Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00396/11.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:10/26/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:INTEMPESTIVIDADE DA RECLAMAÇÃO GRACIOSA;
PEDIDO DE NOMEAÇÃO DE PATRONO;
ARTIGO 33º, N.º 4 DA LEI DE APOIO JUDICIÁRIO;
Sumário:
I. No exercício dos direitos reconhecidos a Recorrente, na qualidade de responsável subsidiário, pode reclamar ou impugnar a dívida na origem do processo de execução fiscal, com base nos fundamentos previstos no artigo 99º do CPPT, e os prazos estabelecidos nos artigos 70º e 102º do CPPT

II. Não é aplicável ao pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono formulado, o artigo 24º n.º 4 da Lei 34/2004 de 29/07, na redação da Lei 47/2007 de 28/08, para efeitos de interrupção daqueles prazos em curso, mas sim o artigo 3º, n.º 4.

III. Precisamente por ser de aplicar o citado nº 4, do artigo 33º, tem de se ter por apresentada a Reclamação Graciosa, não na data em que a mesma foi enviada por mail para o serviço de finanças, mas na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. A Recorrente («AA»), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 27 de junho de 2019, que julgou improcedente a acção administrativa especial que instaurou contra Autoridade Tributária e Aduaneira, visando a anulação do despacho do Director de Finanças ... que lhe indeferiu a reclamação graciosa deduzida contra as liquidações de IVA e legais acréscimos, no montante global de €42.292,85, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«1º É nula a sentença, por omissão de pronuncia dos artigos 9º, 10º e 12º a 16º, supra transcritos e alegados pela recorrente, nos termos da primeira parte do nº 1, al. d), do art. 615º do CPC, por remissão dos arts. 94º e 95º do CPTA, nulidade que aqui e agora expressamente se invoca para os devidos efeitos legais.
2º Impugna-se também o ponto II.2- factos não provados, dado que sobre essa matéria deveria ter sido permitida a audição da autora e/ou prova testemunhal, violando assim o tribunal “a quo” o recurso a estes legítimos meios de prova.
3º Por outro lado, e sem querer prescindir, o tribunal “a quo”, não valorou convenientemente a matéria dada como provada, não retirando da mesma, o efeito interruptivo e/ou suspensivo dos prazos.
4º Assim como, se impugna ainda o referido na sentença (pág. 8, 3º parágrafo), de que o prazo é corrido (...), al, b) do art. 279º do Código Civil, uma vez que, esta norma não o diz, o tribunal viola este normativo por errónea interpretação do mesmo.
5º O Tribunal “a quo” violou os normativos e legislação invocada na motivação e nas conclusões do presente recurso.
Deve o presente recurso ser por V.ªs Ex.ªs considerado provado e procedente. com as devidas consequências legais, como único ato de inteira e sã justiça.»
1.2. A Recorrida (Autoridade Tributária e Aduaneira), notificada da apresentação do presente recurso, apresentou contra-alegações, concluindo da seguinte forma:
«1. A douta sentença do Tribunal a quo, decidiu, e bem, julgar verificada, face à intempestividade da reclamação graciosa, a exceção perentória que, nos termos do n.º 3 do artigo 576.º do CPC, consiste na ocorrência de factos que impedem o efeito jurídico dos factos articulados pela autora e, a consequente absolvição do pedido.
2. Resultando evidente, do petitório, que neste caso, a Autora apresentou Reclamação Graciosa na sequência da citação para a reversão das dívidas de IVA e Coimas da devedora originária “[SCom01...], LDA”, NIPC ..., objeto de cobrança coerciva no âmbito do Processo de Execução Fiscal n.º ...20 logo, o prazo para apresentação da Reclamação Graciosa conta-se da citação para a reversão nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT.
3. Este é um prazo de natureza substantiva, contínuo e contado de acordo com as regras do artigo 279.º do Código Civil. É isso, aliás, o que estatui o artigo 20.º do CPPT e do artigo 57.º n.º 3 da Lei Geral Tributária.
4. Como constitui jurisprudência pacífica, do n.º 4º do citado normativo decorre que que incumbia à Autora, enquanto requerente do apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, e parte interessada na interrupção do prazo que estava a correr, juntar cópia do respetivo pedido ao processo para o qual requereu aquele benefício (Acórdão do STJ de 12/06/2012).
Neste sentido, o Tribunal Constitucional tem vindo a entender (Acórdãos n.ºs 585/2016.º, 350/2016, 117/2010, 57/2006, 285/2005 e 98/2004, acessíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc) que a obrigação de comprovar no processo o pedido de apoio não constitui um ónus desproporcionado, considerando-se conforme à Constituição a imposição do referido ónus, face ao interesse do estabelecimento de prazos perentórios disciplinadores do processo.
5. Como ficou provado a Autora não comunicou nem juntou ao processo de execução fiscal o requerimento de pedido de apoio judiciário, de molde a suspender/interromper o decurso do prazo substantivo que se encontrava a correr.
6. Mais a douta sentença, vai mais além considerando que «(...)a Reclamação Graciosa apresentada estaria condenada ao fracasso, porquanto compulsado o teor da mesma verificamos que estriba toda a sua argumentação na falta de culpa da gerente (ora Autora), porém, o meio próprio para a discussão dos pressupostos da reversão é a Oposição à Execução fiscal (art.ºs 203.º e 204.º do CPPT), cujo prazo já se encontrava amplamente ultrapassado aquando da apresentação do pedido de Apoio Judiciário, tal como a Autora assim o confessou no requerimento apresentado: «Urgente porque o prazo da reversão terminou» (cfr. alíneas C) e F) do probatório).
7. Face ao exposto, a decisão objecto de recurso não padece de qualquer vício de erro de julgamento, devendo manter-se no ordenamento jurídico, com todos os seus efeitos.
Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado improcedente e, em consequência, deve a douta sentença ser mantida no ordenamento jurídico com todas as legais consequências».
1.3. Foi notificado o Ministério Público junto deste Tribunal.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
As questões sob recurso e que importa decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, consistem em saber se a sentença recorrida a) enferma de nulidade por omissão de pronúncia, b) padece de deficit instrutório; c) errada valoração da prova e, d) erro de julgamento de direito ao considerar que à contagem do prazo é aplicável o disposto no na alínea b) do artigo 279º do Código Civil, e o disposto nos artigos 24º, n.º 4 e 33º, n.º 4 da Lei 34/2004 de 29/07.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
«(...)
A) Em 19/10/2009, pelo Serviço de Finanças ... (OEF), foi eleito processo principal o Processo de Execução Fiscal n.º ...20 e Aps, instaurado contra a sociedade “[SCom01...], LDA”, NIPC ..., por dívidas de IVA e Coimas, no montante global de €42.292,85, cfr. fls. 15 do PA apenso aos autos;
B) Em 23/11/2009, o OEF mediante ofício n.º ...71, registado com A/R, RM..........10PT, citou a ora Autora da Reversão quanto às dívidas referidas em A), cfr. fls. 5/7 do PA apenso;
C) O A/R referido em B) mostra-se assinado em 03/12/2009 por “«AA»”, cfr. fls. 7 do PA apenso;
D) Em 04/01/2010, a ora Autora apresentou Requerimento de pedido de pagamento em prestações relativo ao PEF referido em A), e aludindo à citação referida em B), cfr. fls. 8/11 do PA apenso;
E) Em 13/01/2010, pelo OEF foi proferido Despacho de indeferimento do pedido de pagamento em prestações referido em D) (cfr. fls. 12 do PA apenso), e notificado à Autora em 20/01/2010 (cfr. fls. 13/15 do PA apenso);
F) Em 29/01/2010, a ora Autora requereu junto do Instituto da Segurança Social, IP, pedido de “Consulta Jurídica”, com nomeação e pagamento de compensação patrono, com as seguintes Observações: “Pretendo advogado de Direito Fiscal para me defender e aconselhar num processo de Reversão que tem como fim a penhora de bens em virtude de não ter condições financeiras para pagamento da dívida da empresa da qual fui gerente. Urgente porque o prazo da reversão terminou porque pedi prestações e foi-me recusado”, cfr. fls. 30/31 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
G) Em 11/03/2010, o Centro Distrital ... da Ordem dos Advogados (Centro de Apoio jurídico e judiciário), nomeou a Senhora Advogada «BB», cfr. fls. 32 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
H) Em 16/03/2010, foi realizada a Consulta Jurídica requerida em F), donde consta o seguinte “Consulta jurídica no âmbito de processo de execução fiscal. A requerente tem fundamento para intervir no processo. Necessita de Apoio judiciário nomeação de Advogado para tal fim.”, cfr. fls. 34/35 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
I) Em 04/06/2010, o Centro Distrital ... da Ordem dos Advogados (Centro de Apoio jurídico e judiciário), nomeou o Senhor Advogado «CC», cfr. fls. 36 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
J) Em 30/07/2010, a ora Autora, apresentou via e-mail, Reclamação Graciosa que deu origem ao processo n.º ...41, cfr. fls. 2 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
K) Em 13/08/2010, pelo OEF foi elaborada proposta de indeferimento da Reclamação Graciosa referida em J), cujo conteúdo se transcreve parcialmente:
«(...) Tempestividade
De acordo com o n.º 1 do art. 70.º do CPPT “A reclamação graciosa pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial e será apresentada no prazo de 120 dias contados a partir dos factos previstos no n.º 1 do artigo 102.º” A al. C) do n.º 1 do art.º 102.º do CPTT vem, por sua vez, determinar que em caso de reversão, o prazo para exercício das garantias começa a contar-se a partir da “c) Citação dos responsáveis subsidiários em processo de execução fiscal”
Na situação em apreciação, a reclamante foi citada da Reversão em 03.12.2009 – fls. 18.
A Petição de Reclamação Graciosa foi apresentada (inicialmente por e-mail) em 30/07/2010 – fls. 2 – quando já haviam decorrido 120 dias desde a data da referida Citação (terminado em 02 de Abril do corrente ano).
Conclusão
Face ao exposto, sou de parecer que a Reclamação Graciosa será de indeferir por intempestiva.(...)»
(cfr. fls. 39/40 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos);
L) Em 22/10/2010, o OEF mediante ofício n.º ...32, com registo RM........08PT, notificou a Autora na pessoa do seu patrono nomeado para exercício do Direito de Audição, cfr. fls. 43/44 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
M) Em 11/11/2010, pela Sra. Chefe de Divisão da Justiça Administrativa e Contenciosa foi proferido despacho de indeferimento da Reclamação Graciosa referida em J), com os fundamentos constantes do projecto de decisão referido em K), cfr. fls. 45 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
N) A ora Autora foi notificada do despacho a que se alude no ponto antecedente em 29/11/2010 - Cf. fls. 48 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos;
O) Em 16/12/2010, foi apresentada a presente acção via e-mail dirigido ao Serviço de Finanças ..., [cfr. fls. 6 dos autos (p.f.)].
II.2 – FACTOS NÃO PROVADOS
I - Que a Autora tenha apresentado requerimento no dia 07/05/2010, a explicar a sua situação e que tinha solicitado um advogado para a poder defender e que ainda não lhe tinha sido nomeado e que não tinha ainda obtido resposta ao seu requerimento de 26 de março de 2010, onde solicitou a suspensão do processo por estar a aguardar nomeação de advogado (cfr. artigo 12.º da PI) [não provado porquanto não consta da PI, do PA e do PA relativo à Reclamação Graciosa qualquer documento que comprove o alegado].
II.3 – MOTIVAÇÃO
O Tribunal julgou provada a matéria de facto relevante para a decisão da causa com base na análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, ao PA e ao PA relativo à Reclamação Graciosa, que não foram impugnados.»

2.1.2. Aditamento oficioso
Ao abrigo do disposto no artigo 662º, n.º 1 do CPC, importa aditar matéria de facto que resulta provada, com base nos documentos que constam dos presentes autos e que se referem após cada um dos pontos seguintes:
P) Em 29/01/2010, a ora Autora requereu junto do Instituto da Segurança Social, IP, pedido de “Consulta Jurídica”, “Apoio judiciário” na modalidade de dispensa da taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação e pagamento da compensação patrono [cfr. fls. 30/31 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos];
Q) No formulário de “Requerimento de protecção jurídica pessoa singular”, a que se alude em G), assinado pela Recorrente/autora em 29.01.2010, a mesma atesta que tomou conhecimento de que deve: “- comunicar qualquer alteração da informação prestada até ao mês seguinte ao da sua verificação; - entregar cópia do presente requerimento no tribunal onde corre a acção, no prazo que me foi fixado na citação/notificação.” [cfr. fls. 30/31 do PA relativo à Reclamação Graciosa (RG) apenso aos autos]

2.2. De direito
Nas conclusões de recurso a Recorrente insurge-se contra a decisão que julgou extemporânea a reclamação graciosa, confirmando o acto de indeferimento da mesma por intempestividade que compunha o objecto da presente acção administrativa especial, por entender que é nula a sentença por omissão de pronúncia, do erro de julgamento de facto e, do erro de julgamento de direito ao não considerar que perante os factos provados ocorreu o efeito interruptivo e/ou suspensivo dos prazos em curso por aplicação do art. 24º/4 e 33º da Lei 34/2004 de 29 de julho e artigo 279º do Código Civil, este último ao considerar o prazo corrido.
Em suma, a questão que cumpre apreciar prende-se com os efeitos do pedido de proteção jurídica, na modalidade de nomeação de patrono nos prazos em curso decorrentes da citação da Recorrente na qualidade de revertida em execução fiscal, quando aquela não comprova nos autos de Reclamação Graciosa que apresentou e nestes autos que tenha informado os autos de execução fiscal do pedido formulado de nomeação de patrono ou que aquele, por qualquer via tenha tomado conhecimento do mesmo.
Suscitada em recurso a nulidade da sentença, cabe ao juiz do Tribunal a quo, imediatamente antes de ordenar a sua subida, pronunciar-se sobre a nulidade arguida (artigos 617.º, n.º 1, e 641.º, n.º 1, aplicáveis aos despachos ex vi artigo 613.º, n.º 3, do CPC).
Tal pronúncia foi omitida, mas não se justifica que se mande baixar o processo para que seja proferido tal despacho (n.º 5 do citado artigo 617.º), uma vez que, como já veremos, a arguição é, manifestamente, infundada.

2.2.1. Da nulidade por omissão de pronúncia – artigo 615º, n.º 1 al. d) do CPC
Segundo a Recorrente, o tribunal não se pronunciou sobre os seguintes factos por si alegados (conclusão 1º):
«9° E logo no dia 18 de Março de 2010, a ora impugnante, a conselho da advogada que lhe foi nomeada para a consulta jurídica, requereu no Instituto da Segurança Social, a nomeação de um advogado para a defender neste processo.
10° E no dia 26 de Março de 2010, deu entrada no Serviço de Finanças com um requerimento a informar isso mesmo, tendo junto com ele ao processo, cópia do seu pedido de apoio judiciário para nomeação de advogado, que já se encontra assim nestes autos.
12° Entretanto, como lhe foi penhorado o seu bem imóvel, a ora impugnante fez um requerimento no dia 07 de Maio de 2010, a explicar a sua situação, nomeadamente de que tinha solicitado um advogado para a poder defender e que ainda não lhe tinha sido nomeado e que não tinha ainda obtido resposta ao seu requerimento de 26 de Março de 2010, onde solicitou também a suspensão do processo por estar a aguardar nomeação de advogado.
13° No dia 27 de Maio de 2010, a impugnante foi notificada da manutenção da penhora e de que os prazos de reacção da impugnante já tinham sido ultrapassados.
14° A impugnante, por nada receber, voltou a pedir em 18 de Junho de 2010 no Instituto da Segurança Social, nomeação de advogado, conforme documentos que já se encontram juntos aos autos.
15° No dia 22 Junho de 2010, recebeu no seu correio a nomeação de advogado, conforme carta da ordem dos advogados que juntou com a sua reclamação graciosa como documento n.º 3 (muito embora esta esteja datada de 04/06/2010).
16° No dia 15 de Julho de 2010, por força das ferias judiciais, os prazos judiciais ficaram suspensos, estando assim a ora impugnante, salvo sempre melhor opinião, ainda dentro do prazo.»
Cremos não merecer reservas o entendimento de que só ocorre omissão de pronúncia, geradora de nulidade, quando o juiz deixa de se pronunciar (parcial ou integralmente) sobre questões que lhe sejam colocadas pelas partes ou sujeitos processuais ou sobre aquelas de que deva conhecer oficiosamente. Também é pacífico o entendimento de que só se impõe a pronúncia do juiz sobre questões ou problemas concretos que exijam uma decisão e, bem assim, também não se exige que o juiz se pronuncie sobre questões que ficaram prejudicadas pela solução dada a outra(s) questões que apreciou ou que decorram da solução preconizada como prejudicadas. Não são como tal considerados os simples argumentos (jurídicos ou de outra natureza), opiniões ou teses doutrinárias expendidas pelas partes na argumentação e defesa das posições que tomam no decurso do processo.
Uma questão, para este efeito, é um aspecto de um problema sobre o qual pode recair uma decisão autónoma.
Ora, desde logo não há nenhuma questão relacionada com a relevância da data em que foi requerida a nomeação do patrono, aliás cremos que perante os factos dados como provados, a relevar a data do pedido de nomeação de patrono para efeitos de contagem da suspensão e/ou interrupção do prazo, o mesmo teria de ser aferido em função dos factos fixados, nomeadamente do item F), por nós densificado em P) por via do aditamento, de que o pedido se reconduziria ao requerimento de protecção jurídica preenchido pela Recorrente, no qual expressamente consta a menção para efeitos de consulta jurídica e de nomeação de patrono. Assim, assumindo a data de 29.01.2010, e na falta de documento expresso que permitisse concluir que ocorrera novo pedido de nomeação de patrono após a consulta, era inócuo e despiciente de conteúdo indagar e/ou fixar pela negativa da existência de um segundo pedido de nomeação ocorrido na sequência da consulta jurídica que teve lugar, mormente para efeitos da sua recondução aos factos não provados, perante a solução preconizada pelo Tribunal a quo sobre a intempestividade da reclamação graciosa.
Quanto aos factos inseridos em 12º, 13º e 14º apenas peca o Tribunal a quo por não ter reconduzidos ipsis verbis os mesmos aos factos não provados, respeitando a seu enunciação, mas de tal constatação não decorre qualquer omissão de pronúncia, até porque o seu conteúdo na parte que releva para apreciação da causa foi expressamente reconduzida ao probatório pela negativa, ao ali afirmar-se que não resultou provado que a Recorrente “tenha apresentado requerimento no dia 07/05/2010, a explicar a sua situação e que tinha solicitado um advogado para a poder defender e que ainda não lhe tinha sido nomeado e que não tinha ainda obtido resposta ao seu requerimento de 26 de março de 2010, onde solicitou a suspensão do processo por estar a aguardar nomeação de advogado (cfr. artigo 12.º da PI) [não provado porquanto não consta da PI, do PA e do PA relativo à Reclamação Graciosa qualquer documento que comprove o alegado].”
Na parte que para aqui interessa, o tribunal pronunciou-se nos seguintes termos, sobre se ao processo de execução por qualquer via, adveio a informação do pedido de nomeação de patrono,
«Como constitui jurisprudência pacífica, do n.º 4º do citado normativo decorre que que incumbia à Autora, enquanto requerente do apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, e parte interessada na interrupção do prazo que estava a correr, juntar cópia do respectivo pedido ao processo para o qual requereu aquele benefício – cfr. Ac. STJ de 12.06.2012, Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (Relatora), acessível emwww.dgsi.pt.
Refere-se neste acórdão que “a necessidade de juntar ao processo o comprovativo, como exigência de interrupção do prazo da oposição, não corresponde à imposição ao executado de nenhum ónus desproporcionado, lesivo do seu direito constitucional de acesso ao direito e à justiça: trata-se de fazer chegar ao tribunal o comprovativo que fica em poder do requerente, dentro de um prazo de que o interessado foi previamente informado, quer na citação, quer quando assinou imediatamente a seguir à seguinte afirmação, constante do impresso que entregou: “Tomei conhecimento de que devo: (...) entregar cópia do presente requerimento no tribunal onde decorre a acção, no prazo que me foi fixado na citação/notificação. (...)”, depois de ter indicado no requerimento o número do processo (...)”.
Porém, in casu, resulta do probatório maxime dos factos não provados, que a Autora não logrou demonstrar que tenha comunicado e juntado ao processo de execução fiscal o requerimento de pedido de apoio judiciário, de molde a suspender/interromper o decurso do prazo substantivo que se encontrava a correr.
Aliás, nem se diga que deve assegurar-se o direito efectivo à defesa a quem, por insuficiência económica tem que recorrer à protecção judiciária, e o fez, deduzindo tempestivamente pedido de nomeação de patrono; que este direito à defesa - que é assegurado pelo efeito interruptivo do pedido de nomeação de patrono - não pode ficar dependente de um acto subsequente da parte - junção do aludido comprovativo junto do tribunal, e quando ainda desacompanhado de patrono; que deve ser efectuada uma interpretação ab-rogante valorativa do artigo 24º, n.º 4 da Lei n.º 34/2004, e conforme os princípios constitucionais de acesso à justiça, e igualdade dos cidadãos favorecidos e desfavorecidos, considerando-se interrompido o prazo mesmo que o requerente não tenha cumprido o ónus de apresentação em juízo do pedido de apoio judiciário.
Porquanto o Tribunal Constitucional tem vindo a entender (Acórdãos n.ºs 585/2016.º, 350/2016, 117/2010, 57/2006, 285/2005 e 98/2004, acessíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc) que a obrigação de comprovar no processo o pedido de apoio não constitui um ónus desproporcionado, considerando-se conforme à Constituição a imposição do referido ónus, face ao interesse do estabelecimento de prazos peremptórios disciplinadores do processo.».
O que é patente é a discordância da Recorrente contra esta argumentação assente na falta de prova de que dos autos, e do processo administrativo não consta qualquer documento que ateste o por si alegado que comunicou o pedido junto do processo de execução fiscal e, consequentemente da conclusão a que o Tribunal a quo chegou de que os prazos nunca estiveram suspensos e/ou interrompidos.
E, o mesmo se diga do conteúdo dos itens 15º e 16º considerados omissos. Perante a conclusão do tribunal a quo de que o prazo de 120 dias para apresentação da reclamação graciosa culminou a 05.04.2010, é irrelevante aferir da data em que a Recorrente foi notificada da nomeação de patrono, a que acresce que em termos jurídicos relevante é a data da nomeação do patrono e essa foi devidamente patenteada nos factos provados.
Em suma, as omissões apontadas pela Recorrente não ocorrem, e reconduzem-se à tese da sua argumentação que não vingou em 1ª instância, e que na parte em que não se sobrepõem ao erro de julgamento de facto, justificam a interposição de recurso em sede de erro de julgamento de direito, mas nunca a arguição de nulidade da decisão.
A arguição de nulidade do saneador-sentença revela-se, pois, manifestamente infundada.
2.2.2. Do erro de julgamento de facto
Insurge-se a Recorrente com o teor do facto não provado, alegando que “... dado que sobre essa matéria deveria ter sido permitida a audição da autora e/ou prova testemunhal, violando assim o tribunal “a quo” o recurso a estes legítimos meios de prova.”.
Ora, aquilo que se constata é que a Recorrente não se conforma com o facto de o Tribunal a quo julgar como não provado que Autora tenha levado ao conhecimento por via de requerimento a 26.03.2010 e/ou a 07.05.2010 ao processo de execução fiscal a informação de que havia formulado pedido de nomeação de patrono. No entanto a sua oposição ao assim julgado não apresenta ali, em sede de 1ª instância e de processo administrativo, ou aqui, em sede de recurso, qualquer documento plausível de infirmar o julgado. E, em desespero, compreensível, apela a um deficit instrutório que não ocorreu, pois que ao longo do processo nunca foram solicitados quaisquer meios de prova, nomeadamente mediante a indicação de testemunhas e, não podemos ignorar que cabia a autora o ónus de alegar e comprovar os factos impeditivos de operar a invocada caducidade, não lhe aproveitando a invocação de qualquer desconhecimento nos termos do disposto no artigo 342. ° do Código Civil. Assim, cabia-lhe alegar e comprovar a data de apresentação dos requerimentos a que alude junto do processo de execução fiscal.
Falecem os argumentos da Recorrente em abalar a matéria de facto fixada, a qual após os aditamentos oficiosos, aqui se dá por cristalizada.

2.2.3. Do erro de julgamento de direito
A lei do apoio judiciário – Lei 34/2004 de 29/07, na redação da Lei 47/2007 de 28/08, aplicável in casu – prevê no artigo 24º, n.º 4, a interrupção do prazo que estiver em curso, quando o pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono é formulado na pendência do processo.
Determina o artigo 24º, nº4 e nº5 do citado diploma:
“(…)
4. Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de ação judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.
5. O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos:
a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação;
b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono. “
A razão de ser do preceito visa garantir a tramitação processual da ação judicial a prazos certos e definidos e ainda, a garantia de acesso ao direito, por parte daquele que se encontrando numa situação de insuficiência económica carece de nomeação de patrono para promover a sua defesa na ação (artigo 20º e 13º da CRP).
Como se observa no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 467/2004:
“A ratio do preceito é evidente. Os prazos processuais são interregnos de tempo que são conferidos aos interessados para o estudo das posições a tomar no processo na defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, maxime, para virem ao processo expor os factos e as razões de direito de que estes decorrem. Uma tal decisão poderá envolver a utilização de conhecimento técnicos especializados da área do direito, sendo que a capacidade para a sua prática apenas é reconhecida às pessoas que estão legalmente habilitadas a exercer o patrocínio judiciário, em regra, os advogados. Ora, estando pendente de apreciação o pedido de concessão do apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento de honorários de patrono que há de tomar aquela posição do interessado, apreciação essa levada a cabo, no domínio da Lei n.º 30 -E/2000, pelas autoridades administrativas da Segurança Social (no sistema anterior essa tarefa era levada a cabo pelo próprio tribunal), se o prazo em curso não se interrompesse com a apresentação do pedido de apoio à autoridade administrativa competente e a prova dessa apresentação perante a autoridade judiciária perante quem corre a ação, correr -se -ia o risco de o interessado não poder defender de forma efetiva e eficaz os seus direitos e interesses legalmente protegidos, quer porque o prazo entretanto se poderia ter esgotado, quer porque disporia sempre de um prazo inferior ao estabelecido na lei para prática do ato ao qual o prazo está funcionalizado. A não acontecer essa interrupção, o interessado ficaria sempre em uma posição juridicamente desigual quanto à possibilidade do uso dos meios processuais a praticar dentro do prazo em relação aos demais interessados que não carecessem economicamente de socorrer -se do apoio judiciário por poderem contratar um patrono para defender as suas posições na ação. O princípio da igualdade de armas, corolário no processo do princípio fundamental da igualdade dos cidadãos, sairia irremediavelmente afetado”.
Seguiram esta interpretação, entre outros, o Ac. Tribunal Constitucional 350/2016 de 07 de junho e o Ac. Tribunal Constitucional 515/2020 de 13 de outubro de 2020 (acessíveis em www.dgsi.pt e o último publicado no DR I série, nº N.º 225 de 18 de novembro de 2020).
Temos assim, que a lei faz depender a interrupção do prazo da verificação de um conjunto de pressupostos:
- O pedido de apoio judiciário formulado tem de incluir o pedido de nomeação de patrono;
- A junção aos autos pelo requerente do documento comprovativo da apresentação desse pedido; e
- A comprovação enquanto o prazo estiver a correr, pois não é susceptível de interrupção um prazo que já decorreu integralmente.
A junção aos autos de execução, atendendo à particularidade da situação que nos ocupa, do comprovativo da apresentação do pedido acautela a necessidade de comunicação entre procedimentos processados diante de entidades diferenciadas, pois o procedimento não constitui um incidente do processo judicial funcionando neste domínio a regra da autonomia (art. 24º /1 do citado diploma).
Dado que o procedimento de concessão de proteção jurídica não constitui incidente do processo de execução fiscal a que se destina - nem sequer corre junto do órgão de execução fiscal -, torna-se necessário exigir a documentação e/ou informação daquele pedido no âmbito da execução de forma a garantir a segurança jurídica na definição do decurso dos prazos que foram concedidos a Recorrente, enquanto revertida, no âmbito do mesmo, tendo em conta o seu efeito interruptivo.
O ónus que recai sobre o requerente do benefício, justifica-se por ser a parte interessada em obter a interrupção do prazo para lhe permitir preparar a sua defesa.
O Tribunal Constitucional tem sistematicamente defendido que tal ónus não se revela excessivo: ”[t]rata-se, com efeito, de uma diligência que não exige quaisquer conhecimentos jurídicos e que, portanto, a parte pode praticar por si só, com o mínimo de diligência a que, como interessada, não fica desobrigada pelo facto de se encontrar numa situação de carência económica” [Acórdão Tribunal Constitucional 98/2004 de 11 de fevereiro de 2004, Publicado no DR N.º 78 — 1 de Abril de 2004 DIÁRIO DA REPÚBLICA — II SÉRIE; no mesmo sentido Acórdão n.º 350/2016 de 07 de junho].
Atentando aos autos, temos que a Recorrente em 03.12.2009 foi citada para a reversão das dívidas de IVA e Coimas da devedora originária “[SCom01...], LDA”, NIPC ..., em cobrança coerciva no âmbito do Processo de Execução Fiscal n.º ...20 e Aps (cfr. alíneas A), B) e C) do probatório) – artigos 160º/1 e 191º/3 do CPPT.
Da citação, consta cópia do título executivo ou a indicação dos requisitos legais deste – cfr. estipulado nas al. a), c), d) e e) do nº 1 do art. 163º do CPPT, a indicação do prazo para oposição, pagamento ou para requerer o pagamento em prestações ou dação em pagamento, a indicação dos pressupostos da reversão – cfr. o nº 4 do art. 23º da LGT, os elementos essenciais da liquidação que é objecto da reversão e, ainda, a sua fundamentação - cfr. o nº 4 do art. 22º da LGT, constando expressamente que a contar da data da citação, poderá apresentar Reclamação Graciosa ou deduzir impugnação judicial, com base nos fundamentos previstos no artigo 99º do CPPT, e os prazos estabelecidos nos artigos 70º e 102º do CPPT, direito este reconhecido à Recorrente na qualidade de responsável subsidiário de reclamar ou impugnar a dívida na origem do processo de execução fiscal e cujo pagamento lhes é exigido através da reversão.
Acompanhamos a sentença recorrida quando a mesma assevera que «(...) o prazo para apresentar Reclamação Graciosa conta-se da citação para a reversão nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT.
Este é um prazo de natureza substantiva, contínuo e contado de acordo com as regras do artigo 279.º do Código Civil.
É isso, aliás, o que resulta expressamente do disposto no artigo 20.º do CPPT e do artigo 57.º n.º 3 da Lei Geral Tributária.
Na contagem desse prazo, o dia em que ocorre a notificação não é considerado, o prazo é corrido, não se suspendendo aos sábados, domingos ou feriados (alínea b) do artigo 279º do C.C.) e o prazo que termine em domingo ou dia feriado, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte (alínea e) da norma citada).»
Mais se diga, que estamos perante um prazo perentório, ou seja, cujo decurso faz caducar o direito de reclamação, culminando o procedimento accionado com uma decisão de rejeição liminar, o que ocorreu in casu e convocou a instauração da presente acção administrativa especial.
Avoca a Recorrente, sem mais, que a “sentença (pág. 8, 3º parágrafo), de que o prazo é corrido (...), al, b) do art. 279º do Código Civil, uma vez que, esta norma não o diz, o tribunal viola este normativo por errónea interpretação do mesmo.”. Não alcançamos o sentido do erro imputado, pois é pacifico na doutrina e jurisprudencialmente que, o prazo de cento e vinte dias, previsto no artigo 70.º do CPPT, conta-se, segundo o artigo 20.º, n.º 1 daquele Código, ou seja, nos termos do artigo 279.º do Código Civil, como tal, é seguido, não se suspende em dias não úteis, feriados ou férias judiciais e o prazo que termina em dia não útil transfere-se para o dia seguinte útil, com a nota de que não se equipara a dia não útil aquele em que o prazo termina no recurso de férias judicias, por não ter de ser apresentado em justiça, pois que a Reclamação Graciosa, em regra, no serviço periférico local da AT da área do domicílio ou sede do contribuinte, da situação dos bens ou da liquidação (cf. 70.º/6 CPPT). Alusão na sentença, a al. b) do artigo 279º do Código Civil prende-se tão só com as regras que correm do disposto no que tange ao momento em que se iniciam os prazos.
Mas volvemos ao cerne da nossa questão. Verificamos que resulta do probatório [cfr. alíneas C) e F)] que, a ora Recorrente, foi citada na qualidade de responsável subsidiária a 03.12.2009.
Como tal, resulta da contagem do referido prazo que o dies a quo ocorreu em 03.12.2009 (data da citação para a reversão) e a não ocorrer qualquer facto susceptível de suspender e/ou interromper aquele, o dies ad quem ocorre em 05.04.2010.
É certo que, em 29.01.2010, a Recorrente requereu junto do Instituto da Segurança Social, IP, pedido de “Consulta Jurídica”, e, bem assim, o pedido de apoio judiciário com “nomeação e pagamento de compensação patrono”, tendo sido nesse acto expressamente advertida de que deveria dar conhecimento do pedido ao processo no prazo que lhe foi fixado na citação [cfr. item R) do probatório].
Temos, pois, que a Recorrente foi advertida de que deveria dar conhecimento ao processo de execução fiscal do pedido de nomeação de patrono, mais se diga que a mesma tinha consciência que estavam a decorrer prazos, atento o por ela declarado junto do ISS de que “Pretendo advogado de Direito Fiscal para me defender e aconselhar num processo de Reversão que tem como fim a penhora de bens em virtude de não ter condições financeiras para pagamento da dívida da empresa da qual fui gerente. Urgente porque o prazo da reversão terminou porque pedi prestações e foi-me recusado”.
E, advém dos factos provados e não provados que, a Autora/Recorrente não comunicou o pedido de nomeação de patrono ao processo de execução fiscal, ou que este por outra via tenha tido conhecimento do mesmo, sendo que o período temporal relevante para efeitos de lograr a interrupção dos prazos em curso, a “junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento” a que alude o artigo 24º n.º 4 da Lei 34/2004, de 29.07 teria que ser concretizada antes da preclusão daqueles.
Mas aqui chegados, e cientes da bondade de todo o exposto, questiona-se este Tribunal ad quem tendo em conta a diversidade de prazos que se iniciaram com a citação da Recorrente, se a obrigatoriedade da comunicação do pedido de nomeação de patrono para efeitos da interrupção a que alude o artigo 24º, n.º 4 da Lei 34/2004 é extensível aos prazos concedidos para apresentar Reclamação Graciosa ou deduzir Impugnação.
Ou seja, temos por certa a omissão da Autora do seu dever de juntar ao processo de execução fiscal cópia do documento comprovativo da apresentação daquele pedido, não temos dúvida que essa omissão seria de relevar na contagem e preclusão dos prazos que correm “dentro” do processo de execução fiscal, de que são exemplos a Reclamação de acto do órgão de execução fiscal, pedido de pagamento em prestações, mas será que essa exigência de comunicação é extensível aos meios de reação, que apesar de nascerem no seio da execução (citação), o seu exercício em nada contende com o seu processamento e os seus trâmites?
Não pode este Tribunal não atender a essa independência, entre Reclamação Graciosa e execução, até porque com aquela a defesa não se dirige à execução ou qualquer acto praticado no seio na mesma, mas à liquidação. E, se bem que a Recorrente não exponha os seus argumentos, o certo é que no corpo das alegações ao referir-se aos normativos violados da lei do Apoio Judiciário, para além do artigo 24º alude ainda ao artigo 33º, n.º 4, ambos da citada lei.
O art.º 33.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho [com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28/08], usualmente designada por regime de acesso ao direito e aos tribunais, estabelece o seguinte:
“1 - O patrono nomeado para a propositura da acção deve intentá-la nos 30 dias seguintes à notificação da nomeação, apresentando justificação à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores se não instaurar a acção naquele prazo.
(...)
4 - A acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono».
Em suma, a Reclamação Graciosa constitui um meio de reacção, de natureza admistrativa (artigos 68º a 70º do CPPT), que configura um dos meios de defesa concedido ao sujeito passivo aquando da notificação de um acto de liquidação, cujo objecto em nada difere do da Impugnação Judicial, meio judicial de defesa com fundamento em qualquer ilegalidade.
No acto de citação por reversão no âmbito da execução fiscal, na pessoa da Recorrente renascem os direitos de defesa que a lei consagrara ao devedor originário no acto de notificação da liquidação. Ou seja, embora os direitos de impugnar e reclamar da Recorrente tenha “nascido” no seio da execução fiscal (com a citação), o seu exercício em nada contende com o prosseguimento da execução fiscal, não existe nenhuma ligação instrumental ou funcional destes meios de defesa com a execução fiscal.
E, por outro lado não podemos deixar de equiparar a apresentação de Reclamação Graciosa à apresentação de Impugnação judicial, enquanto acção, quando haja pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, cumprindo aplicar o já transcrito artigo 33º da Lei de Acesso ao Direito e aos Tribunais.
Aqui chegados, podemos desde já extrair uma primeira conclusão, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, ao convocar aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 24º da referida lei, a qual não é aplicável aos casos de pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono, feito antes da propositura das acções, para os quais apenas regula o n.º 4 do artigo 33.º.
“Prevê o n.º 4 a data em que se considera proposta a acção em função da qual foi concedido o apoio judiciário na modalidade de patrocínio judiciário, e estatui que ela coincide com aquela em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono. A lei prescreve que só a prática, no prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou a convenção atribua efeito impeditivo é que obsta à caducidade (artigo 331.º, n.º 1, do Código Civil). Por força do normativo em apreciação, no caso de o titular do direito substantivo pedir a nomeação de patrono no quadro do apoio judiciário, a acção considera-se proposta na data em que foi apresentado o referido pedido. Isso significa que, pedida a nomeação de patrono no quadro da protecção jurídica antes do decurso do prazo de caducidade do direito de acção em causa, queda irrelevante o prazo que decorra entre aquele momento e o da propositura da acção pelo patrono que venha a ser nomeado. Este normativo também favorece o demandante requerente do apoio judiciário na modalidade de patrocínio judiciário no que concerne à interrupção do prazo de prescrição (artigo 323.º, n.º 2, do Código Civil).” (Salvador da Costa, in Apoio Judiciário, 6.ª Edição, 2007, Almedina, págs. 206 e seguintes)
[Neste sentido vide ainda acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 24.02.2016, Proc. 12857/16; de 29.01.2015, Proc. 10500/13; de 02.04.2014, Proc. 10733/13 e de 25.10.2012, Proc. 9183/12; bem como nos acórdãos deste Tribunal Central Administrativo Norte, de 05.03.2020, Proc. 476/19, de 19.06.2019, Proc. 379/19 de 19.06.2015, Proc. 00818/13.4BEBRG e de 18.02.2011, Proc. 1231/09.3BEBRG, e nos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, de 04.12.2003, Proc. 1654/03; de 04.03.2004, Proc. 134/04 e de 20.05.2004, Proc. 431/04.]
Revertendo estes considerandos para o caso em apreço, verificamos que resulta do probatório [cfr. alíneas C) e F)] que, a ora Recorrente, foi citada na qualidade de responsável subsidiária a 03.12.2009.
Como tal, resulta da contagem do referido prazo que o dies a quo ocorreu em 03.12.2009 (data da citação para a reversão) e a não ocorrer qualquer facto susceptível de suspender e/ou interromper aquele, o dies ad quem ocorre em 05.04.2010.
É certo que, em 29.01.2010, a Recorrente requereu junto do Instituto da Segurança Social, IP, pedido de “Consulta Jurídica”, e, bem assim, o pedido de apoio judiciário com “nomeação e pagamento de compensação patrono”. Por conseguinte, é nesta data em que se deve considerar a acção proposta. Ao abrigo do disposto no n.º 4 do artigo 33º da Lei n.º 34/2004, de 29.06., sendo manifesto que a Reclamação Graciosa apresentada em 30.07.2010 na sequência do despacho de nomeação de 04.06.2010 é tempestiva.
Quanto ao prazo de 30 dias indicado no n.º 1 do artigo 33º da Lei n.º 34/2004, de 29.06, o STA no Ac. n.º 136/03, de 02.03.2004, acima indicado, já entendeu que tal prazo é meramente disciplinar, não influindo no prazo de propositura da acção, sendo que mesmo uma interpretação distinta não colhia in casu qualquer efeito.
Em suma, podemos concluir que, contra o que se decidiu no Tribunal a quo, a Reclamação Graciosa foi apresentada dentro do prazo de 120 dias, a que alude o artigo 102º do CPPT, uma vez que se tem de considerar como interposta no atrás mencionado dia 29.01.2010, por via do disposto no nº 4, do artigo 33º da Lei 34/2004 e determinar a procedência do recurso, revogar a decisão e julgar procedente a acção.

2.3. Conclusões
I. No exercício dos direitos reconhecidos a Recorrente, na qualidade de responsável subsidiário, pode reclamar ou impugnar a dívida na origem do processo de execução fiscal, com base nos fundamentos previstos no artigo 99º do CPPT, e os prazos estabelecidos nos artigos 70º e 102º do CPPT
II. Não é aplicável ao pedido de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono formulado, o artigo 24º n.º 4 da Lei 34/2004 de 29/07, na redação da Lei 47/2007 de 28/08, para efeitos de interrupção daqueles prazos em curso, mas sim o artigo 3º, n.º 4.
III. Precisamente por ser de aplicar o citado nº 4, do artigo 33º, tem de se ter por apresentada a Reclamação Graciosa, não na data em que a mesma foi enviada por mail para o serviço de finanças, mas na data em que foi apresentado o pedido de nomeação de patrono.
3. DECISÃO

Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Subsecção Comum da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, e em substituição conceder provimento a acção.
Custas pela Recorrida em ambas as instâncias.

Porto, 26 de outubro de 2023

Irene Isabel das Neves
Celeste Oliveira
Tiago Miranda