Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00687/11.9BEAVR-A
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/22/2023
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Margarida Reis
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADOS;
JUROS INDEMNIZATÓRIOS;
ELENCO TAXATIVO DO ART. 43.º DA LGT;
Sumário:I. Os juros indemnizatórios, cujo regime substantivo se encontra previsto no supracitado art. 43.º da LGT, não constituem senão um meio expedito e, por assim dizer, automático, de indemnizar o lesado, independentemente de qualquer alegação e prova dos danos sofridos.

II. O elenco de situações previstas no art. 43.º da LGT em que o legislador aceita serem devidos juros indemnizatórios, é taxativo.

III. Tal não significa que todas as situações passíveis de ressarcimento por prejuízos causados pela prática de atos da Administração tributária ali estejam previstas, devendo o contribuinte, nos casos não contemplados naquela norma, lançar mão de ação de efetivação da responsabilidade civil, nela fazendo prova dos correspondentes requisitos.

IV. Não cabe no âmbito da previsão do art. 43.º da LGT a circunstância em apreço, em que o Recorrente pretende ser ressarcido pelo retardamento do reembolso de pagamentos especiais por conta, mas na ação objeto de execução de julgados não foi apreciada a pertinência do correspondente pedido de reembolso, efetuado nos termos do disposto no então n.º 3 do art. 87.º do CIRC, não sendo por isso devidos juros indemnizatórios.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório
«X, SGPS, S.A.», inconformada com a sentença proferida em 2022-12-20 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou improcedente a ação de execução de sentença proferida no processo de impugnação n.º 687/11.9BEAVR, na qual peticionara (i) o pagamento de juros indemnizatórios no montante total de EUR 71.620,65 e (ii) a fixação de um prazo para a Executada dar cumprimento à sentença e a condenação, na pessoa da sua Diretora-Geral, no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso para além desse prazo, vem dela interpor o presente recurso.
A Recorrente encerra as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
CONCLUSÕES
A. O presente recurso tem por objeto a sentença de 20.12.2022 do M.mo Juiz do TAF de Aveiro, que julgou a ação de execução de julgados improcedente, absolvendo a Autoridade Tributária do pedido de pagamento de juros indemnizatórios.
B. O M.mo Juiz do Tribunal a quo entendeu que a sentença exequenda não poderia constituir título executivo para o pagamento de juros indemnizatórios sobre o valor dos PEC cujo reembolso a ora recorrente requerera em 2008 e 2009, posto que a sentença exequenda não definia sequer o direito ao reembolso dos PEC, tendo como objeto, exclusivamente, a legalidade dos atos de liquidação de taxas de inspeção.
C. Porém, salvo o devido respeito, não se vê por que razão a sentença exequenda teria de definir o direito ao reembolso dos PEC para que a Autoridade Tributária se visse constituída no dever de restabelecer a situação atual hipotética da ora recorrente, designadamente através do pagamento de juros indemnizatórios.
D. Esse dever decorria já da lei – mais precisamente, dos artigos 173.º do CPTA e 100.º da LGT.
E. A abertura destas normas não implica que todas as consequências e obrigações decorrentes da anulação de um ato tributário devam ser fixadas em sentença judicial, sob pena de esta nunca poder valer como título executivo pleno, em toda a extensão que os artigos 100.º da LGT e 173.º do CPTA impõem.
F. Com efeito, resulta dos artigos 176.º e 179.º do CPTA que é na própria ação executiva que se hão de definir os atos e operações necessários ao cumprimento do dever de executar a sentença de anulação, pelo que não tem razão o M.mo Juiz do Tribunal a quo quando conclui pela falta de título executivo.
G. Para rejeitar o pedido de juros indemnizatórios deduzido pela ora recorrente o M.mo Juiz do Tribunal a quo considerou ainda que a definição do direito ao reembolso dos PEC cabia à Autoridade Tributária e não aos Tribunais.
H. Porém, salvo o devido respeito, ao tempo da instauração da ação executiva, a questão da definição do direito da ora recorrente ao reembolso dos PEC já se encontrava resolvida e definitivamente cristalizada, tendo a Autoridade Tributária procedido ao reembolso dos PEC em 14.06.2021.
I. Independentemente disso, sempre se dirá que, contrariamente ao que considerou o M.mo Juiz do Tribunal a quo, o reconhecimento do direito ao pagamento de juros indemnizatórios não depende do reconhecimento judicial do direito ao reembolso de uma quantia pecuniária, mas sim da verificação de uma situação de ilegalidade imputável aos serviços.
J. No presente caso não é controversa nem a ilegalidade dos atos de liquidação das taxas de inspeção tributária, nem a circunstância de a Autoridade Tributária ter condicionado o reembolso dos PEC ao pagamento dessas taxas ilegais, tendo a sentença exequenda reconhecido que a Autoridade Tributária não poderia ter exigido o seu pagamento.
K. Impunha-se, assim, a conclusão de que a Autoridade Tributária não poderia ter arquivado os pedidos de reembolso dos PEC com fundamento na falta de pagamento das taxas de inspeção tributária, como aconteceu.
L. A reparação do prejuízo sofrido pela ora recorrente – decorrente da circunstância de o reembolso dos PEC apenas ter ocorrido passados mais de 10 anos desde o respetivo pedido – passa necessariamente pelo pagamento de juros indemnizatórios, pois só assim pode a Autoridade Tributária restabelecer a situação que existiria se os atos tributários objeto da sentença exequenda não tivessem sido praticados.
M. Não havia, em suma quaisquer obstáculos, à declaração do direito da ora recorrente ao pagamento de juros sobre os PEC indevidamente retidos pelo Estado.
N. A sentença ora recorrida, que decidiu de modo diverso, incorreu, pois, em erro de julgamento, por violação do disposto nos artigos 100.º da LGT e 173.º do CPTA.
Termina pedindo:
Nestes termos, e nos demais de direito que V. Exas doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado inteiramente procedente, revogada a douta decisão e, em sua substituição, proferido acórdão que condene a Autoridade Tributária no pagamento dos juros indemnizatórios oportunamente peticionados, com todas as consequências legais.
***
A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais conclui como se segue:
CONCLUSÕES
A) está em causa nestes autos a execução da Sentença proferida por este Tribunal no Proc.º n.º 687/11.9BEAVR., que condena a AT., na apreciação dos pedidos de reembolso de PEC, sem dependência do pagamento da requerida taxa inspetiva;
B) e que anulou as taxas de inspeção que foram exigidas no procedimento de reembolso dos PECs., 2003/2004;
C) entendeu acertadamente o Tribunal “a quo” que “o direito ao pagamento de juros indemnizatórios só pode integrar as consequências jurídicas de uma sentença que defina o próprio direito ao reembolso de uma quantia pecuniária”;
e
D) continuando esclarecidamente a dizer que, “a sentença exequenda não se pronunciou, nem podia pronunciar-se, sobre o mérito dos pedidos de reembolso, pois a impugnação intentada pela Exequente tinha exclusivamente como objeto a legalidade dos atos de liquidação das taxas”;
E) conclui muito corretamente que “a sentença exequenda não constitui título executivo para o pagamento de juros indemnizatórios pelo alegado atraso na realização do reembolso das quantias entregues pela Exequente a título de pagamentos especiais por conta, pois dela não emerge sequer o direito a tal reembolso”;
F) Com efeito, o que estava em causa nos autos era a restituição do PEC., não estando em causa o direito da AT., à liquidação de qualquer imposto;
G) o reconhecimento do direito à restituição dos PEC impunha que fosse realizado um procedimento inspetivo, o qual foi concretizado dentro do prazo para execução da decisão judicial;
H) a emissão da nota de crédito (restituição do PEC) teve lugar em 2021/06/08;
I) não está consignada no ordenamento jurídico qualquer norma que preveja a atribuição de juros indemnizatórios pelo reembolso dos PEC.;
J) os juros indemnizatórios destinam-se a compensar o contribuinte pelo prejuízo causado pelo pagamento indevido de uma prestação tributária ou pelo atraso na restituição oficiosa de tributos;
K) da análise do n.º 1 do art.º 43.º da LGT resulta que o direito a juros indemnizatórios depende de ter ficado demonstrado no processo de reclamação graciosa ou impugnação judicial, que um ato de liquidação de um tributo está afetado por erro - sobre os pressupostos de facto ou de direito - imputável aos serviços, de que tenha resultado pagamento de dívida tributária de montante superior ao legalmente devido, o que não verifica no caso em apreço;
e
L) não se está perante a anulação de um qualquer imposto que tenha como causa o erro de facto ou de direito cometido pela AT, ou perante o incumprimento de um prazo legalmente estabelecido para a AT restituir os PEC.;
pelo contrário,
M) estamos perante um caso em que é o sujeito passivo que deve respeitar determinado prazo para obter a dedução dos PEC, donde inexistir qualquer conduta ilícita por parte da AT tendo por base um eventual atraso na restituição dos PEC.;
N) o caso “sub-judice” também não se enquadra na al. a), do n.º 3, do art.º 43.º, da LGT., atendendo ao facto de não se tratar de uma restituição oficiosa de tributo;
O) é que as situações abrangidas nesta alínea apenas se traduzem nos casos em que houve excessiva retenção na fonte ou pagamentos por conta, conforme previsto nos art.ºs 96.º, do CIRS e 96.º, n.º 5, do CIRC., bem como no caso dos reembolsos de IVA., não serem efetuados no prazo legal (n.º 8, do art.º 22.º, do CIVA), pelo que o pedido de restituição dos PEC não se subsume nesta norma;
P) a AT., já deu prossecução ao determinado na Sentença exequenda com a anulação das taxas de inspeção tributária liquidadas no procedimento de reembolso dos pagamentos especiais por conta (PEC) relativos aos exercícios de 2003 e 2004., na verdade apreciou e deferiu os pedidos de reembolso de PEC., e restituiu os ditos PECs., sem a dependência do pagamento da taxa ordenada anular pela Sentença;
Q) a Sentença Exequenda de 22-03-2021, que anulou as liquidações das taxas de inspeção tributária do procedimento de reembolso do PEC., exercícios 2003 e 2004, já se encontra plenamente executada, quer nos seus efeitos imediatos, a anulação propriamente dita das taxas liquidadas, com a apreciação dos pedidos sem dependência de taxa, quer nos seus efeitos mediatos, com a restituição dos PECs., requeridos;
R) e pelas razões supra expendidas não há lugar ao pagamento de quaisquer juros indemnizatórios, vista a total inexistência de base legal para a sua imputação, pois nem sequer é concebível a ilegalidade que deles seja a causadora.
S) Em abono desta tese vide a Jurisprudência constante do Ac. do STA., de 06-06-2020, proferido no processo n.º 01650/10.2BEPRT., onde extensivamente nos louvamos, que corrobora a posição aqui defendida.
T) Deve, portanto, ser mantida vigente na Ordem Jurídica a Sentença ora recorrida que julga improcedente a pretensão a juros indemnizatórios, no caso “sub judice”, e porque está isenta da violação de qualquer norma jurídica.
Termina pedindo:
Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Ex.ª, deverá o presente Recurso ser julgado totalmente improcedente e a Sentença ser mantida vigente por não enfermar de qualquer dos vícios que lhe está imputado, por julgar corretamente os factos e estar em consonância com o Direito, e tudo com custas a cargo do Recorrente, por ter dado indevidamente causa ao Recurso, com o que se fará a Sã, Serena e Costumada JUSTIÇA.
***
Notificada a Digna Magistrada do M.º Público, nos termos e para os efeitos do artigo 146.º, n.º 1 do CPTA, a mesma nada veio requerer ou promover.
***
Os vistos foram dispensados, com a prévia anuência dos Ex.mos Juízes-Adjuntos.
***

Questões a decidir no recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, tal como decorre do disposto nos arts. 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do Código de Processo Civil (CPC), disposições aplicáveis, no caso, ex vi art. 281.º do CPPT.
Assim sendo, no caso em apreço, atentos os termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela Recorrente, a questão a decidir é se a sentença incorreu num erro de julgamento ao concluir que a reparação do prejuízo que em causa, decorrente da circunstância de o reembolso dos PEC ter ocorrido passados mais de 10 anos desde o respetivo pedido, não implica o pagamento de juros indemnizatórios

II. Fundamentação
II.1. Fundamentação de facto
Na sentença prolatada em primeira instância consta a seguinte decisão da matéria de facto, que aqui se reproduz na íntegra:
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Com relevância para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
1. Em 27.08.2008 e em 09.06.2009, invocando o disposto no artigo 87.º n.º 3 do Código do IRC, a Exequente requereu ao Diretor Geral dos Impostos o reembolso dos pagamentos especiais por conta referentes aos exercícios de 2003 e 2004, nos montantes de € 91.942,04 e € 64.332,10, respetivamente – cfr. teor da sentença, de fls. 115 a 124 do sitaf do processo n.º 687/11.9BEAVR, e teor da informação, de fls. 27 a 31 do sitaf;
2. Mediante ofício datado de 15.12.2009, os serviços da Direção de Finanças ... notificaram a Exequente para proceder ao pagamento de taxas pela realização de inspeção tributária, nos montantes de € 61.436,03 e € 64.616,27, sob cominação de arquivamento dos pedidos de reembolso mencionados no ponto anterior – cfr. informação, despacho, ofício e guias de pagamento, de fls. 23 a 31 do sitaf;
3. Mediante correio registado em 06.09.2011, a Exequente apresentou impugnação judicial contra os atos de liquidação das taxas, que correu termos neste Tribunal sob o n.º 687/11.9BEAVR – cfr. petição inicial e comprovativo de registo, de fls. 2 a 16 do sitaf do processo n.º 687/11.9BEAVR;
4. Em 22.03.2021, no âmbito da ação mencionada no ponto anterior, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
“[…] julgo a presente ação totalmente procedente, e, em consequência, anulo as liquidações das taxas de inspeção tributária do procedimento de reembolso dos PECs dos exercícios de 2003 e 2004 aqui impugnadas, no montante global de € 126.052,30, com as demais consequências legais; […]”
cfr. sentença, de fls. 115 a 124 do sitaf do processo n.º 687/11.9BEAVR;
5. Notificadas da sentença mediante comunicações eletrónicas enviadas em 22.03.2021, as partes não interpuseram recurso – cfr. ofícios, a fls. 125 e 126 do sitaf do processo n.º 687/11.9BEAVR e por consulta à integralidade desse processo;
6. Em 01.06.2021, os serviços da Direção de Finanças ... elaboraram informação e parecer a propor o reembolso dos pagamentos especiais por conta referentes à Exequente e aos anos de 2003 e 2004, nos montantes de € 91.942,04 e € 67.077,04, respetivamente – cfr. informação e parecer, de fls. 107 a 114 do sitaf;
7. Em 08.06.2021, os serviços da Administração Tributária emitiram as notas de crédito para reembolso dos pagamentos especiais por conta referentes aos exercícios de 2003 e 2004, nos montantes mencionados no ponto anterior – cfr. dados do sistema informático da Administração Tributária, a fls. 104 e 105 do sitaf;
8. Mediante correio registado em 17.09.2021, a Exequente dirigiu ao Diretor de Finanças ... um pedido de pagamento de juros indemnizatórios, no montante de € 71.620,65, mencionando que os juros “se vencerem desde a data do arquivamento dos pedidos de reembolso dos PEC – 01.01.2010 – até ao respetivo reembolso efetivo – 14.06.2021” – cfr. requerimento e comprovativo de registo, de fls. 96 a 102 do sitaf;
9. Em 09.06.2022, foi proferida decisão de indeferimento do pedido de pagamento de juros indemnizatórios – cfr. informações e despachos, de fls. 65, 66 e 69 a 74 do sitaf;
10. Mediante correio registado em 14.06.2022, os serviços da Direção de Finanças ... comunicaram à Exequente a decisão de indeferimento mencionada no ponto anterior – cfr. ofício e comprovativo de registo, a fls. 63 e 64 do sitaf.
*
Não se deram como provados ou não provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.
Os factos foram dados como provados com base na análise crítica dos documentos e informações oficiais constantes dos presentes autos e do processo principal n.º 687/11.9BEAVR, conforme se encontra especificado em cada um dos pontos do probatório.
***
II.2. Fundamentação de Direito
Importa apreciar se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito ao ter concluído que a reparação do prejuízo sofrido pela Recorrente, e que decorre da circunstância de o reembolso dos pagamentos especiais por conta referentes aos exercícios de 2003 e 2004 apenas ter ocorrido passados mais de 10 anos desde o respetivo pedido, não implica o pagamento de juros indemnizatórios.
Em causa está a ação de execução de julgado da sentença proferida pelo TAF de Aveiro em 22 de março de 2021 na impugnação judicial n.º 687/11.9BEAVR interposta pela aqui Recorrente, então com a designação social «W, SGPS, S.A.».
A impugnação judicial n.º 687/11.9BEAVR teve por objeto a decisão da Diretora de Serviços do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, que indeferiu o recurso hierárquico apresentado contra a decisão do Diretor de Finanças ... que, por sua vez, indeferiu a reclamação graciosa apresentada contra os atos de liquidação de taxas de inspeção tributária do procedimento de reembolso do PEC, e, de forma mediata, as referidas taxas de inspeção, tendo a aqui Recorrente ali peticionado a final que fosse “… declarada indevida qualquer taxa em contrapartida da inspeção tributária a que se refere a alínea b) do n.º 3 do art.º 87.º (atual 93.º) do Código do IRC e declarados ilegais e anulados os atos de liquidação das taxas aqui impugnados, com todas as consequências legais.”.
As taxas ali impugnadas, e subsequentemente anuladas, foram-lhe exigidas como condição para que se desse andamento ao procedimento inspetivo conducente à verificação dos requisitos para o reembolso dos PEC em causa, pelo que da sua anulação apenas resultou a constatação de que tais taxas eram ilegais e consequentemente, indevidas.
No entanto, nada foi ali apreciado ou decidido quanto à pertinência do pedido de reembolso dos PEC, efetuado nos termos do disposto no então n.º 3 do art. 87.º do CIRC (posteriormente renumerado 93.º).
Assim sendo, desde já se antecipa que a Recorrente não tem razão.
Se não, vejamos.
Dispunha-se no art. 43.º da LGT, na parte pertinente, então como agora, o seguinte:
Artigo 43.º
Pagamento indevido da prestação tributária
1 - São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
2 - Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.
3 - São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:
a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;
b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30.º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;
c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.
(…)
Os juros indemnizatórios, cujo regime substantivo se encontra previsto no supracitado art. 43.º da LGT, não constituem senão “…um meio expedito e, por assim dizer, automático, de indemnizar o lesado. Independentemente de qualquer alegação e prova dos danos sofridos, ele tem direito à indemnização ali estabelecida, traduzida em juros indemnizatórios nos casos incluídos na previsão. Juros que, previstos como estão na lei, a Administração pagará, mesmo sem que externamente a isso seja constrangida, só porque deve obediência à lei.” (cf. Acórdão do STA proferido em 2006-11-02, no proc. 0604/06, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
De facto, e como vem sendo explicitado pela jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, “[p]odemos afirmar uma natureza taxativa, de numerus clausus, das situações em que o legislador aceita serem devidos juros indemnizatórios; a saber, a prevista, como regra, no n.º 1 do art. 43.º da LGT e aquelas em que se verifiquem, estejam preenchidas, as circunstâncias, específicas, como, rigorosa e expressamente, inscritas nas (atuais) quatro alíneas do seu n.º 3(cf. Acórdão do STA proferido em 2021-04-28 no proc. 02089/11.8BELRS, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Tal não significa que todas as situações passíveis de ressarcimento por prejuízos causados pela prática de atos da Administração tributária ali estejam previstas, devendo o contribuinte, nos casos não contemplados naquela norma, lançar mão de ação de concretização da responsabilidade civil, nela fazendo prova dos correspondentes requisitos.
Efetivamente, e fazendo novamente apelo à jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, “[n]ão impede, o mesmo artigo 43.º, que o contribuinte obtenha ressarcimento dos danos que efectivamente lhe foram causados por condutas da Administração não previstas no mesmo artigo, ou nele previstas mas não sancionadas com a imposição do pagamento de juros. Só que, nestes casos, o interessado terá que alegar e provar o seu direito, para obter indemnização (porventura igual ao montante dos juros indemnizatórios que seriam devidos desde a data do pagamento do imposto indevido). Ponto é que, se não atacou o acto pela via da reclamação ou da impugnação, faça prova de ter sofrido tais danos. Em súmula, o artigo 43º da LGT, em vez de conflituar com o artigo 22º da Constituição, dá-lhe corpo, prevendo um meio rápido, fácil e cómodo para os interessados obterem ressarcimento dos danos presumidos causados pela actuação da Administração nos casos a que é aplicável. Ou porque, por erro que lhe é imputável, exigiu imposto indevido, ou porque excedeu prazos procedimentais a que estava obrigada, a Administração é forçada, por directa e imediata decorrência da lei, independentemente de alegação e prova feitas pelo interessado, a satisfazer os juros indemnizatórios estabelecidos no artigo 43.º da LGT. Nos casos que extravasam a previsão deste artigo o interessado não fica sem ressarcimento dos prejuízos que suportou – mas eles não se presumem, e tem de convencer de que os sofreu.” (cf. já citado Acórdão do STA proferido em 2006-11-02, no proc. 0604/06, disponível para consulta em www.dgsi.pt).
Ora, a situação invocada pela aqui Recorrente manifestamente não é abrangida na previsão do art. 43.º da LGT, como aliás é referido, e bem, na sentença sob recurso, quando na respetiva fundamentação se sustenta, e bem, na fundamentação que se segue:
(…)
As partes divergem apenas quanto à circunstância de o cumprimento da sentença exequenda englobar ou não o pagamento de juros indemnizatórios, calculados sobre os valores dos pagamentos especiais por conta.
Fica, assim, claro que, nos termos em que a ação vem configurada pela Exequente, mormente quanto aos fundamentos e à determinação do quantum do pedido, o invocado direito a juros indemnizatórios emerge do atraso na realização do reembolso dos pagamentos especiais por conta, o que significa que este direito a juros indemnizatórios pressupõe a definição do direito ao reembolso.
Sucede que a sentença exequenda não se pronunciou, nem podia pronunciar-se, sobre o mérito dos pedidos de reembolso, pois a impugnação intentada pela Exequente tinha exclusivamente como objeto a legalidade dos atos de liquidação das taxas.
Neste enquadramento, a alteração à ordem jurídica determinada pela sentença anulatória, cujos efeitos se traduzem na obrigação de repor a situação existente previamente à emissão dos atos de liquidação das taxas, não encerra qualquer definição do direito ao reembolso dos pagamentos especiais por conta, pois este direito ao reembolso ficou dependente da apreciação a realizar pela Administração Tributária no âmbito das suas atribuições.
Portanto, e ao contrário do que vem invocado pela Exequente, o reembolso dos pagamentos especiais por conta não ocorreu em cumprimento da sentença exequenda, mas sim em cumprimento de uma decisão administrativa posterior.
Em suma, na ação de impugnação discutiu-se a legalidade dos atos de liquidação das taxas, mas não o direito ao reembolso dos pagamentos especiais por conta, nem sequer a legalidade de qualquer outro ato praticado no âmbito do procedimento desencadeado para apreciação dos pedidos de reembolso. Nesta medida, a sentença exequenda em nada alterou a incerteza do direito da Exequente ao reembolso dos valores dos pagamentos especiais por conta, sendo que a apreciação do mérito dos pedidos e, portanto, a definição do direito ao reembolso veio apenas a ocorrer no âmbito do procedimento tributário reiniciado após a prolação da sentença exequenda.
(…)
Com efeito, em causa não está uma situação em que “se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido(n.º 1 do art. 43.º da LGT), ou qualquer outra das situações previstas naquela norma.
De facto, na sentença cuja execução requer, o que se determinou foi que as taxas exigidas para se levar a cabo a inspeção tributária conducente à verificação dos requisitos para o reembolso dos PEC em causa eram ilegais, não sendo por isso devidas, e não que o reembolso dos PEC fosse devido, pois, tal como acaba de se referir, essa questão não foi apreciada.
Tanto não significa que a aqui Recorrente não tenha forma de tutelar o seu pretendido direito à indemnização, mas apenas que não estão reunidos os requisitos para que tal tutela lhe seja concedida através da condenação da Administração fiscal ao pagamento de juros indemnizatórios.
Refira-se ainda que o disposto no art. 100.º da LGT, que a Recorrente esgrime em seu favor, se revela totalmente consentâneo com o que se acaba de dizer, seja porque o que dali resulta expressamente é que o pagamento de juros indemnizatórios se faz “nos termos e condições previstos na lei”, seja porque, como vimos referindo, o facto de o ressarcimento dos eventuais prejuízos causados pela concreta atuação da Administração fiscal não ter previsão no regime dos juros indemnizatórios não impede que o contribuinte veja a sua situação tutelada por outra via.
Assim sendo, e em face do exposto, é de julgar o presente recurso improcedente.
***
A Recorrente decai no presente recurso, pelo que é sua a responsabilidade pelas custas, nos termos do disposto no art. 527.º, n.º 1 e 2 do CPC, aplicável ex vi art. 2.º, alínea e) do CPPT.
***
Conclusão:
Preparando a decisão, formulamos a seguinte síntese conclusiva:
I. Os juros indemnizatórios, cujo regime substantivo se encontra previsto no supracitado art. 43.º da LGT, não constituem senão um meio expedito e, por assim dizer, automático, de indemnizar o lesado, independentemente de qualquer alegação e prova dos danos sofridos.
II. O elenco de situações previstas no art. 43.º da LGT em que o legislador aceita serem devidos juros indemnizatórios, é taxativo.
III. Tal não significa que todas as situações passíveis de ressarcimento por prejuízos causados pela prática de atos da Administração tributária ali estejam previstas, devendo o contribuinte, nos casos não contemplados naquela norma, lançar mão de ação de efetivação da responsabilidade civil, nela fazendo prova dos correspondentes requisitos.
IV. Não cabe no âmbito da previsão do art. 43.º da LGT a circunstância em apreço, em que o Recorrente pretende ser ressarcido pelo retardamento do reembolso de pagamentos especiais por conta, mas na ação objeto de execução de julgados não foi apreciada a pertinência do correspondente pedido de reembolso, efetuado nos termos do disposto no então n.º 3 do art. 87.º do CIRC, não sendo por isso devidos juros indemnizatórios.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao presente recurso, e em consequência, manter a sentença recorrida.
Custas pela Recorrente.

Porto, 22 de junho de 2023 - Margarida Reis (relatora) - Cláudia Almeida – Paulo Moura.