Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00396/17.5BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:04/30/2020
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Ricardo de Oliveira e Sousa
Descritores:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL - LIMITES DAS IMPORTÂNCIAS PAGAS.
Sumário:I- O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento de créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, com o limite máximo global equivalente a seis meses de retribuição, e com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal garantida.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:A.
Recorrido 1:FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
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I – RELATÓRIO
A., com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, de 26.03.2018, proferida no âmbito da presente Ação Administrativa por este intentada contra o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, também com os sinais dos autos, que julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou o Réu “(…) a praticar novo ato traduzido no pagamento da quantia de € 13,553,22, valor sobre o qual deverão ser efetuadas as deduções legais que ao caso couber (…).
Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…)
I. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pelo Autor.
II. O Autor intentou a presente ação contra o Fundo de Garantia Salarial, pedindo anulação do despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, o qual deferiu parcialmente o requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho, no valo ilíquido de € 674,16.
III. O Tribunal a quo julgou a presente ação parcialmente procedente, e consequentemente condenou a ED a praticar novo ato traduzido no pagamento ao Autor da quantia global de € 13.553,22;
IV. O Autor não se pode conformar com os fundamentos de facto e de direito que motivaram o indeferimento de parte do valor peticionado.
V. O Autor peticionou, entre outros, a condenação do pagamento integral do valor requerido pelo Autor, até ao montante legalmente previsto no art.° 3° da Lei n° 59/2015 de 21/04;
VI. O Autor arroga-se titular de créditos emergentes do contrato de trabalho, no montante global de € 56.978,40, os quais, salvo melhor opinião em contrário, deveriam ser suportados pela ED até ao montante legalmente previsto no art.° 3° da Lei n° 59/2015 de 21/04;
VII. Nos termos do disposto no art.° 3°, n° 1 do DL. n° 59/15, de 21/04, “o fundo assegura o pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho, referidos no n° 1 do artigo anterior, com o limite máximo global equivalente a seis meses de retribuição, e com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal garantida.”
VIII. O pedido de pagamento de créditos laborais é requerido ao FGS, através de formulário próprio, entregue junto dos Centros Distritais da Segurança Social.
IX. Nesta senda, o Autor logrou apresentar o pedido de pagamento de créditos laborais emergentes de contrato de trabalho junto da Segurança Social, tendo para o efeito procedido à entrega do formulário (Mod. GS 1/2015 - DGSS).
X. Lamentavelmente, o Tribunal a quo desconsiderou os créditos laborais emergentes do trabalho suplementar, diferenças salariais e outros, cujo pagamento foi requerido pelo Autor, conforme resulta do art.° 20° da p.i.
XI. Considera o Tribunal a quo que, “o Autor não requereu à ED os créditos relativos a “Trabalho Suplementar, diferenças salariais e outros”;
XII. Ora, não corresponde à verdade que o Autor não tenha requerido o pagamento dos créditos laborais referentes a trabalho suplementar, diferenças salariais e outros.
XIII. Pois, quando o Autor requereu o pagamento de tais créditos junto do FGS, logrou instruir o formulário ora entregue com os documentos legalmente exigidos para o efeito;
XIV. Desde logo, o Autor logrou instruir o pedido com cópia da lista provisória de créditos reconhecidos e não reconhecidos e com cópia da reclamação de créditos apresentada nos autos do processo especial de revitalização, na qual se descrimina a origem dos valores reclamados, bem como, os seus montantes e datas de vencimento;
XV. Apesar do Autor não discriminar com exatidão os valores peticionados na parte do formulário sob a rubrica “Situação que determina o pedido”, porque não dispunha de campos suficientes ao preenchimento,
XVI. O pagamento dos valores relativos ao trabalho suplementar, diferenças salariais e outros, foi globalmente identificado e requerido como “Créditos emergentes da violação do contrato de trabalho”.
XVII. Neste sentido, não se justifica a omissão do Tribunal a quo em julgar o direito do Autor em obter pagamento quanto aos créditos vencidos referentes ao trabalho suplementar, diferenças salariais e outros,
XVIII. Nem tão pouco, pode o Autor ser prejudicado pelo facto de não ter individualizado cada um dos créditos ora reclamados, por não dispor de “espaço/campos” suficientes para o efeito.
XIX. Assim, tendo o Tribunal a quo se abstido de apreciar o direito de o Autor obter pagamento pelos supramencionados créditos, encontra-se o presente trecho decisório inquinado com a nulidade de omissão de pronúncia, a qual se argui e pretende ver declarada para todos os legais efeitos.
XX. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou as normas previstas nos art.°s 2° e 3° do NRFGS, e art.° 615°, n° 1, al. d) do CPC..
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XXI. No que concerne ao valor peticionado pelo Autor quanto à indemnização devida pelo despedimento ilícito, o Tribunal a quo considerou que não existe obrigação do FGS no pagamento dos montantes reclamados, porquanto o Autor não intentou a ação a que se refere o art.° 388° do CT;
XXII. Ora, salvo devido respeito, não merece acolhimento o entendimento do Tribunal a quo.
XXIII. Pois, por um lado, o Autor logrou demonstrar e provar que o despedimento “coletivo” ocorrido no dia 24-11-2014, não foi precedido de qualquer formalidade, em total arrepio ao regime fixado nos art.°s 359° e sgs do CT;
XXIV. E, por outro lado, não corresponde à verdade que o Autor não tenha cumprido o ónus de intentar ação, por forma a obter uma sentença que reconhecesse judicialmente a ilicitude do seu despedimento.
XXV. O Autor intentou ação laboral, a qual correu termos correu termos na Comarca do Porto Este - Secção de Trabalho - J2 sob o n° 116/15.9T8PNF.
XXVI. Acontece que, à data da propositura da mencionada ação, encontrava-se ainda pendente o Processo Especial de Revitalização,
XXVII. Razão pela qual, considerou o Tribunal verificar-se uma impossibilidade originária da lide, nos termos e para os efeitos do disposto no art.° 17°-E do CIRE, em consequência a petição inicial apresentada pelo Autor foi liminarmente indeferida;
XXVIII. Com efeito, é já entendimento maioritário da doutrina e da jurisprudência que o Tribunal de Trabalho é materialmente incompetente para apreciar do pedido de reintegração ou de indemnização em sua substituição, sendo tal competência atribuída ao Tribunal que proferiu a sentença de insolvência.
XXIX. Veja-se a este propósito, o Acórdão do TRP, proferido no âmbito do Proc. n° 672/15.1T8AGD.P1, datado de 28/10/2015, disponível in www.dgsi.pt e decisão já proferida no saneador/sentença, apenso de reclamação de créditos em que o Recorrente é parte - Processo de Insolvência n° 816/15.3T/AMT-B.
XXX. A acrescer, o Tribunal a quo queda-se à apreciação do quantum indemnizatório devido ao Autor, considerando condição sine qua non a existência de uma sentença proferida por tribunal judicial que declare a ilicitude do despedimento, nos termos e para os efeitos do disposto nos art.°s 387°, n° 1 e 388°, n° 1, ambos do CT;
XXXI. Ignorando que a decisão judicial proferida no âmbito do processo de insolvência que reconheça e gradue os créditos reclamados, inclusive os créditos reclamados a título de indemnização devida pelo despedimento ilícito, vale como decisão judicial para efeitos do disposto no art.° 388° do CT e do art.° 2°, n° 1 do NRFGS.
XXXII. Foi, aliás, esse o fundamento que o Autor utilizou para sustentar o pedido de suspensão da presente instância, nos termos e para os efeitos do disposto no art.° 15° do CPTA, conforme resulta dos factos alegados e devidamente comprovados pelos documentos que instruíram a presente ação,
XXXIII. Encontra-se já agendada audiência de discussão e julgamento no apenso da reclamação de créditos, para o dia 8 de maio de 2018, na qual irá ser apreciada e determinada a indemnização devida ao Autor pela ilicitude do despedimento;
XXXIV. Resulta do art.° 2°, n° 1 do NRFGS que o FGS é responsável pelo pagamento de créditos laborais emergentes da violação do contrato, nos quais se incluem a indemnização referente ao despedimento ilícito.
XXXV. Ora, pertencendo aos tribunais de comércio a competência material para julgamento e decisão dos créditos dos quais o Autor se arroga titular, e encontrando-se pendente o julgamento do apenso de verificação e graduação de créditos, salvo devido respeito, que é muito, deveria o Tribunal a quo ter determinado a suspensão da presente instância, nos termos e com os fundamentos do disposto no art.° ° do CPTA;
XXXVI. Posto isto, face à faculdade prevista no sobredito artigo, não pode ser o Autor prejudicado por ainda não ter sido proferida sentença de verificação e graduação de créditos,
XXXVII. Pelo que, sempre deveria o Tribunal a quo ter determinado a suspensão da instância, até que a questão prejudicial - indemnização pelo despedimento ilícito - fosse apreciada pelo Juízo de Comércio de Amarante.
XXXVIII. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou, entre outras, as normas constantes dos art.°s 383° e 388° do CT; art.°s 2° e 3° do NRFGS, art 17-E CIRE art.° 15° do CPTA e art.° 20° da Constituição da República Portuguesa (…)”.
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Notificado que foi para o efeito, o Recorrido não contra-alegou.
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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida, tendo ainda sustentado a inexistência de qualquer nulidade da decisão judicial recorrida.
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O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu o parecer a que se alude no nº.1 do artigo 146º do CPTA.
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Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.
Neste pressuposto, cumpre conhecer as questões suscitadas: (i) nulidade de sentença, por omissão de pronúncia; e (ii) erro de julgamento de direito, por ofensa do disposto nos “(…) artigos 383° e 388° do CT; artigos 2° e 3° do NRFGS, art 17-E CIRE; art.° 15° do CPTA e art.° 20° da Constituição da República Portuguesa (…)”.
Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.
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III – FUNDAMENTAÇÃO
III – DE FACTO
O quadro fáctico [positivo e negativo] apurado na decisão recorrida foi o seguinte: “(…)
A) O Autor trabalhou por conta, sob a direção e fiscalização da sociedade “J., Lda” por transferência do contrato de trabalho individual por tempo indeterminado que detinha com J., sócio gerente da dita sociedade, desde o dia 01-08-1988 (facto considerado como não controvertido ao abrigo da livre apreciação atribuída ao tribunal nos termos do disposto no art. 83° n°4 do NCPTA e cfr. fls.42/43 do PA e cujo teor se dá por reproduzido);
B) O Autor exercia as funções de Marceneiro e auferia mensalmente salário base de €491,20 acrescida do valor de € 4,49 de subsídio de alimentação (cfr. documento n°2 - 42 e 43 junto à PI e cujo teor se dá por reproduzido);
C) No dia 24-10-2014 o representante legal da sociedade referida em A) promoveu o despedimento do Autor e restantes trabalhadores informando que havia sido requerido a insolvência da empresa, que a empresa atravessava graves dificuldades económicas, que não havia trabalho, que estavam despedidos e que a empresa iria encerrar naquele mesmo dia (facto considerado como não controvertido ao abrigo da livre apreciação atribuída ao tribunal nos termos do disposto no art. 83° n°4 do NCPTA);
D) Em 30-10-2014 foi instaurado Processo Especial de Revitalização da sociedade referida em A) que correu termos no Tribunal da Comarca do Porto Este, Amarante - Instância Central – 1ª Secção de Comércio sob o n° 309/14.6T8AMT, (cfr. fls.81/82 do PA e cujo teor se dá por reproduzido);
E) No processo referido em D) foi proferido despacho de nomeação do Administrador Judicial Provisório em 04-11-2014 (cfr. fls.66 do PA);
F) No processo referido em D) não foi homologado o PER apresentado pela devedora (cfr. fls.51/52 do PA);
G) Em 11-06-2015 deu entrada no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este - Juízo de Comércio de Amarante - Juízo 2 processo de insolvência da sociedade referida em A) e que ali correu termos sob o n° 816/15.3T8AMT, tendo sido proferida sentença de insolvência da referida sociedade em 16-06-2015 (cfr. fls.75 do PA);
H) Ao processo referido em G) foi apenso o PER referido em D) (cfr. fls.16 do PA);
I) O Autor reclamou créditos no processo referido em G), no valor de € 56.978,40 do qual foi reconhecido pelo Sr. Administrador de insolvência a quantia de € 1.011,66 (cfr. documento junto a fls.205/210 da PI);
J) Em 17-07-2015 o Autor apresentou junto dos serviços da ED requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho do qual, além do mais, consta o seguinte (cfr. fls.42/43 do PA e cujo teor se dá por reproduzido):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

K) Por despacho de 01-03-2017 e notificado ao Autor por ofício datado da mesma data, foi deferido parcialmente o pedido do Autor com os termos e fundamentos seguintes (cfr. documento nº1 junto com à PI e cujo teor se dá por reproduzido):
[imagem que aqui se dá por reproduzida]

L) Dá-se por reproduzido o teor de fls.73 do PA.
Inexistem outros factos provados ou não provados com interesse para a decisão da causa (…)”.
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III.2 - DO DIREITO
Assente a factualidade que antecede, cumpre, agora, apreciar as questões suscitadas no recurso jurisdicional em análise.
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I- Da nulidade imputada à decisão judicial recorrida, por omissão de pronúncia
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O Recorrente começa por alegar que a sentença recorrida não se pronunciou sobre o seu direito a obter pagamento quanto aos créditos vencidos referentes a trabalho suplementar, diferenças salariais e outros, mostrando-se, por isso, inquinada com a nulidade de omissão de pronúncia.
Quid iuris?
De acordo com o art. 608º n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), “(…) O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, (...).”
A inobservância de tal comando é, como se sabe, sancionada com a nulidade da sentença: art. 615º n.º 1 al. d) CPC.
O exato conteúdo do que sejam as questões a resolver de que falam tais normativos foi objeto de abundante tratamento jurisprudencial.
Destaca-se, nesta problemática, o Acórdão produzido por este Tribunal Central Administrativo Norte de 07.01.2016, no processo 02279/11.5BEPRT: cujo teor ora parcialmente se transcreve: “(…) “As causas determinantes de nulidade de decisões judiciais correspondem a irregularidades que afetam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua validade encontrando-se tipificadas, de forma taxativa, no artigo 615.º do CPC. O que não se confunde, naturalmente, com errados fundamentos de facto e/ou de direito.
Determina o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 1.º do CPTA, que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”.
Este preceito relaciona-se com o comando ínsito na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, e não todos e cada um dos argumentos/fundamentos apresentados pelas partes, e excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras – cfr. Alberto Reis, Código de Processo Civil anotado, volume V, Coimbra 1984 (reimpressão); e os acórdãos, entre outros, do STA de 03.07.2007, rec. 043/07, de 11.9.2007, recurso 059/07, de 10.09.2008, recurso 0812/07, de 28.01.2009, recurso 0667/08, e de 28.10.2009, recurso 098/09 de 17/03/2010, rec. 0964/09).
Do mesmo modo estipula o artigo 95.º do CPTA que “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras”.
Questões, para este efeito, são pois as pretensões processuais formuladas pelas partes no processo que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais de ordem geral e os específicos de qualquer ato (processual), quando realmente debatidos entre as partes – cfr. Antunes Varela in RLJ, Ano 122.º, p. 112 – a decidir pelo Tribunal enquanto problemas fundamentais e necessários à decisão da causa – cfr. Teixeira de Sousa in “Estudos sobre o novo Processo Civil”, Lex, Lx 1997, págs. 220 e 221.
Exige-se pois ao Tribunal que examine toda a matéria de facto alegada pelas partes e analise todos pedidos formulados por elas, com exceção das matérias ou pedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se torne inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões – cfr. M. Teixeira de Sousa, ob. e pp. cits.”.
Posição que se manteve no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 20.10.2017, no Procº. n.º 00048/17.6, que: “(…) A questão está desde logo em saber se o tribunal se deixou de pronunciar face ao suscitado e, em qualquer caso, se teria de o fazer.
Referiu a este propósito o STJ, no seu acórdão de 21.12.2005, no Processo n.º 05B2287 que:
“A nulidade do acórdão por omissão de pronúncia (art. 668º nº 1 d) do CPC), traduzindo-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever consignado no art. 660º nº 2 - 1ª parte - do CPC, só acontece quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes das posições dos pleiteantes, nomeadamente as que se prendem com a causa de pedir, pedido e exceções (excetuados aqueles cuja decisão esteja prejudicada por mor do plasmado no último dos normativos citados), não, pois, quando tão só ocorre mera ausência de discussão das "razões ou dos "argumentos" invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas.”
Como se refere no Acórdão, desta feita do STA nº 01035/12, de 11-03-2015, “a nulidade de sentença por omissão de pronúncia só ocorre quando o tribunal deixar de apreciar questão que devia conhecer (artigos 668.º, n.º 1, alínea d) e 660.º, n.º 2 do Código de Processo Civil revogado, aplicável no caso sub judice).
(…)
Resulta também do artº 95º, nº 1, do CPTA que, sem prejuízo do disposto no número seguinte, o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras.
Como este Supremo Tribunal Administrativo vem entendendo, haverá omissão de pronúncia sempre que o tribunal, pura e simplesmente, não tome posição sobre qualquer questão que devesse conhecer, inclusivamente, não decidindo explicitamente que não pode dela tomar conhecimento – cf. neste sentido Acórdãos de 19.02.2014, recurso 126/14, de 09.04.2008, recurso 756/07, e de 23.04.2008, recurso 964/06.
Numa correta abordagem da questão importa ainda ter presente, como também vem sublinhando de forma pacífica a jurisprudência, que esta obrigação não significa que o juiz tenha de conhecer todos os argumentos ou considerações que as partes hajam produzido. Uma coisa são as questões submetidas ao Tribunal e outra são os argumentos que se usam na sua defesa para fazer valer o seu ponto de vista.
Sendo que só têm dignidade de questões as pretensões processuais formuladas pelas partes ao tribunal e não os argumentos por elas usados em defesa das mesmas, não estando o tribunal vinculado a apreciar todos os argumentos utilizados pelas partes.”
Em reforço deste entendimento, ressalte-se o expendido no Acórdão do S.T.A. de 12.06.2018 [processo n.º 0930/12.7BALSB], consultável em www.dgsi.pt: “(…)
24. Caraterizando a arguida nulidade de decisão temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2, CPC].
25. Com efeito, o tribunal deve examinar toda a matéria de facto alegada pelas partes e analisar todos os pedidos/pretensões pelas mesmas formulados, ressalvadas apenas as matérias ou pedidos/pretensões que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciação se haja tornado inútil pelo enquadramento jurídico escolhido ou pela resposta fornecida a outras questões.
26. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada a parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio (…)”.
Munidos destes considerandos de enquadramento jurisprudencial, e regressando ao caso concreto, adiante-se, desde já, que o Tribunal a quo não deixou de conhecer de qualquer questão de que devesse conhecer.
Na verdade, na fundamentação da sentença recorrida vem referido “(…) Antes de mais façamos aqui um parêntesis para referir que não obstante o teor do art. 20° da PI, certo é que o Autor não requereu à ED os créditos relativos a “Trabalho Suplementar, diferenças salariais e outros”, razão pela qual o tribunal apenas apreciará do direito do Autor em obter o pagamento dos créditos efectivamente requeridos à ED com exclusão do referidos uma vez que o seu pagamento não foi requerido à ED (…)”.
Ora, a pronúncia em questão, nos termos em que se mostra supra expressada no parágrafo antecedente, revela-nos que o Tribunal a quo, pese embora o tenha feito de uma forma manifestamente sintética, efectivamente, tomou posição sobre o direito do Autor a percecionar os créditos relativos a trabalho suplementar, diferenças salariais e outros, tendo emitido um juízo de falta de direito ao pagamento dos mesmos fundado na falta de requerimento prévio ao Réu a solicitar o pagamento dos mesmos.
Por conseguinte, a sentença recorrida não padece da assacada nulidade por omissão de pronúncia [fundada na violação dos artigos 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC e artigos 95.º e 71.º n.º 1 do CPTA], a qual improcede.
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II- Do imputado erro de julgamento de direito, por ofensa do disposto nos “(…) artigos 383° e 388° do CT; artigos 2° e 3° do NRFGS, art 17-E CIRE; art.° 15° do CPTA e art.° 20° da Constituição da República Portuguesa (…)”..
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A decisão judicial recorrida, como sabemos, julgou a presente ação parcialmente procedente, e, em consequência, condenou o Réu “(…) a praticar novo ato traduzido no pagamento da quantia de € 13,553,22, valor sobre o qual deverão ser efetuadas as deduções legais que ao caso couber (…)”.
A ponderação de direito na qual se estribou o juízo de procedência parcial da ação foi, sobretudo, a seguinte: “(…)
O Autor para sustentar a sua posição alega, em síntese, que todos os créditos se venceram dentro do período de referência a que alude o art. 2° n°4 do NRFGS, devendo a ED assegurar os mesmos com os limites previstos no art. 3° do NRFGS.
A ED devidamente citada para contestar nada disse.
Há data de apresentação do requerimento m.i. na alínea J) do probatório já se encontrava em vigor o Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS) aprovado pelo DL n° 59/2015, de 21/04.
Este diploma procede à revogação dos artigos 316° a 326° da Lei n.° 35/2004, de 29 de julho, alterada pela Lei n.° 9/2006, de 20 de março, pelo Decreto -Lei n.° 164/2007, de 3 de maio, e pela Lei n.° 59/2008, de 11 de setembro, e institui no seu Anexo o NRFGS previsto no artigo 336° do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.° 7/2009, de 12 de fevereiro, transpondo a Diretiva n.° 2008/94/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador, pretendendo, ainda, proceder à “unificação do regime jurídico do FGS, o que se faz através do presente decreto-lei, que aprova o novo regime do Fundo de Garantia Salarial” cfr. refere o se refere no Preâmbulo do DL n° 59/2015.
Este NRFGS é indubitavelmente aplicável ao caso em apreço por força do disposto no art. 3° n°1 do DL n° 59/2015, onde se refere que ficam sujeitos ao novo regime do Fundo de Garantia Salarial, os requerimentos apresentados após a sua entrada em vigor.
Por força do disposto nos artigos 1.°, n.° 1 e 2.°, n.° 1 do mesmo diploma legal, estão abrangidos por esta proteção os créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação.
De acordo com o artigo 2.°, n.° 4 do NRFGS “O Fundo assegura o pagamento dos créditos previstos no n. 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas”, referindo o n°5 do mesmo preceito legal que “[ca]so não existam créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n." 1 do artigo seguinte, o Fundo assegura o pagamento, até este limite, de créditos vencidos após o referido período de referência.”.
Por seu lado, o artigo 3.° refere que (n°1) “O Fundo assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, referidos no n.° 1 do artigo anterior, com o limite máximo global equivalente a seis meses de retribuição, e com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal garantida”, acrescentando o n°2 do mesmo art. que “Quando o trabalhador seja titular de créditos correspondentes a prestações diversas, o pagamento é prioritariamente imputado à retribuição base e diuturnidades.”.
O probatório dá notícia que o processo de revitalização (PER) da entidade patronal da Autora, deu entrada em juízo em 30-10-2014 (\e nomeado o administrador judicial provisório) cfr. resulta da alínea E) do probatório, pelo que o caso sub juditio encontra-se abrangido pelo regime legal de proteção nos termos do disposto no artigo 1.°, n.° 1, al. b) do NRFGS.
In casu, o período de referência a que se refere o art. 2° n°4 do NRFGS situa-se no caso em apreço entre 30-04-2014 e 30-10-2014, pelo que tendo o contrato de trabalho do Autor cessado em 24-10-2014 (ou ainda que se admita que cessou em novembro de 2014 como entende a ED cfr. resulta da informação m.i. na alínea D) do probatório), quer se entenda que os créditos se venceram em 24-10-2014 ou em novembro de 2014 e tendo-se vencido nessa data todos os créditos laborais do Autor, impõe-se concluir que os mesmos se venceram com a cessação do contrato de trabalho e, portanto, em qualquer dos casos, dentro do período de referência a que alude o art. 2° n°4 (ou n°5) do NRFGS.
Assim sendo, o Autor tem direito aos créditos que tenham tido vencimento dentro do período compreendido entre 30-04-2014 e 30-10-2014 uma vez que o contrato de trabalho cessou em 24-10-2014 ou em momento posterior nos termos do art. 2° n°5 do NRFGS.
Relativamente à fundamentação da ED para indeferir parte dos valores requeridos em virtude de os mesmos não trem sido reconhecidos por parte do Sr. Administrador de insolvência, não se vislumbra qualquer fundamentação legal para tal decisão uma vez que, tal como referido supra, o pagamento dos créditos emergentes de contrato de trabalho requeridos pelos trabalhadores não decorrem ipso facto da reclamação ou do reconhecimento, verificação e graduação dos créditos dos interessados, designadamente, em sede de processo de insolvência, sendo independente do reconhecimento dos créditos salariais em sede de insolvência (cfr. art. 5° n° 2 do D.L. n.° 59/2015 de 21/04), não sendo o reconhecimento de créditos por parte do Administrador de insolvência ou de decisão judicial onde se impugne o não reconhecimento dos créditos por parte do administrador , condição para apresentar o requerimento ao FGS mas tão só apresentação de declaração ou cópia autenticada de documento comprovativo dos créditos reclamados pelo trabalhador, emitida pelo administrador de insolvência ou pelo administrador judicial provisório ou declaração comprovativa da natureza e do montante dos créditos em dívida declarados no requerimento pelo trabalhador emitida pelo empregador ou, alternativamente, de declaração de igual teor, emitida pelo serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área do emprego, quando não seja possível obtenção das declarações supra referidas emitidas pelo administrador de insolvência, pelo administrador judicial ou pelo empregador.
Por outro lado, considerando que os créditos se venceram aquando da cessação do Contrato de Trabalho do Autor, em 24-10-2014 (ou mesmo que se admita que se venceram em novembro de 2014 como fez a ED) e considerando que o período de referência se situa entre 30-04-2014 e 30-10-2014, não se vislumbra quais os créditos vencidos fora do período de referência, uma vez que aplicando quer o art. 5° n°4 do NRFGS ou o n° 5 do mesmo preceito legal, sempre os créditos se encontram vencidos em data anterior (ou posterior) aos seis meses que antecederam a propositura do PER.
Assim sendo, impõe-se analisar se assiste ao Autor o direito em obter o pagamento por parte da ED dos créditos reclamados a esta.
Antes de mais façamos aqui um parêntesis para referir que não obstante o teor do art. 20° da PI, certo é que o Autor não requereu à ED os créditos relativos a “Trabalho Suplementar, diferenças salariais e outros”, razão pela qual o tribunal apenas apreciará do direito do Autor em obter o pagamento dos créditos efectivamente requeridos à ED com exclusão do referidos uma vez que o seu pagamento não foi requerido à ED.
Relativamente aos valores referentes à retribuição do mês de outubro e respectivo subsídio de alimentação (18 dias uteis), verifica-se do teor das alíneas B) e J) do probatório que a ED assegurou o seu pagamento (€491,20 + € 80,82), pelo que se mostra prejudicada apreciação desta questão.
No que respeita aos créditos relativos a férias vencidas (presumivelmente as férias de 2013 e não gozadas), a questão que se coloca reside em saber se os créditos se venceram no período de referência previsto no art. 2° n°4 do NRFGS.
Ora, o Fundo de Garantia Salarial apenas intervém dentro de certos limites, que contendem com a natureza dos créditos, com a data em que se venceram e com o seu limite quantitativo.
Segundo o disposto no art. 2° n°4 do NRFGS, o Fundo apenas assegura o pagamento dos créditos que se hajam vencido nos seis meses anteriores à data da propositura da ação de insolvência, ou após esse período de referência nos termos do art. 2° n°5 do NRFGS.
Em primeiro lugar, e como tem sido assinalado pela jurisprudência, importa não confundir o vencimento do direito às férias, com o vencimento dos créditos relativos à remuneração das férias e respectivo subsídio uma vez que ambos os conceitos não se confundem.
De acordo com o disposto no art.° 237.°, n.° 1, do CT “o trabalhador tem direito, em cada ano civil, a um período de férias retribuídas, que se vence em 1 de janeiro” e segundo o n.° 2 da mesma norma, por regra esse direito reporta-se ao trabalho prestado no ano civil anterior.
Tal como referido supra não é confundível o vencimento do direito a férias com a retribuição das férias.
Neste sentido, o n.° 3 do art.° 264.° do CT estabelece, em relação ao subsídio de férias, que “salvo acordo escrito em contrário, o subsídio de férias deve ser pago antes do início do período de férias e proporcionalmente em caso de gozo interpolado de férias”, ou seja, o montante devido a título de subsídio de férias apenas se vence imediatamente antes do gozo das férias, e não no mesmo momento em que se vence o direito às férias, o que também vale para a remuneração das férias propriamente ditas.
Neste caso, a retribuição é devida imediatamente antes de o trabalhador iniciar o gozo do período de férias, o que não se confunde com o momento em que o trabalhador adquiriu o direito ao gozo das férias .
Assim sendo, como é, o crédito referente a férias que nunca tenha sido gozadas, no caso respeitantes ao direito a férias vencido em 01-01-2014 em decorrência do trabalho prestado em 2013, apenas se poderia considerar vencido no momento em que cessou o contrato de trabalho, já que, tendo este cessado, o trabalhador não mais poderia gozar as férias e fica, desde logo, na posição de poder exigir o seu pagamento.
Em relação ao subsídio de férias, também este se vence no momento anterior àquele em que o trabalhador inicia o gozo do direito a férias (cf. acórdão do TCA Norte de 28-04-2014, proferido no processo n.° 00247/12.7BEPNF).
Porém, o Autor não alega se à data da cessação do contrato de trabalho já havia gozado as férias relativas ao ano de 2013 e vencidas em 01-01-2014 (e recebido o subsídio correspondente), conditio sine qua non para que as mesmas se pudessem considerar vencidas na data de cessação do contrato de trabalho pelo que assim sendo, à míngua de qualquer alegação de se as mesmas foram já gozadas e pagas antes do seu gozo efetivo, não assiste ao Autor direito ao seu pagamento.
Além do mais, resulta da alínea B) do probatório que no ano de 2014 o Autor gozou 11 dias uteis de férias e recebeu o respectivo subsídio de férias no valor de € 491,20 (relativo às férias vencidas em 01-01-2014 e referentes ao trabalho prestado em 2013).
Relativamente aos proporcionais das férias referentes ao ano de 2014 (cessação do contrato) e respectivo subsídio, estatui o art. 245° n.° 1 do CT que cessando o contrato de trabalho, o trabalhador tem direito a receber a retribuição de férias e respectivo subsídio proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação, acrescentando o art. 237° do CT, ainda, que o trabalhador tem direito, em cada ano civil, a um período de férias retribuídas, que se vence em 1 de janeiro, e que o direito a férias, em regra, reporta -se ao trabalho prestado no ano civil anterior, o qual não está condicionado à assiduidade ou efetividade de serviço.
In casu, resulta dos autos que em 24-10-2014 cessou o contrato de trabalho do Autor, pelo que, à luz dos supra referidos preceitos legais e tendo em consideração que todos os créditos se venceram na data de cessação do contrato, este tem direito a receber os proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação e respectivo subsidio e que se computam em € 818,67 [(€491,20 / 12) x 10 x 2].
Porém, tendo já sido assegurados pela ED € 102,14 a esse título, assiste ao Autor receber ainda a quantia de € 716,53.
Relativamente aos créditos referentes aos proporcionais do subsídio de natal, e tendo em consideração que nos termos do disposto no art. 263° do CT o trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que deve ser pago até 15 de dezembro de cada ano, e que o valor do subsídio de Natal é proporcional ao tempo de serviço prestado no ano civil, no ano de cessação do contrato de trabalho, considerando que o mesmo não foi pago até ao dia 15-12-2014, o direito ao seu recebimento venceu-se na data de cessação do contrato de trabalho — 24-10-2014 -, data esta que, como já vimos, se encontra situada dentro do período de referência, pelo que também este crédito se encontra situado dentro do período de referência a que alude o art. 2° n°4 do NRFGS razão pela qual, a este título, assiste ao Autor o direito a receber a quantia de € 409,33 [491,20 / 12 x 10].
No que concerne aos valores referentes à indemnização/compensação pela cessação do contrato de trabalho, o Autor defende que o montante reclamado e que eventualmente venha a ser reconhecido a título de indemnização deverá ser assegurado pela ED.
Porém, recuperando a fundamentação já supra expendida na presente decisão, preliminarmente se dirá que não é o facto de o Autor ter reclamado esses valores em sede de processo de insolvência e venha a obter eventualmente o seu reconhecimento judicial que conduz a que o FGS seja obrigado a compensar o Autor na mesma medida, porquanto estamos em domínios distintos: ali, num processo de insolvência regido pelas normas vertidas no CIRE e aqui numa atribuição de uma indemnização por parte do FGS regida pelas normas vertidas no Regulamento do Código de Trabalho (RCT) o que impõe diversas soluções jurídicas.
Com efeito, no processo de insolvência o trabalhador reclama todos os créditos de que se arroga credor, mas a responsabilidade do FGS está submetida à disciplina do RCT e a ela deve obediência visando-se, apenas, assegurar que os trabalhadores obtenham, em tempo útil, o pagamento das retribuições.
E como se afirma no Acórdão do TCA Norte de 3/5/2013, proc. n.° 00340/11, cuja fundamentação se acompanha, “falar-se em Fundo de Garantia Salarial requer atender-se à finalidade social do mesmo, a qual justifica que sejam adotados limites à sua intervenção, não só temporais, que decorrem do enquadramento comunitário que lhe está subjacente, como também os atinentes às importâncias a pagar” daí que o RCT defina limites à atuação do FGS que têm subjacente finalidades distintas da disciplina prevista no CIRE.
Por outro lado, o probatório dá notícia — alínea C) — que no caso em apreço o contrato de trabalho a termo incerto do Autor cessou devido ao despedimento coletivo dos trabalhadores, situação esta que se mostra prevista no art. 359° e ss do CT, sendo certo que assistiria aos trabalhadores o direito ao pagamento de uma compensação calculada nos termos do art. 366° do CT, sem prejuízo da possibilidade da declaração da ilicitude do despedimento coletivo prevista no art. 383° do CT e da aplicação do disposto nos arts. 389° e ss do CT.
Porém, no caso em apreço, o Autor não intentou a ação a que se refere o art. 388° do CT (nem a pode já intentar pois o seu prazo já decorreu), razão pela qual não se pode considerar o despedimento coletivo ilícito (por falta de sentença judicial proferida por tribunal judicial que o reconheça), pelo que assiste apenas ao Autor o direito à compensação prevista no art. 366° do CT, na redação dada pela Lei n° 69/2013.
Como se refere no Acórdão do TRP proferido no processo n° 88/11.9TTVCT.P1, de 28-10-2013, “(...) Comunicando o empregador ao trabalhador que é forçado a encerrar a empresa e a cessar todos os postos de trabalho, esta comunicação configura um despedimento coletivo, a impugnar mediante a ação especial prevista no artigo 156º e seguintes do CPT, no prazo de seis meses a contar da cessarão do contrato.”.
No mesmo Acórdão, é ainda referido que se considera despedimento coletivo “a cessação de contratos de trabalho promovida pelo empregador e operada simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo, pelo menos, dois a cinco trabalhadores, consoante se trate de microempresa ou de pequena empresa, por um lado, ou de média ou grande empresa, por outro, sempre que aquela ocorrência se fundamente em encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou redução do número de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos” -artigo 359° do Código do Trabalho.
Recordemos que, nos termos do artigo 367° n° 1 do Código do Trabalho, se considera extinção do posto de trabalho “a cessarão de contrato de trabalho 'promovida pelo empregador e fundamentada nessa extinção, quando esta seja devida a motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa. A lógica é 'portanto a do encerramento de uma ou várias secções, ou por maioria de razão, a do encerramento de toda a empresa, a processar como despedimento coletivo, e a da simples extinção dum posto de trabalho, que obviamente se há de localizar numa determina orgânica, numa secção ou departamento. Da comunicação enviada à recorrida consta: “(...) por motivos alheios à nossa vontade, falta de encomendas (...) falta de clientes no setor do turismo (...) somos forrados a proceder ao encerramento da empresa (...) a cessar todos os postos de trabalho, pelo que a partir desta data, o seu vínculo está terminado”.
Em termos literais, não consta desta comunicação a extinção do posto de trabalho, fórmula aliás geralmente conhecida e que os empregadores também generalizadamente usam quando querem extinguir um posto de trabalho. Não consta portanto: “somos forrados a extinguir o seu posto de trabalho”. Tampouco consta a extinção de todos os postos de trabalho, mas apenas a cessarão de postos. Rigorosamente, os postos não cessam, o que cessa são os contratos de trabalho.
Nenhum outro facto provado nos dá qualquer outra orientação no sentido de que se tratasse duma simples extinção do posto de trabalho.
Por outro lado, como bem nota a Exma. Senhora Procuradora-Geral. Adjunta, a referência ao encerramento da empresa, com a cessação de todos os postos de trabalho, só pode interpretar-se como reportada a uma realidade de facto quantificável como despedimento coletivo. Na verdade, e como resulta da diferença entre despedimento coletivo e extinção do posto de trabalho que acima referimos, a nota distintiva do primeiro é justamente o encerramento da unidade orgânica em que se inserem os postos de trabalho. (...)”.
Acresce que, e ainda que não se considerasse que a cessação do contrato de trabalho do Autor é subsumível à figura do despedimento coletivo mas sim à prevista no art. 346° do CT, ao despedimento previsto no art. 347° do CT ou ao previsto no art. 367° do CT, em todo o caso o cálculo da compensação pela cessação do contrato de trabalho também seria, em última instância, calculada nos termos do art. 366° do CT, sendo certo que, em qualquer dos casos, inexistiria sentença proferida por tribunal judicial que declarasse a ilicitude do despedimento, cfr. exigem os arts.387° n°1 e 388° n°1, ambos do CT.
Assim sendo, importa apenas apreciar qual o quantum da indemnização devida nos termos do art. 366° do CT, em conjugação com o disposto no art.2° e 5° da Lei n° 69/2013.
No referido art. 366° n° 1 do CT, refere-se que “Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade”.
Porém, o art. 5° n°1 a) da Lei n° 69/2013, fixa um regime transitório no que concerne ao cálculo da indemnização a que alude o art. 366° n°1 do CT no que respeita a contratos sem termo (como é o caso da Autora, referindo que:
1 - Em caso de cessação de contrato de trabalho celebrado antes de 1 de novembro de 2011, a compensação prevista no n.’ 1 do artigo 366.° do Código do Trabalho, na redação conferida pela presente lei, é calculada do seguinte modo:
a) Em relação ao período de duração do contrato até 31 de outubro de 2012, o montante da compensação corresponde a um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade ou é calculado proporcionalmente em caso de fração de ano;
b) Em relação ao período de duração do contrato a partir de 1 de novembro de 2012 inclusive e até 30 de setembro de 2013, o montante da compensação corresponde a 20 dias de retribuição base e diuturnidades calculado proporcionalmente ao período efetivo de trabalho prestado;
c) Em relação ao período de duração do contrato a partir de 1 de outubro de 2013 inclusive, o montante da compensação corresponde à soma dos seguintes montantes:
i) A 18 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, no que respeita aos três primeiros anos de duração do contrato;
ii) A 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, nos anos subsequentes;
iii) O disposto na subalínea i) aplica-se apenas nos casos em que o contrato de trabalho, a 1 de outubro de 2013, ainda não tenha atingido a duração de três anos.
Ora, resulta do probatório que a antiguidade do Autor corresponde a 26 anos, 2 meses e 24 dias e que este auferia a remuneração base de € 491,20.
Aplicando as regras previstas no art. 366° n°1 e 2 do CT em conjugação com o art. 5° n°1 da Lei n° 69/2013, assiste ao Autor, tendo por base uma remuneração diária de € 16,37, o direito a receber uma compensação correspondente a € 12.427,36.
Importa no entanto ter em consideração que o valor relativo à indemnização, no montante de € 12.427,36, tem natureza indemnizatória, não se encontrando em nosso entender limitado pelo artigo 3.° do NRFGS que apenas se refere a “créditos emergentes do contrato de trabalho” e não a créditos emergentes “da sua violação ou cessação” (referido no artigo 2.°, n.° 1).
Assim os créditos emergentes do contrato de trabalho a que o Autor tem direito a receber por parte da ED (para além dos já deferidos no montante de € 674,16) perfazem a quantia de € 1.125,86 [perfazendo a este título a quantia total a título de créditos emergentes de contrato de trabalho de € 1.800,02 (674,16 + 1.125,86)], montante que não ultrapassa o limite de € 2.947,20 (€ 491,20 x 6) a que alude o art. 3° n°1 do NRFGS.
Assim, assiste ao Autor o direito a receber a título de indemnização o montante de € 12.427,36 e a auferir, a título de créditos emergentes de contrato de trabalho € 1.125,86, o que perfaz a quantia total de € 13.553,22.
A tal montante deve, nos termos do artigo 2.°, n.° 2 do Decreto-Lei n.° 59/2015, de 21 de abril serem deduzidas as quotizações para a segurança social e correspondente retenção na fonte do imposto sobre o rendimento (…)”.
Do assim decidido em matéria de indemnização devida pelo despedimento ilícito discorda o Recorrente, por entender, no mais essencial, de que, encontrando-se pendente o julgamento do apenso de verificação e graduação de créditos, cuja decisão final vale como decisão judicial para efeitos do disposto no art.º 388º do CT e do art.º 2º, nº 1 do NRFGS, sempre deveria o Tribunal a quo ter determinado a suspensão da instância até que a questão prejudicial – indemnização pelo despedimento ilícito – fosse apreciada pelo Juízo de Comércio de Amarante.
Com esta argumentação visa o Recorrente demonstrar de que o segmento decisório da sentença recorrida que fixou a quantia de € 12.427,36 como sendo o montante devido a título de compensação devida pelo despedimento coletivo mostra-se eivado de erro de julgamento de direito por violação do disposto nos “(…) artigos 383° e 388° do CT; artigos 2° e 3° do NRFGS, art 17-E CIRE; art.° 15° do CPTA e art.° 20° da Constituição da República Portuguesa (…)”
Face à motivação recursiva que se vem de sintetizar cumpriria, agora, determinar se assiste razão ao Recorrente no imputado erro de julgamento de direito, que se mostra enquadrado nos termos e com o alcance supra explicitados.
Ocorre, porém, que, na senda do que se decidiu no aresto deste T.C.A.N., de 21.12.2018, tirado no processo nº. 00392/17.2BEPNF, que versou sobre situação em tudo semelhante à dos presentes autos, tal tarefa se nos apresenta como inútil por destituída de efetiva relevância no desfecho final da causa considerando o quadro normativo que se nos impõe e deriva do artigo 3º, nº. 1 do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21/4, e suas implicações.
Explicitemos pormenorizadamente esta convicção, que, de resto, segue o trilho preconizado no aresto deste T.C.A.N. supra mencionado.
O n.º 1 do artigo 3.º do NRFGS, sob a epígrafe “Limites das importâncias pagas”, estatui que ” O Fundo assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, referidos no n.º 1 do artigo anterior, com o limite máximo global equivalente a seis meses de retribuição, e com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal”.
A leitura do preceito da lei ordinária que se vem de transcrever revela-nos que o legislador estabeleceu dois limites diversos: (i) um valor limite global máximo de créditos derivados de retribuições a pagar, correspondente a 6 meses de retribuição; e (ii) um limite máximo de retribuição mensal a considerar, correspondente ao triplo da Retribuição Mínima Mensal Garantida [doravante, RMMG].
Assim, o Fundo só está obrigado ao pagamento dos créditos laborais até 6 meses do valor da retribuição mensal efetivamente auferida pelo trabalhador à data da cessação do contrato, sendo que o valor desta retribuição mensal nunca poderá ser superior a 3 vezes o valor da retribuição mínima legal garantida em vigor na mesma data [neste sentido, vd. aresto do colendo S.T.A., tirado no processo nº. 0627/17.1BEPRT, que não admitiu o recurso de revista interposto deste Tribunal Superior, e consultável em www.dgsi.pt].
Deste modo, sendo o valor da RMMG em 2014 fixado em € 505,00 [cfr. D.L nº. 144/2004, de 30.09], o limite máximo da retribuição mensal a considerar para efeitos do previsto no art.º 3.º, n.º 1 é, em abstrato, de € 1.515,00.
Em consequência, o montante máximo a pagar pelo Réu, aqui Recorrido, a título de créditos de retribuição emergentes de contrato de trabalho é de, para o ano de 2014, e, em abstrato - sem cuidar, portanto, da real situação do A.-, € 9,090,00.
Este valor, naturalmente, constitui o resultado da multiplicação do limite máximo da remuneração mensal pelos 6 meses estatuídos no art.º 3.º, n.º 1 [505,00€ x 3= 1,515,00 € x 6 meses = 9,090,00 €].
Revertendo ao caso concreto, e considerando a específica situação do Autor, aqui Recorrente, verifica-se - atento o probatório coligido - que este auferia o valor mensal de € 491,00 a título de remuneração.
Quer isto dizer, então, que o Autor, aqui Recorrente tem direito ao pagamento dos créditos vindos de enunciar até ao limite máximo global de € 2,946,00, pois que o seu vencimento mensal ilíquido ascende a € 491,00 [€ 491,00 x 6= € 2,946,00].
Por conseguinte, ilícito ou não o despedimento, a pretensão de pagamento pelo Fundo de Garantia Salarial nunca poderá exceder o valor de € 2,946,00, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão em relação à pretensão do Recorrente de obtenção de vantagem maior para pagamento do valor relativo à compensação por despedimento ilícito eventualmente atingível pela procedência do erro de julgamento em análise.
E nesta impossibilidade de “obtenção de vantagem maior” reside o “punctum saliens” distintivo da falta de préstimo à boa decisão de causa da procedência do erro de julgamento em análise, do qual, saliente-se, até saiu beneficiado o Recorrente.
Indevidamente beneficiado é certo, mas, como se decidiu no citado aresto deste T.C.A.N., de 21.12.2018, cuja linha jurisprudencial aqui se reitera, (…) sem que agora em recurso possa ficar em pior sorte.
Neste último ponto terá de se notar que com o recurso o autor prossegue, como já dito, um interesse de obtenção de vantagem maior para pagamento do valor relativo à compensação. Calculada pelo tribunal “a quo” no montante de € 10.706,32 [no caso em apreço, € 12.427,36] , até esta fasquia, e na expressão pecuniária do interesse, o recurso preserva o decidido.
E na similitude, é de chamar à colação a norma do art.º 635º, nº 5, do CPC (…)”.
Nestes termos, por falta de relevância no desfecho final da causa, improcede o invocado erro de julgamento de direito em análise.
Concludentemente, deverá ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e mantida a decisão judicial recorrida.
Ao que se provirá em sede de dispositivo.
* *
IV – DISPOSITIVO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Administrativa deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da CRP, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso jurisdicional “sub judice”, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente, sem prejuízo do beneficio de apoio judiciário com que litiga nos autos.

Registe e Notifique-se.
* *

Porto, 30 de abril de 2020,


Ricardo de Oliveira e Sousa
Fernanda Brandão
Hélder Vieira