Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00387/07.4BEPRT |
![]() | ![]() |
Secção: | 2ª Secção - Contencioso Tributário |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 02/25/2021 |
![]() | ![]() |
Tribunal: | TAF do Porto |
![]() | ![]() |
Relator: | Paula Moura Teixeira |
![]() | ![]() |
Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL; MAIS-VALIAS; VALOR DE REALIZAÇÃO; VALOR DE AQUISIÇÃO; |
![]() | ![]() |
Sumário: | I- Da conjugação do n.º 1 do art.º 43.º, n. º1 alínea f) e n.º 1 do 45.º do CIRS resulta que a mais-valia corresponde ao saldo apurado entre valor da realização e o valor da aquisição gratuita tendo por referência, à data do facto tributário, o valor do imposto considerado para efeitos de imposto do sobre sucessões e doações e o de realização, na percentagem de 50%. II. O ato tributário, enquanto ato divisível, tanto por natureza como por definição legal, é suscetível de anulação parcial. III. O critério para determinar se o ato deve ser total ou parcialmente anulado passa por aferir se a ilegalidade afeta o ato tributário no seu todo, caso em que o ato deve ser integralmente anulado, ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial IV. O critério para determinar se o ato deve ser total ou parcialmente anulado passa por aferir se a ilegalidade afeta o ato tributário no seu todo, caso em que o ato deve ser integralmente anulado, ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial. V - Não impede a anulação parcial do ato a necessidade de um ulterior acertamento por parte da AT, de modo a conformar a parte remanescente do ato com os termos da decisão judicial anulatória, como o impõe no caso.* * Sumário elaborado pela relatora |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Recorrente: | Fazenda Pública |
Recorrido 1: | M. |
Votação: | Unanimidade |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Decisão: | Conceder parcial provimento ao recurso. |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer no sentido de dever ser concedido provimento ao recurso. |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: * 1. RELATÓRIOA Recorrente, FAZENDA PÚBLICA, recorre da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial, da liquidação de IRS, referente ao exercício de 2002, com imposto a pagar de € 20 464,56. A Recorrente não se conformou com a decisão tendo interposto o presente recurso formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões: “ (…) A douta sentença concedeu provimento à impugnação anulando os actos tributários de liquidação de IRS e de juros compensatórios, por haver considerado que a liquidação teve por base valor de aquisição errado, no que concerne ao prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo (...), sendo o erro nos pressupostos de facto determinante da anulação da liquidação impugnada (imposto e juros compensatórios) e do direito a juros indemnizatórios devidos ao impugnante, com o que a Fazenda Pública não pode conformar-se. A. Discordamos do probatório fixado, atentas as soluções de direito configuráveis para a decisão da causa, e atenta a aplicação do direito efectuada, atendendo às razões que de imediato passamos a elencar. C. Não se encontrando sujeitas a tributação as mais valias geradas pela alienação de imóveis adquiridos antes de 01,01.1989, de acordo com o disposto no art. 5° do Decreto-Lei n° 442-A/88 de 30 de Novembro, o valor de aquisição correspondente à parte adquirida antes desta data não deve ser considerado, assim como o valor de realização a considerar apenas deve incluir o corresponde ao valor proporcionalmente apurado como correspondente à parte dos imóveis adquirida após a entrada em vigor do CIRS. D. Consequentemente, a aquisição pela impugnante na pendência do casamento, de 25% do artigo (...) do qual provem o artigo (...), corresponde a uma parte que se encontra não sujeita a tributação, não devendo o valor correspondente ser considerado para efeitos de apuramento do valor de aquisição, assim como o valor de realização que proporcionalmente lhe corresponda não deverá ser considerado para efeitos do apuramento da mais valia tributável. E. Por outro lado, é determinante dar como provado o valor patrimonial do mesmo prédio à data da morte do marido da impugnante, em 16.09.1991 (o facto dado como provado na alínea c) da fundamentação de facto constitui apenas a data do falecimento), sendo o próprio impugnante a admitir o valor patrimonial de € 21.452,30 a considerar para este efeito. F. A douta sentença ao indicar as operações a que havia de proceder-se para determinar o valor de aquisição do prédio considerou, erradamente, o valor patrimonial de 33.765,92, para a determinação do valor de aquisição de 25% do artigo (...), em 16.09.1991, por morte do marido da impugnante, assim alcançando um valor de € 4.220,74, quando o valor a considerar seria de € 2.681,54 G. Pelas razões até aqui expostas, consideramos que o valor de aquisição determinado na douta decisão recorrida não se encontra correcto, sendo certo que ainda que se considerasse correcto o valor apurado, tal não seria susceptível de suportar a anulação da liquidação na sua totalidade como foi sentenciado, pois que a liquidação deveria manter-se na parte não viciada. H. Isto é, tendo sido concluído que a liquidação se encontrava viciada por erro nos pressupostos de facto, atendendo à consideração de um valor de aquisição inferior ao que se determinou como correcto, tal sustentaria a anulação da liquidação apenas na parte correspondente ao valor de imposto que a mais foi considerado devido atento o valor de aquisição imputado. I. A douta sentença, com base na determinação do valor de aquisição que efectuou deveria ter declarado a anulação parcial da liquidação, pelo valor excedente àquele que seria o resultante se o apuramento da mais valia tivesse sido com base no valor reputado correcto, uma vez que o acto de liquidação é, por natureza, divisível, devendo ser anulado apenas na parte eivada de erro ou ilegalidade. J. Como referem Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e Pacheco Amorico, no seu Código de Procedimento Administrativo comentado, a pág. 663, "em vez de se revogar o acto que está ferido de ilegalidade, ele é depurado das suas imperfeições iniciais e mantido (total ou parcialmente) na ordem jurídica, técnica que deve ser considerada como manifestação do princípio do aproveitamento do acto administrativo". K. A douta decisão recorrida violou o disposto no art. 5° do Decreto-Lei n° 442-A/88 de 30 de Novembro e o disposto no art. 45°, n° 1° do CIRS, impondo-se a sua revogação. Termos em que, deve ser dado provimento ao recurso, revogando-se a douta sentença recorrida..(…)” * A Recorrida contra-alegou tendo formulado as seguintes conclusões: “(…) 1ª CONCLUSÃO O valor patrimonial do art. (...)°-U, vigente em 16/09/1991, era de 33.765,92€, como fez constar a impugnante/recorrida, das alegações dos artigos "7" a "11", assim como o mesmo V P que foi dado como provado na sentença recorrida consta no (doc. «17» da p.i.). 2ª CONCLUSÃO Tendo-se demonstrado na sentença recorrida esse erro nos pressupostos de facto, verifica-se que existe uma discrepância entre o conteúdo do acto tributário praticado, e as normas invocadas pela impugnante/recorrida, que são aplicáveis ao facto tributário, pelo que a liquidação impugnada enferma de vício de violação de lei. Se a liquidação impugnada enferma de vício de violação de lei, deve ser totalmente anulada, por ilegal e inválida, como cabalmente se demonstrou e decidiu a sentença recorrida. 3ª CONCLUSÃO No acto tributário impugnado, ao contrário do que defende a Fazenda Pública, não se vê, como poderia agora o Tribunal recorrido, vir a efectuar, ou mandar efectuar (aproveitar o acto impugnado), uma nova liquidação, usando para o efeito os elementos que deu como provados, em conjunto com os restantes. Pelo exposto, com tantos e tão variados pressupostos de facto e direito relevantes para a situação tributária em causa, não se consegue descortinar, como poderia o Tribunal recorrido, sem mais, decidir manter um acto tributário que verificou estar inválido, com base nos pressupostos que resultam da lei, pois tudo indicia existirem outras vinculações a atender para além das que já constam do processo. Termos em que a Recorrida considera que a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto recorrida deverá ser mantida nos seus precisos termos. Como sempre, farão V.(s) Ex.ª(s), inteira e objectiva JUSTIÇA! (…)” * O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal emitiu parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso revogar a sentença recorrida.* Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF e atendendo à situação atual de pandemia, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, submetendo-se à Conferência para julgamento.2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, a quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, sendo as de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de facto e direito (i) por violação do disposto no art.º 5° do Decreto-Lei n° 442-A/88 de 30 de novembro e o disposto no art.º 45°, n° 1° do CIRS (ii) e erro de julgamento por anular totalmente a liquidação de IRS, aqui em causa. 3.JULGAMENTO DE FACTO 3.1. Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:“(…) A. Em 02.04.1978, a impugnante casou com A. no regime da comunhão do adquiridos – cfr. fls. 69. B. Em 31.12.1989, o valor patrimonial tributário do prédio inscrito na matriz sob o Artigo (...) era de € 33.765,92 – cfr. fls. 69. C. Em 16.09.1991, A. faleceu - cfr- fls. 68. D. Em 1998, foi inscrita na matriz o prédio urbano sob o artigo (...), proveniente do artigo (...), em regime de compropriedade, sendo 50% a favor da impugnaste e 50% a favor de A. com o valor patrimonial de € 90.031,42 - cfr. fls. 86 a 88. E. O artigo (...) integrava os prédios correspondentes aos artigos urbanos 2028 e (...) - cfr. fls. 97. F. Em 03.06.1998, a impugnante e A. outorgaram escritura pública de divisão, da qual resultou a autonomização do prédio inscrito na matriz sob o artigo (...), com o valor patrimonial de 18.049.680$00 (€90.248,40), o qual foi adjudicado à impugnante - cfr. fls. 96 a 99. G. Em 09.04.2002, pelo Serviço de Finanças de Beja foi emitida "Cópia do termo de declaração - Imposto Municipal de Sisa'', com o seguinte teor: "(...) P. (…), na qualidade de gestor de negócios de A., S.A. (…), declarou que pretende pagar a sisa que for devida com referência à compra que, pelo preço total de 349.159,00 € vai fazer a M.,(…), dos seguintes prédios: - Prédio urbano, inscrito (…) na respectiva matriz predial urbana da freguesia de Santa Maria da Feira, sob o artigo n.º (...), com o valor patrimonial de 90.031,42 € e o valor declarado de 174,579,50 € - Prédio urbano (…), inscrito na respectiva matriz predial urbana da freguesia de Santa Maria da Feira, sob o artigo n.º (...), com o valor patrimonial de 10.831,50 € e o valor declarado de 174.579,50 € (…) – cfr. fls.38 do PA apenso. H. Em 15.04.2002, a impugnante e o administrador de A., S.A., outorgaram "contrato-promessa de compra e venda-, tendo por objecto os prédios urbanos destinados a armazéns inscritos na matriz predial urbana sob os artigos (...) e (...), coro os valores patrimoniais de € 10831,30 e €90.031,42, respectivamente, nos termos do qual a impugnante declara prometer venda e a A. declara prometer comprar os referidos prédios pelo preço global de € 349.159,00, correspondendo a cada prédio a quantia de € 174.579.50, sendo entregue no acto pela promitente compradora a quantia de € 17.333,00, a titulo de sinal e corno principio de pagamento, sendo paga a quantia de € 97.240.00 em 65 prestações mensais de 1.496,00, com início em Maio de 2002 e término em 07.09.2007, e sendo a restante parte do preço - € 234,586,00 - liquidada no acto da escritura pública de compra e venda: mais ficou declarado que a promitente compradora entrou na posse dos referidos imóveis na data da celebração do contrato-promessa - cfr. fls. 50 a 55 do PA apenso. I. Em 2003, foi determinado o valor patrimonial do prédio inscrito sob o artigo (...) em 102.635,81 - cfr. fls. 90. J. Em 07.04.2003, a impugnante apresentou declaração modelo 3 de IRS relativa ao ano de 2002 - cfr. fls. 32 a 35. K. Na sequência da declaração de IRS apresentada pela impugnante, foi emitida a liquidação com o n.º 2003 560 3436897 - cfr. fls. 37. L. Com data de 09.02.2006, pela Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Beja, foi dirigido à impugnante o oficio n.º 200422, notificando-a para regularizar a omissão declarativa relacionada com a alienação dos prédios inscritos na matriz sob os artigos (...) e (...), mediante a apresentação de uma declaração de substituição modelo 3 de IRS para o ano de 2002, acompanhada do anexo G, com os valores relativos à venda e aquisição dos referidos prédios cfr. fls. 41. M. Em 20.02.2006, a impugnante apresentou declaração de substituição na qual declarou, quanto aos rendimentos da categoria T obtidos no ano de 2002, os seguintes valores - cfr. fls. 42 a 47: [imagem que aqui se dá por reproduzida] N. Por oficio da Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o rendimento e sobre a despesa (SEGIR) datado de 10.04.2006, foi a impugnante notificada para entregar a declaração modelo 3 do IRS com anexo G por ter obtido rendimentos da categoria em virtude da venda, em 09.04.2002, dos prédios correspondentes aos artigos matriciais (...) e (...) – cfr. fls. 51. O. Em 26.06.2006, a Divisão de Liquidação dos Impostos sobre o rendimento e sobre a despesa (SEGIR) emitiu “informação" que dirigiu à impugnante com o seguinte teor - cfr. fls. 53 e 54: "(...) Tendo por base o conhecimento de sisa n.º 274, de 09.04.2002, do serviço de finanças de Beja, verificou-se que alienou, pelo preço de € 349.159,00, à A., S.A., os prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos (...) e (...), da freguesia de Santa Maria da Feira, Beja. Após consulta ao sistema informático central, verifica-se que declarou a venda mencionado, conforme estava obrigada pela conjugação do disposto nos artigos 10.º, 15.º e 57.º, todos do CIRS, havendo no entanto, uma divergência entre as datas e os valores de aquisição indicados e os fornecidos pela Divisão de inspecção Tributária, a funcionar junto da Direcção de Finanças de Beja. Face ao que foi anteriormente exposto, vão estes serviços propor a alteração do conjunto dos rendimentos líquidos, nos termos previstos nos artigos 65.º e 66.º do Código do IRS, considerando mais-valia o montante de € 94.039,40, determinado de acordo com o disposto nos artigos 43. ° a 51.º do mesmo diploma legal, conforme mapa anexo. No cálculo da mais-valia foi considerada a aquisição de 50% do prédio com o artigo (...) em 16.09.1991 pelo valor de 4.165,96 € e de venda 87.289,75 €; 25% do artigo (...) com o valor de aquisição de 5.363,08€, reportado a 16.09.1991 e 43.644,88€ de venda e 50% do mesmo prédio com o artigo (...) em 31.12.1997 com o valor de aquisição de 13.944,00€ e de venda 87.289,75€, conforme mapa anexo (…) Demonstração do cálculo do valor da mais-valia fiscal Identificação do vendedor: M. (…) [imagem que aqui se dá por reproduzida] Em 10.07.2006, foi emitida a liquidação n.º 2006 5002256276, por referência à impugnante, respeitante ao ano de 2002, de onde resultou um valor a pagar de € 18.787,44 – cfr. fls. 48. P. Em 16.08.2006, a impugnante procedeu ao pagamento do imposto correspondente à liquidação emitida em 10.07.2006 – cfr. fls. 50. Q. Em 23.11.2006, foi emitida “Demonstração de compensação” por referência à impugnante, com o seguinte teor - fls. 31 do PA apenso: [imagem que aqui se dá por reproduzida] Em 02.01.2007, a impugnante procedeu ao pagamento da quantia de €20.494,56 – cfr. fls. 67. S. Em 12.02.2007, deu entrada neste Tribunal a petição de impugnação judicial que deu origem aos presentes autos - cfr. fls. 2. T. Em 29.10.2007, a impugnante e o administrador de A., S.A,. outorgaram "contrato de compra e venda", tendo por objecto os prédios urbanos destinados a armazéns inscritos na matriz predial urbana sob os artigos (...) e (...), com os valores patrimoniais de €10831,50 e €90.031,42, respectivamente, nos termos do qual a impugnante declara vender e a A. declara comprar os referidos prédios pelo preço global de € 349.159,00. - cfr. fls. 105 a 107. Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos. O Tribunal formou a sua convicção re1ativamente a cada um dos factos dados como assentes, rendo por base os documentos juntos aos autos, os quais não foram objecto de impugnação. (…)” 4. JULGAMENTO DE DIREITO 4.1. A questão principal em que se centra o recurso é o de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento no âmbito da valoração da prova produzida e da aplicação do direito, por violação do disposto no art.º 5° do Decreto-Lei n° 442-A/88 de 30 de novembro e o do n.º 1 do art. º 45°do CIRS. Vejamos: O n.º 1 do art.º 43.º do CIRS, (atual art.º 44.º) na redação à data do facto tributário, determinava que:” O valor dos rendimentos qualificados como mais valias é o correspondente ao saldo apurado entre as mais valias e as menos valias realizadas no mesmo ano ..”: (...). Por sua vez o n.º 2 do mesmo artigo refere que no caso de alienação de imóveis apenas é considerado 50% do seu valor. Nos termos do art.º 44.º do CIRS, o valor de realização, (venda/alienação) tratando-se de compra e venda de bem imóvel corresponde à contraprestação, ou seja, ao valor da venda. Por sua vez, o art.º 45.º do CIRS (a data dos factos) previa que: “1 - Para a determinação dos ganhos sujeitos a IRS considera-se o valor de realização, no caso de bens ou direitos adquiridos a título gratuito, o valor que tenha sido considerado para efeitos de imposto do sobre sucessões e doações.” Assim, o valor de aquisição, a título gratuito é o valor que tenha sido considerado para efeitos de imposto do sobre sucessões e doações. Da conjugação do n.º 1 do art.º 43.º, n. º1 alínea f) e n.º 1 do 45.º do CIRS resulta que a mais-valia corresponde ao saldo apurado entre valor da realização e o valor da aquisição gratuita tendo por referência, à data do facto tributário, o valor do imposto considerado para efeitos de imposto do sobre sucessões e doações e o de realização, na percentagem de 50%. Para melhor compreensão importa fazer uma resenha factual da situação. A Recorrida/Impugnante apresentou em 07.04.2003 a declaração de rendimento (mod. 3 de IRS) referente ao ano de 2002, na qual declarou mais valias decorrentes da alienação de imóveis urbano da freguesia de Santa Maria da Feira, Beja, inscrito na matriz predial urbana sob o n.º (...) que teve a sua origem no art.º (...), e do art.º (...).º, de que era proprietária. Nessa sequência a Administração Fiscal procedeu à liquidação de IRS. No entanto, em 09.02.2006, no âmbito de uma fiscalização interna a Impugnante/Recorrida foi notificada para regularizar a situação relativa a omissão de valores relativos á celebração de um contrato promessa. Nessa sequência foi apresentada nova declaração de IRS, que deu origem a liquidação no valor de € 18 787,44 cujo pagamento efetuou. Porém em 26.06.2006 foi novamente instada a prestar esclarecimentos e posteriormente notificada para o exercício do direito de audição, dando origem a nova liquidação, desta vez, no valor de mais € 20 494,56, valor que foi oportunamente pago. A Recorrida, na petição inicial questiona única e exclusivamente o valor de aquisição, para efeitos de mais valias decorrentes da alienação do art.º (...) de Beja, e não a do art.º (...).º de Beja, também objeto de liquidação. A Administração entende que em 16.09.1991 o valor da aquisição de 25% desse prédio foi de € 5 363,08 e em 31.12.1997 aquisição de 50% de € 13 944,00, face ao valor de realização ocorrida em 02.2004 perfazia uma mais valia de € 188 078,80. A Recorrente não concorda, e entende o valor de aquisição de 25% desse prédio foi de € 5 363,08 e em 06.1998 a aquisição de 50% de € 90 031,42 perfazia uma mais valia de 104 800,97. A sentença recorrida após analisar os valores declarados concluiu que o valor de aquisição seria de € 53 565,68 (€ 4 220,74 + € 4 220,74 + 45 124,20). Referindo que tal valor não coincide com o “valor indicado pela fiscalização (€ 19307,08= €5 363,08 + € 13 944,00) razão pela qual fica, necessariamente posto em causa, o cálculo das mais-valias apuradas pois que o mesmo pressupõe a correta determinação do valor da aquisição. Por conseguinte padece a liquidação impugnada de erro nos pressupostos de facto porque estar incorretamente determinado o valor da aquisição.” A Recorrente insurge-se contra este entendimento, alegando que a sentença incorre em erro de julgamento de facto e erro de direito, por violação do art.º 5° do Decreto-Lei n° 442-A/88 de 30 de novembro, uma vez, que não se encontram sujeito a tributação as mais valias geradas pela alienação de imóveis adquiridos antes de 01.01.1989. Relativamente a este argumento a Recorrente tem razão pois o regime transitório da categoria, previsto no art.º 5 do Decreto-Lei n° 442-A/88 de 30 de novembro que aprovou o IRS previa que não se encontram sujeitas a tributação as mais valias geradas pela alienação de imóveis adquiridos antes de 01.01.1989. Como decorre da matéria de facto provada a Recorrente era proprietária de 25% do prédio com art.º (...), de Beja, (que veio dar origem ao art.º 2028 e (...), sendo este aqui em causa) e seu marido, A., tinha 25% e A., detinha 50% . Com a morte do seu marido, 16.09.1991, a Recorrida adquiriu por herança 25% que pertencia a seu marido e passou a deter 50% do art.º (...).º. Com efeito a Recorrida possuía 25%, em data anterior a 01.01.1998, logo essa percentagem não está sujeita a mais valias. Destarte a sentença recorrida incorre em erro de raciocínio quando considera para o cálculo das mais valias tal percentagem. O desacordo da Recorrente e da Recorrida consiste no valor patrimonial a considerar na aquisição de 50%, que a primeira considera ter ocorrido em 31.12.1997, e ser de € 13 944,00 e a segunda de € 90 031,42. A Recorrente entende que, é determinante dar como provado o valor patrimonial do mesmo prédio à data da morte do marido da impugnante, em 16.09.1991 [o facto dado como provado na alínea c) apenas refere a data do falecimento] sendo a própria admitir o valor patrimonial de € 21.452,30. A Recorrente, não dá cumprimento ao art.º 685.ºB do CPC, não indicando os documentos probatórios de onde se pode extrair que o valor patrimonial do art.º (...).º em 16.09.1991 (data do falecimento de marido da impugnante) era de € 21.452,30, nem dos documentos existentes nos autos resulta tal valor. Acresce ainda que não pode vingar tal argumentação pois do facto provado em B, não impugnado, resulta que em 31.12.1989 o valor patrimonial inscrito era de € 33 765,92. Entre 31.12.1989 e 16.09.1991 não existe qualquer indicio que tenha levado à redução do valor patrimonial. Acresce ainda que em 03.07.1998, por escritura pública de Divisão, a Recorrente e A., os quais eram possuidores, na proporção de metade do art.º (...), procederam à divisão de coisa comum, dando origem ao art.°s 2028 e (...) constando como valor patrimonial, respetivamente 18 122 685$00 (90 395,57 ) e 18 049 680$00 (90 395,57). Tendo a divisão exigido que a Recorrida recebesse tornas para completar a sua parte. Face ao exposto não se percebe o critério utilizado pela Administração Tributária para considerar, para efeito de mais valias o valor de € 13 944,00 como valor de aquisição, nem dos autos resulta o processo de apuramento do imposto de sucessões e doações. Nesta conformidade, fica necessariamente posto em causa, o cálculo das mais-valias apuradas pois dela não resulta a correta e compreensível determinação do valor da aquisição, relativamente ao art.º (...) (art.º (...)). Por conseguinte e nos termos do n. º 1 do art.º 100.º do CPPT sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o ato impugnado ser anulado. Nesta conformidade, a liquidação de IRS, com base nas mais valias geradas pela venda do art.º 1032.º ((...).º) uma vez, que não resulta a correta determinação do valor da aquisição teria de ser anulada, pelo que a sentença recorrida terá de se manter embora com fundamentação diversa. 4.2. A Recorrente nas conclusões G. a K. alega em síntese que a sentença, com base na determinação do valor de aquisição que efetuou deveria ter declarado a anulação parcial da liquidação, pelo valor excedente àquele que seria o resultante se o apuramento da mais valia tivesse sido com base no valor reputado correto, uma vez que, o ato de liquidação é, por natureza, divisível, devendo ser anulado apenas na parte eivada de erro ou ilegalidade. Vejamos: Relembre-se que da liquidação em causa, como refere a Recorrida, nos pontos 32.º a 39.º da petição inicial, relativamente ao art.º (...).º não existe qualquer divergência. A sentença recorrida no segmento decisório julgou a impugnação procedente e anulou a liquidação impugnada e declarou o direito a Recorrida a juros indemnizatórios. Com efeito a Recorrida nunca questionou a liquidação relativa ao art.º (...).º pelo que a sentença recorrida ao anular in totum a liquidação incorreu em err0 de julgamento, uma vez que, o ato de liquidação é divisível. Posição que a Recorrente parece discordar nas suas contra-alegações. No entanto, para melhor elucidação importa trazer à colação a jurisprudência do Pleno da Secção do Contencioso Tributários, do STA proferido no acórdão 0436/18.0BALSB de 30.01.2019, entre outros, do qual consta do seu sumário que: I - O acto tributário, enquanto acto divisível, tanto por natureza como por definição legal, é susceptível de anulação parcial. II - O critério para determinar se o acto deve ser total ou parcialmente anulado passa por aferir se a ilegalidade afecta o acto tributário no seu todo, caso em que o acto deve ser integralmente anulado, ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial. III - Não impede a anulação parcial do acto a necessidade de um ulterior acertamento por parte da AT, de modo a conformar a parte remanescente do acto com os termos da decisão judicial anulatória, como o impõe no caso a diminuição ao valor da matéria colectável apurada em sede de acção inspectiva do valor respeitante às correcções que foram julgadas ilegais pelo tribunal.” Transpondo a presente jurisprudência para o caso em apreço a anulação parcial do ato relativo à liquidação de mais valias relacionadas com o art.º (...).º ((...).) não impede que a Administração Fiscal proceda a ulterior acertamento, de modo a conformar a parte remanescente do ato com os termos da decisão judicial anulatória, nomeadamente no que diz respeito aos juros indemnizatórios. 4.3. E assim formulamos as seguintes conclusões/sumário, apropriando, com a devida vénia de conclusões do acórdão do STA, supra citado.: I- Da conjugação do n.º 1 do art.º 43.º, n. º1 alínea f) e n.º 1 do 45.º do CIRS resulta que a mais-valia corresponde ao saldo apurado entre valor da realização e o valor da aquisição gratuita tendo por referência, à data do facto tributário, o valor do imposto considerado para efeitos de imposto do sobre sucessões e doações e o de realização, na percentagem de 50%. II. O ato tributário, enquanto ato divisível, tanto por natureza como por definição legal, é suscetível de anulação parcial. III. O critério para determinar se o ato deve ser total ou parcialmente anulado passa por aferir se a ilegalidade afeta o ato tributário no seu todo, caso em que o ato deve ser integralmente anulado, ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial IV. O critério para determinar se o ato deve ser total ou parcialmente anulado passa por aferir se a ilegalidade afeta o ato tributário no seu todo, caso em que o ato deve ser integralmente anulado, ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial. V - Não impede a anulação parcial do ato a necessidade de um ulterior acertamento por parte da AT, de modo a conformar a parte remanescente do ato com os termos da decisão judicial anulatória, como o impõe no caso. 5. DECISÃO Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, em concede-se parcial provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida na parte que julgou totalmente procedente determinando-se a anulação parcialmente do ato de liquidação no que concerne à parte relativa do art.º (...).º ((...).º) e consequentemente o direito a juros indemnizatórios nessa parte. * Custas pela Recorrente e Recorrida, nos termos do art.º 527.º do CPC e demais legislações aplicáveis, que se fixa em 90% e 10%., respetivamente. * Porto, 25 de fevereiro de 2021Paula Maria Dias de Moura Teixeira Maria Conceição de Soares Carlos Alexandre Morais de Castro Fernandes |