Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01550/12.1BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:09/12/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Moura
Descritores:FATURAÇÃO DE VEÍCULOS USADOS E IMPORTADOS DE ESTADO DA EU;
Sumário:
I – Os depoimentos para serem valorados devem ser diretos, claros e precisos.

II – A remissão para prova documental sem identificar concretamente qualquer documento, não é modo aceitável de recurso, implicando a sua rejeição nessa parte.

III - A faturação de veículos usados importados de outro Estado membro da União Europeia, não deve conter IA ou ISV, pois estes impostos especiais não tributam a venda do bem, mas o registo de matrícula no caso do IA e o ISV tributa os contribuintes na medida dos custos que estes provocam nos domínios do ambiente, infraestruturas viárias e sinistralidade rodoviária, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

«X, Lda.», interpõe recurso da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (“IVA”) relativas aos períodos de tributação correspondentes aos doze meses do ano 2007, no valor global de € 46.952,17, e contra as liquidações dos correlativos juros compensatórios, no montante global de € 5.457,80, num valor total de € 52.409,97.

Formula nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
A) A recorrente interpôs a competente impugnação judicial, com vista à anulação das liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), no valor global de € 46.952,17, e Juros Compensatórios no montante total de € 5.457,80, relativas ao exercício de 2007.
B) Sobre essa impugnação judicial recaiu sentença, nos seguintes termos:
(....)
DISPOSITIVO
Nos termos expostos e com base nos argumentos neles vertidos, julgo a presente impugnação judicial não provida e improcedente, mantendo, na ordem juridica, as impugnadas liquidações adicionais de IVA e dos correspondentes juros compensatórios, no montante global de € 52.409,97.
(....)
C) E é sobre esta decisão que a recorrente não concorda, pelo que interpõe o presente recurso.
D) [Rejeitada, conforme Acórdão de 15 de junho de 2022.].
E) A recorrente, no decurso da audiência de inquirição de testemunhas, fez prova documental e testemunhal de factos que não constam da douta sentença, e, que alteram por completo a decisão constante da mesma.
F) A recorrente refere aqui toda a prova produzida, em sede de audiência de inquirição de testemunhas, (documental e testemunhal) relativa à matéria de facto que carreou na impugnação judicial quanto ao ponto 2.2 do Relatório.
G) Ponto este que levou a que a AT procedesse á liquidação adicional de IVA, dado que, no entender da AT, a recorrente liquidou IVA inferior ao devido, por contabilização dos custos superiores ao efetivamente suportado na aquisição de viaturas em segunda mão a dois fornecedores alemães, no montante global de € 8.200,50.
H) A prova que a recorrente produziu em sede de audiência de inquirição de testemunhas, consistiu.
I) No decurso da audiência de inquirição das testemunhas, foi a testemunha, «AA» («AA»), Contabilista Certificado da recorrente e a sócia-gerente da recorrente, «BB» («BB»), cujas declarações foram tomadas como declarações de parte, confrontados com os documentos n.ºs 9 a 26, 27 a 42 e n.º 43, documentos estes que se referem:
– às faturas emitidas pelos fornecedores «CC» e «EE», relativas às aquisições das viaturas usadas que a recorrente adquiria no Mercado alemão, diretamente a estes e a particulares com a intervenção destes;
– as DGAIEC (DAVs), Declarações aduaneiras de Veículo, através das quais se apurava o Imposto Automóvel (IA) de cada viatura adquirida pela recorrente, sendo que esta declaração tinha como suporte a fatura de aquisição atrás referidas;
– as faturas de vendas da recorrente aos seus clientes das viaturas usadas.
J) Assim, os documentos com que, na audiência de inquirição de testemunhas, foram confrontados, a testemunha, «AA» e a sócia-gerente, «BB», foram para cada aquisição e por cada viatura:
– a fatura de aquisição aos fornecedores «CC» e «EE», ou a particulares por intermédio destes;
– a DGAIEC (DAV), que era elaborada e o cálculo do IA efetuado, tendo por base a fatura de aquisição correspondente;
– e a fatura da venda que a recorrente emitia ao seu cliente.
K) Sendo que ambos, testemunha, e, sócia-gerente em declarações de parte, confirmaram a genuinidade de tais documentos, tendo por consequência feito prova da autenticidade das faturas de aquisição que a recorrente escriturou no ano de 2007 na sua contabilidade, e relativas à aquisição de viaturas usadas adquiridas no mercado alemão, diretamente ao fornecedores «CC» e «EE», bem como a particulares com a intervenção destes.
L) E disseram ainda, mais concretamente a sócia-gerente «BB» em declarações de parte, quando a recorrente recebeu, o projeto de relatório de inspeção tributária, para exercer o direito de audição, ocorrido em 12 de Julho de 2010, e se deparou com o que constava do projeto de relatório, que, entre outras coisas, havia a questão da divergência entre os valores constantes das faturas que a recorrente tinha escriturado na sua contabilidade, e, os montantes constantes nas faturas que aqueles fornecedores tinham escriturado na sua contabilidade na Alemanha.
M) A recorrente, na pessoa da sua sócia-gerente «BB», entrou imediatamente em contacto com tais fornecedores, «CC» e «EE», para que estes dissessem o que se lhes oferecia sobre o assunto.
N) Tendo a recorrente recebido como resposta de ambos, que já tinham sido objeto de fiscalização pela Autoridade Tributária Alemã, que já tinham pago os impostos das referidas correções.
O) Sendo que:
– O fornecedor «EE», enviou um documento no qual demonstrava a correção a que tinha sido objeto, quanto às faturas relacionadas com a recorrente, e colocou-se à disposição da recorrente para o que fosse preciso;
– O fornecedor «CC», por sua vez, disse que também tinha sido objeto de inspeção tributária alemã, que em consequência dessa inspeção insolveu, e que toda a documentação contabilística tinha sido apreendida no processo de insolvência, pelo que não tinha forma de enviar à recorrente qualquer documento contabilístico. No entanto colocou-se à inteira disposição da recorrente para o que tivesse por conveniente.
P) E foi ainda dito, pela sócia-gerente, «BB», em declarações de parte que a partir desse momento não compraram mais nenhuma viatura a estes fornecedores.
Q) O documento que o fornecedor «EE» enviou à recorrente, resultante das correções a que foi sujeito na inspeção que a Autoridade Alemã efetuou, e que se prendiam com faturas de venda à recorrente, foi desde logo junto com a resposta ao exercício do direito de audição, pela recorrente, atribuindo-se o n.º 43, documento este com que a testemunha «AA» e a sócia-gerente «BB», foram confrontados em sede de audiência de inquirição de testemunhas e o confirmaram inteiramente.
R) E, quer aqui a recorrente deixar bem vincado, que tal documento, n.º 43, já tinha que ser do conhecimento dos serviços de inspeção tributária quando efetuaram a inspeção à recorrente, não o tendo levado em linha de conta aquando da inspeção à contabilidade da recorrente, levando-o apenas em consideração após o exercício do direito de audição que a recorrente, uma vez que dele lhes deu conhecimento e juntou-o para sua defesa.
S) [Rejeitada, conforme Acórdão de 15 de junho de 2022.].
T) Em face dos depoimentos acima transcritos, não pode aceitar a recorrente o que o Meritissimo Juiz aquo refere na douta sentença quanto ao depoimento da testemunha «AA», quando a fls 21 e 22 diz:
(....)
«AA» prestou um depoimento sério, no qual revelou segurança e convicção, mas que, no que concerne à questão da contabilização dos custos de aquisição de viaturas, não se baseou no conhecimento directo dos factos, pois era contabilista da Impugnante, mas exterior ao quadro de pessoal da mesma, ou seja, prestava à Impugnante serviços de contabilidade, pelo que o seu testemunho se baseou em papéis que a Impugnante lhe entregava e que eram necessários à elaboração da contabilidade ou escrita, e, bem assim, no que o gerente da Impugnante lhe disse a respeito dos dois fornecedores alemães, designadamente que estes “falsificaram as facturas”, acrescendo que, neste contexto, contribuiu para a formação da convicção de «AA», de que os fornecedores alemães “falsificaram as facturas”, o facto de o gerente da Impugnante lhe ter exibido o documento 43 junto à petição inicial (documento com o qual foi confrontado e que reconheceu), que se encontra redigido, veja-se, em alemão.
U) O depoimento da testemunha «AA», foi um depoimento de que resultou claro que todo o seu depoimento assentou em razão de saber, e de ciência, na medida em que foi o Técnico Oficial de Contabilidade (TOC) da recorrente.
V) Demonstrou conhecer perfeitamente toda a atividade da recorrente.
W) Disse claramente como funcionava a importação de viaturas usadas.
X) Quem eram os fornecedores em 2007 de viaturas usadas importadas da Alemanha, mais concretamente «EE» e «CC».
Y) Confrontado com as faturas destes fornecedores, confirmou-as, e disse que eram estas as reais faturas de aquisição, que estavam escrituradas na contabilidade da recorrente, e, que as mesmas serviam de base à tributação em sede de Imposto Automóvel (IA).
Z) Disse ainda que teve conhecimento da divergência dos valores das faturas que constavam nos registos contabilísticos, quando comparados com os valores que aqueles fornecedores fizeram constar na sua contabilidade.
AA) Mas que desconhecia o porquê de aqueles fornecedores terem feito isso.
BB) Não deixou de afirmar categoricamente que o valor de aquisição por que a recorrente adquiria as viaturas usadas àqueles fornecedores, era, sem, sombra de dúvidas o constante das faturas que estavam escrituradas na contabilidade da recorrente.
CC) O mesmo se diga quanto ao depoimento, que foi considerado como declaração de parte da, agora sócia-gerente, ao tempo em que ocorreram os factos de que estamos a tratar, ano de 2007, funcionária da recorrente, «BB».
DD) Em face dos depoimentos acima transcritos, não pode aceitar a recorrente o que o Meritíssimo Juiz aquo refere na douta sentença quanto ao depoimento-declaração de parte de «BB», quando a fls 22 diz:
(....)
Já «BB», a quem foram tomadas declarações de parte e que também prestou um depoimento sério, igualmente revelador de segurança e convicção, foi bastante emotiva, tendo as suas declarações, no essencial, incidido, igualmente, sobre a sua visão ou interpretação acerca da aplicação do regime especial de tributação da margem, especialmente no que concerne à inclusão ou não inclusão do valor do IA ou do ISV no valor de aquisição das viaturas em segunda mão.
No demais, declarou que os custos de aquisição das viaturas adquiridas em segunda mão aos fornecedores alemães foram sempre os constantes nas facturas cujos valores foram relevados na contabilidade e que também serviram de base à liquidação do IA ou do ISV, afirmando que foi sempre esse o procedimento da, agora, sua gerida.
EE) A declarante foi séria, conhecedora, prática, em todas as suas declarações quanto a esta matéria, “valores de aquisição” das viaturas usadas importadas do Mercado Alemão diretamente ou por intermédio dos fornecedores «EE» e «CC».
FF) Desde logo começou por dizer que era, como ainda hoje é, quem confere as faturas quando algum carro usado chega às instalações da recorrente.
GG) Que essa conferência é feita ao nível do tipo da viatura, do valor constante na fatura e negociado entre as partes.
HH) Que é quem junto da Alfandega trata da liquidação e pagamento do IA para matricular a viatura em Portugal.
II) Que o pagamento das viaturas importadas daqueles fornecedores era feito por entregas de verbas, em dinheiro, normalmente à pessoa que transportava essas viaturas, valores esses que eram registados nas contas correntes desses mesmos fornecedores.
JJ) Que quando a recorrente foi inspecionada e receberam o projeto de relatório de inspeção, de onde constava a divergência de valores entre os que constavam nas faturas em poder da recorrente e os valores das faturas que aqueles fornecedores registaram na sua contabilidade.
KK) Imediatamente entraram em contacto com eles «EE» e «CC», para que estes esclarecessem o que se estava a passar.
LL) Tendo dito em declarações de parte que, o fornecedor «EE», confirmou essas divergências, também tinha sido objeto de inspeção tributária pelas Autoridades Alemãs, que foi objeto de correções, e que iria enviar um documento com as correções das faturas relativas aos negócios com a recorrente.
MM) E, foi isto que aconteceu, disse a declarante que a recorrente recebeu tal documento, e anexou-o, à resposta às finanças.
NN) Quanto ao fornecedor «CC», disse que este também foi objeto de inspeção pelas Autoridades Alemãs, mas que este insolveu em consequência desta inspeção e que os documentos foram entregues ao Tribunal, pelo que não tinha forma de fazer chegar à recorrente qualquer documento, que ajudasse.
OO) Disse ainda que a partir deste momento, de terem tido conhecimento destas alterações nas faturas, por parte daqueles fornecedores, deixou a recorrente de efetuar negócios com tais fornecedores.
PP) Nunca mais lhe compraram uma viatura.
QQ) Confrontada na audiência de inquirição com as faturas de aquisição das viaturas usadas, com as DAV e com as faturas da recorrente para os seus clientes, viatura a viatura, foi perentória de que tais faturas correspondem aos valores reais de aquisição, que são as que serviram de base à liquidação do IA, pelo que são os valores reais das aquisições de tais viaturas.
RR) Disse ainda que sabe de muitos comerciantes, instalados na rua onde a recorrente desenvolve a sua atividade, que compram e vendem viaturas usadas sem qualquer tipo de registo, ou controle, que também o poderia e saberia fazer, mas não é essa a postura comercial da concorrente.
SS) Ainda, e em relação a esta matéria de facto, todos os documentos carreados pela recorrente no processo, nomeadamente com a resposta ao direito de audição, com a reclamação graciosa e com a impugnação judicial, não foram pela Fazenda Pública impugnados, pelo que se consideram como provados.
TT) Em face do precedentemente exposto, e no que tange a esta matéria de facto, relativa ao ponto 2.2 do Relatório de Inspeção Tributária, mais concretamente:
– Que, no âmbito da referida inspeção tributária, os Serviços de Inspeção Tributária entenderam, que o valor dos custos contabilizados a título de aquisição de viaturas em segunda mão a dois fornecedores alemães, foi no seu todo, superior ao valor efetivamente suportado, num total de € 39.050,00, o que teve como consequência a liquidação de IVA inferior ao devido, no montante global de € 8.200,50.
UU) Não pode a recorrente aceitar tal conclusão a que chegaram os serviços de inspeção tributária no ponto 2.2 do relatório, e agora sufragada na fundamentação fáctico-jurídica, dos factos, dos factos provados, da douta sentença a fls 5 a 22.
VV) De tudo o expendido supra, resultou inequívoco que, em face da prova documental carreada pela recorrente ao longo de todo o processo e da prova testemunhal e das declarações de parte produzidas em sede de audiência de inquirição, que, as faturas de aquisição de viaturas em segunda mão que a recorrente adquiriu, no ano de 2007, aos fornecedores «EE» e «CC», e escriturou na sua contabilidade, correspondem aos valores reais pelos quais aquelas viaturas foram adquiridas.
WW) E, assim, a recorrente não pode aceitar a conclusão que o Meritíssimo Juiz aquo retira na Douta Sentença, quanto aos factos provados, constantes de fls 5 a 22, sendo que tal decisão quanto a esta matéria deve ser proferida em sentido contrário, devendo os mesmos serem declarados como factos não provados, e, serem as faturas de aquisição de viaturas em segunda mão que a recorrente adquiriu, no ano de 2007, aos fornecedores «EE» e «CC», e escriturou na sua contabilidade, consideradas como documentos que correspondem aos valores reais pelos quais aquelas viaturas foram adquiridas.
XX) Não podendo tais faturas serem objeto de qualquer tipo de correção.
YY) [Rejeitada, conforme Acórdão de 15 de junho de 2022.].
ZZ) Vejamos então porque não pode aceitar a recorrente este entendimento do Meritíssimo Juiz, a quo.
AAA) Em matéria de direito a questão que se coloca é a de saber se deve o anterior IA ou o actual ISV ser incluído no valor tributável, para efeitos do IVA, das transmissões internas, aquisições intracomunitárias ou importações de veículos automóveis.
BBB) Atentemos na legislação que ao caso se aplica.
CCC) Quanto à legislação comunitária versa a Diretiva 2006/112/CE (Diretiva IVA), que nos diz:
- O artigo 73.º da Diretiva tem a seguinte redação:
«Nas entregas de bens e às prestações de serviços, que não sejam as referidas nos artigos 74.º a 77.º, o valor tributável compreende tudo o que constitui a contraprestação que o fornecedor ou o prestador tenha recebido ou deva receber em relação a essas operações, do adquirente, do destinatário ou de um terceiro, incluindo as subvenções directamente relacionadas com o preço de tais operações.»
- Por sua vez o artigo 78.º, 1.º parágrafo, alínea a), da Diretiva dispõe:
«O valor tributável inclui os seguintes elementos:
a) Os impostos, direitos aduaneiros, taxas e demais encargos, com exceção do próprio IVA.»
- De acordo com o artigo 83.º da Diretiva, o valor tributável nas aquisições intracomunitárias de bens é constituído pelos mesmos elementos que os utilizados para determinar o valor da entrega desses mesmos bens no território do Estado membro.
- O artigo 85.º da Diretiva estabelece:
«Nas importações de bens, o valor tributável é constituído pelo valor definido para efeitos aduaneiros pelas disposições comunitárias.»
- O artigo 86.º, n.º 1, alínea a), da Diretiva IVA estatui:
«O valor tributável inclui os seguintes elementos, caso não estejam já incluídos: a) Os impostos, direitos aduaneiros, taxas e demais encargos devidos fora do Estado-Membro de importação, e bem assim os que são devidos em virtude da importação, com exceção do IVA a cobrar».
DDD) [Rejeitada, conforme Acórdão de 15 de junho de 2022.].
EEE) [Rejeitada, conforme Acórdão de 15 de junho de 2022.].
GGG) E como tal o IVA não pode incidir sobre o IA, pelo que andou bem a recorrente ao incluir no preço de aquisição das viaturas usadas adquiridas no ano de 2007, aos fornecedores «EE» e «CC».
HHH) Toda a legislação e doutrina supra exposta, e que se aplica ao caso em apreço, contraria tudo o que o Meritíssimo Juiz aquo refere na matéria de Direito da douta sentença, pelo que a mesma deve ser aplicada ao caso aqui em apreço e ser por consequência alterada a conclusão a que a douta sentença chega devendo ser alterada a decisão estatuída na sentença, decidindo-se pela total procedência da impugnação judicial que a recorrente interpôs.
III) Relativamente à matéria vertida na sentença no titulo “Dos custos contabilizados a título de compras de viaturas em segunda mão”, a fls 27 a 31 da douta sentença, a recorrente não aceita o que vem referido.
JJJ) A recorrente, desde sempre pautou as suas declarações segundo os ditames da boa fé, e fez prova de tudo quanto disse na petição de Impugnação Judicial.
KKK) [Rejeitada, conforme Acórdão de 15 de junho de 2022.].
LLL) Diz-se a dada altura da douta sentença, a fls 31 da mesma, que (...) os SIT recorreram, inclusivamente, à cooperação administrativa com a administração tributária da Alemanha e, mais, tomaram em consideração os argumentos expendidos e alguma prova evidenciada pela Impugnante......(...).
MMM) A recorrente em todo este procedimento de inspeção, sempre informou, forneceu e escalereceu, os SIT de tudo aquilo que lhe foi solicitado.
NNN) Não tem responsabilidade alguma de os fornecedores «EE» e «CC» terem adulterado os seus documentos contabilisticos e que alguns deles referiam a entidade aqui recorrente.
OOO) E tanto assim é, que logo após terem tido conhecimentos destes factos, a recorrente deixou, definitivamente, de comercializar com eles.
PPP) Em face do supra exposto a recorrente não tem qualquer dúvida de que demonstrou cabalmente que as faturas de aquisicão relativas à compra de viaturas usadas no mercado alemão, através dos fornecedores «EE» e «CC», no ano de 2007, e escrituradas na contabilidade da recorrente correspondem às reais e verdadeiras aquisições, não podendo por consequência serem objeto de quaisquer correções.
QQQ) Também quanto ao facto de ter incluido no preço de aquisição o IA suportado, demonstrou a recorrente que face à legislação em vigor e à doutrina, supra expostas, que esteve bem, não sendo passível de qualquer censura jurídica.
RRR) Em face de toda a prova produzida, documental e testemunhal, em sede de audiência de julgamento, do direito e da doutrina expendida supra, não pode a recorrente aceitar a decisão de improcedência da impugnação.
SSS) A sentença recorrida ao julgar improcedente a impugnação judicial, é illegal, razão pela qual se requer que quanto à decisão de improcedência da impugnação judicial, a mesma seja alterada, declarando-se provada e procedente a impugnação judicial, devendo ser anuladas na totalidade as liquidações adicionais de IVA e Juros Compensatórios, relativamente ao exercicio de 2007, no montante de € 46.952,17 e € 5.457,80, respetivamente.
Termos em que,
E nos melhores de Direito, e, com sempre mui douto suprimento de V.Exas, deverá o presente recurso jurisdicional ser procedente, revogando-se a decisão judicial recorrida, declarando-se provada e procedente a impugnação judicial e, consequentemente, devem ser anuladas na totalidade as liquidações de IVA e Juros Compensatórios relativas ao ano de 2007 no montante global de € 52.409,97.

Não foram apresentadas contra-alegações.

O Ministério Público emitiu parecer no sentido de o recurso ser julgado improcedente.

Foram dispensados os vistos legais, nos termos do n.º 4 do artigo 657.º do Código de Processo Civil, com a concordância da Exma. Desembargadora Adjunta e do Exmo. Desembargador Adjunto, atenta a disponibilidade do processo na plataforma SITAF (Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais).

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Delimitação do Objeto do Recurso – Questões a Decidir.

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitada pelas alegações de recurso e respetivas conclusões [vide artigos 635.º, n.º 4 e 639.º CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º, e artigo 281.º do CPPT] são as de saber se em face dos depoimentos prestados e da prova documental deve ser alterada a matéria de facto, no sentido de admitir como válido o valor dos custos contabilizados a titulo de aquisição de viaturas em segunda mão a dois fornecedores alemães; assim como saber se o anterior IA ou o atual ISV, deve ser incluído no valor de aquisição das viaturas em segunda mão que a Impugnante vendeu em território nacional.

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Relativamente à matéria de facto, o tribunal, deu por assente o seguinte:
FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA
– DOS FACTOS
Dos factos provados
Com interesse para a prolação da decisão, julgo provados os seguintes factos:
1. No período compreendido entre 09.02.2010 e 02.07.2010, a coberto da Ordem de Serviço n.º OI............329 e da Ordem de Serviço n.º ............330, a «X, Lda.» foi alvo de uma acção de inspecção tributária de âmbito parcial, circunscrita, entre o mais, ao exercício correspondente ao ano 2007 e à verificação do cumprimento das obrigações tributárias em sede de IVA - cfr. fls. 1 do relatório de inspecção tributária, constante de fls. 62- verso a fls. 69-verso do PRG;
2. A 06.07.2010, no âmbito da acção de inspecção tributária a que se refere a alínea anterior, foi elaborado o “PROJECTO DE RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA” - cfr. de fls. 79 a fls. 86 do PRG;
3. Através do ofício n.º ...04, de 08.07.2010, dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças ..., expedido por carta registada, a «X, Lda.» foi notificada do teor do “PROJECTO DE RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA” - cfr. fls. 91 e verso do PRG;
4. A 26.07.2010, a «X, Lda.» exerceu, por escrito, o seu direito de audição, escrito do qual se exara, entre o mais, o seguinte:
“(...)
30.
Quanto às correcções ao lucro tributável do ano fiscal de 2006 referidas no Ponto 2.2 do Projecto de Relatório, estas fundamentam-se nos factos:
- De que foram detectadas que algumas das viaturas vendidas pelo fornecedor alemão «EE» estavam registadas na contabilidade da contribuinte como sendo adquiridas directamente a particulares alemães;
- de terem os Serviços de Inspecção Tributária apurado que a contribuinte considerou a aquisição de viaturas por um valor superior ao verificado na Alemanha, facturas e viaturas essas a que se referem no quadro constante do Ponto 2.2 do Projecto de Relatório a fls. 7/12 e 8/12.
31. Relativamente ao fundamento de que foram detectadas que algumas das viaturas vendidas pelo fornecedor alemão «EE» estavam registadas na contabilidade da contribuinte como sendo adquiridas directamente a particulares alemães, a contribuinte esclarece que adquiriu algumas viaturas a cidadãos particulares de nacionalidade alemã, mas a generalidade destes negócios tiveram a intervenção do fornecedor «EE».
32. Assim, quando a contribuinte, através da internet, constata a existência de uma viatura que lhe interessa comercializar, solicita a intervenção dos fornecedores com que trabalha na Alemanha para desenvolver esse negócio.
33. Posteriormente, e na maioria das vezes, realiza o negócio directamente com o particular alemão, cfr. fotocópias dos docs. n.ºs. 9 a 26, que se anexam.
34. No entanto, num ou outro caso, os fornecedores «EE» e «CC», aparecem como fornecedores de viaturas adquiridas a particulares, cfr. fotocópias dos docs. nºs. 27 e 28, que se anexam.
35. Assim, a contribuinte adquire viaturas usadas directamente a particulares, com intervenção dos fornecedores «EE» e «CC», e directamente a estes.
36. Não vê a contribuinte neste tipo de transacções quaisquer irregularidades, pois que neste tipo de negócio as aquisições fazem-se directamente com particulares e com empresas.
37. No que diz respeito ao facto de os Serviços de Inspecção Tributária terem apurado que a contribuinte considerou a aquisição de viaturas por um valor superior ao verificado na Alemanha, facturas e viaturas essas referidas no quadro constante do Ponto 2.2 do Projecto de Relatório a fls. 7/12 e 8/12, tal fundamento não corresponde à verdade.
38. Os valores de aquisição das viaturas constantes no quadro a que se refere o Ponto 2.2 do Projecto de Relatório, em 2006, são os valores constantes das facturas que se anexam, cfr. fotocópias docs. n.ºs. 29 a 42, tendo sido estes registados na contabilidade da contribuinte.
39. Quanto ao que é referido no Projecto de Relatório de que as facturas do fornecedor alemão «EE» têm um valor inferior, não pode a contribuinte ser responsabilizada por tal facto, pois que só conhece um único valor de aquisição.
40. O constante nas facturas anexas sob os docs. nºs 29 a 42, e que foram objecto de contabilização e de posterior pagamento.
41. Também quanto a este facto não há no Projecto de Relatório qualquer elemento que o confirme.
42. Apenas é feita referência no Projecto de Relatório pelos Serviços de Inspecção sem que para
o efeito seja aduzido e /ou anexado qualquer tipo de prova.
Sem prescindir,
43. No entanto, e logo após ter recepcionado o presente Projecto de Relatório, a contribuinte preocupada com o que é referido no mesmo, contactou o fornecedor em questão solicitando-lhe esclarecimentos sobre o assunto.
44. Tendo-lhe este referido que foi objecto de Inpecção Tributária, da qual resultou a correcção à matéria tributável, tendo pago todos os impostos que resultaram dessa acção inspectiva, ou seja, foi tributado pelos valores constantes das facturas que a contribuinte tem em seu poder.
45. Para o efeito o fornecedor «EE» enviou à contribuinte documento da Administração Tributária Alemã, que confirma o supra referido e que anexamos à presente sob doc. n.º 43.
46. Para além do envio do doc. atrás referido, colocou-se ainda à inteira disposição da contribuinte e por consequência dos Serviços de Inspecção, se assim o entenderem, para confirmar o que aqui se refere.
(...)
IVA 2007
81. Quanto ao IVA, e no que diz respeito ao ano fiscal de 2007, a contribuinte não aceita as liquidações em falta constantes do Projecto de Relatório, a que se referem os pontos 2.2, cujos argumentos constam das páginas 5/12 a 9/12.
82. Relativamente às liquidações em falta em sede de IVA contantes do Projecto de Relatório, a que se refere o ponto 2.2, cuja justificação consta das páginas 5/12 a 9/12, a contribuinte não as aceita pelas razões que passa a indicar.
83. Quanto às liquidações em falta de IVA relativas ao ano fiscal de 2007 e referidas no ponto 2.2 do Projecto de Relatório, estas fundamentam-se nos factos:
- De que foram detectadas que algumas das viaturas vendidas pelo fornecedor alemão «EE» estavam registadas na contabilidade da contribuinte como sendo adquiridas directamente a particulares alemães;
- de terem os Serviços de Inspecção Tributária apurado que a contribuinte considerou a aquisição de viaturas por um valor superior ao verificado na Alemanha, facturas e viaturas essas a que se referem no quadro constante do Ponto 2.2 do Projecto de Relatório a fls. 7/12 e 8/12.
84. Relativamente a estes factos não pode a contribuinte ser responsabilizada, pelos mesmos argumentos já expendidos nos artigos 30 a 46 desta resposta ao direito de audição.
85. Não pode assim a contribuinte ser responsabilizada por estes factos, pelo que, não deve ser liquidado imposto em falta de IVA, no montante de € 12.396,15, conforme é referido no Ponto 2.2, a fls. 9/12 do Projecto de Relatório.
(...)” – cfr. de fls. 97 a fls. 112 do PRG;
5. A 29.07.2010, no âmbito da acção de inspecção tributária a que se refere a alínea “1”, foi elaborado o “RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA”, do qual se exara, entre o mais, o seguinte:
“(...)
CAPÍTULO I – Conclusões da acção inspectiva
Da acção inspectiva aos exercidos de (...) 2007, efectuada ao sujeito passivo «X, Lda.», NIPC ..., resultaram correcções meramente aritméticas de IVA (...), nos montantes que a seguir se discriminam:
(...)
2007:
(...)
IVA - €46.952,17
CAPÍTULO II – Objectivos, âmbito, e extensão da acção inspectiva
(...)
C - Outras situações
1 - O sujeito passivo exerce a actividade de comércio de veículos automóveis, principalmente da marca ... A quase totalidade as compras, foi efectuada na Alemanha, directamente a particulares e a dois fornecedores, “«CC», NIF DE ... e “«EE», NIF DE ....
CAPITULO III - Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável
1- Análise efectuada:
O sujeito passivo, após ter detectado alguns erros na contabilidade e nos inventários, procedeu à sua regularização, quer ao nível da contabilidade, quer através do envio de declarações de substituição (...).
1.1 - Na contabilidade:
Foram verificados os registos contabilísticos e respectivos documentos de suporte, tendo-se detectado algumas divergências, que dão origem a correcções em (...) IVA, conforme a seguir discriminado:
(...)
2 - Elementos recebidos da Alemanha relativamente a «CC» e «EE»:
Ao abrigo do artigo 5.º do Regulamento (CE) n.º 1798/2003, foi solicitado à Administração alemã elementos relativamente às compras efectuadas pelo sujeito passivo aos fornecedores “«CC», NIF ... e “«EE», NIF ..., uma vez que se detectou que os pagamentos a estes efectuados eram superiores às compras.
2.1 - Relativamente ao fornecedor «CC», é referido que, no ano de 2006, este fornecedor não possui facturas com n.º superior ao n.º ...05 e, a empresa portuguesa tem 23 facturas deste fornecedor com n.º superior a este (...)
2.2 - Relativamente ao fornecedor «EE», foi constatada situação idêntica, para 2006 e 2007. Em 2006, detectou-se que algumas das viaturas vendidas pelo fornecedor alemão, estavam registadas na contabilidade da «X, Lda.» como sendo adquiridas directamente a particulares alemães. As viaturas com o chassis “WME0...................135” e “WAU................769” vendidas pelas facturas n.ºs ...03 e ...06, respectivamente, encontram-se registadas como sendo adquiridas a este fornecedor, mas na qualidade de particular alemão. A viatura com o chassis “WME.................275” (factura n.º ...36 de 2006.12.04), encontra-se registada na contabilidade como sendo adquirida a «CC» pela factura n.º ...95. Em 2007, também a viatura com o chassis “WME................302”, foi registada na contabilidade com a factura n.º ...00 “emitida” por «CC».
As diferenças apuradas entre os valores fornecidos pela Administração fiscal alemã e os valores declarados na contabilidade do sujeito passivo constam do quadro seguinte, onde a coluna “OBS” indica o “fornecedor”, um particular alemão que supostamente vendeu a viatura ao sujeito passivo ou alguma irregularidade detectada. Acrescenta-se que nem todas as viaturas constantes das facturas, mencionadas pela Administração Fiscal alemã como sendo adquiridas pelo sujeito passivo, estão aqui relacionadas, uma vez que muitas dessas viaturas foram legalizadas em Portugal por outros sujeitos passivos.
Apurou-se:
(...)
Compras2007
Factura Fornecedor
ValorDiferença
chassisFact.DATAValor«X, Lda.»a tributarOBS
VF1.....................48880806.119.350,0012.000,002.650,00Particular alemão
“WME................302”80912.102.250,006.850,004.600,00Fact. ...00 de «CC»
WME..................93981013.105.300,006.600,001.300,00Particular alemão
WME...................47481013.108.350,0010.000,001.650,00Particular alemão
WME........................18581119.104.700,007.000,002.300,00Particular alemão
WME.....................01481225.103.781,517.100,003.318,49Particular alemão
WME....................37281325.103.000,004.000,001.000,00Particular alemão
WME......................12781325.104.500,007.800,003.300,00Particular alemão
WME........................84381430.102.800,004.600,001.800,00Particular alemão
WBA.....................06981531.109.150,009.200,0050,00Em nome de «BB»..
WAU......................56681710.117.800,009.500,001.700,00Fact. N.º ...27 deste fornecedor
WME......................01581710.112.350,005.500,003.150,00
WBA......................08582017.116.638,6612.550,005.911,34Fact. ...45 de «CC»
WVW.....................74482323.115.100,009.000,003.900,00Particular alemão
WME.................23883007.123.025,214.500,001.474,79
Total Dif.38.104.62
As diferenças encontradas traduzem-se na contabilização de um custo (compras) superior ao devido e, consequentemente, IVA liquidado inferior ao devido, pelo que terão que ser tributadas em sede de (...) IVA. Atendendo a que nem todas as viaturas foram vendidas no ano em que foram adquiridas, as correcções vão ser efectuadas no período de imposto em que realizou a venda. Assim, (...) IVA em falta de (...) €8.200,50, conforme se discrimina nos quadros seguintes:
(...)
- Em 2007:
ValorValorDiferençaVenda
ChassisFornecedor«X, Lda.»a tributarIVA faltaN.º factData
WME......................2754.450,00 €6.850,00 €2.400,00 €504,00 €49422.01
WME......................2894.900,00 €7.000,00 €2.100,00 €441,00 €50127.01
WME......................5815.100,00 €8.500,00 €3 400,00 €714,00 €52628.02
WME.....................9515.250,00 €7.000,00 €1 750,00 €367 50 €55203.04
TRU.....................50810 200,00 €16 000,00 €5 800,00 €1.218,00 €58630.05
WBA....................0699 150,00 €9 200,00 €50,00 €10,50 €67031.10
“WME................302”2 250,00 €6.850,00 €4 600,00 €966,00 €67205.11
VF1.....................4889 350,00 €12 000,00 €2.650,00 €556,50 €67306.11
WME...................4748 350,00 €10 000,00 €1 650,00 €346,50 €67909.11
WAU......................5667.800,00 €9.500,00 €1.700,00 €357,00 €68113.11
WME........................8432.800,00 €4.600,00 €1 800,00 €378,00 €68624.11
WME.....................3723 000,00 €4.000,00 €1 000,00 €210,00 €68828.11
WME..................9395.300,00 €6.600,00 €1 300,00 €273,00 €69210.12
WME.................2383.600,00 €4.500,00 €900,00 €189,00 €69412.12
WBA......................0857 900,00 €12 550,00 €4 650,00 €976,50 €69722.12
WME......................1274.500,00 €7.800,00 €3.300,00 €693,00 €69928.12
Totais39.050,00 €8.200,50 €
2.3 - Porque a maioria das compras foi efectuada a particulares na Alemanha, foram verificados os pagamentos, não se tendo verificado nenhum pagamento a particulares. Os pagamentos são efectuados para os fornecedores «CC» e «EE», através de transferências bancárias. Foram efectuadas transferências bancárias para estes fornecedores, nos montantes a seguir discriminados por exercício:
20062007
«EE»(...)900.400,00 €
«CC»(...)100.200,00 €
As compras a eles efectuadas registadas na contabilidade, foram:
20062007
«EE»(...)217.700,00 €
«CC»(...)194.000,00 €
Verificamos que, para «EE», os pagamentos foram superiores ao valor das compras a ele efectuadas e registadas na contabilidade.
Tal situação já não acontece para o fornecedor «CC», mas que se explica pelo facto de, em 2006, só a partir de Abril serem registadas na contabilidade as transferências bancárias nas contas de fornecedores, e que até aí, eram lançados directamente por “Caixa”. Em 2006 e 2007, as facturas “emitidas” por este fornecedor têm uma numeração superior ao n.º ...05, n.º que a Administração Fiscal alemã informou não existir facturação posterior e, como se pode verificar no ponto 2.2, existem na -contabilidade do sujeito passivo, três facturas “emitidas” por este, cujas viaturas foram vendidas por «EE».
Encontraram-se documentos de transporte (CMR), cujos chassis lá identificados constam de documentos de particulares ou em facturas de «CC» que identificam «EE» como expedidor.
Do exposto, concluímos que compras registadas na contabilidade como tendo sido efectuadas a particulares, foram efectuadas a estes fornecedores, justificando-se as divergências relatadas nos dois pontos anteriores.
(...)
4 - Correcção a efectuar em IVA
(...)
4.1 - A maioria das viaturas foram adquiridas na Alemanha pelo Regime da margem (§ 25 a), pelo que a sua transmissão, por força do disposto no artigo 3.º do Dec.-Lei n.º 199/96 de 18/10, também está sujeita ao regime especial de tributação da margem.
No entanto, o sujeito passivo, para cálculo do valor tributável em IVA, considerou diferença entre o preço final de venda e o preço de aquisição da viatura, incluindo Imposto Automóvel/ Imposto sobre Veículos (IA / ISV).
Neste regime, e de acordo com o n.º 1 do artigo 4.º do citado decreto conjugado com a alínea f) do n.º 2 do artigo 16.º do Código do IVA, o valor tributável nas transmissões de viaturas usadas é constituído pela diferença entre a contraprestação obtida ou a obter do cliente e o preço de compra desses bens. Logo o IA pago não faz parte do preço de compra, para aplicação do Regime da Margem.
Foi calculado a diferença entre o valor de IVA que deveria ser liquidado e o que foi considerado pelo sujeito passivo, e que consta discriminado no Anexo I (5 folhas) e Anexo II (4 folhas), em que:
“IVA corrigido” = (Valor de venda - valor de compra) * 21/121
“IVA a liquidar” = IVA corrigido - IVA liquidado
Neste cálculo foram também tidos em conta as correcções referidas no ponto 1.
Assim, o valor de liquidação adicional de IVA, efectuada nos termos do artigo 87.º do Código do IVA, nos exercícios de (...) 2007 é de (...) €38.751,67 (...).
4.2 - Tendo em conta também as correcções referidas no ponto 2 e ponto anterior, por período de imposto apuramos os montantes seguintes:
2007ponto 4.1ponto 2.2Totais
Janeiro360,74 €945,00 €1 305,74 €
Fevereiro4 809,44 €714,00 €5 523,44 €
Março4 856,33 €0,00 €4 856,33 €
Abril1 777,76 €367,50 €2 145,26 €
Maio4 331,49 €1 218,00 €5 549,49 €
Junho5.228 08 €5.228,08 €
Julho3.815,06 €3.815 06 €
Agosto1.440,44 €1 440,44 €
Setembro2.536,53 €2.536,53 €
Outubro4.427,33 €10,50 €4 437,83 €
Novembro1.707,39 €2.814,00 €4 521,39 €
Dezembro3 461,08 €2 131,50 €5 592,58 €
38 751,67 €8 200,50 €46 952,17 €
(...)
CAPÍTULO VIII - Direito de audição
O sujeito passivo, após ter sido foi notificado, nos termos dos artigos 60.º da LGT e 60.º do RCPIT (ofício n.º ...04 de 2010.07.08), veio a exercer o direito de audição com um documento extenso, concordando no geral, com as correcções descritas nos pontos 1.1.1 e 1.1.2, e discordando das correcções descritas no ponto 2 (em sede de IRC e IVA) e no ponto 4.1 (em sede de IVA) do Projecto de Relatório.
Seguidamente são apresentadas as justificações para a sua aceitação ou não, e, a referência ao Item/n.º do documento do Direito de Audição.
1 - Assim, relativamente às correcções efectuadas em IVA e IRC, resultantes das respostas obtidas da Administração Fiscal Alemã dos fornecedores «CC» e «EE», adiante designados por “«CC»” e “«EE»”, refere-se:
1.1 - Itens 11 a 18 e 73 a 75 do Direito de audição:
Embora seja mencionado que a Administração fiscal (Alemanha) tenha comunicado que o fornecedor “«CC»” não possui facturas com n.º superior ao 605, tal não teve qualquer influência ao nível das correcções efectuadas, aceitando-se os valores registados na contabilidade com base nesses documentos, com excepção facturas n.ºs ...95, ...00 e ...45, porque os chassis nelas mencionados, foram os relacionados pela Alemanha como sendo facturados por “«EE»” nas facturas n.ºs ..36, ..09 e ..20. Acresce que se encontraram algumas divergências, que põem causa a veracidade de tais documentos, tais como, documentos de transporte (CMR) que indicam como expedidor «EE» e, cujos chassis lá mencionados constam de facturas emitidas por “«CC»”, como é o caso dos CMR n.ºs ..83, ..90, ..06, ..33 e ..20 do transportador «W», e ainda facturas deste fornecedor com o mesmo para viaturas diferentes (facturas n.º 616, com datas de 18.05 e 08.06 e 617 com datas de 15.02 e 19.05), documentos que não se juntam por se encontrarem arquivados no sujeito passivo.
1.2 - Itens 19 a 29 e 76 e 77 do Direito de audição:
No ponto 2.1 do Projecto de Relatório, foram considerados os valores enviados pela Alemanha, que se juntam em Anexo III (2 folhas). Tais valores não foram postos em causa, uma vez que foram enviados pela Administração Fiscal alemã e porque os pagamentos efectuados aos dois fornecedores alemães registados na contabilidade foram superiores aos montantes facturados, conforme se descreveu no ponto 2.3 do Projecto de Relatório.
1.3 - No que concerne ao mencionado nos itens 30 a 42, 51 a 64 e 78 a 85 do Direito de Audição, importa referir:
(a) No ponto 2.2 do Projecto de Relatório, foram considerados os valores enviados pela Alemanha, que se juntam em Anexo IV (4 folhas), sendo assinalado com “(a)” as viaturas objecto de correcção, uma vez nem todas as viaturas aí relacionadas foram legalizadas em Portugal pelo sujeito passivo, tal como foi referido no mesmo ponto do Relatório. Não foram postos em causa tais montantes, uma vez que foram enviados pela Administração Fiscal alemã e porque os pagamentos efectuados aos dois fornecedores alemães registados na contabilidade foram superiores aos montantes facturados, conforme se descreveu no ponto 2.3 do Projecto de Relatório.
(b) Considerou-se os valores mencionados pela Alemanha e não os valores constantes em documentos que traduzem os contratos efectuados directamente com os particulares porque nestes documentos se detectaram algumas irregularidades tais como, documento que não menciona valor de aquisição (em anexo V), divergência entre a marca do veículo constante do documento e a marca real (exemplo: factura n.º ...01 de “«CC»” e Dav n.º ...48; documento de aquisição da viatura chassis WVW....................112 e DAV n.º ...05; factura n.º ...45 de “«CC»” e DAV n.º ...78) e, ainda porque se o negócio é realizado directamente com particulares, cujos contratos têm a assinatura dos dois intervenientes (particular e representante da «X, Lda.»), seria normal que existissem despesas relacionadas com o transporte alojamento do representante do sujeito passivo para Alemanha registadas na contabilidade, o que não acontece.
(c) Quanto à intervenção do fornecedor “«EE»” nos negócios, se este intervém no negócio, deveria constar uma comissão por esse serviço prestado e, tal também não esta reflectido na contabilidade.
1.4 - No que se refere ao documento n.º 43 anexado ao Direito de Audição (itens 43 a 47 e 65 a 68), e uma vez que a Administração Fiscal alemã tributou o fornecedor alemão com base em elementos enviados pela Administração Fiscal portuguesa, os valores aí tributados não serão tributados, por corresponderem aos valores aqui registados, pelo que os valores correspondentes às viaturas constantes das facturas nele mencionados foram retirados dos cálculos constantes no Projecto de Relatório, sendo tidos em consideração neste Relatório.
2 - Não concorda com as correcções efectuadas descritas no Ponto 4.1 e 4.2 pelo facto do Imposto Automóvel / Imposto Sobre Veículos (IA/ISV) não fazer parte do preço de compra do bem para efeito do IVA apurado nos termos do Decreto-Lei n,º 199/96 de 18/10, pelas razões que expõe nos itens 86 a 160 do Direito de Audição.
2.1 - Sobre o que é exposto naqueles itens, escusamo-nos de nos pronunciar sobe a legalidade do Decreto-Lei e de outras normas mencionadas no Direito de audição, e remetemo-nos para a legislação em que foram apoiadas as correcções efectuadas. Estas basearam-se na aplicação do Decreto-Lei n.º 199/96 de 18/10, pois acordo com o n.º 1 do artigo 4..º do Regime especial dos bens em 2.ª mão aprovado por este Diploma legal, “o valor tributável das transmissões de bens referidas no artigo anterior, efectuadas pelo sujeito passivo revendedor, é constituído pela diferença, devidamente justificada, entre a contraprestação obtida ou a obter do cliente, determinada nos termos do artigo 16.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, e o preço de compra dos mesmos bens, co, inclusão do imposto sobre o valor acrescentado, caso este tenha sido liquidado e venha expresso na factura ou documento equivalente” e, o na alínea f) do n.º 2 do artigo 16.º do Código do IVA é mencionado que “para as transmissões de bens em segunda mão, de objectos de arte, de colecção ou antiguidades, efectuadas de acordo com o disposto em legislação especial, a diferença, devidamente justificada, entre o preço de venda e o preço de compra”.
De acordo com este Decreto-Lei a sua criação visou a transposição para a ordem jurídica nacional da Directiva n.º 94/5/CE, do Conselho, de 14 de Fevereiro de 1994, relativa à tributação, em imposto sobre o valor acrescentado, das transmissões de bens em segunda mão, objectos de arte, de colecção e antiguidades. Esta Directiva establece que “a margem de lucro é igual à diferença entre o preço de venda solicitado pelo revendedor para os bens e o seu preço de compra” entendendo-se por:
“preço de venda, tudo o que constitui a contraprestação obtida ou a obter pelo sujeito passivo revendedor da parte do comprador ou de um terceiro, incluindo as subvenções directamente ligadas a essas operações, os impostos, direitos, contribuições e taxas, as despesas acessórias, tais como cobradas pelo sujeito passivo revendedor ao comprador......”
– “preço de compra, tudo o que constitui a contrapartida obtida ou a obter do sujeito passivo revendedor pelo seu fornecedor”.
Perante estes conceitos, conclui-se que, constitui preço de compra apenas o valor facturado
pelo respectivo fornecedor e preço de venda, o montante a receber do comprador.
Sobre este assunto a Administração Fiscal emitiu Ofício-Circulado n.º 030 012 - SIVA de 20 de Janeiro de 2000, esclarecendo a forma de aplicação do Regime Especial dos bens em 2.ª Mão - Veículos.
Face ao exposto, as correcções efectuadas são devidas e apoiadas na legislação supra referida. Assim, considera-se que as razões apresentadas pelo contribuinte não merecem acolhimento, mantendo-se, o que consta do Projecto de Relatório, com excepção do descrito no ponto 1.4 deste Capitulo, que foi tido em conta nos cálculos do ponto 2 do Capitulo III deste Relatório.
(...)” – cfr. de fls. 61 a 69-verso do PRG;
6. A 03.08.2010, através do Ofício n.º ...04, de 02.08.2010, da Divisão de Inspecção Tributária - I da Direcção de Finanças ..., expedido por carta registada com aviso de recepção, a «X, Lda.» foi notificada, na pessoa do seu mandatário, do teor do relatório de inspecção tributária – cfr. fls. 93 a fls. 95 do PRG;
7. Com termo final do prazo legal de pagamento a ocorrer a 31.10.2010, foram emitidas as seguintes liquidações:
Liquidação n.º ..............25, relativa a IVA do mês de Janeiro de 2007, no valor de € 1.305,74 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º................26, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 176,72 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º.............27, relativa a IVA do mês de Fevereiro de 2007, no valor de € 5.523,44 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º............28, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 730,00 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............29, relativa a IVA do mês de Março de 2007, no valor de € 4.856,33 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............30, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 625,87 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º.............31, relativa a IVA do mês de Abril de 2007, no valor de € 2.145,26 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º .............32, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 268,95 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ..............33, relativa a IVA do mês de Maio de 2007, no valor de € 5.549,49 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............34, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 678,10 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............35, relativa a IVA do mês de Junho de 2007, no valor de € 5.228,08 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ...........36, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 621,07 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º............37, relativa a IVA do mês de Julho de 2007, no valor de € 3.815,16 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ...........38, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 440,25 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º............39, relativa a IVA do mês de Agosto de 2007, no valor de € 1.440,44 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º............40, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 161,49 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ...........41, relativa a IVA do mês de Setembro de 2007, no valor de € 2.536,53 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............42, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 275,20 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............43, relativa a IVA do mês de Outubro de 2007, no valor de € 4.437,83 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............44, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 467,86 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ............45, relativa a IVA do mês de Novembro de 2007, no valor de € 4.521,39 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ...........46, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 461,31 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ...........47, relativa a IVA do mês de Dezembro de 2007, no valor de € 5.592,58 – cfr. documento 1 junto à petição inicial;
Liquidação n.º ...........48, relativa aos juros compensatórios sobre o valor de IVA a que se refere o ponto anterior, na importância de € 550,98 – cfr. documento 2 junto à petição inicial;
8. A 28.02.2011, a «X, Lda.» apresentou reclamação graciosa das liquidações de IVA e de juros compensatórios identificadas na alínea anterior, reclamação que foi autuada sob o Processo n.º .....................994 – cfr. fls. 1 do PRG apenso;
9. A 13.12.2011, no âmbito do Processo n.º .....................994, foi proferido despacho, da qual resulta, entre o mais, o seguinte:
“(...)
Em 2011/11/21, o reclamante foi notificado por carta registada, através do ofício nº ...03 do teor do projecto de despacho proferido em 2011/11/18, e para exercer, querendo, no prazo de 10 (dez) dias, o direito de audição previsto no artº 60º da LGT.
Face à ausência do direito de audição, matém-se a decisão explanada no projecto de despacho comunicado, pelo que, INDEFIRO a pretensão do reclamante manifestada em sede de reclamação com base nos demais fundamentos apresentados.
(...)” - cfr. fls. 222 do PRG;
10. A 16.12.2011, no âmbito do Processo n.º .....................994, a «X, Lda.» foi notificada da decisão de indeferimento da reclamação graciosa – cfr. fls. 227 a fls. 229 do PRG;
11. A 16.01.2012, no âmbito do Processo n.º .....................994, a «X, Lda.» apresentou recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, recurso que foi autuado sob o Processo n.º......................030 e sobre o qual não recaiu qualquer decisão - cfr. fls. 230, 325 e 326 do PRG;

Nada mais se julgou ou é de julgar provado ou não provado, tendo o Tribunal formado a sua convicção, por um lado, a partir da análise crítica de todos os documentos juntos aos autos, os quais se dão aqui por integralmente reproduzidos, que foram admitidos, não foram impugnados e se encontram especificadamente identificados em cada uma das alíneas do probatório.
Por outro lado, a partir do depoimento da testemunha «AA» («AA»), que, ao tempo dos factos, era contabilista da Impugnante, e da tomada de declarações de parte a «BB» («BB»), que, actualmente, é sócia-gerente da Impugnante, mas que, ao tempo dos factos, era apenas funcionária da Impugnante.
«AA» prestou um depoimento sério, no qual revelou segurança e convicção, mas que, no que concerne à questão da contabilização dos custos de aquisição de viaturas, não se baseou no conhecimento directo dos factos, pois era contabilista da Impugnante, mas exterior ao quadro de pessoal da mesma, ou seja, prestava à Impugnante serviços de contabilidade, pelo que o seu testemunho se baseou em papéis que a Impugnante lhe entregava e que eram necessários à elaboração da contabilidade ou escrita, e, bem assim, no que o gerente da Impugnante lhe disse a respeito dos dois fornecedores alemães, designadamente que estes “falsificaram as facturas”, acrescendo que, neste contexto, contribuiu para a formação da convicção de «AA», de que os fornecedores alemães “falsificaram as facturas”, o facto de o gerente da Impugnante lhe ter exibido o documento 43 junto à petição inicial (documento com o qual foi confrontado e que reconheceu), que se encontra redigido, veja-se, em alemão.
No demais, «AA» limitou-se a externar a sua opinião ou interpretação acerca da aplicação do regime especial de tributação da margem, especialmente no que concerne à inclusão ou não inclusão do valor do IA ou do ISV no valor de aquisição das viaturas em segunda mão.
Já «BB», a quem foram tomadas declarações de parte e que também prestou um depoimento sério, igualmente revelador de segurança e convicção, foi bastante emotiva, tendo as suas declarações, no essencial, incidido, igualmente, sobre a sua visão ou interpretação acerca da aplicação do regime especial de tributação da margem, especialmente no que concerne à inclusão ou não inclusão do valor do IA ou do ISV no valor de aquisição das viaturas em segunda mão.
No demais, declarou que os custos de aquisição das viaturas adquiridas em segunda mão aos fornecedores alemães foram sempre os constantes nas facturas cujos valores foram relevados na contabilidade e que também serviram de base à liquidação do IA ou do ISV, afirmando que foi sempre esse o procedimento da, agora, sua gerida.

**
Apreciação jurídica do recurso.

Alega a Recorrente que em face da prova testemunhal, das declarações de parte e da prova documental a decisão do tribunal tinha de ser diferente, na medida em que considera ter provado o valor real ser o que consta das faturas.
A Recorrente remete para os depoimentos, que aliás, transcreve, para além de indicar as concretas passagens, pelo que cumpre o ónus estabelecido na alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil.
Desta forma, transcrevem-se as pertinentes passagens dos depoimentos:
Depoimento de «AA»
[00:11:25]Mandatário (Dr. «HH»): Cá estão a faturas que foram objeto de correção.
[00:11:31]«AA»: Sim, tenho ideia, tenho. Tenho ideia. Não posso jurar que seja este ou que seja… Mas…

[00:17:16]Mandatário (Dr. «HH»): Muito bem. Porquê? Porquê? Porque as faturas que constam do relatório, as faturas ...94, ...96, ...99, estas faturas eram… Os valores que foram contabilizados na «X, Lda.» eram ou não eram os valores reais?
[00:17:31]«AA»: Claro que sim.
[00:17:32]Mandatário (Dr. «HH»): E porque é que o senhor diz que eram os valores reais? O que é que o senhor… Em que é que fundamenta que são esses os valores reais?
[00:17:38]«AA»: Para já são os valores que estão nas faturas, são as faturas que foram utilizadas na alfândega para despachar as viaturas e para lhes… Para pagar o IA e para pagar…
[00:17:50]Mandatário (Dr. «HH»): Então, faça favor, quer dizer aqui ao Tribunal qual é esse documento que confirma isso? Senhor doutor Juiz, já agora, posso confrontar a testemunha com o tal documento que dá origem ao pagamento da taxa, do IA? Eu tenho aqui. De exemplo. [00:18:09] Meritíssimo Juiz: Pode.
[00:18:10]Mandatário (Dr. «HH»): Já agora, o senhor… por exemplo, esta fatura, o documento 27…
[00:18:17]«AA»: Isto é uma fatura.
[00:18:18]Mandatário (Dr. «HH»): Uma fatura. Que a «X, Lda.» importou este carro por 6.850.
[00:18:23]«AA»: Sim.
[00:18:25]Mandatário (Dr. «HH»): E o que é que tem, o que é este documento aqui a seguir?
[00:18:27]«AA»: Isto é o IA, isto é o…
[00:18:31]Mandatário (Dr. «HH»): É a declaração aduaneira.
[00:18:33]«AA»: DA, a DA.
[00:18:34]Mandatário (Dr. «HH»): A DA. E o que tem aí?
[00:18:36]«AA»: Tem o valor que está na fatura, como é evidente. E todos os cálculos de impostos são calculados nesse valor.
[00:18:45]Mandatário (Dr. «HH»): Nesse valor. Portanto…
[00:18:46]«AA»: Sem dúvida nenhuma.
[00:18:48]Mandatário (Dr. «HH»): …todo o processo de importação de uma viatura tem um documento original de fornecedor e tem a DAV, a DAV…
[00:18:54]«AA»: Original… Tem a DAV… Que dá origem à legalização e à atribuição da matrícula.
[00:19:00]Mandatário (Dr. «HH»): OK, era isto que eu queria. Portanto, então o senhor confirma a este Tribunal de que os valores das faturas originais dos fornecedores «EE» e «CC» são as que estão na contabilidade da «X, Lda.».
[00:19:26]«AA»: Sim, sim.
[00:19:28]Mandatário (Dr. «HH»): Que a «X, Lda.» não adulterou nenhum desses valores?
[00:19:30]«AA»: Evidentemente que não.

[00:33:18] RFP: Uma última questão. Relativamente aos valores das faturas, relativamente aos valores das faturas que o senhor afirmou aqui que são efetivamente valores reais, o senhor diz isso porquê? Porque é que diz que são valores efetivamente reais das faturas?
[00:33:38] «AA»: Eu nunca pus em causa que os valores que vêm nas faturas que acompanham a mercadoria, que são utilizados na alfândega para fazer o despacho aduaneiro e pagamento de impostos e o tal IA para obter a matrícula, porque é que se havia de pôr em causa? E é o valor que foi pago ao fornecedor. Quer dizer, porque é que se haveria de pôr em causa o valor, o que está nas faturas? Não é… Porque é que… porquê? E mesmo a Autoridade Tributária só o deve ter feito porque de alguma forma foi alertada por as autoridades alemãs por alguma razão, eu não sei qual foi. Eu não sei o que é que despoletou isso. Não é? Porque… Porque é que se havia de pôr em causa o valor que vem nas faturas? É uma coisa que não…
[00:34:39] RFP: E o senhor também sabe de conhecimento direto de que o valor das faturas foi aquele que foi efetivamente transferido ou pago aos fornecedores alemães.
[00:34:47]«AA»: Claro.

[00:35:01] Meritíssimo Juiz: Só um esclarecimentozinho a respeito de uma coisa que disse aqui no início. Como é que o senhor sabe ou como é que obteve a informação, e cito, que o fornecedor falsificou as faturas para menos? Como é que o senhor sabe que o fornecedor falsificou?
[00:35:26] «AA»: Porque foi-me informado na altura pela «X, Lda.».
[00:35:29] Meritíssimo Juiz: Pela «X, Lda.».
[00:35:30] «AA»: Que na inspeção que tinha acontecido na Alemanha, a esse indivíduo, que tinham verificado esse facto.

Depoimento da sócia-gerente, prestado como declaração de parte «BB»:
[00:48:29]Mandatário (Dr. «HH»): O relatório, primeiro veio o projeto. [00:48:32]«BB»: Das Finanças. O que nos foi dito é que havia alterações entre as nossas faturas de compra, de aquisição das viaturas e as faturas de venda dos nossos fornecedores na Alemanha. Nós ficámos surpresos, porque é assim, o que nós acordámos referente ao valor das viaturas era o valor, porque é sempre conferido, eu até conferia isso, as faturas que vinham referente a cada viatura. Isso era sempre conferido. Quando questionámos na Alfândega os nossos, na Alemanha, os nossos fornecedores, houve um deles que foi o «EE»…
[00:49:05]Mandatário (Dr. «HH»): «EE»?
[00:49:06]«BB»: Sim, que nos enviou o documento 43 com a retificação feita, porque na verdade ele disse que fez a alteração, que era uma coisa que nós éramos completamente alheios.
[00:49:16]Mandatário (Dr. «HH»): Ele disse que fez a alteração como? Foi objeto de inspeção.
[00:49:18]«BB»: Sim, foi objeto e teve de fazer a retificação…
[00:49:22]Mandatário (Dr. «HH»): Dos impostos?
[00:49:23]«BB»: Dos impostos. Referente ao «CC», nós falámos com ele e só não obtivemos os documentos dele, da parte dele, porque ele disse que tinha havido uma insolvência da empresa e o administrador tinha levado toda a documentação e ele não tinha com nos mandar alguma coisa referente a isso.
[00:49:41]Mandatário (Dr. «HH»): Portanto, então em relação ao «EE», enviou o documento 43.
[00:49:46]«BB»: Sim.
[00:49:47]Mandatário (Dr. «HH»): Que era o documento que a Autoridade Tributária alemã fez sobre a inspeção alemã. E o «CC» também foi inspecionado…
[00:49:57]«BB»: Também foi, mas diz que não tinha documentação. [00:49:58]Mandatário (Dr. «HH»): …só que insolveu e o administrador apreendeu os documentos…
[00:50:02]«BB»: O administrador da insolvência… toda a documentação.
[00:50:05]Mandatário (Dr. «HH»): …e não tinha documentos para vos facultar. Portanto, disse-me… Já disse aqui a este Tribunal que foi enviado, e então o «EE» enviou o documento 43, não foi?
[00:50:17]«BB»: Sim.
[00:51:13]«BB»: Sim, [inaudível]. Eu acho que não, isto não posso dizer a 100% que são todas estas folhas que estão aqui, sinceramente… Mas que ele mandou o modelo e várias faturas, e eu até fiquei surpreendida há dias quando estive cá que me foi dito pela senhora doutora que essas faturas tinham sido retiradas do processo, que já não constavam no processo. Que eu não tinha conhecimento disso. Eu não consigo assim dizer assim “são estas.” É o (modelo?) 43.
[00:51:54]Mandatário (Dr. «HH»): É o documento.
[00:51:55]«BB»: Isto foi… sim.
[00:51:57]Mandatário (Dr. «HH»): Foi enviado, foi enviado da «X, Lda.».
[00:52:00]«BB»: Exatamente. E até mesmo as datas e isso. Aqui sim, aqui eu digo de certeza absoluta que é. Aqui. Isto eu sei que sim. O restante…
[00:52:09]Mandatário (Dr. «HH»): É o documento da «X, Lda.» para o meu escritório, para o meu escritório para eu fazer anexar ao processo.
[00:52:16]«BB»: Posso?
[00:52:18]Mandatário (Dr. «HH»): E depois deste documento 43, houve depois a feitura do relatório final, primeiro, houve um projeto, nós respondemos em sede de direito de audição e anexámos este documento e depois houve um relatório. A pergunta é: sabe se a Autoridade Tributária corrigiu logo algumas faturas retirando-as do projeto?
[00:52:48]«BB»: Houve, houve… As que estavam referentes ao documento 43 foram retiradas do processo.
[00:52:50]Mandatário (Dr. «HH»): Do documento… retirou-as logo?
[00:52:54]«BB»: Sim.
[00:52:55]Mandatário (Dr. «HH»): E agora a pergunta é: porque é que não retirou as outras?
[00:52:58]«BB»: Não sei.
[00:52:59]Mandatário (Dr. «HH»): Não sabe, não sabe.
[00:53:01]«BB»: Sinceramente, não sei, só a Autoridade Tributária pode responder a isso, que eu não sei.
[00:53:05]Mandatário (Dr. «HH»): Só a Autoridade. Pronto. Agora eu pergunto: os documentos que estavam na contabilidade da «X, Lda.» tanto de um fornecedor como do outro
foram ou não foram aqueles por que foram adquiridos, os valores reais?
[00:53:24]«BB»: Claro que foram aqueles que foram adquiridos. As viaturas, o que acordámos a valor, a nível de valor, cada uma das viaturas, e o que foi enviado deles para nós para a «X, Lda.». Alguns deles vinham pelo correio, a maioria deles eram entregues ao condutor do camião que trazia, da transportadora, que nos entregava em mão. E era sempre verificado, era eu que verificava isso, ainda hoje faço isso, verifico o valor da viatura, a fatura, a ver se está tudo correto.
(…)
[00:57:46]Mandatário (Dr. «HH»): São estas as faturas, não é? Documento 27. Portanto, confirma a este Tribunal que são vários os documentos. Mas vamos… O documento 27, como é que confirma que o valor desta viatura foram 6.850 e não o que a Autoridade Tributária…
[00:58:07]«BB»: Eu confirmo porque estes documentos são os documentos que nos chegaram, foi o acordado por cada viatura o valor de cada uma das viaturas. Seja esta ou qualquer uma das outras. Sendo da «X, Lda.», são estas que nos foram chegadas a nós. E o valor acordado por cada…
[00:58:20]Mandatário (Dr. «HH»): E este documento que está anexo ao documento 27 o que é?
[00:58:23]«BB»: Isto é o documento alfandegário.
[00:58:24]Mandatário (Dr. «HH»): E o valor também vai?
[00:58:26]«BB»: Tem que estar aí porque este documento é entregue na alfândega.

[00:58:59] Meritíssimo Juiz: A contraprestação em dinheiro é sempre invariavelmente o que vem na fatura que vem da Alemanha?
[00:59:03]«BB»: Sempre, sempre.
[00:59:05] Meritíssimo Juiz: Exatamente.
[00:59:05]«BB»: Exatamente.
[00:59:06] Meritíssimo Juiz: Sem desvios?
[00:59:07]«BB»: Sem desvio nenhum, sem desvio.
[00:59:12]Mandatário (Dr. «HH»): E a comprová-lo, e a comprová-lo é que houve algumas faturas que, por força do documento 43, corrigiram logo?
[00:59:21]«BB»: Aliás, senhor doutor Juiz, eu, se pudesse… Nós quando tivemos, tivemos conhecimento dessas situações, deixámos de trabalhar com esses dois fornecedores,
(…)
[01:06:51] RFP: Quando compra, quando compra, vem um valor, o valor que lá consta é o valor acordado entre o comprador e o fornecedor, é o valor da fatura?
[01:06:58]«BB»: Sim. (…)
[01:08:35] RFP: Esse pagamento era feito como? Por transferência bancária, por numerário? Quem é que o levava, se eventualmente fosse em numerário, quem é que o levava aos fornecedores?
[01:08:44] «BB»: Olhe, posso-lhe dizer em relação ao Sr. «EE», o Sr. «EE» foi várias eles próprio à empresa e fazia muita questão que fosse em numerário. E digo-lhe mais: se falar, não é só comigo, a maioria das pessoas na Alemanha, à data dos factos, não queriam transferências, não queriam cheques, não queriam nada, porque não sei como é que eles trabalhavam lá, não me pergunte que eu não sei. Mas não éramos só nós, era a maioria. Nós tínhamos uma conta-corrente com eles, com esses dois fornecedores, enviávamos, havia alturas que eu sinceramente já aqui há dias e já o podia ter visto, há umas transferências bancárias que o dinheiro fica disponível na hora na conta dos fornecedores, ficava na altura. Há algumas que foram feitas, essa transferência, 70% dos casos foi em numerário e quem levava o numerário era o transportador, o condutor das transportadoras que levava em numerário. Havia a conta-corrente e nós abatíamos esse valor. Eles recebiam lá: “Olhe, já temos cá o dinheiro, vamos abater à conta-corrente.”
[01:09:42] RFP: Portanto, se havia conta-corrente quer dizer que o valor da fatura, ou melhor, o valor que era entregue muitas vezes não correspondia ao valor da fatura? Sendo uma conta-corrente.
[01:09:50]«BB»: Não, não, não.
[01:09:51] RFP: Ai, portanto, havia ali uma margem de…?
[01:09:53]«BB»: Por exemplo, nós mandávamos 20 ou 30 ou 15 ou 10 e era abatido. Se tínhamos uma conta-corrente de 20.000, não era por fatura, era abatido à conta-corrente.

Conforme se pode verificar pelo que acima ficou transcrito, o depoimento de «AA», reporta-se sempre aos documentos que lhe foram apresentados e ao que lhe foi dito pela Impugnante. Portanto não assistiu aos termos dos negócios, aos pagamentos, não teve contacto com os fornecedores, nem alguma intervenção direta ou sequer indireta na formação dos preços constantes das faturas.
Para além disso, o depoimento não se revelou consistente, conforme se observa logo no início da parte acima transcrita, quando refere: Sim, tenho ideia, tenho. Tenho ideia. Não posso jurar que seja este ou que seja… Mas…
Depois refere que não pôs em causa o valor que vem nas faturas (o que corrobora que não presenciou a negociação em apreço), mas acaba por referir que a Autoridade Tributária foi alertada pelas autoridades alemãs, por alguma razão, que desconhece, esclarecendo, quando inquirido pelo Juiz, que soube através da Impugnante, que o fornecedor falsificou as faturas para menos, conforme a inspeção realizada na Alemanha, que verificou essa situação.
Portanto, a testemunha dá a sua interpretação das faturas, antes de saber da inspeção realizada na Alemanha, sendo que acaba por corroborar que as faturas que a inspeção alemã detetou, eram faturas com valores inferiores.
Em face deste depoimento, não é possível alterar a matéria de facto.

No que concerne ao depoimento da sócia-gerente, começa por referir que tem interesse na causa e acaba por dizer que efetuava 70% dos pagamentos em numerário. Ora, não obstante, dizer que conferia as faturas, a partir do momento em que refere pagamentos em numerário, não é mais possível saber ao certo o que é que se pagou e qual o exato valor das transações.
Por sua vez, no Relatório de Inspeção (vide ponto 5 da matéria de facto, para esta situação, pág. 13 da Sentença) referem-se pagamentos superiores aos valores das compras realizadas a «EE», sendo que a Impugnante não logra explicar estas discrepâncias, sendo que agora a depoente menciona pagamentos em numerário, pelo que se os pagamentos eram superiores ao que consta nas faturas e registado na contabilidade e ainda há pagamento em numerário, alguma coisa não bate certo.
Como é necessário demonstrar a veracidade das faturas, ou melhor, dos valores exarados nas faturas, não se pode considerar que tais pagamentos possam ser comprovados por depoimento, na medida em que, na atualidade são usadas formas de pagamento facilmente documentável, como transferências bancárias.
Para além disso, o depoimento também não explica outras discrepâncias mencionadas no Relatório de Inspeção, como o registo de compras a particulares, mas registadas em nome dos fornecedores «EE» e «CC». No demais o depoimento revela-se genérico.
Portanto, com este depoimento não fica demonstrada a exatidão dos pagamentos, pelo que não se pode considerar comprovada a veracidade dos valores constantes das faturas.
Desta forma, também não é possível alterar a matéria de facto, com este depoimento.

Alega, ainda, a Recorrente que faz prova através de todos os documentos por si carreados para o processo, nomeadamente com a resposta ao direito de audição, com a reclamação graciosa e com a impugnação judicial, não foram pela Fazenda Pública impugnados, pelo que se consideram como provados.
Ora, a remissão genérica para todos os documentos carreados no processo, no direito de audição e na reclamação graciosa, não é forma processual de sindicar a matéria de facto. Ou seja, a Recorrente é obrigada a identificar cada um dos documentos mediante os quais pretende contrariar a matéria de facto o que deseja sejam dados como provados, indicando as concretas páginas onde se encontram e identificando concretamente cada um desses documentos, conforme determina a alínea b) do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil.
Veja-se sobre o assunto o que escreve o Conselheiro Abrantes Geraldes, em Recursos em Processo Civil, (6.ª edição, 2020, ed. Almedina), em anotação ao artigo 640.º do Código de Processo Civil, a págs. 196-197, onde refere:
«Sem nos alongarmos demasiado com considerações sobre os regimes anteriores, podemos sintetizar da seguinte forma o sistema que agora vigora sempre que o recurso de apelação envolva a impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões.
b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova, constantes do processo ou que nele tenham sido registados, que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos.
A pág. 199 e 200, refere o seguinte:
5. A rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em algumas das seguintes situações:
(…)
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.).
(…)
As referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor.».

Não logrando cumprir o mencionado preceito, o recurso, nesta parte é rejeitado.
*
Estabilizada, assim, a matéria de facto conforme consta da Sentença, cumpriria apreciar a parte de direito.
Sucede que, conforme decido neste processo no Acórdão proferido em 16/05/2022, as conclusões D), S), YY) DDD), EEE) e KKK), foram rejeitadas por não se mostrarem sintetizadas.
Desta forma, apenas se pode apreciar o que está alegado nas conclusões não rejeitadas, sendo a questão que se coloca é a de saber se o anterior IA ou o atual ISV, deve ser incluído no valor de aquisição das viaturas em segunda mão que a Impugnante vendeu em território nacional, entendendo a Recorrente que andou bem ao incluir, no preço de aquisição das viaturas usadas adquiridas no ano de 2007, o IA ou o ISV.
A Sentença recorrida decidiu sobre esta matéria, da seguinte forma:
«Está em causa a interpretação e aplicação do “Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão, Objectos de Arte, de Colecção e Antiguidades”, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 199/96, de 18 de Outubro, que procedeu, entre o mais e em matéria de harmonização comunitária, à transposição para a ordem jurídica nacional da Directiva n.º 94/5/CE, do Conselho, de 14.02.1994, relativa à tributação, em IVA, das transmissões de bens em segunda mão, de objectos de arte, de colecção e de antiguidades, estabelecendo o “Regime Especial de Tributação da Margem” (doravante “RETM”).
Consigna o artigo 1.º do RETM que “Estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado, segundo o regime especial de tributação da margem, as transmissões de bens em segunda mão, de objectos de arte, de colecção e de antiguidades, efectuadas nos termos deste diploma, por sujeitos passivos revendedores ou por organizadores de vendas em leilão que actuem em nome próprio, por conta de um comitente, de acordo com um contrato de comissão de venda.”.
Dispondo o artigo 4.º, n.º 1, do RETM que “O valor tributável das transmissões de bens referidas no artigo anterior, efectuadas pelo sujeito passivo revendedor, é constituído pela diferença, devidamente justificada, entre a contraprestação obtida ou a obter do cliente, determinada nos termos do artigo 16.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, e o preço de compra dos mesmos bens, com inclusão do imposto sobre o valor acrescentado, caso este tenha sido liquidado e venha expresso na factura ou documento equivalente.”.
Dos citados normativos decorre que o RETM é aplicável às transmissões de bens
em segunda mão efectuadas por sujeitos passivos revendedores (cfr. artigo 1.º do regime), sendo que, neste caso, o valor tributável, para efeitos de IVA, é constituído pela diferença entre o valor da contra-prestação a obter, do seu cliente, pelo sujeito passivo revendedor e o valor da compra do bem revendido (cfr. artigo 4.º, n.º 1, do regime).
Não pode ignorar-se que o Decreto-Lei n.º 199/96, de 18 de Outubro, do qual emanam as sobreditas normas, visou, entre o mais, a transposição para a ordem jurídica interna da Directiva n.º 94/5/CE, do Conselho, de 14.02.1994, relativa à tributação, em IVA, das transmissões de bens em segunda mão, tendo em vista, nesta matéria, a harmonização do direito comunitário.
Significa isto que o conteúdo, a extensão e o alcance da expressão “(…) valor de compra (…)”, contida na norma do artigo 4.º, n.º 1, do RETM, devem ser encontrados à luz da Directiva n.º 94/5/CE, do Conselho, de 14.02.1994, sob pena de violação do Direito Comunitário.
Assim, o n.º 3 do artigo 1.º da Directiva n.º 94/5/CE, do Conselho, de 14.02.1994, aditou à Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17.05.1977, relativa, entre o mais, ao sistema comum do IVA e, em concreto, à uniformização da matéria colectável, o artigo 26.º-A (“Regime especial aplicável aos bens em segunda mão, aos objectos de arte e de colecção e às antiguidades”), cuja alínea B (“Regime especial dos sujeitos passivos revendedores”), n.º 3, assim estabelece:
“(…)
3. A matéria colectável das entregas de bens referidas no n.º 2 é constituída pela margem de lucro realizada pelo sujeito passivo revendedor, deduzido o montante do imposto sobre o valor acrescentado correspondente à própria margem de lucro. Esta margem de lucro é igual à diferença entre o preço de venda solicitado pelo sujeito passivo revendedor para os bens e o seu preço de compra.
Para efeitos do presente número, entende-se por:
- preço de venda, tudo o que constitua a contrapartida obtida ou a obter pelo sujeito passivo revendedor da parte do comprador ou de um terceiro, incluindo as subvenções directamente ligadas a essa operação, os impostos, direitos, contribuições e taxas, as despesas acessórias, tais como as despesas de comissão, embalagem, transporte e seguro cobradas pelo sujeito passivo revendedor ao comprador, com exclusão dos montantes referidos no ponto A, n.º 3, do artigo 11.º,
- preço de compra, tudo o que constitua a contrapartida definida no primeiro travessão, obtida ou a obter do sujeito passivo revendedor pelo seu fornecedor.
(…)”.
*
Da inclusão do IA ou do ISV no valor de aquisição dos automóveis
Das sobreditas definições, resulta claro que o preço de compra corresponde à contra-prestação obtida ou a obter pelo fornecedor do comprador, ou seja, do sujeito passivo revendedor.
Sendo que o valor dessa contraprestação pode incluir “(…) os impostos, direitos, contribuições e taxas (…)”, desde que, como resulta da norma, o valor dos mesmos seja devido ao fornecedor pelo sujeito passivo revendedor e a este cobrado por aquele.
Contudo, o valor do IA ou do ISV não é devido pelo sujeito passivo revendedor dos bens em segunda mão ao fornecedor dos mesmos, posto não ser este quem, no momento da transacção, o liquida e cobra ao sujeito passivo revendedor.
De facto, na aquisição intracomunitária de bens em segunda mão, designadamente de automóveis em segunda mão, tendo em vista a sua revenda, em território nacional, por sujeito passivo de IVA revendedor com sede em território nacional, o IA ou o ISV é devido pelo desalfandegamento dos automóveis em segunda mão, pelo que, sendo um imposto nacional, é devido ao Estado Português e não ao fornecedor dos automóveis em segunda mão, com residência ou sede em outro Estado-Membro da União Europeia.
Donde, para efeitos de aplicação do RETM, em concreto, para apuramento do valor tributável, o montante suportado ou pago pelo sujeito passivo revendedor a título de IA ou de ISV não integra o preço de compra, porquanto o valor do IA ou do ISV não integra e não pode integrar o valor da contraprestação obtida ou a obter pelo fornecedor dos automóveis em segunda mão.
Neste sentido, a jurisprudência emanada dos tribunais superiores é abundante, pacífica e consolidada, podendo ver-se “inter alias”, o acórdão proferido pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo a 14.01.2015, no Processo n.º 033/14, no qual se deixou dito o seguinte:
“(…) a interpretação e aplicação do conceito de “preço de compra” a que se refere o artigo 4.º n.º 1 do Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão, Objectos de Arte, de Coleção e Antiguidades, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 196/96, de 18 de Outubro, que transpôs para a ordem jurídica nacional a Directiva 94/5/CE, do Conselho, de 14 de Fevereiro, aditando à Sexta Directiva o seu artigo 26.º-A, tem de ser feita em conformidade com a legislação comunitária aplicável, pois que de conceito comunitário se trata, não havendo liberdade do legislador nacional, ou do intérprete, na definição do seu conteúdo.
Ora, o conceito de “preço de compra”, como o de “preço de venda”, para efeitos de determinação do valor tributável em IVA no âmbito do Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão, Objectos de Arte, de Colecção e Antiguidades (correspondente ao designado regime da margem de lucro), foi ab initio definido na legislação comunitária (cfr. o n.º 3, segundo travessão, do artigo 26.º-A da Sexta Directiva), e corresponde a «tudo o que constitua a contraprestação definida no ponto 1), obtida ou a obter do sujeito passivo revendedor pelo seu fornecedor (cfr. artigo 312.º, 2) da Directiva IVA, correspondendo ao n.º 3, segundo travessão do artigo 26.º-A da Sexta Directiva – sublinhados nossos).
Da referida definição comunitária - da qual a legislação nacional não se pode apartar sob pena de ilegalidade por violação do direito europeu pertinente -, decorre que, não sendo o valor do IA devido pelo desalfandegamento dos automóveis usados adquiridos em Estado-membro pago pelo revendedor ao seu fornecedor, antes o sendo ao Estado português (pois que de imposto nacional se trata), o valor deste imposto não pode incluir-se no “preço de compra” para efeitos de aplicação do artigo 4.º, n.º 1 do Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão, Objectos de Arte, de Colecção e Antiguidades, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 196/96, de 18 de Outubro.
(…)”.
No mesmo sentido, podem ainda ver-se, entre muitos outros, os acórdãos proferidos pelo mesmo STA a 8.06.2005, 07.03.2007, 14.11.2007 e 13.04.2011, nos processos n.ºs 1958/03, 647/06, 0507/07 e 016/10, respectivamente.
Assim, no caso em apreço, não resultando controvertido que a Impugnante, sujeito passivo revendedor de automóveis em segunda mão, procedeu à inclusão do valor do IA ou do ISV, devido ao Estado Português pelo desalfandegamento dos automóveis em segunda mão, no valor da compra, isto é, no valor devido ao seu fornecedor a título de contraprestação por este obtida ou a obter pela venda, à Impugnante, dos automóveis em segunda mão, resta concluir que, neste particular, as liquidações adicionais de IVA impugnadas não merecem censura, posto que, deste modo, o valor da margem foi diminuído em montante igual ao que foi suportado a título de IA ou ISV, sendo devido IVA, à taxa legal, sobre este montante.
Isto, sem prejuízo de a Impugnante poder reflectir no preço de revenda dos automóveis em segunda mão o valor suportado a título de IA ou de ISV, como decorre da definição de “preço de venda” ínsita na Directiva n.º 94/5/CE, do Conselho, de 14.02.1994, e do artigo 16.º do CIVA.
Face ao que fica dito e neste particular, as liquidações adicionais de IVA que constituem o objecto da presente impugnação judicial não merecem qualquer censura.» [Fim de transcrição].

Temos de concordar com sentenciado, na medida em que o Imposto Automóvel (IA) ou o seu substituto (o ISV – Imposto Sobre Veículos), não tem a ver com o valor de venda do veículo, ou seja, não são componentes do preço de custo do veículo, para efeitos da determinação desse valor tributável.
A tributação de IA/ISV, tem antes a ver com outras realidades que o legislador entendeu tributar.
Assim, no IA, a tributação reportava-se ao registo da matrícula, conforme estabelecia o n.º 1 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 40/93, de 18 de fevereiro. O que significa que o imposto é devido por quem requer a atribuição de matrícula e não por quem vende o veículo, nem é devido antes desse pedido de matrícula. Vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 01/10/2003, tirado no processo n.º 0956/03 (em www.dgsi.pt), que refere:
I - O imposto automóvel é devido pelo requerente da atribuição de matrícula nacional ao respectivo veículo automóvel - nºs. 1 dos artºs. 1 e 3 do dec-lei 40/93, de 18 Fev.

Por sua vez, o ISV tributa os contribuintes na medida dos custos que estes provocam nos domínios do ambiente, infraestruturas viárias e sinistralidade rodoviária, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária (vide artigo 1.º do Código de Imposto sobre Veículos).
Portanto, a faturação de veículos usados importados de outro Estado membro da União Europeia, não deve conter IA ou ISV, pois estes impostos especiais não tributam a venda do bem, mas as outras realidades acabadas de referir.
Neste sentido veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 28/10/2020, proferido no processo n.º 0817/09.0BEVIS 0392/15 (disponível em www.dgsi.pt), cujo sumário contém o seguinte teor:
I - O revendedor de automóveis que, para efeitos de determinação do valor tributável em IVA, haja incluído o valor do IA (Imposto Automóvel) no preço de compra dos automóveis vendidos, viola o disposto no art. 4º nº 1 do “Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão (D.L. nº 199/96, de 18-10).
II - No preço de compra não se inclui o Imposto Automóvel, pois este é pago em Portugal e a aquisição dos veículos ocorreu no estrangeiro, sendo que, no exercício de um poder de conformação normativa em consonância com os fins visados na tributação de bens em segunda mão, o legislador decidiu incluir o IA no preço de venda, segundo a regra geral de determinação do valor tributável das transmissões de bens e das prestações de serviços.

No mesmo sentido veja-se o Acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 11/11/2021, proferido no processo n.º 00330/11.6BEAVR (em www.dgsi.pt), cuja parte do sumário, para análise do tema aqui em causa se transcreve:
III. Verifica a violação do disposto no n.º 1 do artigo 4.º do “Regime Especial de Tributação dos Bens em Segunda Mão” (Decreto-Lei n.º 199/96, de 18-10-1996) quando o revendedor de automóveis que, para efeitos de determinação do valor tributável em IVA, incluída o valor do IA (Imposto Automóvel) no preço de compra dos automóveis vendidos.

Em face do exposto, também quanto ao direito improcede o recuso.
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No concerne a custas, atenta a improcedência total do recurso, é a Recorrente a responsável pelas custas do recurso – vide artigo 527.º, nos. 1 e 2 do e 529.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
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Nos termos do n.º 7 do artigo 663.º do Código de Processo Civil, elabora-se o seguinte sumário:
I – Os depoimentos para serem valorados devem ser diretos, claros e precisos.
II – A remissão para prova documental sem identificar concretamente qualquer documento, não é modo aceitável de recurso, implicando a sua rejeição nessa parte.
III - A faturação de veículos usados importados de outro Estado membro da União Europeia, não deve conter IA ou ISV, pois estes impostos especiais não tributam a venda do bem, mas o registo de matrícula no caso do IA e o ISV tributa os contribuintes na medida dos custos que estes provocam nos domínios do ambiente, infraestruturas viárias e sinistralidade rodoviária, em concretização de uma regra geral de igualdade tributária.
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Decisão
Termos em que, acordam em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
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Custas a cargo da Recorrente.
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Porto, 12 de setembro de 2023.

Paulo Moura
Vítor Salazar Unas
Ana Patrocínio