Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00579/18.0BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/23/2024
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:DECRETO-LEI N.º 117/2010, DE 25 DE OUTUBRO;
DIRECTIVA 98/34/CE;
COMBUSTÍVEIS; ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE DIREITO.
Sumário:
1 - O disposto no artigo 11.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro, ao determinar as percentagens de incorporação de biocombustíveis a observar pelas “entidades incorporadoras”, constituía uma “regra técnica” [na aceção do artigo 1.º, ponto 11, da Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, datada de 22 de junho de 1998] a qual só seria oponível aos destinatários particulares se o respetivo projecto tivesse sido comunicado à Comissão Europeia, nos termos previstos no artigo 8.º n.º 1 daquela Directiva.

2 – Assim não tendo sucedido, e falta de idónea base legal substantiva, o acto praticado pela Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis, EPE, ao abrigo do disposto no artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro é inválido e contenciosamente anulável por violação de lei, por erro nos seus pressupostos de direito, por promanado em desconformidade com o direito da União Europeia.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:I - RELATÓRIO


[SCom01...], Ld.ª [devidamente identificada nos autos] Autora na acção administrativa que intentou contra a Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis, EPE [também devidamente identificada nos autos] na qual formulou pedido no sentido de ser anulada a decisão proferida pelo seu Presidente do Conselho de Administração, que no âmbito do processo 07/UB/2017 e nos termos do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro, determinou que pagasse a quantia de € 4.022.000,00, a título de compensações do 2.º trimestre de 2017, inconformada com a Sentença proferida, por via da qual julgou improcedente a acção e absolveu a entidade demandada do pedido, inconformada, veio interpor recurso de Apelação.
*

No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
A) Vem o presente recurso deduzido da Sentença, de 07 de Junho de 2022, que julgou a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, manteve na ordem jurídica o acto que determinou a Recorrente, ao pagamento de € 4.022.000,00 (quatro milhões e vinte e dois mil euros), a título de compensação, nos termos dos artigos 11.º e 24.º, do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro.

B) O Tribunal a quo deu como provada a matéria de facto identificada de fls. 6 a 11 da sentença, tendo por base quer os documentos juntos aos autos, quer o processo administrativo.

C) O Tribunal a quo considerou que os autos tinham matéria de facto suficiente para conhecer de mérito, nos termos do artigo 88.º, n.º 1, alínea b), do CPTA, pelo que dispensou a produção de prova requerida.

D) Sucede, que:

E) O Tribunal a quo não julgou provado que a actividade do grupo “X” se encontrava à data dos factos, plenamente regulada, controlada e sancionada pelas competentes autoridades espanholas, mormente quanto às exigências ambientais e de incorporação de biocombustíveis, como alegado ao longo da PI e entenda-se, devidamente comprovado pela prova documenta aí junta.

F) O Tribunal recorrido também não considerou o facto de o grupo “X” ter entregado à Recorrente fichas técnicas relativas às especificações técnicas do combustível, onde expressamente é indicada a existência de incorporação de biocombustível numa percentagem até 7,58% v/v, como comprovado pela prova documental junta à PI.

G) Por outro lado, impunha-se apurar se a actividade deste grupo se encontrava devidamente regulada para estes efeitos em Espanha, uma vez que, prevendo-se neste Estado-Membro, igualmente, quotas obrigatórias de incorporação de biocombustíveis, a legalidade no exercício da actividade do grupo “X”, implicaria o sancionamento pelas autoridades espanholas da existência efectiva de incorporação de biocombustível no combustível fornecido por esse grupo,

H) O Tribunal a quo não considerou como facto provado ou, pelo menos, facto controvertido, o facto de o Estado Português não ter efectuado, no decorrer do procedimento legislativo que conduziu à promulgação do Decreto-Lei n.º 117/2010, a comunicação desse projecto legislativo à Comissão Europeia e aos restantes Estados-Membros.

I) O Tribunal a quo dispensou a produção de prova requerida pela Recorrente, de que fosse oficiada a competente autoridade nacional para se pronunciar sobre se essa comunicação prévia havia sido efectivamente efectuada.

J) O conhecimento deste facto mostra-se essencial para a decisão material dos autos, uma vez que, e nos termos do que foi alegado pela Recorrente, essa não comunicação prévia do diploma implica uma violação dos artigos 1.º, 8.º e 9.º, da Directiva 98/34/CE, e, por conseguinte, a inaplicabilidade das normas legais deste diploma à aqui Recorrente.

K) Houve manifesto erro de julgamento sobre a suficiência da matéria existente nos autos para o conhecimento imediato do pedido, não tendo sido considerados, pelo menos, como controvertidos factos relevantes para a decisão da causa, com a concomitante omissão de diligências de prova reputadas essenciais o que, naturalmente, afectou o julgamento da matéria de facto e determina a anulação da sentença por défice instrutório (cfr. acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 09 de Abril de 2014, proferido no processo de recurso n.º 01869/13).

L) Com efeito, importa anular a decisão final proferida na 1.ª instância, já que, nos termos do preceituado no artigo 662.º, do CPC – aplicável ex vi artigo 140.º, n.º 3, do CPTA – não constam do processo todos os elementos que permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto,

M) Sendo, salvo o devido respeito, a sentença recorrida manifestamente deficiente, sobre pontos determinados da matéria de facto, considerando a Recorrente indispensável a ampliação desta.

N) Por esta ordem de razões, a sentença recorrida deverá ser anulada e substituída por outra que determine a realização de diligências adicionais de prova destinadas a comprovar:

O) Se a actividade do grupo “X” se encontrava à data dos factos, plenamente regulada, controlada e sancionada pelas competentes autoridades espanholas, mormente quanto às exigências ambientais e de incorporação de biocombustíveis;

P) Se o grupo “X” entregou à Recorrente fichas técnicas relativas às especificações técnicas do combustível, onde expressamente é indicada a existência de incorporação de biocombustível numa percentagem até 7,58% v/v, e, designadamente, se esses valores se encontram correctos ou não;

Q) A efectiva incorporação de biocombustível no combustível rodoviário que a Recorrente introduziu no mercado nacional, no ano de 2017;

R) Se o Estado Português procedeu, ou não, nos termos dos artigos 1.º, 8.º e 9.º, da Directiva 98/34/CE, à comunicação prévia à Comissão Europeia e restantes Estados-Membros, do projecto legislativo que resultou no Decreto-Lei n.º 117/201.

S) A sentença recorrida padece não apenas erros de julgamento da matéria de facto, mas também erros de julgamento da matéria de Direito.

T) Em sede da sentença recorrida, entendeu, o Tribunal a quo que relativamente às disposições contidas no Decreto-Lei n.º 117/2010, maxime as metas/quotas de incorporação previstas no artigo 11.º, não tem aplicação o procedimento de comunicação prévia previsto na Directiva 98/34/CE.

U) As metas/quotas de incorporação de biocombustíveis configuram a (sub)categoria de “outra exigência”, conforme prevista no artigo 1.º, n.ºs 3 e 9, da Directiva 98/34/CE (cfr. artigos 110.º e seguintes, da PI) - veja-se a este propósito quer o acórdão “intercommunale Intermosane SCRL e Fédération de ‘industrie et du gaz”, acórdão do TJUE de 9 de Junho de 2011, Processo C-361/10, quer o acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção), de 31 de Janeiro de 2013, “Belgische Petroleum Unie VZW e o. contra Belgische Staat”, proferido no processo C-26/11, designadamente, as Conclusões ali produzidas pela Advogada-Geral.

V) Se um Diploma nacional contiver regras técnicas na acepção do artigo 1.º, da Directiva 98/34/CE, existe uma obrigação de comunicação prévia do seu projecto à Comissão Europeia e restantes Estados-Membros.

W) Como concluiu a Advogada Geral, no referido processo C-26/11 – vide Conclusão 89 – sendo que o TJUE sufragou este entendimento através do acórdão de 31.Janeiro.2013 – “A quota de biocombustíveis não contém qualquer proibição e no presente caso é irrelevante apreciar a questão de saber se a circunstância de não se ter de incorporar biocombustível em cada litro de combustível exclui a existência de uma especificação técnica. Isto porque a referida quota constitui, em todo o caso, uma “outra [s] exigência [s],”, na acepção do artigo 1º, n.º 4, da Directiva 98/34/CE.” (sublinhado nosso)

X) A quota de biocombustíveis configura uma regra técnica, mais concretamente uma “outra exigência” nos termos dos n.ºs 3 e 9, do artigo 1.º, da Directiva 98/34/CE e por esse motivo sujeitava o projecto legislativo do diploma onde foi prevista – Decreto-Lei n.º 117/2010 – à obrigatoriedade de comunicação prévia, conforme prevista nos artigos 8.º e 9.º, da Directiva 98/34/CE,

Y) Comunicação prévia que não tendo existido determina a inaplicabilidade à Recorrente das metas/quotas de incorporação previstas no artigo 11.º, do Decreto-Lei n.º 117/2010, e, por consequência, determina (também) que o acto administrativo objecto dos presentes autos padeça de um vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de Direito que deverá conduzir à sua anulabilidade, nos termos do artigo 163.º, do CPTA.

Z) Não tendo sido assim considerado pelo Tribunal a quo, a sentença padece de manifesto erro de julgamento, no que, em concreto respeita à interpretação do artigo 11.º, do Decreto-Lei n.º 117/2010, conjugado com os artigos 1.º, 8.º e 9.º, da Directiva 98/34/CE, o que determina a anulação da sentença recorrida neste ponto em concreto, com as demais consequências legais.

AA) Como defendido pela Professora Inês Quadros – veja-se parecer junto aos autos em 03 de Maio de 2018 – “a previsão de metas de incorporação de biocombustíveis no artigo 11º do Decreto-Lei n.º 117/2010, configura uma regra técnica na aceção do artigo 1º, n.º 9 da Diretiva 98/34/CE, na modalidade de “outra exigência” como definida no n.º 3 do artigo 1º dessa diretiva, estando, portanto, sujeita a uma obrigação de comunicação prévia à Comissão, sem a qual não poderá, uma vez aprovada, ser oponível aos particulares.”

BB) Previamente à sua promulgação, em 6 de Outubro de 2010, e entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2011, o projecto legislativo do Decreto-Lei n.º 117/2010, maxime o normativo do artigo 11.º, deveria ter sido comunicado à Comissão Europeia e aos restantes Estados-Membros, nos termos dos artigos 8.º e 9.º, da Directiva 98/34/CE,

CC) Como refere a Professora Inês Quadros, na página 36 do seu Parecer (junto em 03 de Maio de 2018 a estes autos): “É ponto assente para o Direito da União que, na falta de comunicação prévia, as regras técnicas não são oponíveis aos operadores económicos (…)”, sendo que “Desde a década de 90 que o Tribunal o afirma de modo implacável (…).” (Realçado nosso)

DD) Segundo a jurisprudência do TJUE, “A eficácia do controlo ficará tanto mais reforçada quanto a directiva for interpretada no sentido de que a inobservância da obrigação de notificação constitui um vício processual essencial susceptível de acarretar a inaplicabilidade aos particulares das regras técnicas em causa – acórdão do TJUE, de 30 de Abril de 1996, Processo C-194/94 (n.º 48), grifado nosso. Numerosos acórdãos do TJUE perfilham este entendimento, como o Acórdão de 8 de Setembro de 2005, Processo C-303/04 (n.º 23), o Acórdão de 15 de Abril de 2010, Processo C-433/05 ou o Acórdão de 31 de Janeiro de 2013, Processo C-26/11.

EE) A inobservância de comunicação prévia prevista nos artigos 8.º e 9.º, da Directiva 98/34/CE, constitui um vício processual essencial, uma vez que a comunicação tem a finalidade geral de eliminar ou restringir os entraves às trocas comerciais e submeter ao acordo, ou à não oposição da Comissão e dos restantes Estados-Membros, dos projectos de regulamentações nacionais. – Cfr. acórdão do TJUE, de 30 de Abril de 1996, Processo C-194/94 (n.º 50).

FF) A entrada em vigor de regra técnica no ordenamento jurídico nacional, inscrita em diploma legal cujo procedimento legislativo violou os artigos 8.º e 9.º, da Directiva, tem como consequência jurídica a sua inoponibilidade aos particulares, podendo o particular invocar as normas comunitárias violadas “perante o juiz nacional, ao qual compete recusar a aplicação de uma regra técnica nacional que não tenha sido notificada em conformidade com a directiva – Cfr. acórdão do TJUE, de 30 de Abril de 1996, Processo C-194/94 (n.º 55)

GG) Não tendo existido no procedimento legislativo que conduziu à aprovação e entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 117/2010, a obrigatória prévia comunicação à Comissão e aos restantes Estados-Membros, prevista nos artigos 8.º e 9.º, da Directiva 98/34/CE, as metas de incorporação previstas no artigo 11.º, n.º 1, do referido Decreto-Lei, são inaplicáveis aos particulares e, naturalmente, à Recorrente.

HH) O acto administrativo em crise aplicou normas legais (nacionais) que violam normas comunitárias processuais essenciais, pelo que, e no respeito do princípio da prevalência do Direito da UE sobre o Direito Nacional, plasmado no artigo 8.º, da CRP, padece aquele acto de um vício de violação, por erro nos pressupostos de Direito, o que determinava a sua anulação (cfr. artigo 163.º, n.º 1, do CPA).

II) Assim sendo, também por esta ordem de razões, a sentença recorrida não poderá manter-se no nosso ordenamento jurídico, devendo ser substituída por outra que faça uma correcta aplicação do Direito, maxime uma correcta interpretação da legislação aplicável.


JJ) Ademais, entendeu o Tribunal a quo que a interpretação subjacente à decisão impugnada não viola o artigo 5.º, da Directiva 98/70/CE, e, mais concretamente, o princípio da livre circulação de mercadorias.

KK) No essencial considerou o Tribunal a quo que o artigo 11.º, do Decreto-Lei n.º 117/2010, a respeito de metas/quotas de incorporação, não viola a norma de Direito europeu – artigo 5.º, da Directiva 98/70/CE – e o princípio da livre circulação de mercadorias no espaço da União, uma vez que decorre de exigências ambientais de promoção da utilização de biocombustíveis nos transportes, impostos aos Estados-Membros pelas Directivas 2003/30/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de Maio de 2003 e 2009/28/CE, de 23 de Abril de 2009.

LL) A Recorrente não alegou, como parece ter sido entendido na sentença sub judice, que a previsão de metas/quotas de incorporação de biocombustível no artigo 11.º, do Decreto-Lei n.º 117/2010, de per se constitui uma violação do princípio da livre circulação de mercadorias.

MM) Na verdade, foi até a Recorrente quem na sua PI citou o Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção), de 31 de Janeiro de 2013, “Belgische Petroleum Unie VZW e o. contra Belgische Staat”, proferido no processo C-26/11, considerando na esteira desta decisão que a previsão legal de metas/quotas de incorporação de biocombustíveis não merece por si censura à luz do princípio da livre circulação de mercadorias e artigo 5.º, da Directiva 98/70/CE.


NN) Com efeito, a violação do princípio da livre circulação de mercadorias, rectius de combustíveis, previsto no artigo 5.º, da Directiva 98/70/CE, decorre outrossim da aplicação dessas exigências de incorporação previstas no artigo 11.º, do Decreto-Lei n.º 117/2010, relativamente a combustível rodoviário introduzido no mercado nacional, que já se encontra incorporado com metas/quotas de incorporação de biocombustível previstas em outro Estado-Membro,

OO) Metas/quotas de incorporação essas já sancionadas/verificadas pela Autoridade competente desse Estado e cujas especificações estão de acordo com as especificações ambientais previstas no anexo II da Directiva 98/70/CE.

PP) Como decorre da matéria de facto assente nos autos, o combustível cuja introdução no mercado nacional originou a aplicação de compensações, foi importado pela Recorrente e, no caso concreto, de Espanha.

QQ) Sendo combustível já refinado, nesse Estado-Membro foi sujeito a exigências de incorporação de biocombustíveis, cuja verificação e controlo foi efectuado pelas Autoridades congéneres da Recorrida nesse Estado.

RR) E, ademais, combustível cujas especificações das fichas técnicas que foram entregues à Recorrente pela “X”, eram em tudo iguais às especificações ambientais do anexo II, da Directiva 98/70/CE.

SS) A aplicação das metas/quotas de incorporação nacional de biocombustível, de acordo com o referido artigo 11.º, do Decreto-Lei, à introdução de combustível rodoviário que já se encontrava incorporado com as metas/quotas de incorporação previstas em outro Estado-Membro, e até esse limite, como está subjacente no acto impugnado, extravasa as obrigações e exigências decorrentes das Directivas 2003/30/CE e 2009/28/CE, de promoção do uso de biocombustíveis e configura, nessa medida, uma violação do artigo 5.º, da Directiva 98/70/CE e, consequentemente, do princípio da livre circulação de mercadorias/ combustíveis no espaço da União Europeia.

TT) Deste modo, ocorreu erro de julgamento quanto à interpretação do artigo 5.º, da Directiva 98/70/CE e, bem assim, das Directivas 2003/30/CE e 2009/28/CE de promoção do uso de biocombustíveis.

UU) Como (bem) esclarece a Professora Inês Quadros no seu parecer sobre esta matéria – vide parecer junto aos autos pela Recorrente em 03 de Maio de 2018 – “o art.° 11° do decreto-lei 117/2010, quando interpretado no sentido de exigir, aos operadores que colocam no mercado português combustível que adquiriram no mercado de um outro Estado-membro onde ele já se encontrava em livre prática, a comprovação do caráter sustentável do biocombustível que só poderia ser obtida por meio de contacto direto com o produtor, sem levar em conta a conformidade do produto com a legislação do Estado-Membro no qual ele foi introduzido em livre prática, viola o princípio da livre circulação de mercadorias previsto no art.° 340 TFUE, concretizado a respeito dos combustíveis no art.° 5° da diretiva 98/70/CE, de 13 de outubro, e inscrito como finalidade dos artigos 17° a 19° da “diretiva combustível” que aquele mesmo artigo 11° pretende transpor para a ordem jurídica portuguesa.” (Realçado nosso).

VV) Mais ainda, entendeu o Tribunal não existir qualquer violação do artigo 11.º e 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro, uma vez que não está em causa o cumprimento da obrigação de incorporação de combustível mas sim a realização de prova da mesma – a qual de acordo com esse Tribunal não foi realizada pela aqui Recorrente, o que não é verdade.

WW) De facto e ao contrário do entendido por esse Tribunal, a Recorrente juntou aquando a apresentação da sua PI, guias de carga da [SCom02...], onde é expressamente indicada a existência de incorporação de biocombustível – e centenas de outras guias de carga, na posse da Recorrente e relativamente ao mesmo período, indicam a existência dessa incorporação.

XX) Ora, os documentos mencionados e apresentados à aqui Recorrida e ao Tribunal, bem como as guias de carga da [SCom02...] contrariam cabalmente o entendimento preconizado por esse último.

YY) Deste modo, entende a Recorrente que dúvidas não podem existir de que resulta desmentida plenamente a fundamentação do acto administrativo em crise e, consequentemente, da sentença em escrutínio.

ZZ) Por conseguinte, existe uma errada aplicação do artigo 24º do Decreto-lei n.º 117/2010, relativamente ao incumprimento das metas de incorporação previstas no artigo 11º, n.º 1 e 3 do Decreto-lei.

AAA) Pelo que padece a sentença recorrida de uma errada interpretação dos factos e do direito, devendo ser substituída por uma que tenha em conta os verdadeiros factos apresentados e uma correcta interpretação da lei.

BBB) Também no âmbito da referida sentença entendeu o Tribunal a quo não existir a violação do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010 e do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 147/2088, de 29 de Julho, por não ser requisito de aplicação do artigo 24.º a prova de culpa.

CCC) Ora, conforme foi já sobejamente referido em sede de PI, o acto administrativo em crise determinou a Recorrente ao pagamento de compensações, nos termos do artigo 24º do Decreto-lei n.º 117/2010, consequência do alegado incumprimento do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 11º, do diploma.

DDD) Na fundamentação do acto administrativo nada mais é alegado ou comprovado, quanto à aplicação das compensações em causa.

EEE) Por conseguinte, entende a Recorrente que o acto administrativo é ilegal, padecendo de um vício de violação de lei, por manifesta falta de fundamentação da verificação dos pressupostos de aplicação das compensações, previstas no artigo 24º do Decreto-lei n.º 117/2010.

FFF) Pois senão, veja-se:

GGG) Para determinar quais os pressupostos de aplicação das compensações em causa, é essencial determinar a sua natureza jurídica.

HHH) Neste desiderato, e como já referido na matéria de facto, o Decreto-lei n.º 117/2010, transpôs parcialmente para a ordem jurídica portuguesa, o normativo previsto em directivas comunitárias relativas à protecção ambiental, maxime a Directiva 2009/28/CE, de 23 de Abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis e a Directiva 2009/30/CE, de 23 de Abril de 2009, referente às especificações da gasolina e gasóleo rodoviário, que veio fixar metas de incorporação de biocombustível para consumo final no sector dos transportes.

III) É neste normativo jurídico-ambiental que as disposições do Decreto-lei n.º 117/2010, e mormente a que concerne à aplicação de compensações pelo incumprimento das metas de incorporação de biocombustível, devem ser entendidas.

JJJ) Por conseguinte, as compensações aplicadas reconduzem-se ao que a doutrina classifica como “o instituto da compensação ecológica, através do qual se colmata uma lesão provocada no meio ambiente criando um benefício que neutralize a perda Cfr. Carla Amado Gomes, Compensação ecológica, serviços ambientais e protecção da biodiversidade, ICJP, 2014, p. 35..

KKK) Salvo melhor opinião, parece ser inequívoco que à Recorrente foi aplicada uma compensação ecológica/ambiental ex post, porquanto a sua aplicação é feita depois de um alegado dano efectivo se ter verificado.

LLL) Ora, é a doutrina unânime e pacífica ao considerar, quanto à natureza jurídica das compensações ambientais, que estas são “uma modalidade de reparação do dano contemplada no instituto da responsabilidade civil Cfr. Carla Amado Gomes, ob.cit., p. 36. Igualmente, neste sentido, numerosa doutrina, vide “Actas do Colóquio: A responsabilidade civil por dano ambiental”, Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, disponível em www.icjp.pt, e os autores intervenientes. .

MMM) Derivando da responsabilidade civil assacada a operadores em determinados sectores.

NNN) A dogmática e o normativo jurídico-ambiental, aliás, não desconhecem este princípio da responsabilidade, estando expressamente previsto no artigo 3º, alínea f), da Lei n.º 19/2014, de 14 de Abril, diploma onde estão consagradas as bases de política ambiental.

OOO) Este entendimento sai ainda reforçado recorrendo a uma interpretação sistemática do Decreto-lei n.º 117/2010, pois na epígrafe do Capítulo V expressamente o Legislador se refere por um lado à aplicação de compensações e, por outro, à aplicação de contra-ordenações, o que não pode deixar de levar à conclusão que se pretendeu estabelecer aos operadores, normas de responsabilidade civil, e de responsabilidade contra-ordenacional, pelos danos ambientais causados.

PPP) Conclui neste sentido a Recorrente, e em plena concordância com a doutrina invocada, que as compensações que lhe foram aplicadas pela Recorrida constituem uma forma de efectivar a sua responsabilidade civil, pelos danos ambientais alegadamente causados.

QQQ) E mais conclui que é no instituto da responsabilidade civil ambiental que devem ser encontrados os pressupostos de aplicação das compensações em causa.

RRR) Ora, o nosso legislador, através do Decreto-lei nº 147/2008, de 29 de Julho, criou o Regime Jurídico da Responsabilidade por Danos Ambientais (doravante RJRDA).

SSS) Neste diploma, além do princípio da responsabilidade ambiental, deu-se relevo ao princípio do poluidor-pagador Princípio que decorre da Directiva n.º 2004/35/CE, transposta para a ordem jurídica interna pelo RJRDA., e previram-se dois regimes de responsabilidade por danos ambientais: no Capítulo II a “Responsabilidade civil”; e no Capítulo III, a denominado “Responsabilidade administrativa pela prevenção e reparação de danos ambientais”.

TTT) Ambos os regimes consagram tipos de responsabilidade civil ambiental, “por um lado, um regime de responsabilidade civil subjectiva e objectiva nos termos do qual os operadores-poluidores ficam obrigados a indemnizar os indivíduos lesados pelos danos sofridos por via de um componente ambiental. Por outro fixa-se um regime de responsabilidade administrativa destinado a reparar os danos causados ao ambiente perante toda a colectividade (…)” Cfr. Preâmbulo do Decreto-lei n.º 147/2008, de 29 de Julho, grifado nosso..

UUU) Da leitura do preâmbulo do diploma, agora transcrito, “num caso, está em causa a indemnização de lesões sofridas por determinados indivíduos em concreto e, noutro caso, está em causa a reparação de danos provocados ao meio-ambiente, que apenas reflexamente ou de forma difusa acabam por afectar a colectividade como um todo Cfr. Tiago Antunes, Da natureza jurídica da responsabilidade ambiental, Actas do Colóquio: A responsabilidade civil por dano ambiental”, Instituto de Ciências Jurídico-Políticas, p. 126..

VVV) A compensação ambiental, prevista no artigo 24º do Decreto-Lei n.º 117/2010, reconduz-se inequivocamente à responsabilidade consagrada no Capítulo III do RJRDA, pois visa a indemnização da colectividade como um todo.

WWW) Por conseguinte, é neste tipo de responsabilidade que devem ser assacados os pressupostos da sua aplicação, na situação sub iudice.

XXX) Analisando este regime, o legislador consagrou duas modalidades para efectivar esta responsabilidade, dita administrativa: uma objectiva e prevista no artigo 12º; e outra subjectiva, prevista no artigo 13º.

YYY) Nos mesmos cânones da responsabilidade civilista, o eixo diferenciador subjaz-se ao requisito de culpa.

ZZZ) A responsabilidade objectiva não o exige, enquanto a subjectiva, para que seja estabelecida, depende da verificação e comprovação da conduta dolosa ou negligente dos operadores, quanto ao dano ambiental verificado - n.º 1 do artigo 13º do RJRDA.

AAAA) Salvo melhor opinião, esta interpretação não oferece divergências hermenêuticas, sendo a lei clara, como é quando expressamente estatui que estão sujeitas a responsabilidade objectiva as actividades incluídas na lista do anexo III ao RJRDA, consideradas pelo legislador como sendo manifestamente perigosas, e por isso sujeitas a esse ónus.

BBBB) O que determina, em consequência e necessariamente, que não se encontra sujeita ao regime da responsabilidade objectiva, prevista no artigo 12º do RJRDA, mas subsidiariamente ao regime da responsabilidade civil subjectiva, prevista no artigo 13º.

CCCC) Sendo uma modalidade de responsabilidade subjectiva, a sua aplicação depende do requisito de culpa da Recorrente no alegado incumprimento das metas de incorporação de biocombustível, exigindo-se a prova de que esta actuou com dolo ou negligência – o que não aconteceu.

DDDD) É assim forçoso concluir que o acto administrativo em crise, que determinou a responsabilidade da Recorrente no incumprimento e danos ambientais alegadamente verificados, e o pagamento das respectivas compensações, não fundamenta os pressupostos de que depende a aplicação das compensações, previstas no artigo 24º do Decreto-lei n.º 117/2010, maxime o requisito de culpa da Recorrente.

EEEE) O que em consequência determina que viole o disposto no artigo 24º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 117/2010, bem como o previsto no artigo 13º, n.º 1 do RJRDA., padecendo de um vício de violação de lei,

FFFF) Que também por este motivo deve determinar a sua anulabilidade nos termos do nº 1, do artigo 163º do CPA e, em consequência, da sentença aqui em escrutínio.

GGGG) Por último e não menos relevante, entende o Tribunal que não existe no caso em apreço uma violação do princípio da boa-fé.

HHHH) Uma vez mais, não pode a Recorrente concordar com esse entendimento.

IIII) O princípio da boa-fé é um dos princípios fundamentais que norteia a actividade administrativa, estando previsto no n.º 2, do artigo 266.º, da CRP, e concretizado no artigo 10º, do CPA.

JJJJ) A Recorrida sabe – ou, pelo menos, devia saber – que a Recorrente não comercializa combustível fóssil sem incorporação de biocombustível.
KKKK) A Recorrida, enquanto entidade reguladora, tem assim por determinação da lei, a função de zelar pelo bom funcionamento do mercado de transacção de TdB, apoiando os operadores a cumprirem as suas obrigações em matéria de biocombustíveis. Ora,

LLLL) Quando a Recorrente foi confrontada com a necessidade da aquisição de TdB, relativamente à introdução de combustível rodoviário, com diligência e boa-fé recorreu precisamente ao mercado nacional de transacção de TdB, regulado pela Recorrida.

MMMM) E fê-lo no convencimento da existência de um mercado regulado cujo único propósito passaria por propiciar as condições para o cumprimento das metas de incorporação de biocombustível.

NNNN) Porém, constatou após tentativas reiteradas que não era possível adquirir TdB no mercado nacional, sem que isso colocasse em causa de forma séria a sua própria viabilidade económica.

OOOO) Não permite o mercado nacional de TdB, ao diversos operadores, nomeadamente os de menor dimensão, suprir as suas necessidades de TdB, em condições de igualdade com os grandes operadores.

PPPP) Igualmente não permite que os valores praticados para a aquisição dos TdB se encontrem empolados e sujeitos a movimentos especulativos.

QQQQ) Todas estas situações entende a Recorrente, são potenciadas pelas próprias regras do leilão de TdB, sendo as propostas apresentadas em carta fechada o que o transforma este leilão mais numa espécie de “jogo de fortuna e azar”, onde ganha quem tem mais capacidade para arriscar, e, não, numa via de os operadores poderem de forma razoável, cumprir as suas obrigações ambientais.

RRRR) Bem longe, portanto, de um mercado de transacção de TdB, cujo objectivo seja o de propiciar aos diversos operadores, e diversos na sua capacidade económica, em condições de igualdade, o cumprimento das metas de incorporação de biocombustível.

SSSS) Perante este estado de coisas, a entidade reguladora do mercado, e Recorrida nos presentes autos, reitera-se, não se pode eximir das suas responsabilidades como fez com os seus deveres de regulação.

TTTT) É dever da Recorrida criar as condições para que em condições de igualdade, todos os operadores possam suprir as suas necessidades de TdB.

UUUU) Assim resulta expressamente não apenas do seu estatuto, como do regulamento para a transacção de títulos de biocombustível.

VVVV) A Recorrida omite manifestamente os seus deveres de regulação do mercado de transacção de TdB, não permitindo que os operadores, nomeadamente os de menor dimensão como a Recorrente, tenham a possibilidade de adquirir os TdB exigidos em condições de igualdade e a preços que se reportem justos e dentro da lógica que preside ao mercado nacional de TdB.

WWWW) Regras nacionais e comunitárias que, naturalmente, os operadores devem cumprir.

XXXX) Ora, o incumprimento destes deveres por parte da Recorrida tem necessárias consequências jurídicas no exercício do poder-dever de aplicação de compensações, previsto no artigo 24º do decreto-lei n.º 117/2010.

YYYY) Ganham precisamente aqui relevo as exigências decorrentes do princípio da boa-fé, previsto no artigo 266º da CRP e concretizado no artigo 10º do CPA.

ZZZZ) O dever de boa-fé é estatuído de uma forma objectiva, ou seja, enquanto conjunto de regras, ditames ou limites impostos do exterior à Administração e aos administrados, no âmbito da relação administrativa.

AAAAA) A boa-fé prevista de forma objectiva ínsita na figura do “abuso de direito” que, no regime jurídico português, se assume como o “exercício inadmissível de posições jurídicas”.

BBBBB) Ou seja, como aplicável aos problemas “para os quais a boa fé promova uma solução justa, em detrimento do que resultaria do Direito estrito;” Cfr. Ambas as citações, Menezes Cordeiro, Teoria Geral do Direito Civil, 1º volume, 1986, p. 359..

CCCCC) É hoje pacífico o entendimento que também no direito administrativo, e naturalmente no procedimento administrativo, se verifica a existência da figura do abuso de direito, como resulta da douta doutrina do STA:

DDDDD) “Na verdade, e de acordo com o disposto no artº 334.º do Código Civil, só é “ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. Cfr. Acórdão do STA de 19 de Maio de 2005, processo n.º 0209/05, mas igualmente o Acórdão do STA, de 9 de Junho de 2016, processo n.º 029842..

EEEEE) O que significa que a figura do abuso do direito constitui, como a jurisprudência e a doutrina vêm assinalando, uma válvula de segurança destinada a ultrapassar situações de chocante e reprovável injustiça decorrentes do exercício de um direito conferido por lei, as quais, a não serem removidas da ordem jurídica, iriam ferir o sentimento de justiça prevalente na comunidade social (Manuel Andrade, Teoria Geral das Obrigações, 1958, 63 e seguintes; Almeida Costa, Direitos das Obrigações, 5 edição, 60 e seguintes; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, 4 edição, notas ao artigo 334.º).

FFFFF) Ou seja, a figura do abuso de direito destina-se a impedir que uma pessoa, no exercício de um poder formal que lhe foi atribuído por lei, possa - em contradição com os fins (económicos ou sociais) ou com o condicionalismo ético-jurídico (boa fé e bons costumes) a que esse poder se encontra adstrito - alcançar benefícios para cuja obtenção o mesmo não foi, manifestamente, concebido de sorte a que o sentimento de justiça dominante saia gravemente ferido.

GGGGG) Ora, uma das modalidades que a jurisprudência e a doutrina assacam ao instituto do abuso de direito é a modalidade tu quoque,

HHHHH) Onde um comportamento é considerado abusivo, porque “o exercente pratica um facto ilícito ou indevido e depois alega-o contra outrem Cfr. Menezes Cordeiro, Teoria Geral do Direito Civil, 1º volume, 1986, p. 360..

IIIII) Ou seja, “trata-se de um caso de violação do dever de honeste agere que é eticamente inaceitável para o Direito (turpitudo sua non allegare) (…)” Cfr. Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil, 5ª edição. p. 275..

JJJJJ) In casu, como a Recorrente entende ter ficado demonstrado, a Recorrida não cumpriu os seus deveres de descoberta da verdade material dos factos, como era seu dever,

KKKKK) E, em segundo lugar, os seus deveres de regulação do mercado de TdB, sendo responsável por este mercado não cumprir o seu propósito de proporcionar aos operadores, em condições de igualdade, a possibilidade de cumprir as exigências em matéria de incorporação de biocombustível, através da detenção de TdB

LLLLL) Daqui decorre então e necessariamente que não pode posteriormente aos incumpridos deveres, a Recorrida exercer o seu poder-dever de aplicação das compensações, previstas no artigo 24º do Decreto-Lei n.º 117/2010.

MMMMM) Considerando, por conseguinte a Recorrente, que a situação em apreço constitui uma clara violação do princípio da boa-fé, não podendo entender como o Tribunal a quo não a reconhece.

NNNNN) Por tudo o exposto, dúvidas não podem restar de que, não poderá a sentença recorrida manter-se no nosso ordenamento jurídico, devendo ser substituída por outra que faça uma correcta aplicação do Direito, maxime uma correcta interpretação da legislação aplicável.


V – Pedido:

Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas doutamente suprirão:

a) Deve ser julgado procedente, por provado, o presente recurso e, em consequência, deve ser anulada a sentença recorrida e ordenada a remessa dos autos ao Tribunal a quo para produção adicional de prova, nos termos e com os fundamentos alegados;

Assim se não considerando, o que por cautela se admite,

b) Deve ser o presente recurso julgado procedente, por provado, ordenando-se, em consequência, a anulação da sentença recorrida, por estarem verificados os fundamentos da sua anulação e, bem assim, do acto de aplicação de compensação;

Tudo com as necessárias consequências legais.
[…].”

**

A entidade Recorrida apresentou Contra Alegações, no âmbito das quais elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:

“[…]
1.ª – O Tribunal a quo proferiu despacho a dispensar a realização da audiência de julgamento, o qual consta de fls. 422 do SITAF. A Recorrente não só não exerceu o contraditório como não recorreu do referido despacho. Das decisões de rejeição de meios de prova cabe recurso de apelação autónoma, nos termos do artigo 644.º, n.º 2, alínea d) do CPC, aplicável ex vi do artigo 142.º, n.º 5 do CPTA. Pelo que, não tendo a Recorrente recorrido da decisão no prazo de que dispunha, formou-se caso julgado formal, sendo a decisão de dispensa da audição de testemunhas irreversível.
2.ª – As metas de incorporação de biocombustível dizem respeito à introdução de combustível no consumo. Pelo que as metas de incorporação aplicáveis no país de origem do combustível não afetam, em momento algum, o produto importado e a possibilidade da importação. Mais ainda, as metas de incorporação impõem-se em relação a um trimestre completo e, por conseguinte, não afetam diretamente o produto propriamente dito.
3.ª – Os documentos juntos aos autos pela Recorrente não demonstram a incorporação de biocombustível porque não se confundem com certificados de sustentabilidade. A relevância das guias de carga é circunscrita ao contexto do contrato de transporte. Mas acima de tudo, sendo o pagamento das compensações devido pela não apresentação de TdB e sendo as metas de incorporação incidentes sobre um trimestre completo e não sobre cada lote, a discussão relativa à eventual efetiva mistura de biocombustível neste lote específico é absolutamente irrelevante à decisão da causa.
4.ª – O Tribunal a quo entendeu que o artigo 11.º do DL n.º 117/2010, de 25 de outubro não configura uma regra técnica, em qualquer uma das suas subcategorias e que, por conseguinte, não existia qualquer dever de comunicação prévia do projeto de lei à Comissão Europeia. Pelo que, o facto de essa comunicação ter ou não ocorrido não configura um facto relevante à discussão da causa.
5.ª – Os Tribunais estão obrigados, nos termos do dever de gestão processual, a adotar apenas as diligências necessárias ao apuramento da verdade material e a cingir a apreciação de facto ao que se afigura relevante à decisão da causa, indeferindo e afastando tudo o que seja impertinente e dilatório. Pelo que, a decisão de facto impugnada afigura-se absolutamente correta e desmerecedora de qualquer crítica.
6.ª – As metas de incorporação de biocombustível não configuram regras técnicas, em qualquer das suas subcategorias, uma vez que não introduzem especificidades ou características que limitem a comercialização do produto e porque não alteram o seu ciclo de vida. Sendo que, mais uma vez, as metas de incorporação poderão ser cumpridas mediante a mistura de biocombustível em apenas alguns dos lotes de combustível vendidos ou sem que haja qualquer mistura, vendendo-se biocombustível em estado puro numa percentagem que dê cumprimento à referida obrigação. Deste modo, o dever previsto no direito comunitário de proceder à comunicação prévia do projeto de lei à CE não era aplicável no caso. Pelo que, não se verifica qualquer erro de julgamento da parte do Tribunal a quo.
7.ª – Em todo o caso, tendo as metas de incorporação sido fixadas no âmbito da transposição de uma Diretiva, i.e., de um ato comunitário vinculativo, o dever de comunicação prévia sempre seria afastado, ainda que estivéssemos perante uma regra técnica, em razão do disposto no artigo 10.º da Diretiva 98/34/CE.
8.ª – O Tribunal a quo identificou corretamente o argumento utilizado pela Recorrente, segundo o qual a sujeição às metas de incorporação portuguesas representava uma dupla oneração, atenta a suposta necessidade de conformar o produto às metas de incorporação do Estado de origem, que colocaria em causa a liberdade de circulação de bens e mercadorias, na medida em que tornava a importação inexequível. Todavia, o Tribunal a quo esclareceu que as metas de incorporação dizem respeito ao consumo nacional e, por conseguinte, as metas de incorporação do Estado de origem não são aplicáveis ao caso, não existindo qualquer necessidade de conformidade do produto com essas mesmas, não se verificando assim qualquer restrição à liberdade de circulação de bens e mercadorias. Pelo que, não se verifica qualquer erro de julgamento na sentença recorrida quanto a este ponto.
9.ª – Não se verifica qualquer erro de julgamento quanto ao cumprimento das metas de incorporação de biocombustível, porquanto, desde logo, e como o Tribunal a quo decidiu, e bem, o ato impugnado diz respeito a uma ordem de pagamento de compensações devidas pela não apresentação de TdB e, por conseguinte, a efetiva mistura de biocombustível é absolutamente irrelevante neste momento, uma vez que essa era uma obrigação de demonstração que se impunha ao operador no momento da obtenção de TdB e para esse específico efeito e porque, em todo o caso, um único lote de biocombustível nunca seria suscetível de demonstrar a venda de biocombustível necessária por reporte a todo o trimestre.
10.ª – A Recorrente nunca pôs em causa o facto de não ter obtido os TdB a que estava obrigada, não sendo esse um facto controvertido – até porque a Recorrente intentou a presente ação administrativa pelo facto de entender não estar adstrita à respetiva obtenção e apresentação.
11.ª – Em todo o caso, as guias de carga não demonstram a mistura de biocombustível porque não se confundem com certificados de sustentabilidade, tendo meramente relevância no contexto do contrato de transporte, na medida em que fazem prova de que a mercadoria entregue ao transportador corresponde àquela que este fez chegar ao destinatário, isentando-o de responsabilidades associadas à desconformidade no produto transportado.
12.ª – O regime das compensações é um regime especial, com regras próprias – inexistindo qualquer fundamento jurídico que justifique a recondução ao regime da responsabilidade por danos ambientais, quando o legislador deixou claro quais as regras concretas do regime das compensações, não se apresentando qualquer necessidade de o compatibilizar ou de o preencher com recurso às regras da responsabilidade por danos ambientais. Atento o referido, a culpa não configura um pressuposto da aplicação do regime das compensações. Pelo que, não se verifica qualquer erro de julgamento quanto a este ponto.
13.ª – O regime das compensações não tem como pressuposto a verificação de um dano ambiental específico, configurando a agressão ambiental, no limite, o motivo pelo qual foi criado o regime da sustentabilidade, exigindo-se a apresentação de TdB como forma de controlar o respeito pela adoção das medidas que mitigam a referida agressão. A compensação configura uma alternativa que visa repor o equilíbrio perdido com o incumprimento das regras de apresentação de TdB, em virtude do cenário de criação de risco que daí resulta.
14.ª – A ENSE não violou o princípio da boa-fé, porquanto, em virtude de tudo o anteriormente referido, estavam reunidos os pressupostos que, não só permitiam, como exigiam a ordem de pagamento de compensações. Sendo que, como o Tribunal a quo referiu, e bem, a conduta da ENSE era até vinculada, uma vez que não dispunha de qualquer margem de decisão que lhe permitisse isentar do pagamento das compensações um operador que não tivesse cumprido o regime da obtenção e apresentação de TdB. Pelo que, andou bem o Tribunal a quo quanto à apreciação feita também quanto a esta última questão.
NESTES TERMOS,
E nos mais de Direito que os Venerandos Juízes Desembargadores, doutamente, suprirão, deverá ser negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente, e, em consequência, manter-se a sentença recorrida.
[…].”


*

O Tribunal a quo proferiu despacho visando a admissão do recurso interposto, com a fixação dos seus efeitos.
**

O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.
*

A Recorrente e a Recorrida vieram apresentar os requerimentos constantes a fls. 621 [635], 655, 666 e 681 dos autos [SITAF].

***

II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que venha a declarar a sua nulidade, sempre tem de decidir [Cfr. artigo 149.º, n.º 1 do CPTA] “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.”, reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.


**

III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

Face ao que é a essência da Sentença recorrida, e a base na qual assentará a prolação da presente decisão, julgamos ser suficiente a remessa para o probatório constante da Sentença proferida, o que assim decidimos.

**


IIIii - DE DIREITO
IIIiia – Sobre a junção de documento após as Alegações de recurso.

Depois de apresentadas as Alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, assim como as Contra alegações de recurso pela Recorrida, e na pendência dos autos já neste TCA Norte, a Recorrente veio apresentar requerimento [Cfr. fls. 621 dos autos – SITAF, ao que sucederam pronúncias, no pressuposto de que era devido o direito ao contraditório], pelo qual, entre o mais, referiu juntar aos autos um documento [Cfr. fls. 635 dos autos-SITAF], que é atinente ao Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, proferido no Processo n.° C-604/2116, no dia 09 de março de 2023, invocando tratar-se de decisão prolatada no âmbito de pedido de reenvio prejudicial formulado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, cujo pedido e causa de pedir são em tudo semelhante ao que se discute nestes autos, pelo que se impõe para já apreciar e decidir sobre se tal se mostra processualmente admissível.

Dispõe o artigo 627.º, n.º 1 do CPC que “As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos”, ou seja, que o recurso é o meio processual por via do qual são impugnadas as decisões judiciais, e nessa medida, o tribunal superior é chamado a reexaminar a decisão proferida e os seus fundamentos.

Deste modo, e quanto à junção de documentos em sede de recurso jurisdicional, dispõe o artigo 425.º do CPC, que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.”, sendo que, por sua vez, o artigo 651.º, n.º 1 do mesmo diploma, determina que “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o artigo 425.º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância.”

Assim, em sede de recurso, e de acordo com os normativos acima citados, a junção de documentos assume carácter excepcional, só sendo consentida nos casos especiais previstos na lei, mormente, quando a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento, e neste conspecto, em virtude de ter ocorrido superveniência objectiva [quando se trate de documento formado depois de ter sido proferida a decisão[ ou subjectiva [quando se trate de documento cujo conhecimento ou apresentação apenas se tornou possível depois da decisão e ou se tenha revelado necessária em virtude do julgamento proferido] – Cfr. neste sentido, Abrantes Geraldes, in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2014, página 191.

Como resulta dos autos, e assim já referimos supra, a Recorrente juntou um documento aos autos, embora já depois de apresentadas as respectivas Alegações de recurso, tratando-se de um documento que foi produzido em data posterior à Sentença recorrida, quer muito logicamente, em data anterior à apresentação em juízo da Petição inicial, pelo que, pelo mero confronto destas datas se verifica por isso a razão para a superveniência objectiva do mesmo, e para a sua admissão nos autos.

De resto, trata-se de um Acórdão proferido pelo TJUE, que está já no conhecimento do domínio público generalizado, e acessível no link:
https://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?text=&docid=271072&pageIndex=0&doclang=PT&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=2407524, que aqui deixamos enunciado.

De maneira que se admite a junção do identificado documento.

IIIiib – Sobre o mérito do recurso jurisdicional.

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 02 de junho de 2022, que tendo apreciado a pretensão deduzida pela Autora contra a Ré Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis, EPE, no sentido de ser anulada a decisão proferida pelo Presidente do Conselho de Administração da ENMC, que no âmbito do processo UB/07/2017 e nos termos do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro, determinou que a Autora ora Recorrente pagasse a quantia de € 4.022.000,00, a título de compensações do 2.º trimestre de 2017, veio a julgar pela sua improcedência e a absolver a Ré dos pedidos contra si formulados.

Constituindo os recursos jurisdicionais os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Cotejadas as Alegações de recurso apresentadas pela Recorrente, delas se extrai que vem por si sustentada a ocorrência de erro em matéria de facto assim como em matéria de direito.

Em sede da identificação das questões que lhe cumpria apreciar e decidir, identificou o Tribunal a quo que lhe cumpria:

i) Saber se ocorre litispendência;
ii) Saber se a decisão do presidente do Conselho de Administração da ENMC, proferida no processo n.º 07/UB/2017 e que determina a aplicação à Autora do pagamento de compensações no valor de € 4.022.000,00, relativas ao segundo trimestre de 2017, pelo incumprimento de incorporações de biocombustíveis – padece dos seguintes vícios:
a) Violação dos artigos 8.º e 9.º da Diretiva 98/34/CE, de 22 de Junho de 1998;
b) Violação do artigo 5.º da Diretiva 98/70/CE, de 13 de Outubro de 1998;
c) Violação dos artigos 11.º e 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro;
d) Violação do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro e do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 147/2008, de 29 de Julho;
e) Violação do princípio da boa-fé, previsto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP, e no artigo 10.º do CPA.

Aqui chegados.

Conforme assim foi apreciado e decidido pelo Tribunal a quo [no que é atinente às questões a decidir por si identificadas], o pedido a que se reporta os autos foi julgado totalmente improcedente, e para alcance desse desiderato, foram por si julgadas inverificadas todas as invalidades/ilegalidades apontadas pela Autora ao acto impugnado, tendo o Tribunal recorrido vindo a referir a final, que “… com a emissão dos actos impugnados, limitou-se [a entidade demandada] a aplicar estritamente as referidas normas legais […].”

Ora, na base da pretensão recursiva da Recorrente está a consideração de que o Tribunal a quo:

(i) errou na apreciação das provas e errou na fixação de factos materiais da causa e sua interpretação;
(ii) errou na interpretação e aplicação do n.º 1 do artigo 11.º e do n.º 1 do artigo 24.º, ambos do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro;
(iii) errou em torno da aplicação do princípio de boa-fé no instituto do abuso de direito;
(iv) errou em torno da interpretação e aplicação do artigo 5.º da Diretiva 98/70/CE;
(v) errou em torno da interpretação e aplicação dos artigos 8.º e 9.º da Diretiva 98/34/CE.

Em torno do invocado erro na interpretação e aplicação dos artigos 8.º e 9.º da Diretiva 98/34/CE, a que se reporta a nossa alínea v) supra, decidiu o Tribunal a quo, conforme por facilidade para aqui se extrai, como segue:

Início da transcrição
“[…]
A. Da violação dos artigos 8.º e 9.º da Directiva 98/34/CE, de 22 de Junho de 1998
Alega a autora que a norma do n.º 1 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro, ao estabelecer as metas de incorporação obrigatória de biocombustível, consubstancia norma técnica, pelo que se impunha a comunicação prévia pelo Estado português à Comissão e aos restantes Estados-membros, tal não tendo acontecido, em desrespeito dos artigos 8.º e 9.º da Directiva 98/34/CE, de 22 de Junho de 1998.
Vejamos.
A Directiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 22 de Junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas, vigorou até 06.10.2015, tendo sido revogada e substituída pela Diretiva (UE) 2015/1535 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de setembro de 2015, relativa a um procedimento de informação no domínio das regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação.
[…]
Tendo como referência as directrizes constantes das definições de regras técnicas acima referidas, constatamos facilmente que o teor da citada norma legal não contém qualquer especificação técnica ou exigência para utilização ou comercialização nem proíbe o fabrico, a importação, a comercialização ou a utilização de um produto; não remete para qualquer especificação técnica ou exigência, não definindo quaisquer características de um produto nem se reportando a métodos e processos de produção nem estabelece quaisquer condições de utilização, de reciclagem, de reutilização ou de eliminação de produtos. Efectivamente, o que a norma estabelece é a obrigatoriedade de contribuição para o cumprimento das metas de incorporação por parte das entidades que introduzam combustíveis rodoviários no consumo bem como a medida de tal contribuição, pelo que, manifestamente, não estamos perante qualquer regra técnica e, por conseguinte, não há que convocar o disposto no citado artigo 8.º da Directiva 98/34/CE, de 22 de Junho de 1998, que, assim, não se mostra violado pela norma em análise e cuja aplicação esteve na origem dos actos impugnados.
Ante o exposto, improcede este fundamento invocado.
[...]”
Fim da transcrição

Ora, em torno desta concreta questão, e que reputamos ser nuclear para efeitos do que a final era a pretensão anulatória da Autora, e em que também vem a radicar a sua pretensão recursiva, este TCA Norte veio já a prolatar, de forma unânime e reiterada, jurisprudência com que a Sentença recorrida não tem o devido alinhamento, de que destacamos o Acórdão proferido no Processo n.º 856/21.3BEBRG, datado de 04 de outubro de 2023, o Acórdão proferido no Processo n.º 2639/17.6BEBRG, e o Acórdão proferido no Processo n.º 1584/21.5BEPRT, ambos datados de 30 de novembro de 2023, decisões judiciais essas em que interviemos na qualidade de Adjunto.

Esses Acórdãos deste TCA Norte foram proferidos com amparo quer em jurisprudência do STA, quer do TJUE.

Efectivamente, pelo seu Acórdão datado de 09 de março de 2023 [“Vapo Atlantic” (C-604/21, EU:C:2023:175)], o TJUE [Terceira Secção] apreciou e decidiu em sede de reenvio prejudicial, conforme por facilidade para aqui extraímos com interesse para a decisão a proferir, o que segue:

Início da transcrição
“[…]
1) O artigo 1.°, ponto 4, da Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de junho de 1998, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas e das regras relativas aos serviços da sociedade da informação, conforme alterada pela Diretiva 2006/96/CE do Conselho, de 20 de novembro de 2006, deve ser interpretado no sentido de que: uma legislação nacional que fixa um objetivo relativo à incorporação de 10 % de biocombustíveis nos combustíveis rodoviários introduzidos no consumo por um operador económico relativamente a um determinado ano é abrangida pelo conceito de «outra exigência» na aceção do artigo 1.°, ponto 4, da Diretiva 98/34, conforme alterada, e constitui assim uma «regra técnica» na aceção do artigo 1.°, ponto 11, da Diretiva 98/34, conforme alterada, a qual apenas é oponível aos particulares se o seu projeto tiver sido comunicado em conformidade com o artigo 8.°, n.° 1, da Diretiva 98/34, conforme alterada.
2) O artigo 8.°, n.° 1, da Diretiva 98/34, conforme alterada pela Diretiva 2006/96, deve ser interpretado no sentido de que: uma legislação nacional que visa transpor o artigo 7.°-A, n.° 2, da Diretiva 98/70/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 1998, relativa à qualidade da gasolina e do combustível para motores diesel e que altera a Diretiva 93/12/CEE do Conselho, conforme alterada pela Diretiva 2009/30/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, em consonância com o objetivo que figura no artigo 3.°, n.° 4, da Diretiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis que altera e subsequentemente revoga as Diretivas 2001/77/CE e 2003/30/CE, não é suscetível de constituir uma mera transposição integral de uma norma europeia na aceção do artigo 8.°, n.° 1, da Diretiva 98/34, conforme alterada, e, por conseguinte, de se eximir à obrigação de comunicação prevista nesta disposição.
3) O artigo 4.°, n.° 1, segundo parágrafo, da Diretiva 2009/30, deve ser interpretado no sentido de que: esta disposição não constitui uma cláusula de salvaguarda prevista num ato vinculativo da União, na aceção do artigo 10.°, n.° 1, terceiro travessão, da Diretiva 98/34, conforme alterada pela Diretiva 2006/96.
[…]”
Fim da transcrição

Atento o teor deste Acórdão do TJUE, e com base no que aí foi apreciado e decidido, o STA veio a proferir Acórdão no Processo 02739/17.2BEBRG-A, datado de 06 de julho de 2023, em que a relação jurídica controvertida de base era similar à que ora está em apreço nestes autos, de onde para aqui extraímos, por facilidade e dado o seu interesse para a decisão a proferir, o seu sumário, como segue:

Início da transcrição
“[…]
I - Do Acórdão do TJUE de 9/3/2023, “Vapo Atlantic” (C-604/21), proferido em reenvio prejudicial operado pelo TAF/Braga no processo 860/21.1BEBRG, resulta que o disposto no nº 1 do art. 11º do DL nº 117/2010, de 25/10, nas suas sucessivas versões até à sua revogação pelo DL nº 84/2022, de 9/12, ao determinar as percentagens de incorporação de biocombustíveis a observar pelas “entidades incorporadoras”, constituía uma “regra técnica” (na aceção do art. 1º, ponto 11, da Diretiva 98/34) a qual só seria oponível aos destinatários particulares se o respetivo projeto tivesse sido comunicado à Comissão Europeia, nos termos previstos no art. 8º nº 1 daquela Diretiva (o que não sucedeu). Mais resulta do Acórdão do TJUE que aquela norma nacional não é suscetível de constituir uma mera transposição integral de uma “norma europeia”, não se subsumindo, pois, à exceção prevista naquele art. 8º nº 1 da citada Diretiva, nem é suscetível de integrar uma “cláusula de salvaguarda”.
II - Esta jurisprudência interpretativa do TJUE impõe-se também no âmbito do presente processo, onde se discute questão idêntica, tornando inútil a manutenção do reenvio prejudicial aqui também operado (“Vapo Atlantic II”, C-413/22), em que foram colocadas ao TJUE questões suplementares, pois que, em face daquele seu Acórdão de 9/3/2023, resulta, por si, incontornável a procedência da impugnação contenciosa, aqui em apreciação, da ordem de pagamento fundamentada naquela legislação nacional tida como inoponível aos destinatários particulares (como a aqui Autora/Recorrente), sendo, pois, tal ato impugnado, inválido e contenciosamente anulável por vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito (falta de base legal).
[…]”
Fim da transcrição

E neste conspecto, tendo presente aqueles identificados Acórdãos deste TCA Norte [onde o ora Relator interveio como Adjunto] e onde foi conhecida e apreciada, em torno das questões aí suscitadas, na sua essência, matéria de igual natureza e mérito àquelas que aqui ora vêm colocadas, aderindo à jurisprudência por eles firmada [sem reservas, embora com as adaptações que mostrem necessárias, designadamente em sede da matéria de facto], aqui damos por enunciada parte da fundamentação aportada no Acórdão proferido no Processo n.º 2639/17.6BEBRG, datado de 30 de novembro de 2023 [de que será junta cópia aos autos] tendo em vista alcançar uma interpretação e aplicação uniformes do direito [cfr. artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil], como segue:

Início da transcrição
“[…]
No caso vertente, o ato administrativo impugnado determinou à A. o pagamento de compensações no valor de €142.000,00 (cento e quarenta e dois mil euros) pelo incumprimento das obrigações de incorporação de biocombustíveis relativas ao 1.º Trimestre de 2020.
Essas metas de incorporação resultam do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 117/2010 que, de acordo com o acórdão do TJUE supracitado, constituem normas técnicas.
Ora, se tais metas de incorporação constituem normas técnicas, deveriam ter sido comunicadas à Comissão Europeia, sob pena de serem inoponíveis e inaplicáveis aos particulares.
A comunicação prévia das regras técnicas encontra-se prevista no artigo 8.º da sobredita Diretiva, nos seguintes termos:
1. Sob reserva do disposto no artigo 10º, os Estados membros comunicarão imediatamente à Comissão qualquer projeto de regra técnica, exceto se se tratar da mera transposição integral de uma norma internacional ou europeia, bastando neste caso uma simples informação relativa a essa norma. Enviarão igualmente à Comissão uma notificação referindo as razões da necessidade do estabelecimento dessa regra técnica, salvo se as mesmas já transparecerem do projeto.
Não tendo sido efetuada tal comunicação, como resulta da matéria de facto provada nos presentes autos, concluímos que o referido ato administrativo, já que fundamentado no Decreto-Lei n.º 117/2010, padece de invalidade, devendo ser anulado, como, efetivamente, o foi pela sentença recorrida.
Acresce que, com relevância para os presentes autos, no âmbito do processo n.º 2739/17.2BEBRG-A, que tramitou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, e cujo objeto é idêntico ao dos presentes autos, designadamente, a impugnação de um ato administrativo praticado pela ora recorrente traduzido na aplicação de compensações à ora recorrida, o Supremo Tribunal Administrativo proferiu Acórdão em 06 de julho de 2023, o qual julgou procedente, por provada, a ação administrativa da recorrente, determinando a anulação de tal ato [...]
[...]
Importa, transcrever, ainda, parte do teor deste acórdão do STA de 6/07/2023, que infirma totalmente as conclusões da recorrente:
“21. Deste Acórdão do TJUE, de 9/3/2023, resulta, pois, em conclusão, que o disposto no nº 1 do art. 11º do DL nº 117/2010, de 25/10, nas suas sucessivas versões até à sua revogação operada pelo DL nº 84/2022, de 9/12, ao determinar as percentagens de incorporação de biocombustíveis a observar pelas “entidades incorporadoras”, constituía uma “regra técnica” (na aceção do art. 1º, ponto 11, da diretiva 98/34), a qual só seria oponível aos destinatários particulares (como a aqui Autora) se o respetivo projeto tivesse sido comunicado à Comissão nos termos previstos no art. 8º nº 1 da Diretiva 98/34. Mais declarou o TJUE que tal norma nacional não é suscetível de constituir uma mera transposição integral de uma “norma europeia” (não se subsumindo, pois, à exceção prevista no art. 8º nº 1 da Diretiva 98/34), nem é suscetível de se integrar numa cláusula de salvaguarda.
Ora, este julgamento do TJUE, proferido em 9/3/2023 no âmbito daquele mecanismo de reenvio prejudicial (C-604/21) operado pelo TAF/Braga no âmbito do processo 860/21.1BEBRG, é decisivo, por si, para determinar a sorte deste nosso presente processo.
Na verdade, não sendo a norma contida no nº 1 do art. 11º do DL 117/2010, de 25/10, oponível aos destinatários particulares, ela não era, consequentemente, oponível à aqui Autora/Recorrente, pelo que o ato impugnado, praticado pela Ré/Recorrida “ENSE”, consistindo numa ordem de pagamento fundamentada num incumprimento daquela norma, queda-se sem fundamento legal, incorrendo, pois, em vício de erro nos pressupostos de direito (falta de base legal).
Dúvidas não pode haver que aquele julgamento do TJUE é plenamente aplicável no caso do presente processo, uma vez que a jurisprudência daquele tribunal europeu, quanto à interpretação fixada do direito da UE, designadamente em processo de reenvio prejudicial, torna-se obrigatório quer no âmbito da causa em que o reenvio foi operado quer em quaisquer outros processos em que seja pertinente a aplicação das mesmas normas interpretadas. Efetivamente, além de o tribunal nacional destinatário ficar vinculado pela interpretação dada, o Acórdão do TJUE vincula também os outros órgãos jurisdicionais a quem seja submetida uma questão idêntica.
Ora, no presente processo, estamos perante um litígio substancialmente idêntico, apenas variando a quantia da compensação a dever ser, alegadamente, paga pela Autora/Recorrente e o espaço temporal a que tal compensação se reporta (no nosso caso, o ano de 2016, a que, nos termos do aludido nº 1 do art. 11º do DL 117/2010, correspondia uma obrigação de incorporação de biocombustíveis na percentagem de 7,5% - cfr. alínea c). Sendo irrelevantes, quanto à manutenção dessa inoponibilidade, a variação das várias versões do DL 117/2010 até á sua revogação pelo DL 84/2022, de 9/12 (nomeadamente, as versões introduzidas pelos DLs. 6/2012, de 17/1, 69/2016, de 3/11 – em que se baseou o ato aqui impugnado, 152-C/2017, de 11/12 e 8/2021, de 20/1).
Em face do julgamento do TJUE, tornam-se, pois, inúteis as eventuais respostas às questões prejudiciais colocadas suplementarmente ao TJUE pelo reenvio prejudicial operado, à cautela, no âmbito deste nosso processo, uma vez que, independentemente dessas respostas, a já estabelecida inoponibilidade aos destinatários particulares (como a aqui Autora/Recorrente) da norma impositiva contida no nº 1 do art, 11º do DL 117/2010, impõe, por si, irremediavelmente, uma decisão de procedência da presente ação impugnatória, por força de vício do ato impugnado, por erro nos pressupostos de direito (falta de base legal) – o que se decide.”
Pelo exposto, temos que, não sendo a norma inserta no nº 1 do art. 11º do DL 117/2010, de 25/10, oponível aos destinatários particulares, ela não era, consequentemente, oponível à aqui Autora/Recorrente, pelo que o ato impugnado, praticado pela Ré/Recorrente “ENSE”, consistindo numa ordem de pagamento fundamentada num incumprimento daquela norma, fica sem fundamento legal, incorrendo em vício de erro nos pressupostos de direito (falta de base legal).
[...]
Note-se, ademais, que o citado Acórdão do TJUE, de 9/3/2023, ao declarar a inoponibilidade, aos destinatários/particulares, da legislação portuguesa em causa, já pressupõe preenchida uma das condições para que essa consequência seja possível: o “efeito direto” do relevante direito da UE. Isto é, a possibilidade de os particulares poderem invocar este direito europeu em ordem a salvaguardarem os seus direitos e interesses, eventualmente contra legislação nacional que o contrarie (cfr. Acórdão fundamental “Van Gend en Loos”, 26/62).
E, nos termos do Acórdão fundamental “CIA Security Service (C-194/94), aliás citado pelo TJUE no Acórdão interpretativo de 9/3/2023, «há que concluir que a Diretiva 83/189 deve ser interpretada no sentido de que a inobservância da obrigação de notificação acarreta a inaplicabilidade das “regras técnicas” em questão, de modo que não podem ser opostas aos particulares», sendo que ao juiz nacional «compete recusar a aplicação de uma “regra técnica” nacional que não tenha sido notificada em conformidade com a Diretiva”.
Não tendo sido assim considerado pelo Tribunal a quo, independentemente de qualquer outra invalidade, a sentença padece de erro de julgamento, no que, em concreto respeita à interpretação do artigo.° 11, do Decreto-Lei n.° 117/2010, conjugado com os artigos 1.°, 8.° e 9.°, da Directiva 98/34/CE, o que determina a revogação da sentença recorrida, com as demais consequências legais.
[...]“
Fim da transcrição

Como assim deflui do extraído supra, a solução jurídica que aí foi alcançada, e que teve presente, na sua base fundamental, o julgamento de que está em causa uma “regra técnica” que não foi notificada à Comissão Europeia em conformidade com a Directiva n.º 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, datada de 22 de junho de 1998, e que as normas em causa a que se reporta o Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro [em particular o seu artigo 11.º, n.º 1], não sendo oponíveis aos previstos destinatários, in casu, à Autora ora Recorrente, e tendo-o sido porque a Recorrida emitiu o acto administrativo que lhe dirigiu e que a final consubstancia uma ordenm para pagamento, incorreu o Tribunal a quo, na realidade, em erro de julgamento em matéria de interpretação e aplicação do direito, por estar subjacente ao acto impugnado uma actuação contrária à lei, fundada em erro nos pressupostos da sua aplicação, desde logo, em desconformidade com o direito da União Europeia.

Neste patamar, dada a manifesta procedência do recurso jurisdicional, julgamos ser desnecessária, por inútil para os termos dos autos, a apreciação e decisão em torno dos demais erros de julgamento imputados pela Recorrente à Sentença recorrida, assim como do pedido de reenvio prejudicial para o TJUE, que formulou nos autos [Cfr. fls. 621 dos autos – SITAF].
*

E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro; Directiva 98/34/CE; Combustíveis; Erro nos pressupostos de direito.

1 - O disposto no artigo 11.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro, ao determinar as percentagens de incorporação de biocombustíveis a observar pelas “entidades incorporadoras”, constituía uma “regra técnica” [na aceção do artigo 1.º, ponto 11, da Diretiva 98/34/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, datada de 22 de junho de 1998] a qual só seria oponível aos destinatários particulares se o respetivo projecto tivesse sido comunicado à Comissão Europeia, nos termos previstos no artigo 8.º n.º 1 daquela Directiva.

2 – Assim não tendo sucedido, e falta de idónea base legal substantiva, o acto praticado pela Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis, EPE, ao abrigo do disposto no artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de outubro é inválido e contenciosamente anulável por violação de lei, por erro nos seus pressupostos de direito, por promanado em desconformidade com o direito da União Europeia.
***

IV – DECISÃO

Face ao que deixamos expendido supra, e tendo subjacente o disposto nos artigos 27.º, n.º 1, alínea i) e 94.º, n.º 5, ambos do CPTA e artigo 656.º do CPC, julgamos em CONCEDER PROVIMENTO ao recurso interposto pela Recorrente [SCom01...], Ld.ª, e consequentemente:
A) Em revogar a Sentença recorrida;
B) Em julgar procedente o pedido deduzido;
C) Em anular o acto da autoria do Presidente do Conselho de Administração da ENMC, EPE, proferido nos termos do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 117/2010, de 25 de Outubro, no âmbito do processo UB/07/2017.

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Custas a cargo da Recorrida – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.
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Junte aos autos cópia do Acórdão proferido no Processo n.º 2639/17.6BEBRG

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Notifique, também com remessa de cópia do Acórdão referido antecedentemente.

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Porto, 23 de janeiro de 2024.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator