Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:002195/18.8BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/18/2019
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Rogério Paulo da Costa Martins
Descritores:PRAZO DE IMPUGNAÇÃO; 3 MESES; ARTIGO 59º, N.º 1, ALÍNEA B), E N.º 2, DO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS (2015).
Sumário:Após a revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos de 2015 o prazo para impugnação judicial de 3 meses a que alude a alínea b) do n.º1 do artigo 59º deste diploma é um prazo contínuo, face ao disposto no n.º2 do mesmo preceito. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:M. F. P. F.
Recorrido 1:Instituto da Segurança Social, I.P.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Outros despachos
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Decisão Texto Integral:EM NOME DO POVO

Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

M. F. P. F. veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 28.02.2019, pelo qual foi julgada procedente a excepção dilatória da intempestividade da prática de acto processual e, consequentemente, foi absolvido da instância o Réu, Instituto da Segurança Social, I.P., na presente acção administrativa intentada pela ora Recorrente contra o ora Recorrido, peticionando a revogação do acto administrativo ilegal praticado pela Directora do Núcleo de Prestações do Sistema Previdencial, do Instituto da Segurança Social, IP, Centro Distrital de Braga, de 06.03.2018, e a substituição por outro que defira o requerimento de atribuição do subsídio de desemprego formulado pela ora Recorrente.

Invocou para tanto, em síntese, que não se verifica a intempestividade da interposição da presente acção.

O Réu apresentou contra-alegações, em que pugna pela manutenção da decisão recorrida.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Cumpre decidir já que nada a tal obsta.
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I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional:

A- O ofício “objecto” da presente acção declara que a interposição de recurso hierárquico suspende o prazo do recurso contencioso, voltou a correr novo prazo de 3 meses nos termos já invocados.

B- Como a presente ação foi proposta antes de decorrer esses 3 meses, contando outra vez com a suspensão das férias, estas as “grandes de verão” e passando a contar outra vez como 90 dias, fora as férias, ao entrar na data que entrou a ação veio a tempo e encontrava-se em prazo.

C- Pelo que a invocada exceção dilatória teria de improceder.

D- Ao não ter decidido assim o tribunal a quo violou a norma do n.º 2, do art.º 69.º do CPTA.

E- A requerente veio, em 27 de junho de 2018, porquanto a notificação de que recorria foi feita nunca antes do dia 20 de março de 2018, ao abrigo do n.º 2 do artº 193.º do Código do Procedimento Administrativo, DL n.º 4/2015, de 7 de janeiro, interpor recurso hierárquico facultativo, o qual, atento o facto de ter sido requerida a realização de prova testemunhal, se enquadra no n.º 2 do art.º 198.º do CPA, sendo que o prazo de 90 dias para a decisão do recurso e este contado nos termos do artigo 87.º do CPA, com suspensão nos sábados, domingos e feriados, o mesmo só termina no dia 5 de novembro de 2018.

F- Devendo a sentença de que recorre ser revogada por errada interpretação da lei. Sendo considerado que a ação foi interposta em tempo e a exceção de intempestividade declarada improcedente e seja feita seguir os ulteriores termos da ação.
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II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte:

A) A Autora apresentou ao Réu requerimento para atribuição do subsídio de desemprego (cfr. processo administrativo – página 57 do SITAF).

B) O Réu elaborou ofício dirigido à Autora, datado de 14.03.2018, no qual incorporou o acto de indeferimento do requerimento acabado de referir, com o seguinte teor:

[imagem que aqui se dá por reproduzida]
»
(cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial – fls. 9 do processo físico - folhas 13 do SITAF e folhas 50 do processo administrativo – página 57 do SITAF).

C) A Autora teve conhecimento do acto incorporado naquele ofício em 20.03.2018 (facto admitido – petição inicial).

D) Em 27.06.2018, a Autora interpôs recurso hierárquico do acto incorporado naquele ofício (cfr. folhas 69 a 51 do processo administrativo – página 57 do SITAF).

E) A petição inicial relativa à presente acção administrativa foi remetida a Tribunal em 01.10.2018 (cfr. folhas 2 do processo físico – página 1 do SITAF).
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III - Enquadramento jurídico; a intempestividade da instauração da presente acção.

Constituindo esta uma excepção, que conduz à absolvição do Réu da instância, deve ser ela a primeira questão a decidir quanto ao êxito da acção e para proferir tal decisão são suficientes os factos dados como provados.

Determina o artigo 58º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de 2015):

“1 – Salvo disposição legal em contrário, a impugnação de acto nulos não está sujeita a prazo e a de actos anuláveis tem lugar no prazo de:

a) Um ano, se promovida pelo Ministério Público;
b) Três meses, nos restantes casos.

2 – Sem prejuízo do disposto no nº 4 do artigo 59º, os prazos estabelecidos no número anterior contam-se nos termos do artigo 279º do Código Civil.”

Por seu turno, estabelece o artigo 59º do mesmo diploma:

“(…)
2 - O prazo para impugnação pelos destinatários a quem o acto administrativo deva ser notificado só corre a partir da data da notificação ao interessado ou ao seu mandatário, quando este tenha sido como tal constituído no procedimento, ou da data da notificação efetuada em último lugar caso ambos tenham sido notificados, ainda que o acto tenha sido objecto de notificação, mesmo que obrigatória.
(…)
4 – A utilização de meios de impugnação administrativa suspende o prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo, que só retoma o seu curso com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal, consoante o que ocorra em primeiro lugar.”

A presente acção foi intentada em 01.10.2018, mais de seis meses depois do acto contra o qual pretende reagir a Autora, ora Recorrente, identificado em B) dos factos provados.

A Autora alega que apresentou impugnação administrativa – facto D) dado como provado.

Ora o recurso hierárquico facultativo instaurado pela Autora data de 27.06.2018, ou seja, é intempestivo, pelo que não pode atender-se para efeitos de suspensão do prazo de impugnação contenciosa do acto administrativo em questão.

O prazo de três meses para interposição da presente acção conta-se nos termos do artigo 279º do Código Civil, o qual dispõe do seguinte modo:

À fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida, as seguintes regras:

b) Na contagem de qualquer prazo não se inclui o dia, nem a hora, se o prazo for de horas, em que ocorrer o evento a partir do qual o prazo começa a correr;

c) O prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contar de certa data, termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da última semana, mês ou ano, a essa data; mas se no último dia do mês não existir dia correspondente, o prazo finda no último dia desse mês;
(…)
e) O prazo que termine em domingo ou dia feriado transfere-se para o primeiro dia útil; aos domingos e dias feriados são equiparadas as férias judiciais, se o acto sujeito a prazo tiver se ser praticado em juízo.
Ao contrário do que entende a Recorrente, as férias judiciais não suspendem, nem interrompem os prazos judiciais em curso, como já foi defendido no acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 12.07.2019, no processo nº 2256/18.3 BRG, cujo sumário se reproduz:

“1 – A revisão de 2015 do CPTA afastou a regra do anterior artigo 58.°, nº 3, segundo a qual o prazo de impugnação de três meses se contava de acordo com o disposto no artigo 144.° do CPC, suspendendo-se durante as férias judiciais. Ao se estabelecer que os prazos estabelecidos no nº1 se contam nos termos do artigo 279° do Código Civil, o novo n° 2 do artigo 58.° assume que eles se contam de modo contínuo, sem suspensão durante as férias judiciais.

2 - Para efeitos de verificação da eventual caducidade do direito de ação, ter-se-á de ter presente que a apresentação de impugnação administrativa determina, nos termos do art.º 59º, n.º4, do CPTA, a suspensão [e não interrupção] do prazo do exercício do direito de ação, até ser proferida decisão sobre a impugnação deduzida para o efeito ou até que decorra o prazo legal para a decidir, retomando-se a contagem do prazo a partir daí.

3 - Sendo o referido novo regime de contagem de prazos, expresso e explícito, tendo sido aplicável decorrido que foi a vacatio legis de 60 dias previsto no artº 15º do DL nº 214-G/2015, de 2 de outubro (Artº 15º), não se mostra desculpável o desconhecimento do novel regime de contagem de prazos introduzido, tanto mais que, em concreto, a Ação foi intentada em Outubro de 2018, quando as referidas alterações foram publicadas cerca de 3 anos antes.

Tendo a Recorrente sido notificada do acto administrativo impugnado em 20.03.2018 e a acção sido instaurada em 01.10.2018, entre as duas datas decorreram muito mais de três meses, contados nos termos do artigo 279º do Código Civil. O direito de acção caducou em 21.06.2018, sendo irrelevante a dedução de recurso hierárquico, já que tendo este sido deduzido a 27.06.2018, nesta data já não podia ocorrer a suspensão do prazo para impugnação contenciosa, por já se encontrar caducado esse direito.
Dispõe o nº 2 do artigo 193º do Código do Procedimento Administrativo que:

“Quando a lei não estabeleça prazo diferente, o recurso hierárquico necessário dos actos administrativos deve ser interposto no prazo de 30 dias e o recurso hierárquico facultativo, no prazo de impugnação contenciosa do acto em causa.”

Estamos em presença de um recurso hierárquico facultativo, pelo que devia ser interposto até 20.06.2018.

Não o tendo sido, a acção foi interposta intempestivamente face aos preceitos supra invocados, devidamente conjugados com o artigo 69º, nº 2, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de 2015).

O recurso, aliás, só se justifica pelo erro de interpretação do artigo 279º do Código Civil, entendendo a Recorrente que o prazo de impugnação contenciosa se suspende durante as férias judiciais, quando o artigo 279º do Código Civil não prevê tal causa de suspensão.

A interpretação de tal norma foi correctamente efectuada em Iª Instância.

Não merece, pois, provimento o presente recurso, impondo-se manter a decisão recorrida.
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IV - Pelo exposto, os juízes da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte, acordam em NEGAR PROVIMENTO ao presente recurso jurisdicional pelo que mantém a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.
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Porto, 18.10.2019
Rogério Martins
Luís Garcia
Conceição Silvestre