÉVIA; DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS; CASO JULGADO; CONDENAÇÃO DA ENTIDADE DEMANDADA À ADJUDICAÇÃO À PROPOSTA EXCLUÍDA; ARTIGO 27°, N.° 3 DA PORTARIA N.° 701-G/2008; ARTIGO 146°, N.° 2, AL. E) DO CÓDIGO DOS CONTRATOS PÚBLICOS; N.º 3 DO ARTIGO 72º DO CÓDIGO DE CONTRATOS PÚBICOS, NA REDACÇÃO DADA PELO DECRETO-LEI N.º 111-B/2017, DE 31.08. |
| Sumário: | 1. Mostra-se aconselhável, para evitar uma desconformidade ou contradição prática, que os tribunais administrativos respeitem as decisões do Tribunal de Contas transitadas em julgado, apesar de não se verificar uma situação de caso julgado em sentido próprio, porque está presente a mesma necessidade de coerência entre decisões judiciais subjacente ao instituto do caso julgado. 2. Nos termos do disposto no artigo 27°, n.° 3 da Portaria n.° 701-G/2008, nos casos em que o certificado digital não possa relacionar directamente o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante. 3. Porém o facto de um candidato não ter submetido à plataforma, pelo menos até à adjudicação, documento electrónico oficial apto a atestar a qualidade de quem assinou a sua proposta não deve levar à exclusão da proposta se efectivamente quem assinou a proposta tinha poderes para representar e obrigar a mesma concorrente. 4. O ónus de submeter à plataforma electrónica um documento oficial, que permita aferir dos poderes de representação do assinante, não constituiu um requisito de validade material e intrínseca da proposta mas apenas uma exigência formal. 5. O cumprimento desta formalidade legal destina-se a assegurar o cumprimento de uma exigência substantiva, a de que quem vincula a empresa à aceitação do caderno de encargos, por meios electrónicos estabelecidos na lei, tem poderes para o fazer. 6. Alcançado este desiderato legal, não se justifica excluir a proposta nos termos previstos no artigo 146°, n.° 2, al. e) do Código dos Contratos Públicos, pois este preceito impõe a exclusão de uma proposta somente quando quem assina digitalmente a proposta não tem poderes para representar e obrigar a mesma concorrente.”. 7.A exclusão de uma proposta reduz a concorrência. Logo as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas. 8. Este mínimo necessário traduz-se precisamente em apenas permitir a exclusão nos casos expressos previstos na lei (tipificação dos casos de exclusão) e interpretar estas normas de forma restritiva e não extensiva e, menos ainda, analógica. 9. Solução que agora resulta do disposto no n.º 3 do artigo 72º do Código de Contratos Púbicos, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31.08, com início de vigência em 01.01.2018 e por isso aplicável ao caso dos autos. 10. Não havendo motivo para exclusão e sendo a proposta da Autora, ora Recorrente, a proposta com o preço mais baixo, deveria ter-lhe sido adjudicado o contrato de empreitada, tal como pediu, porque o preço mais baixo era o único critério de adjudicação.* * Sumário elaborado pelo relator |
| Recorrente: | M., Lda |
| Recorrido 1: | Instituto da Conservação da Natureza e Florestas, I.P., e Outro. |
| Votação: | Unanimidade |
| Meio Processual: | Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional |
| Decisão: | Conceder provimento ao recurso. |
| Aditamento: |
| Parecer Ministério Publico: | Não emitiu parecer. |
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| Decisão Texto Integral: | EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A M., L.da veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, de 24.08.2020, pela qual foi julgada (totalmente) improcedente a acção intentada pela ora Recorrente contra o Instituto da Conservação da Natureza e Florestas, I.P. - e em que foi indicada como Contra-Interessada a F., S.A. - para anulação do acto de exclusão da sua proposta e do acto de adjudicação quanto ao lote 1, proferido no âmbito do concurso público 13/2019 para aquisição de serviços para prevenção estrutural e restauro de “habitats” naturais em áreas protegidas, cumulativamente com a condenação da Entidade Demandada a aceitar a proposta da Autora e a reordenar as propostas e consequente adjudicação à Autora por ser a proposta economicamente mais vantajosa. Invocou para tanto, em síntese, que o acto de exclusão em apreço viola os princípios da legalidade, igualdade, justiça, imparcialidade e boa fé, bem como o disposto no artigo 72.º, n.º 3, do Código dos Contratos Públicos; o contrato deveria ter-lhe sido adjudicado porque, não havendo motivo legal para a exclusão da sua proposta, esta devia ter sido seleccionada por ser a mais vantajosa para o erário público, tal como decidido no acórdão do Tribunal de Contas n.º 17/2020, de 25.03, processo 4210/2019, por ser a de melhor preço, único critério de adjudicação escolhido para este concurso, ao contrário do decidido pelo Tribunal recorrido que manteve na ordem jurídica o acto impugnado. A Contra-Interessada F., S.A., contra-alegou defendendo a manutenção do decidido. O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer. * Cumpre decidir já que nada a tal obsta.* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1. A Recorrida publicou, na plataforma eletrónica AnoGOv, dividido em sete lotes, designado “Contratação de serviços para restauro e prevenção estrutural em 7 áreas protegidas que tem por objeto a aquisição de serviços para a execução de ações destinadas ao restauro, valorização e conservação de habitats naturais afetados por incêndios, em sete áreas protegidas”. 2. A Recorrente apresentou proposta para os Lotes um (Serra de S. Mamede) e cinco (Serra do Açor) do procedimento, posto que quanto ao lote 5 a Entidade Demandada revogou a decisão de contratar, o objecto do presente recurso está limitado ao Lote um (Serra de S. Mamede). 3. O preço base do procedimento, no que respeita ao Lote um (Serra de S. Mamede), foi fixado no montante de € 1.367.847,83 e o critério de adjudicação, por lote, de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa na modalidade de avaliação do preço enquanto único aspecto a considerar. 4. O ponto 18 do Programa do Concurso, sob a epígrafe, “Regras sobre o modo de apresentação da Proposta e dos documentos que a instruem” especifica o seguinte: “18.1 – AS propostas e os documentos que as instruem são inseridos diretamente na plataforma eletrónica de contratação pública utilizada pela entidade adjudicante (www.anogov.com) (…)”; “18.3 – Em cumprimento do n.º 5 do art.º 54.º e do n.º 4 do art.º 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, todos os documentos que compõem a proposta devem ser encriptados (…) e assinados com recurso a assinatura eletrónica/digital qualificada, sob pena de causa de exclusão, os quais são emitidos por uma entidade certificadora credenciada pela Autoridade Nacional de Segurança (informação disponível em WWW.gns.gov.pt”; “18.4 – Nos casos em que o certificado utilizado não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, como é o caso, por exemplo, do cartão de cidadão, deve o concorrente submeter, também, um documento indicando o poder de representação e de assinatura, designadamente, uma certidão de registo comercial ou procuração conferindo poderes necessários para o efeito”. 5. A Recorrente apresentou e submeteu proposta na plataforma electrónica indicada para o efeito, respeitante ao Lote um (Serra de S. Mamede) pelo valor de € 1.231.063,05. 6. Os documentos que compõem a proposta da Recorrente foram assinados manualmente pelos dois sócio-gerentes – J. e P.. 7. Todos os documentos que compõem a proposta da M., Lda foram submetidos na plataforma AnoGov e assinados pelo sócio-gerente J. através de assinatura eletrónica digital qualificada, com a designação de “Certificado Digital Qualificado” com o número de série 1468945cfa9179acf5999e575021335e. 8. Nos termos da Certidão Permanente junta pela Recorrente com a sua proposta e conforme expresso pela mesma no Documento Europeu Único de Contratação Pública (adiante, “DEUCP”), a gerência da sociedade é composta por dois gerentes (J. e P.) requerendo-se a assinatura conjunta para obrigar a sociedade. 9. A assinatura electrónica qualificada aposta pela Recorrente nos documentos da Proposta refere: “cn=J. ou=Entitlement – ASSINAR EM PLATAFORMAS ELETRONICAS DE CONTRATAÇÃO” 10. identificado certificado tem perfil de representação, porquanto o identificado sócio-gerente, titular do certificado emitido pela DigitalSign - Certificadora Digital, S.A., tem poderes bastantes para atuar no âmbito do objeto de representação constante de tal certificado, designadamente, os de assinar eletronicamente em Plataformas Eletrónicas de Contratação em nome e representação da M., Lda, , Lda., vinculando-a sozinho em relação a terceiros. 11. A M., Lda, emitiu assim uma inequívoca declaração de vontade ao assinar a Declaração de aceitação do conteúdo do Caderno de Encargos por parte de quem possui poderes de representação e de vinculação da concorrente à proposta apresentada. 12. A assinatura digital aposta pelo sócio-gerente J. nos documentos do procedimento, relaciona o assinante com a concorrente, já que sendo sócio-gerente, tem poderes de representação da sociedade. 13. Era, pois, fácil relacionar o J. com a Concorrente por se tratar precisamente de um dos sócios gerentes que assinou manualmente os documentos da proposta e consta da certidão permanente junta aos autos como sendo um dos sócios gerentes da sociedade. 11. Diferente seria se a assinatura eletrónica aposta não pertencesse a um dos sócios gerentes da sociedade, ora Recorrente. 12. Pelo que, in casu, forçoso é concluir que a assinatura eletrónica constante dos autos relaciona o assinante com a concorrente/recorrente, já que sendo sócio-gerente tem poderes de representação da sociedade. 13. E, nos termos do disposto no artigo 260.º, n.º 4, do Código Comercial, “os gerentes vinculam a sociedade, em actos escritos, apondo a sua assinatura com indicação dessa qualidade”. 14. Temos pois que a proposta foi assinada manualmente pelos sócios-gerentes da M., Lda e que os documentos submetidos foram digitalmente assinados por pessoa com poderes para submeter eletronicamente a proposta na plataforma eletrónica. 15. Os poderes do sócio-gerente J. foram verificados pela DigitalSign, na qualidade de Entidade Certificadora e no âmbito das atribuições legais conferidas em virtude do disposto no artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, em momento anterior à emissão do certificado digital qualificado – daqui resultando o perfil de representação supra descrito. 16. Deste modo, no acto de assinatura e submissão da proposta, quem utiliza um Certificado Digital Qualificado de Representação, dado que este já tem incorporados os poderes de representação do utilizador, i. e., relaciona o assinante com a sua função e poder de assinatura, fica dispensado de anexar qualquer documento adicional (procuração ou outro), tal como resulta dos disposto no n.º 7, do artigo 54.º, da Lei n.º 96/2015, de 17/08, a contrario sensu. 17. Contudo, No Relatório Preliminar, o júri do procedimento, alegando que a descrição da assinatura digital em apreço não demonstrava a respetiva função e poder, propôs a exclusão da proposta apresentada pela Recorrente, invocando para o efeito os artigos 57.º, n.º 1 e 4, e 146.º, n.º 2, alínea e), do Código dos Contratos Públicos e o artigo 54.º da Lei 96/2015. 18. Em sede de audiência prévia, a Recorrente alegou que para efeitos de assinatura digital o seu gerente submeteu a proposta na Plataforma Eletrónica de Contratação, tem poderes bastantes para assinar eletronicamente em nome e representação da sociedade, juntando à pronúncia uma declaração emitida pela entidade certificadora de assinaturas e certificados digitais, DigitalDesign, no qual se afirma essa titularidade. 19. Invocou ainda, como legislação aplicável complementar à mencionada pelo júri os artigos 7.º, 25.º, n.º 1 e 29.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de Agosto. 20. Na declaração junta emitida pela DigitalDesign, com validade para o período de 19-12-2016 a 19-12-2019, embora não se encontre datada, consta que «J. poderá ASSINAR EM PLATAFORMAS ELETRÓNICAS DE CONTRATAÇÃO, na qualidade de legal representante da entidade M., LDA., VINCULANDO-A SOZINHO (A), em relação a terceiros, sem necessidade de apresentar qualquer documento adicional para efeitos de comprovar os seus poderes de representação e vinculação da sociedade». 21. Analisada a pronúncia, o júri, em 19-10-2019, decidiu manter a posição de que se estava na presença da «ausência de plenos poderes para representar o concorrente na apresentação de proposta e assinatura de documentos», deliberando manter a sua proposta de exclusão. 22. Na fundamentação argumentou que a descrição da assinatura digital foi alterada para «assinado por J. com recurso a certificado de assinatura eletrónica de representação da entidade M., LDA., certificado este que o vincula sozinho a assinar eletronicamente em plataformas eletrónicas de contratação em nome da M., LDA , », considerando o júri que, caso fosse essa a descrição constante da assinatura à data da submissão da proposta, se consideraria dispensada «a apresentação de qualquer documento adicional referente à forma de obrigação daquela sociedade comercial». 23. Afirmou o júri, ainda, que «em sede de audiência prévia a entidade não apresentou qualquer documento que comprove que, à data da submissão da sua proposta, a titularidade da assinatura eletrónica aposta nesses documentos conferia poderes bastantes ao seu signatário para, sozinho, a vincular». 24. Atenta a matéria de facto provada, a única reserva que seria legítimo apresentar quanto à ausência de plenos poderes para representar o concorrente através de assinatura eletrónica reportar-se-ia a uma eventual dúvida sobre os aludidos poderes para assinar eletronicamente por si só a proposta submetida na plataforma. 25. Em caso de dúvida o Recorrido deveria dar cumprimento ao disposto no n.º 3 do artigo 72.º do CPP, no qual se prevê a possibilidade de solicitar a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data da apresentação da proposta, em vez da ação adotada pelo júri do procedimento de exclusão da proposta, mesmo depois de junta prova documental dos poderes da pessoa que submeteu a proposta na plataforma eletrónica. 26. Viola os princípios da legalidade, igualdade, justiça, imparcialidade e boa fé, a exclusão de candidatura ou proposta exclusivamente “por força de mera formalidade não essencial “em sentido contrário ao disposto no artigo 72.º, n.º 3, do CCP, e no presente caso verifica-se a agravante de nem sequer ter sido concedido à Recorrente qualquer prazo para satisfazer essa formalidade ou prova de poderes. 27. Acresce que, in casu, a Recorrente juntou prova dos poderes do subscritor da assinatura eletrónica da proposta em plataforma existente para o efeito, os quais já existiam à data da apresentação da proposta, documentação que, apesar de ter sido apresentada durante a fase da audição prévia anterior à decisão final sobre a exclusão, não foi atendida pelo júri. 28. Consequentemente, a violação por omissão do regime legal foi complementada por uma atuação ilegal por ação da Recorrida ao recusar atender à prova junta pelo concorrente quando este se limitou a comprovar factos ou qualidades anteriores à data da apresentação da proposta (apesar de o júri reconhecer “caso fosse essa a descrição constante da assinatura à data da submissão da proposta, se consideraria dispensada a apresentação de qualquer documento adicional referente à forma de obrigação daquela sociedade comercial. 29. Sublinhe-se que o n.º 3 do artigo 72.º do CCP se reporta a um dever do júri que não tinha expressão legal no regime anterior à revisão de 2017 do CCP e no caso concreto o suprimento em causa comprovativo dos poderes exercidos de assinatura digital, não era susceptível de introduzir qualquer alteração nas qualidades da proposta não tendo, consequentemente, qualquer impacto na sã concorrência (devendo ser tido em atenção que o certificado junto pela Recorrente demonstra que o gerente que assinou eletronicamente a proposta já detinha os respetivos poderes para o efeito à data em que a mesma foi submetida). 30. No caso sub judice, indiscutivelmente, não se verifica nenhum impedimento ao pedido de esclarecimento, visto que que o esclarecimento que in casu se impunha não iria contrariar os elementos constantes dos documentos da proposta, nada interferia com os respetivos atributos nem visava suprir qualquer omissão que determinasse a sua exclusão. 31. A Recorrente apresentou a melhor proposta de preço no procedimento, sendo este o único critério de adjudicação escolhido pela Recorrida. 32. É uma proposta que permite uma redução dos custos da empreitada a suportar pelo erário público. 33. Como bem referiu o Tribunal de Contas no douto acórdão n.º 17/2020, de 25 de Março – proc. 4210/2019, no qual se concluiu afinal pela recusa do visto ao contrato celebrado no âmbito dos presentes autos. 34. A exclusão suportada pelo júri nos artigos 57.º, n.º 1 e 4, e 146.º, n.º 2, alínea e), do CCP, tem por base preceitos que, no plano nacional, têm de ser articulados com o artigo 72.º, n.º 3, do CCP e, além do valor da concorrência, com os princípios da prossecução do interesse público, igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade e boa-fé, consagrados nos artigos 4.º e 6.º a 10.º do CPA. 35. Desta forma, a opção do júri de excluir a proposta da Recorrente, violou a imposição legal estabelecida pelo n.º 3 do artigo 72.º do CCP e dos princípios da transparência, igualdade, proporcionalidade e concorrência, que constituem a base axiológica do direito da União Europeia, invocada de forma expressa no artigo 1.º-A, n.º 1, do CCP. 36. Termos em que deve ser julgado procedente o presente recurso, anulando-se a douta sentença recorrida e, em consequência, deverá ser anulada a decisão de adjudicação tomada pela Recorrida e condenada esta na prática dos actos devidos, consubstanciados na anulação da exclusão da proposta da Recorrente, reordenação das propostas e na adjudicação da proposta apresentada pela Recorrente. * II –Matéria de facto.Importa aditar à matéria de facto alinhada na decisão recorrida um facto que resulta do processo instrutor junto com a contestação e que se mostra decisivo para a decisão do pleito, sob o n.º 15.1: “Este certificado de assinatura digital junto pela Autora em sede de audiência prévia, não datado, indica a respectiva a validade para o período de 19.12.2016 a 19.12.2019”. Também se impõe aditar à matéria de facto, porque relevante e referido em sede de alegações de recurso quer pela Recorrente quer pela Contra-Interessada, ora Recorrida, o acórdão do Tribunal de Contas, ainda não transitado em julgado, de 25.03.2020, proferido no processo 4201/2019, em sede de fiscalização prévia do contrato aqui também em apreço (certidão junta a 14.12.2020, a folhas 1278 do SITAF). Deveremos assim dar como provados os seguintes factos: 1. (Eliminado por despacho de 14.10.2020 do Tribunal recorrido). 2. A M., Lda é uma sociedade comercial cujo objeto é: “elaboração, execução e manutenção de projetos florestais e agrícolas, limpeza e manutenção de áreas florestais e agrícolas, venda de produtos agroflorestais, produção de sementes e plantas, elaboração e execução de projetos de espaços verdes públicos, vias de comunicação, obras de urbanização e outras infra-estruturas, ajardinamentos e infraestruturas de desporto e de lazer” – cfr. certidão permanente com o código de acesso 8840-7033-0177. 3. No dia 19 de junho de 2019, a Entidade Demandada deu início a um procedimento concursal com publicidade internacional (JO: 2019/S 119291906), Procedimento n.º 13/2019/ICNF/SEDE, para a aquisição de serviços para restauro e prevenção estrutural em 7 áreas protegidas – 3ª geração de projetos (cfr. documentos constantes do processo administrativo e, designadamente, Anúncio de Procedimento n.º 6344/2019, publicado no DR n.º 116- Parte L, em 19 de junho de 2019). 4. A Entidade Demandada publicou, na plataforma eletrónica AnoGov, associada à tramitação procedimental do concurso, dividido em sete lotes, designado “Contratação de serviços para restauro e prevenção estrutural em 7 áreas protegidas que tem por objeto a aquisição de serviços para a execução de ações destinadas ao restauro, valorização e conservação de habitats naturais afetados por incêndios, em sete áreas protegidas situadas no território continental português”. 5. O procedimento seguiu os seus trâmites e a M., Lda apresentou, atempadamente, proposta para os lotes um (Serra de S. Mamede) e cinco (Serra do Açor) do procedimento, posto que quanto ao lote 5 a Entidade Demandada revogou a decisão de contratar, o objeto da presente ação está limitado ao lote um (Serra de S. Mamede). 6. O preço base do procedimento, no que respeita ao lote um (Serra de S. Mamede), foi fixado no montante de 1.367.847,83 € e o critério de adjudicação, por lote, de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa na modalidade de avaliação do preço enquanto único aspeto a considerar, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 74.º do CCP, cfr. ponto 8 do Programa do concurso. 7. O ponto 18 do Programa do Concurso, sob a epígrafe, “Regras sobre o modo de apresentação da Proposta e dos documentos que a instruem” especifica o seguinte: “18.1 – As propostas e os documentos que as instruem são inseridos diretamente na plataforma eletrónica de contratação pública utilizada pela entidade adjudicante (www.anogov.com) (…)”; “18.3- Em cumprimento do n.º 5 do art.º 54.º e do n.º 4 do art.º 68.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, todos os documentos que compõem a proposta devem ser encriptados (…) e assinados com recurso a assinatura eletrónica/digital qualificada, sob pena de causa de exclusão, os quais são emitidos por uma entidade certificadora credenciada pela Autoridade Nacional de Segurança (informação disponível em www.gns.gov.pt)”; “18.4- Nos casos em que o certificado utilizado não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, como é o caso, por exemplo, do cartão de cidadão, deve o concorrente submeter, também, um documento indicando o poder de representação e de assinatura, designadamente, uma certidão de registo comercial ou procuração, conferindo poderes necessários para o efeito”. 8. A M., Lda apresentou e submeteu proposta na plataforma eletrónica indicada para o efeito, respeitante ao lote um (Serra de S. Mamede) pelo valor de € 1.231.063,05 - cfr. consta da Proposta e do Relatório Preliminar. 9. Os documentos que compõem a proposta da M., Lda foram assinados manualmente pelos dois sócios-gerentes – J. e P.. 10. Todos os documentos que compõem a proposta da M., Lda foram submetidos na plataforma AnoGov e assinados pelo sócio-gerente J. através de assinatura eletrónica digital qualificada, com a designação de “Certificado Digital Qualificado” com o número de série 1468945cfa9179acf5999e575021335e. 11. Nos termos da Certidão Permanente junta pela Autora com a sua proposta e conforme expresso pela mesma no Documento Europeu Único de Contratação Pública (adiante, “DEUCP”), a gerência da sociedade é composta por dois gerentes (J. e P.), requerendo-se a sua assinatura conjunta para obrigar a sociedade. 12. A assinatura electrónica qualificada aposta pela Autora nos documentos da Proposta refere: “cn=J. ou=Entitlement – ASSINAR EM PLATAFORMAS ELECTRONICAS DE CONTRATACAO” 13. No Relatório preliminar a Entidade Demandada decidiu propor a exclusão da autora, com os seguintes fundamentos: “Na proposta apresentada pela concorrente M., Lda,, constata-se a aposição, em todos os documentos que a constituem, da assinatura eletrónica qualificada de um dos gerentes da sociedade, J.. Sucede que, nos termos que resultam da certidão permanente dessa entidade, a sociedade é formada por dois gerentes, dos quais se requer a sua assinatura conjunta para a obrigar. Atento este facto, importará observar o disposto no n.º 4 do artigo 57.º do CCP, que estabelece que todos os documentos submetidos com a proposta, são obrigatoriamente assinados pelo concorrente ou por representante legal que tenha poderes para o obrigar. Ora, essa assinatura é digital, sendo que previamente à submissão dos documentos na plataforma AnoGov cada um dos documentos deve ser legal e obrigatoriamente assinados digitalmente pelo (s) representante (s) legal da sociedade comercial, em cumprimento do disposto no ponto 18 do Programa do Concurso, que é, por si, uma expressão da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, diploma legal que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública, designadamente o que versa o artigo 54.º. Estabelece o citado diploma legal, com interesse para a questão aqui analisada, que “os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura electrónica qualificada, própria ou dos seus representantes legais” e “nos casos em que o certificado digital não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma eletrónica um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante”. Face ao exposto, constata-se pela falta de assinatura do outro gerente em exercício de funções, o que conflitua com os poderes de representação identificados na Certidão Comercial da sociedade e, inevitavelmente, com o enquadramento legal supra referenciado supra. Consequentemente, a ausência de plenos poderes para representar o concorrente na apresentação da proposta e assinatura dos documentos, conduzirá legalmente à exclusão da proposta da concorrente, M., Lda – Estudos e Projetos, Lda., atento o disposto nos n.º s 1 e 4 do artigo 57.º, na alínea e) do n.º 2 do artigo 146.º, todos do CCP e nos n.º s 2 e 7 do artigo 54.º da Lei n.º 96/2015, de 17 de Agosto, diploma legal que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública.” 14. Em sede de audiência prévia veio a autora, em resumo, pugnar pela admissão da proposta por si apresentada alegando para tanto que é bastante a assinatura eletrónica qualificada de um dos gerentes da sociedade, designadamente, do gerente J., porquanto o identificado gerente, titular do certificado emitido pela DigitalSign – Certificadora Digital, S.A., tem poderes bastantes para actuar no âmbito do objecto de representação constante de tal certificado, designadamente, os de assinar eletronicamente em Plataformas Eletrónicas de Contratação em nome e representação da M., Lda - , Lda., vinculando-a sozinho em relação a terceiros, cfr. Pronúncia em sede de audiência prévia datada de 12 de Setembro de 2019. 15. A assinatura electrónica constante da pronúncia em sede de audiência prévia apresentada pela Autora no Procedimento (e subsequentes documentos apresentados pela mesma) especifica o seguinte: “Assinado por J. com recurso a certificado de assinatura electrónica de representação da entidade M., LDA, certificado este que o vincula sozinha a assinar electronicamente em plataformas electrónicas de contratação em nome da M., Lda.”. 15.1. Este certificado de assinatura digital junto pela Autora em sede de audiência prévia, não datado, indica a respectiva a validade para o período de 19.12.2016 a 19.12.2019 – cfr. processo instrutor. 16. No Primeiro Relatório Final, datado de 17 de Outubro de 2019, a Entidade Demandada deliberou manter a proposta de exclusão da proposta apresentada pela autora, desta feita alegando que “a assinatura eletrónica encriptada nos documentos da proposta não reúne os pressupostos que permitam aferir integralmente os poderes que nela estão investidos, designadamente, a suficiência da dita assinatura para vinculação legal da proposta apresentada por aquela sociedade comercial”, e acrescenta, “em sede de audiência prévia a entidade não apresentou qualquer documento que comprove que, à data da submissão da sua proposta, a titularidade da assinatura eletrónica aposta nesses documentos conferia poderes bastantes ao seu signatário para, sozinho, a vincular” - cfr. primeiro relatório final, junto ao processo administrativo, a fls.. e que aqui se dá por integralmente reproduzido. 17. Com data de 24 de Outubro de 2019 a Autora veio, em sede de audiência prévia, apresentar nova pronúncia. 18. No segundo relatório final, datado de 8 de Novembro de 2019, o Júri deliberou manter a decisão anteriormente anunciada e propor a exclusão da proposta apresentada pela M., Lda e mais deliberou em propor a adjudicação do Lote um (Serra de S. Mamede) à concorrente F.. 19. Por decisão de 19 de Novembro de 2019, o procedimento, quanto ao Lote um (Serra de S. Mamede), foi a M., Lda excluída do concurso e adjudicado à Contrainteressada F., pelo valor de € 1.299.318,65. 20. A decisão de adjudicação foi notificada às concorrentes, através da colocação na plataforma AnoGov, no dia 22 de Novembro de 2019. 21. Por acórdão de 25.03.2020, proferido no processo 4201/2019, o Tribunal de Contas decidiu o seguinte, em sede de fiscalização prévia do contrato aqui também em apreço, celebrado com a Contra-Interessada, ora Recorrida F., S.A. (certidão junta a 14.12.2020, a fls.1278 do SITAF): “(…) ENQUADRAMENTO JURÍDICO 4. A principal questão jurídica suscitada no presente caso vai ser analisada em duas etapas: 4.1 Ilegalidade do contrato submetido a fiscalização prévia em face do regime jurídico sobre a respetiva formação estabelecido no Código dos Contratos Públicos (CCP); 4.2 Efeito da ilegalidade do contrato no processo de fiscalização prévia: recusa de visto. Ilegalidade do contrato submetido a fiscalização prévia em face do regime concorrencial sobre a respetiva formação estabelecido no Código dos Contratos Públicos 5. A fiscalização prévia do TdC constitui uma competência própria deste órgão cuja intervenção nessa sede é provocada (dependente de impulso exógeno) e tipificada, por referência a uma tabela legal que compreende um âmbito subjetivo (entidades) e objetivo (atos e contratos) delimitador do que está sujeito a fiscalização prévia — enquadramento estabelecido, nomeadamente, pelas disposições conjugadas dos artigos 5.º, n.º 1, alínea c), e 46.º a 48.º da LOPTC. 6. O contrato objeto do processo integra o âmbito objetivo e subjetivo da fiscalização prévia, em face do disposto nas disposições conjugadas dos artigos 2.º, n.º 1, alínea c), 5.º, n.º 1, alínea c), e 46.º, n.º 1, alínea b), da LOPTC. 7. Sendo pacífica a sujeição do procedimento ao Código dos Contratos Públicos (CCP), as questões jurídicas fundamentais reportam-se à conformidade legal do procedimento pré-contratual em face desse referido regime normativo em conjugação com o regime de fiscalização prévia dos contratos pelo TdC, em particular o fundamento para recusa de visto previsto no artigo 44.º, n.º 3, alínea c), da LOPTC e o complexo normativo constituído pelos artigos 1.º-A, n.os 1 e 3, 57.º, n.os 1 e 4, 70.º, n.os 1 e 2, 72.º, n.º 3, e 146.º, n.º 2, alínea e), do Código dos Contratos Públicos, conjugado o artigo 54.º da Lei 96/2015, de 17 de agosto, e os artigos 7.º, 24.º a 31.º, do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto, enquanto regime legal relevante sobre a admissibilidade da exclusão da proposta d mais baixo preço no caso concreto (apresentada por M., Lda – Estudos e Projetos, Ld.ª). 8. A primeira norma que se afigura central para a apreciação convocada nesta sede consta do artigo 1.º-A, n.º 1, do CCP: «na formação e na execução dos contratos públicos devem ser respeitados os princípios gerais decorrentes da Constituição, dos Tratados da União Europeia e do Código do Procedimento Administrativo, em especial os princípios da legalidade, da prossecução do interesse público, da imparcialidade, da proporcionalidade, da boa -fé, da tutela da confiança, da sustentabilidade e da responsabilidade, bem como os princípios da concorrência, da publicidade e da transparência, da igualdade de tratamento e da não-discriminação». 9. Sobre a Noção de proposta, o artigo 56.º do CCP estabelece: «1 - A proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo. 2 - Para efeitos do presente Código, entende-se por atributo da proposta qualquer elemento ou característica da mesma que diga respeito a um aspeto da execução do contrato submetido à concorrência pelo caderno de encargos.» 10. O n.º 3 do artigo 72.º do CCP prescreve: «o júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento.» 11. O artigo 54.º da Lei n.º 96/2015 que regula a disponibilização e a utilização das plataformas eletrónicas de contratação pública dispõe: «1 - Os documentos submetidos na plataforma eletrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura eletrónica qualificada, nos termos dos n.os 2 a 6. 2 - Os documentos elaborados ou preenchidos pelas entidades adjudicantes ou pelos operadores económicos devem ser assinados com recurso a certificados qualificados de assinatura eletrónica próprios ou dos seus representantes legais. 3 - Os documentos eletrónicos emitidos por entidades terceiras competentes para a sua emissão, designadamente, certidões, certificados ou atestados, devem ser assinados com recurso a certificados qualificados de assinatura eletrónica das entidades competentes ou dos seus titulares, não carecendo de nova assinatura por parte das entidades adjudicantes ou do operador económico que os submetem. 4 - Os documentos que sejam cópias eletrónicas de documentos físicos originais emitidos por entidades terceiras, podem ser assinados com recurso a certificados qualificados de assinatura eletrónica da entidade adjudicante ou do operador económico que o submete, atestando a sua conformidade com o documento original. 5 - Nos documentos eletrónicos cujo conteúdo não seja suscetível de representação como declaração escrita, incluindo os que exijam processamento informático para serem convertidos em representação como declaração escrita, designadamente, processos de compressão, descompressão, agregação e desagregação, a aposição de uma assinatura eletrónica qualificada deve ocorrer em cada um dos documentos eletrónicos que os constituem, assegurando-lhes dessa forma a força probatória de documento particular assinado, nos termos do artigo 376.º do Código Civil e do n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, de 2 de agosto, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 88/2009, de 9 de abril, sob pena de causa de exclusão da proposta nos termos do artigo 146.º do Código dos Contratos Públicos. 6 - No caso de entidades que devam utilizar assinaturas eletrónicas emitidas por entidades certificadoras integradas no Sistema de Certificação Eletrónica do Estado, o nível de segurança exigido é o que consta do Decreto-Lei n.º 116-A/2006, de 16 de junho, alterado e republicado pelo Decreto-Lei n.º 161/2012, de 31 de julho. 7 - Nos casos em que o certificado digital não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma eletrónica um documento eletrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante. 8 - Sempre que solicitado pelas entidades adjudicantes ou pelos operadores económicos, as plataformas eletrónicas devem garantir, no prazo máximo de cinco dias úteis, a integração de novos fornecedores de certificados digitais qualificados. 9 - As plataformas eletrónicas devem garantir que a validação dos certificados é feita com recurso à cadeia de certificação completa.» 12. A atual redação do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, com a epígrafe Assinatura eletrónica qualificada, estabelece: «1 - A aposição de uma assinatura eletrónica qualificada a um documento eletrónico equivale à assinatura autógrafa dos documentos com forma escrita sobre suporte de papel e cria a presunção de que: a) A pessoa que apôs a assinatura eletrónica qualificada é o titular desta ou é representante, com poderes bastantes, da pessoa coletiva titular da assinatura eletrónica qualificada; b) A assinatura eletrónica qualificada foi aposta com a intenção de assinar o documento eletrónico; c) O documento eletrónico não sofreu alteração desde que lhe foi aposta a assinatura eletrónica qualificada. 2 - A assinatura eletrónica qualificada deve referir -se inequivocamente a uma só pessoa singular ou coletiva e ao documento ao qual é aposta. 3 - A aposição de assinatura eletrónica qualificada substitui, para todos os efeitos legais, a aposição de selos, carimbos, marcas ou outros sinais identificadores do seu titular. 4 - A aposição de assinatura eletrónica qualificada que conste de certificado que esteja revogado, caduco ou suspenso na data da aposição ou não respeite as condições dele constantes equivale à falta de assinatura.» 13. O artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 290-D/99, com a epígrafe Emissão dos certificados qualificados, na sua atual redação prescreve: «1 - A entidade certificadora emite, a pedido de uma pessoa singular ou coletiva interessada e a favor desta, os dados de criação e de verificação de assinatura ou, se tal for solicitado, coloca à disposição os meios técnicos necessários para que esta os crie, devendo sempre verificar, por meio legalmente idóneo e seguro, a identidade e, quando existam, os poderes de representação d requerente. 2 - A entidade certificadora emite, a pedido do titular, uma ou mais vias do certificado e do certificado complementar. 3 - A entidade certificadora deve tomar medidas adequadas para impedir a falsificação ou alteração dos dados constantes dos certificados e assegurar o cumprimento das normas legais e regulamentares aplicáveis, recorrendo a pessoal devidamente habilitado. 4 - A entidade certificadora fornece aos titulares dos certificados as informações necessárias para a utilização correta e segura das assinaturas, nomeadamente as respeitantes: a) Às obrigações do titular do certificado e da entidade certificadora; b) Ao procedimento de aposição e verificação de assinatura; c) À conveniência de os documentos aos quais foi aposta uma assinatura serem novamente assinados quando ocorrerem circunstâncias técnicas que o justifiquem; d) À força probatória dos documentos aos quais seja aposta uma assinatura eletrónica. 5 - A entidade certificadora organizará e manterá permanentemente atualizado um registo informático dos certificados emitidos, suspensos ou revogados, o qual estará acessível a qualquer pessoa para consulta, inclusivamente por meio de telecomunicações, e será protegido contra alterações não autorizadas.» 14. Atenta a matéria de facto provada, no plano epistémico a única reserva que seria legítimo o júri apresentar quanto à ausência de plenos poderes para representar o concorrente através de assinatura eletrónica reportar-se-ia a uma eventual dúvida sobre os aludidos poderes para assinar eletronicamente a proposta submetida na plataforma. 15. Em caso de dúvida, o ICNF, I.P. deveria dar cumprimento ao disposto no n.º 3 do artigo 72.º do CCP, no qual se prevê a possibilidade de solicitar a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta, em vez da ação adotada pelo júri do procedimento de exclusão da proposta, mesmo depois de junta prova documental dos poderes da pessoa que submeteu a proposta na plataforma eletrónica. 16. A norma em causa foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, sendo a respetiva teleologia destacada no preâmbulo do diploma governamental: «recuperação da possibilidade de sanar a preterição de formalidades não essenciais pelas propostas apresentadas, evitando exclusões desproporcionadas e prejudiciais para o interesse público». 17. Como se sublinha no Acórdão do TdC n.º 29/2019-27.JUL-1.ªS/SS viola os «princípios da legalidade, igualdade, justiça, imparcialidade e boa-fé» a exclusão de candidatura ou de proposta exclusivamente «por força de mera formalidade não essencial» em sentido contrário ao disposto no artigo 72.º, n.º 3, do CCP, e no presente caso verifica-se a agravante de nem sequer ter sido concedido ao concorrente qualquer prazo para satisfazer essa formalidade ou prova de poderes (no do Acórdão n.º 29/2019-27.JUL-1.ªS/SS o excluído era candidato e foi-lhe conferido um prazo para suprir as formalidades determinantes da exclusão). 18. Na mesma linha jurisprudencial, no Acórdão n.º 01/2020-07.JAN-1.ªS/SS, considerou-se que a omissão relativa à falta de demonstração dos «poderes de representação de quem assinava, era suscetível de ser suprida e o júri deveria ter solicitado ao concorrente esse suprimento, em face do estatuído no n.º 3 do art. 72.º do CCP, incluindo, se fosse o caso, através da junção de documento comprovativo dos necessários poderes de representação» para concluir que «não se compreende» «decisão de exclusão» sem que tenha sido «dada a possibilidade de supressão da irregularidade». 19. Acresce que no caso objeto do presente julgamento o concorrente juntou prova dos poderes do subscritor da assinatura eletrónica da proposta em plataforma existente para o efeito, os quais já existiam à data da apresentação da proposta, documentação que, apesar de ter sido apresentada durante a fase de audiência prévia anterior à decisão final sobre a exclusão, não foi atendida pelo júri (cf. supra §§ 2.10 a 2.17), consequentemente a violação por omissão do regime legal foi complementada por uma atuação ilegal por ação da entidade adjudicante ao recusar atender à prova junta pelo concorrente quando este se limitou «a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta» (apesar de o júri reconhecer «caso fosse essa a descrição constante da assinatura à data da submissão da proposta, se consideraria dispensada “a apresentação de qualquer documento adicional referente à forma de obrigação daquela sociedade comercial”», cf. supra § 2.16). 20. Sublinhe-se que o n.º 3 do artigo 72.º do CCP se reporta a um dever do júri que não tinha expressão legal no regime anterior à revisão de 2017 do CCP e no caso concreto o suprimento em causa, comprovativo dos poderes exercidos de assinatura digital, não era suscetível de introduzir qualquer alteração nas qualidades da proposta não tendo, consequentemente, qualquer impacto na sã concorrência (devendo ser tido em atenção que o certificado junto pelo concorrente excluído demonstra que o gerente que assinou eletronicamente a proposta já detinha os respetivos poderes para o efeito à data em que a mesma foi submetida, cf. § 2.14). 21. A exclusão suportada pelo júri nos artigos 57.º, n.os 1 e 4, e 146.º, n.º 2, alínea e), do CCP, tem por base preceitos que, no plano do direito nacional, têm de ser articulados com o artigo 72.º, n.º 3, do CCP e, além do valor da concorrência, com os princípios da prossecução do interesse público, igualdade, proporcionalidade, justiça, imparcialidade e boa-fé consagrados nos artigos 4.º e 6.º a 10.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA). 22. Desta forma, a opção do júri de excluir a proposta de M., LDA, violou a imposição legal estabelecida pelo n.º 3 do artigo 72.º do CCP e dos princípios da transparência, igualdade e concorrência, que constituem a base axiológica do direito da União Europeia, invocada de forma expressa no artigo 1.º-A, n.º 1, do CCP. 23. A referida violação da legalidade tem uma dimensão axiológica indissociável das implicações hermenêuticas dos princípios europeus sobre processo concorrencial aberto, em particular, os artigos 107.º, n.º 1, 120.º, e 173.º, n.º 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE). 24. Desde os primeiros textos fundadores, a União Europeia reclama «uma ação concertada tendo em vista garantir a estabilidade na expansão económica, o equilíbrio nas trocas comerciais e a lealdade na concorrência», paradigma conformador da competência exclusiva da União no «estabelecimento das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno» (artigo 3.º, n.º 1, alínea b), do TFUE). 25. Quadro europeu em que o princípio da concorrência é um dos vetores centrais do programa constitucional da União Europeia refletido, nomeadamente, na jurisprudência do TJUE. 26. Contexto que conforma o direito nacional quanto a procedimentos pré-contratuais que culminam em adjudicações por entidades públicas potencialmente desconformes com o princípio da concorrência, valor reconhecido como primacial no artigo 1.º-A, n.º 1, do CCP. Efeito da ilegalidade do contrato no processo de fiscalização prévia: recusa de visto 27. Sendo o processo de fiscalização prévia teleologicamente vinculado à decisão final sobre concessão ou recusa de visto, a identificação de ilegalidades tem de ser complementada pelo respetivo enquadramento em face das tipologias estabelecidas no artigo 44.º, n.º 3, da LOPTC. 28. No caso concreto, a violação de normas e princípios legais deve ser qualificada como ilegalidade prevista na alínea c) do n.º 3 do artigo 44.º da LOPTC, pois, na medida em que podem alterar o resultado financeiro do procedimento, preenchem o segundo requisito dessa norma para efeitos de recusa de visto — sobre os cânones de ponderação nesta matéria, cf. Acórdão n.º 13/2018 10.JUL-1.ªS/PL (§§ 69 a 73). 29. Juízo sobre alteração potencial do resultado financeiro que tem de ser precedido de um enquadramento conceptual da conexão entre o(s) desvalor(es) consubstanciado(s) na violação de normas e princípios legais com o resultado financeiro envolvido no processo, o qual não tem de ser de um concreto dano, relativo a um nexo causal entre o específico vício e um resultado, mas reportado a uma compreensão abstrato-concreta do vício na etapa procedimental em que ocorre e da importância desta na celebração do contrato. 30. Isto é, para valorar a aptidão da ilegalidade se repercutir no resultado financeiro deve ser ponderado o relevo da mesma na fase procedimental em que ocorre e da específica etapa na decisão final, a adjudicação do contrato, não se exigindo a demonstração de um nexo causal entre o vício e um imediato impacto financeiro. 31. Matriz compreensiva que conforma a jurisprudência maioritária do TdC quer quanto à prática de um ato administrativo com custos financeiros, sendo relevado, para efeitos de interpretação e aplicação da alínea c) do artigo 44.º, n.º 3, da LOPTC, a norma ou complexo normativo violado e a sua dimensão axiológica fundamental, em particular quanto a medidas com resultado financeiro (em que a própria decisão com impacto financeiro podia, em abstrato, não ser praticada2) e nos casos em que a etapa, apesar de não ser relevante para a existência do momento final que concretiza o impacto financeiro (o qual verificar-se-ia, independentemente dos contornos daquela), se afigura suscetível de poder ser considerada mediatamente relacionada com o concreto resultado financeiro, por exemplo, o valor da adjudicação — daí se falar de uma aptidão ou de um perigo abstrato-concreto de impacto financeiro. 32. Em síntese, para o aplicador a questão que se coloca é a seguinte: se não ocorresse o vício a decisão final podia ser diferente na respetiva componente económico-financeira (dimensão que não se refere apenas à aprovação do contrato, mas à celebração do contrato por aquele valor)? 33. Segundo jurisprudência pacífica do TdC, verifica-se o impacto financeiro potencial previsto no artigo 44.º, n.º 3, alínea c), da LOPTC quando no âmbito de procedimento regulado pelo CCP se violam regras fundamentais sobre o imperativo de um procedimento concorrencial. 34. Em particular no caso concreto, o impacto no resultado financeiro é evidente, já que o preço contratual da proposta excluída é inferior ao da proposta sobre a qual recaiu a adjudicação e o único critério de adjudicação era o preço, pelo que, a ser admitida, a proposta excluída seria a vencedora. 35. A ponderação judicial prevista no n.º 4 do artigo 44.º da LOPTC (sobre se a concreta violação da alínea c) do n.º 3 do artigo 44.º da LOPTC deve determinar a recusa do visto ao contrato) tem uma dimensão holista no sentido em que envolve um juízo sobre dimensões gerais e concretas relevantes (para a situação concreta) e pelos princípios da adequação e proporcionalidade, em particular, graus de lesão do interesse público e da ilegalidade. 36. A operação de concordância prática exige uma valoração integrada de todas as ilegalidades identificadas de forma articulada com outros fatores relevantes para o juízo sobre a alternativa dicotómica entre a recusa e a concessão de visto ao concreto contrato que no caso sub judice impõe a recusa de visto em face da pluralidade e gravidade das violações de regras (nacionais e europeias) sobre concorrência na contratação pública. 37. Em conclusão, o Tribunal de Contas deve recusar o visto ao contrato por força do disposto no artigo 44.º, n.º 3, alínea c), da LOPTC. III. DECISÃO Em face do exposto, decide-se recusar o visto ao contrato objeto de fiscalização prévia nos presentes autos. (…)”. 22. Este acórdão do Tribunal de Contas ainda não transitou em julgado – idem, a mesma certidão. * III - Enquadramento jurídico. 1. O acórdão do Tribunal de Contas de 25.03.2020, proferido no processo 4201/2019, em sede de fiscalização prévia do contrato aqui também em apreço; o caso julgado. Caso tivesse transitado em julgado este acórdão, em termos rigorosos, não se podia aqui falar na excepção de caso julgado ou na autoridade do caso julgado, por estarmos, naquele processo e no presente, perante jurisdições distintas e por isso perante causas de pedir e pedidos distintos, ali a apreciação da legalidade da despesa pública que resultará da execução do contrato em apreço, em vez da adjudicação à Autora, e a concessão, ou recusa, do necessário visto prévio do Tribunal de Contas, aqui a legalidade do acto de exclusão da Autora, ora Recorrente, do procedimento pré-concursal assim como a procedência (ou improcedência) do pedido de adjudicação do objecto do contrato à Autora. Mas num ponto nuclear as decisões em ambos os processos se interceptam: a análise da legalidade da exclusão da proposta da Autora e, em contraponto, o imperativo da adjudicação do contrato à Autora, por ser, ou não, a solução legal e mais vantajosa para o erário público. Assim, mostrar-se-ia aconselhável, para evitar uma desconformidade ou contradição prática, que os tribunais administrativos respeitassem neste caso a decisão do Tribunal de Contas. Sob pena de podermos ter na ordem jurídica duas decisões contraditórias: uma, do Tribunal de Contas, a afirmar a ilegalidade da exclusão da proposta da Autora e o imperativo legal de adjudicar o contrato à Autor a impedir, pela recusa do visto prévio, a execução do contrato, e outra, dos Tribunais Administrativos, a afirmar a legalidade da exclusão da proposta da Autora e da adjudicação do contrato à Contra-Interessada que, com base nesta decisão, poderia requerer a execução do contrato, passado por cima da recusa do visto prévio por parte do Tribunal de Contas. Contradição que precisamente a figura jurídica do caso julgado pretende evitar, sendo, por isso, de aplicar o mesmo regime. Como no presente caso a decisão do Tribunal de Contas não transitou em julgado esta questão não se coloca. Mas tal não impede que se acolha, como referência jurisprudencial, o que ficou dito neste acórdão. 2. O mérito da acção e do recurso jurisdicional. 2.1. A legalidade da exclusão da proposta da Autora. A manifestação de vontade resultante da declaração de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, porque vinculativa da sociedade, podia ser conferida pelos administradores a um procurador (nº 7 do artigo 391º do Código das Sociedades Comerciais. No relatório preliminar, o júri do procedimento, alegando que a descrição da assinatura digital em apreço não demonstrava a respetiva função e poder, propôs a exclusão da proposta apresentada pela Recorrente, invocando para o efeito os artigos 57.º, n.º 1 e 4, e 146.º, n.º 2, alínea e), do Código dos Contratos Públicos e o artigo 54.º da Lei 96/2015 – ponto 13 dos factos provados. Relatório que veio a ser mantido, após pronúncia adversa da Autora em sede de audiência prévia, quer no relatório quer que no acto impugnado, e exclusão da proposta da Autora. Acto impugnado que veio ser mantido na ordem jurídica pela decisão recorrida, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela. Decisão da qual se extai, para facilidade de análise, o seguinte, de mais relevante: “(…) Note-se, por exemplo, que a assinatura electrónica constante da pronúncia em sede de audiência prévia apresentada pela Autora no Procedimento (e subsequentes documentos apresentados pela mesma) especifica: “Assinado por J. com recurso a certificado de assinatura electrónica de representação da entidade M., LDA, certificado este que o vincula sozinha a assinar electronicamente em plataformas electrónicas de contratação em nome da M., Lda.”. Efectivamente, tal assinatura electrónica é manifestamente distinta daquela aposta pela Autora nos documentos que compunham a sua proposta. Apenas em sede de audiência prévia, a Autora procedeu à junção de certidão emitida pela DigitalSign (não datada, note-se!), alegadamente evidenciando os poderes necessários à vinculação da sociedade pela assinatura única do gerente J.. A este propósito importa atender ao previsto no artigo 57.º do CCP, o qual especifica, no n.º 1, alínea a), que a proposta é constituída, entre outros documentos, por uma declaração do concorrente de aceitação do conteúdo do caderno de encargos, elaborada em conformidade com o modelo constante do anexo I ao referido Código. Determina ainda o n.º 4 desta norma que a referida declaração deve ser assinada pelo concorrente ou por representante que tenha poderes para o obrigar. Ora, apenas em sede de audiência prévia quanto ao teor do Relatório Preliminar, a Autora procedeu à alteração da assinatura electrónica por si utilizada – que passou a usar desde então no Procedimento – e, bem assim, juntou Declaração da DigitalSign que, ainda que não datada, atesta a referida titularidade. Ora, a assinatura prevista no n.º 4 do artigo 57.º do CCP reveste a forma de assinatura digital, nos termos da Lei das Plataformas Electrónicas. Estabelece o artigo 54.º da referida Lei, que “os documentos submetidos na plataforma electrónica, pelas entidades adjudicantes e pelos operadores económicos, devem ser assinados com recurso a assinatura electrónica qualificada, próprios ou dos seus representantes” e que “nos casos em que o certificado digital não possa relacionar o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma electrónica um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e a assinatura do assinante.”. Conforme se escreve no Acórdão do Tribunal Administrativo Norte, de 26.01.2018, processo n.º 00280/17.2BEVIS , a necessidade de verificação da suficiência dos poderes de quem assina eletronicamente “Trata-se da exigência de uma declaração de vontade por parte do concorrente para a celebração do contrato público que, consequentemente, deve observar os ditames constantes dos artigos 217.º e seguintes do Código Civil. Ora, o n.º 1 do artigo 260.º deste normativo especifica que se uma pessoa dirigir em nome de outrem uma declaração a terceiro, pode este exigir que o representante, dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes, sob pena de a declaração não produzir efeitos. (…).” É o que resulta, igualmente, do Código das Sociedades Comerciais, especificamente, e no que às sociedades por quotas respeita, do artigo 260.º do aludido Código, sob a epígrafe “Vinculação da Sociedade”. Conforme evidencia o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte acima citado “De facto, uma coisa é ter poderes para „comunicar‟com a plataforma electrónica; outra bem distinta, é ter poderes para emitir uma declaração de vontade em nome da sociedade comercial e a vincular. Não tendo quem assinou poderes para obrigar a sociedade, individualmente considerado, e não tendo sido junta procuração que, nos termos legais, pudesse constituir uma válida declaração de vontade por parte da sociedade comercial, em cumprimento dos normativos legais e do respetivo pacto social (…) viola o dever imposto no n.º 4 do artigo 57.º do CCP.” Neste mesmo sentido pronunciou-se também o Tribunal Central Administrativo Norte, no Acórdão de 26.05.2017, processo n.º 00440/16.3BEVIS . Contrariamente ao afirmado pela Autora na sua petição inicial, não estamos in casu perante uma mera irregularidade formal, tratando-se antes de um requisito de validade substantiva – ou seja, a verificação, no caso concreto, de que quem pretende vincular a sociedade tem poderes para o fazer. Insuficiência, esta, insusceptível de ser rectificada subsequentemente, sob pena de violação do princípio da intangibilidade das propostas. Neste mesmo sentido, têm-se pronunciado a nossa jurisprudência, designadamente o Supremo Tribunal Administrativo, considerando que “(…) as irregularidades iniciais do género – recaídas sobre a própria vontade de contratar – não podem ser supridas «medio tempore».”. Pelo que tais requisitos devem ser aferidos quanto à contemporaneidade da assinatura, devendo, como tal, a função e poder de assinatura evidenciar-se logo aquando da submissão da proposta e não em momento posterior. Daí que no primeiro Relatório Final, a Entidade Demandada tenha considerado que “(…) a assinatura electrónica encriptada dos documentos da proposta não reunia os pressupostos que permitiam aferir integralmente os poderes que nela estão investidos, designadamente, a suficiência da dita assinatura para vinculação legal da proposta apresentada por aquela sociedade comercial(…)” e tenha considerando que “(…)situação diferente constitui, de facto, a assinatura que se encontra aposta sobre o documento da pronúncia, a qual se tivesse sido utilizada no documento da proposta dispensaria a apresentação de qualquer documento adicional referente à forma de obrigação daquela sociedade comercial (…)” e, por isso, tenha decidido que “(…)a presunção da titularidade imbuída na assinatura encriptada no documento da pronúncia não se estenderá retroativamente à assinatura aposta sobre os documentos da proposta (…)”; O que foi secundado no segundo Relatório Final, onde se decidiu“(…) manter a decisão anteriormente anunciada e propor a exclusão das propostas apresentadas pelo concorrente M., Lda para o lote 1 e 5 com fundamento no disposto nos n.ºs 1 e 4 do artigo 57.º, na alínea e) do n.º 2 do artigo 146.º, todos do CCP, e nos n.ºs 2 e 7 do artigo 54.º da Lei 96/2015, de 17 de Agosto (…).” Dispõe o artigo 148.º, n.º 1 do CCP que “(…) o júri elabora um relatório final fundamentado, no qual pondera as observações dos concorrentes efetuadas ao abrigo do direito de audiência prévia, mantendo ou modificando o teor e as conclusões do relatório preliminar (…)”. Ora, analisado a fundamentação constante do relatório final acima transcrito, designadamente no que tange à apreciação da pronúncia em sede de audiência prévia apresentada pela Autora, constata-se que o Júri do procedimento não só expôs os motivos por que não atendeu às observações críticas efectuadas por aquela em sede de audiência prévia, como também indica, fundamentadamente, as razões subjacentes à decisão de manutenção das conclusões constantes do relatório preliminar. Impunha-se, face ao supra exposto, a exclusão da proposta da Autora pela , para os Lotes 1 e 5, ao abrigo do disposto nos n.ºs 1 e 4 do artigo 57.º, na alínea e) do n.º 2 do artigo 146.º, todos do CCP, e nos n.ºs 2 e 7 do artigo 54.º da Lei das Plataformas Electrónicas. Assim, não podem ser assacados vícios à decisão de adjudicação e/ou exclusão que acompanha o entendimento plasmado no Primeiro e Segundo Relatórios Finais. Em relação ao argumento da Autora no sentido de que ambos sócios-gerentes assinaram manualmente a proposta e que isso deveria ter sido tido em consideração pelo júri do concurso, reitere-se que, a Lei n.º 96/2015, de 17 de agosto optou por um modo concreto de assinatura dos documentos constituintes das propostas e não um qualquer, e, esse modo, consubstancia-se na assinatura eletrónica qualificada, que não a assinatura manual. Efectivamente, se o enquadramento legal anterior à vigência da Lei 96/2015 admitiria, e diferenciava, a possibilidade de os documentos serem assinados manuscritamente pelos titulares do direito de representação das entidades e de a assinatura digital possuir um efeito meramente legitimador do ato de submissão das propostas em plataformas eletrónicas, o mesmo parece não se prever desde aquela vigência, a qual terá passado a valorar unicamente a utilização de assinaturas digitais, tornando irrelevante as assinaturas manuscritas. Com sustento na fundamentação supra, improcede, pois, este fundamento. Aqui chegados, por tudo quanto acima vem explicitado, não podem ser assacados vícios à decisão de adjudicação e/ou exclusão que acompanha o entendimento plasmado no Primeiro e Segundo Relatórios Finais e, decidindo este Tribunal pela conformidade do ato de exclusão com as normas do Programa do Concurso e com os normativos acima expressamente indicados, é forçoso concluir pela improcedência da pretensão condenatória. * Nos termos previstos no artigo 527º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável, ex vi, do artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos será de condenar em custas a Autora. (…)”. Esta decisão assentou, em resumo, em dois pressupostos: 1º - certificado de assinatura electrónica que “alegadamente evidencia os poderes necessários à vinculação da sociedade pela assinatura única do gerente J. apenas foi apresentado em sede de audiência prévia e deveria ter sido apresentado logo com a proposta 2º - contrariamente ao afirmado pela Autora na sua petição inicial, não estamos in casu perante uma mera irregularidade formal, tratando-se antes de um requisito de validade substantiva – ou seja, a verificação, no caso concreto, de que quem pretende vincular a sociedade tem poderes para o fazer; insuficiência, esta, insusceptível de ser rectificada subsequentemente, sob pena de violação do princípio da intangibilidade das propostas, pelo que a proposta foi validamente rejeitada, face ao disposto nos n.ºs 1 e 4 do artigo 57.º, na alínea e), do n.º 2, do artigo 146.º, todos do Código dos Contratos Públicos, e nos n.ºs 2 e 7 do artigo 54.º da Lei 96/2015, de 17 de Agosto. Não subscrevemos este entendimento. Ao disposto no artigo 54º da Lei n.º 96/2015, de 17.08, em que se apoia no essencial a decisão recorrida, sucedeu o disposto no n.º 3 do artigo 72º do Código de Contratos Púbicos, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31.08, com início de vigência em 01.01.2018 e por isso aplicável ao caso dos autos: “O júri deve solicitar aos candidatos e concorrentes que, no prazo máximo de cinco dias, procedam ao suprimento das irregularidades das suas propostas e candidaturas causadas por preterição de formalidades não essenciais e que careçam de suprimento, incluindo a apresentação de documentos que se limitem a comprovar factos ou qualidades anteriores à data de apresentação da proposta ou candidatura, e desde que tal suprimento não afete a concorrência e a igualdade de tratamento”. Norma invocada pela ora Recorrente e no acórdão do Tribunal de Contas, referido na matéria de facto agora aditada. Como ali se declara, no ponto 16: “A norma em causa foi introduzida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, sendo a respetiva teleologia destacada no preâmbulo do diploma governamental: «recuperação da possibilidade de sanar a preterição de formalidades não essenciais pelas propostas apresentadas, evitando exclusões desproporcionadas e prejudiciais para o interesse público». Possibilidade afirmada já no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 22.06.2011, no processo 770/10.8, com o mesmo Relator (sumário): “1. Nos termos do disposto no artigo 27°, n.° 3 da Portaria n.° 701-G/2008, nos casos em que o certificado digital não possa relacionar directamente o assinante com a sua função e poder de assinatura, deve a entidade interessada submeter à plataforma um documento electrónico oficial indicando o poder de representação e assinatura do assinante. 2. Porém o facto de um candidato não ter submetido à plataforma, pelo menos até à adjudicação, documento electrónico oficial apto a atestar a qualidade de quem assinou a sua proposta não deve levar à exclusão da proposta se efectivamente quem assinou a proposta tinha poderes para representar e obrigar a mesma concorrente, facto que o Júri do concurso comprovou por elementos extra concursais de que dispunha e por a empresa em causa, em momento ulterior, ter procedido à apresentação da Certidão Permanente. 3. O ónus de submeter à plataforma electrónica um documento oficial, que permita aferir dos poderes de representação do assinante, não constituiu um requisito de validade material e intrínseca da proposta mas apenas uma exigência formal. 4. O cumprimento desta formalidade legal destina-se a assegurar o cumprimento de uma exigência substantiva, a de que quem vincula a empresa à aceitação do caderno de encargos, por meios electrónicos estabelecidos na lei, tem poderes para o fazer. 5. Alcançado este desiderato legal, não se justifica excluir a proposta nos termos previstos no artigo 146°, n.° 2, al. e) do Código dos Contratos Públicos, pois este preceito impõe a exclusão de uma proposta somente quando quem assina digitalmente a proposta não tem poderes para representar e obrigar a mesma concorrente.” O que se manteve no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 16.02.2018, processo 1335/16.6 BRG, com o mesmo Relator (sumário): “1. A exclusão de uma proposta reduz a concorrência. Logo as hipóteses de exclusão das propostas devem ser reduzidas ao mínimo necessário, de forma a garantir o mais amplo possível leque de propostas. 2. Este mínimo necessário traduz-se precisamente em apenas permitir a exclusão nos casos expressos previstos na lei (tipificação dos casos de exclusão) e interpretar estas normas de forma restritiva e não extensiva e, menos ainda, analógica. (…)” Como defende Rodrigo Esteves de Oliveira, em “Os princípios gerais da contratação pública”, nos “Estudos de Contratação Pública” (CEDIPRE), I volume, Coimbra Editora, 2008, página 111, seguindo o entendimento anti-formalista prevalecente na nossa doutrina e jurisprudência, “…haverá uma situação de irrelevância do vício de procedimento sempre que (e na medida em que) os fins específicos que a imposição legal (ou regulamentar) da formalidade visava atingir tenham sido comprovadamente alcançados, ainda que por outra via” (na jurisprudência, seguindo este entendimento, ver os acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 22.10.2010, no processo n.° 323/10.0 BECBR, citado na sentença recorrida, e de 27.01.2011, processo n.º 228 10.5 BEVIS). Nos termos do preceituado no artigo 56°, n.° 1 do Código dos Contratos Públicos, a proposta é a declaração da vontade de contratar nos termos e condições constantes do caderno de encargos e inclui documentos relativos aos atributos da proposta, isto é, ao modo como o concorrente se dispõe a contratar os aspectos submetidos à concorrência pelo caderno de encargos. É o caso, por exemplo, dos aspectos referentes ao preço, elemento típico de submissão à concorrência. A comprovação, por meios electrónicos, dos poderes para representar a empresa concorrente não integra, como é evidente, os elementos intrínsecos da proposta, sujeitos à concorrência, mas traduz, antes, um aspecto meramente formal da proposta. Pelo que não se verifica qualquer violação de princípios concursais, designadamente, o princípio da intangibilidade das propostas, da igualdade, da concorrência, da imparcialidade da transparência e boa-fé. Estes princípios são violados, isso sim, pela exclusão de uma proposta com um fundamento que não tem a ver com o mérito da proposta, mas apenas com um aspecto formal para o qual a legislação aplicável prevê a sanação. No caso concreto a Autora demonstrou, através de documento cuja genuinidade e autenticidade ninguém pôs em causa, que o sócio gerente da Autora J. era detentor de um certificado de assinatura eletrónica de representação da M., Lda que vinculava a empresa apenas com a assinatura deste sócio gerente nas plataformas eletrónicas de contratação, certificado válido para o período de 19.12.2016 a 19.12.2019 – cfr. processo instrutor. Ou seja este documento comprova que durante todo o período do procedimento do concurso aqui em causa, incluindo o da apresentação das propostas, o referido sócio gerente tinha poderes para vincular a sua empresa com apenas a sua assinatura. Não se vê, por outro lado, qual a relevância de este certificado não estar datado nem referir este procedimento em concreto quando refere os dados que são relevantes: o seu período de validade e a finalidade genérica, a assinatura de documentos nas plataformas de contratação. Assim como não se vê relevância em este documento não coincidir com o apresentado com as propostas. Se coincidisse não haveria interesse na sua apresentação em sede de audiência prévia. O que significa que o mencionado sócio tinha poderes para vincular apenas com a sua assinatura a empresa M., Lda pelo que não havia fundamento válido para excluir a sua proposta. Termos em que se impõe, ao invés do decidido na decisão recorrida, anular o acto impugnado, de exclusão da proposta da Autora, ora Recorrente, por violação de lei, julgando logo nessa parte procedente a acção. 2.2. A adjudicação do contrato em apreço à Autora, ora Recorrente. Não havendo motivo para exclusão e sendo a proposta da Autora, ora Recorrente, a proposta com o preço mais baixo, deveria ter-lhe sido adjudicado o contrato de empreitada, tal como pediu, porque o preço mais baixo era o único critério de adjudicação – facto provado no n.º6. Tal como decidido para o caso concreto pelo acórdão do Tribunal de Contas de 25.03.2020, proferido no processo 4201/2019. E, em abstracto, já tinha sido decidido pelo mencionado acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 16.02.2018, processo 1335/16.6 BRG. O que determina a procedência da acção e, logo, do recurso jurisdicional, quanto ao pedido de condenação da Entidade Demandada a adjudicar o contrato do procedimento em apreço à Autora, ora Recorrente. * IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em CONCEDER PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que:1. Revogam a decisão recorrida. 2. Julgam a acção procedente e, em consequência: 2.1. Anulam o acto impugnado, de exclusão da Autora. 2.2. Condenam a Entidade Demandada a adjudicar o contrato em apreço à Autora, ora Recorrente. * Custas do recurso pela Contra-Interessada, ora Recorrida, a única que contra-alegou.* Porto, 18.12.2020 Rogério Martins Luís Garcia Frederico Branco |