Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00450/09.7BEAVR
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:03/02/2023
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Irene Isabel Gomes das Neves
Descritores:IRC;
MÉTODOS INDIRECTOS;
CRITÉRIO E EXCESSO DE QUANTIFICAÇÃO;
Sumário:I. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).

II. Concluindo-se que, no caso, a Administração Tributária demonstrou a ocorrência dos necessários pressupostos legais à utilização de métodos indirectos, por um lado e, por outro, apresentando-se adequadamente fundamentados os critérios de que a Administração Tributária se serviu na tarefa de quantificação, era à impugnante que se impunha demonstrar que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade, demonstração essa que não logrou fazer, sem olvidar que, mesmo a subsistir qualquer dúvida, o que se postula por comodidade de raciocínio, ela sempre teria de ser processualmente valorada contra a recorrente, ou seja, contra a parte onerada com a prova.*
* Sumário elaborado pela relatora
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. « X, Lda. » (Recorrente) notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, a qual julgou totalmente improcedente a impugnação judicial contra a liquidação de IRC referente ao ano de 2005, no valor global de € 138.020,85, inconformada vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
«A) Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 1ª instância pelo TAF de Aveiro que não deferiu a pretensão de anulação da liquidação de IRC do ano de 2005.
B) A sentença recorrida começou por apreciar a legalidade no recurso à avaliação indireta que entendeu não ter sido ofendida por parte da AT esgrimindo, no essencial, duas razões:
C) A primeira, reconhecendo que da análise dos fluxos financeiros de Caixa no período em causa não se justifica a origem de todos os montantes em dinheiro;
D) Que alguns dos suprimentos efetuados foram concretizados mediante a entrega de valores em numerário não existindo evidência do depósito na conta bancária, como exigido por lei,
E) Concluindo pela existência de lançamentos meramente contabilísticos sem aderência à realidade.
F) As questões suscitadas na sentença além de não caberem na previsão dos arts 87º e 88º da LGT também se encontram cabalmente esclarecidas na P1 que o Tribunal recorrido não ponderou ou ponderou erradamente,
G) Incorrendo, assim, em erro de julgamento
H) A sentença recorrida validou o recurso à avaliação indireta, também, com a evolução atípica das margens de lucro.
Porém:
I) O tribunal não devia ignorar que:
a) Os inventários que serviram de base ao apuramento de tais margens de lucro foram, por si mesmo, considerados incorretos;
b) Os inventários incorretos não permitem, dada a metodologia utilizada no apuramento da margem bruta (MB absoluta= Vendas – CMV); (MB percentual = MB/CMV), fundamentar conclusões idóneas.
J) E consequentemente a conclusão retirada com base em pressupostos errados não pode servir de base a qualquer decisão verdadeiramente fundamentada.
K) Atentando tais pressupostos contra a realidade dos factos invocados como suporte válido da sua atuação, tal comportamento encontra-se viciado por violação de lei.
No que respeita ao critério, pressupostos e excessos de quantificação:
L) A questão central que se suscitava nos presentes processos consistia em determinar se as irregularidades detetadas pela IT e adotadas para efeitos de liquidação se traduziam, efetivamente, em omissões a vendas ou se, como aí se referia, o problema não residia, antes, na incorreta determinarão do Custo das existências consumidas e mercadorias vendidas imputável a cada um dos anos obieto de análise,
M) E se tal (errado) critério e pressuposto conduzia a manifesto excesso de quantificação dos proveitos, excesso que correspondia à totalidade dos acréscimos feitos.
N) O Tribunal validou o procedimento da AT que, com base no controle das quantidades movimentadas retirado dos elementos da contabilidade no ano de 2005, onde detetou discrepâncias entre as quantidades consumidas e as quantidades vendidas,
O) Presumindo que tais diferenças corresponderiam a vendas sem registo.
P) A idoneidade destas conclusões depende da realidade dos respetivos pressupostos usados na metodologia da AT ou seja, da realidade tanto dos consumos de capacetes quanto das vendas nesse ano.
Q) O Tribunal reconheceu a incorreção dos inventários neste ano (e em todos os demais, entre 2002 e 2008);
R) Por isso, não podia ignorar que o apuramento das quantidades consumidas neles baseado não conduzia a resultados corretos viciando as conclusões retiradas.
S) A fiabilidade das conclusões depende da fiabilidade dos pressupostos.
T) A verdade material apenas poderá ser atingida se o controlo físico partir de dados reconhecidamente reais o que, no caso dos inventários apenas aconteceu em 2002 e 2008 (pontos 17. e 18. do probatório).
U) E assim, só a análise que abarque a totalidade deste período pode permitir extrair conclusões idóneas, base de uma justa decisão;
V) Os demais elementos suscetíveis de permitir o controlo da atividade naquele período (2003/2008), isto é, as quantidades compradas e vendidas foram retiradas dos registos contabilísticos da impugnante, utilizadas em sede de Revisão, alegadas no art. 642 das PI apresentadas e não contestadas pela AT.
W) Tratando-se de elementos fundamentais para proferir decisão materialmente justa e legal impunha-se, em caso de eventuais dúvidas, a realização das necessárias diligências instrutórias (a que, de resto, a AT se encontraria adstrita em ordem à prossecução da verdade material),
X) O que, tanto quanto se sabe, não aconteceu.
Y) A conjugação de todos esses elementos permite concluir pela congruência entre as quantidades vendidas e as quantidades consumidas nesse período (de 6 anos), contemplando as especificidades nas vendas para o Brasil,
Z) Relação de congruência que assumidamente existe entre vendas e consumos no sexénio e que deveria verificar-se em cada um dos anos em causa;
AA) Tal não acontece única e exclusivamente por força das incorreções de inventários devendo notar-se que as diferenças positivas em um ou mais exercícios daquele período são, necessariamente, compensadas por diferenças de igual montante mas de sentido contrário, de modo a que a final as correções se anulam.
BB) Tais incorreções parcelares de inventários produzem efeitos apenas ao nível do Custo das Mercadorias Vendidas, área onde a atuação da AT se deveria ter centrado mas que, inexplicavelmente ignorou.
CC) Este manifesto excesso de presumidas vendas (única componente corrigida pela AT) identifica-se com o valor total das correções introduzidas pela AT.
Termos em que se requer a V. Ex.ªs se dignem conceder procedência ao presente recurso, revogando a sentença recorrida e, em consequência, mandar anular a liquidação adicional de IRC do ano de 2005.»
1.2. A Recorrida Fazenda Pública, notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
1.3. O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer a fls. 219 SITAF, no sentido da improcedência do recurso, acompanhando a fundamentação factual e jurídica da sentença.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cfr. art. 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
As questões sob recurso e que importam decidir, suscitadas e delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, são as seguintes: Se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na apreciação da matéria de facto e em erro de julgamento de direito ao considerar a legalidade no recurso à avaliação indirecta pela AT e ao considerar que o critério utilizado não conduziu a um manifesto excesso de quantificação de proveitos.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada e não provada na 1.ª instância e respectiva fundamentação:
«Consideram-se provados, com relevo para a boa decisão da causa, os seguintes factos:
1. A Impugnante é uma sociedade por quotas, correspondendo o seu objeto social a “indústria, importação, exportação e comércio de capacetes, fivelas, velas e os demais para o setor motociclo”, constando da respetiva certidão permanente como gerentes «AA» e «BB» – (Cfr. certidão permanente, matrícula e Ap. ...30 e ...11, a fls. 209 a 211 do PAT em apenso);
2. Em cumprimento da ordem de serviço n.º ...18 de 5 de março de 2008 da Direção de Finanças ... foi a Impugnante sujeita a ação inspetiva externa, de âmbito geral, relativa aos exercícios de 2005 e 2006 e de âmbito parcial quanto ao exercício de 2007, sendo que em 6 de agosto de 2008 esta última passou a ser de âmbito geral – (cfr. ordens de serviço, a fls. 205 e 206 do PAT em apenso);
3. Em 8 de agosto de 2008 foi a Impugnante notificada pelos Serviços de Inspeção Tributária – DIT II da Direção de Finanças de ... através do ofício n.º ...52 para “no prazo máximo de 10 dias, proceder à entrega das fichas técnicas de produção, contendo o detalhe das matérias-primas incorporadas e respetivo custo, referentes ao fabrico dos seguintes tipos de capacetes: CRI; CRS; CITY; D-JET; GP2; GP4; J3 ...”, elementos juntos pela Impugnante e dos quais resulta o seguinte:
Tipo de capacetePreço unidade (produto acabado)
CRI13,45€
CRS21,82€
CITY5,97€
D-JET18,94€
GP216,82€
GP426,31€
J316,32€
(Cfr. ofício e fichas técnicas, a fls.131 a 138 do PAT em apenso);
4. Em 6 de outubro de 2008 foi a Impugnante notificada pelos Serviços de Inspeção Tributária – DIT II da Direção de Finanças de ... para “apresentar...justificação para a valorização ou suprir os eventuais erros e inexatidões na contabilidade das operações relativas as existências finais a 31 de dezembro de cada um daqueles exercícios, bem como se pronunciar ou suprir as irregularidades na execução dos registos de Caixa relativos aos suprimentos supra identificados. Fica, ainda notificado, que não dando cumprimento ao disposto na presente notificação, fica a « X, Lda. », NIF ... sujeita à aplicação de métodos indiretos por força do disposto nos artigos 87.º e do já mencionado artigo 88.º da LGT...”, notificação subscrita pelo sócio gerente «AA» – (Cfr. notificação, a fls. 81 e 82 do PAT em apenso);
5. Em 20 de outubro de 2008, foi ouvido em declarações na qualidade de sócio gerente da Impugnante «AA» que declarou o seguinte: “relativamente à valorização uniforme nos exercícios de 2004 a 2007 dos produtos acabados relacionados na notificação não existem justificações para a alteração dos custos de produção, porque não terá havido oscilações significativas nos preços das matérias primas; relativamente às quatro regularizações da conta Caixa 11.1 por contrapartida da conta 26.8.9 Outros devedores e Credores assegurou que o Técnico Oficial de Contas da empresa Sr. «CC» irá efetuar diligências no sentido de identificar a origem real dos valores dados como entradas de Caixa. No que concerne às quantidades de capacetes envolvidas nos testes para homologação na Europa afirmou, suportado por elementos fornecidos pelo Engenheiro de Produção «DD» que são necessários 2 por cada um dos sete tamanhos, exceto medida maior que são 10 e menor que são 4, mais um de amostra, que em média ascenderão 30 capacetes. Para certificação no caso de integrais são necessários 50 do tamanho maior e 10 do tamanho menor, e se forem abertos são 40 e 10, respetivamente. Para obtenção de etiquetas para produção são necessários 4 capacetes para um lote com um máximo de 204, sendo necessário os mesmos 4 para encomendas de inferiores. Desde o ano de 2005, foram efetuadas homologações na Europa dos modelos XR-7, D-JET e CRS e na Austrália dos modelos CRI, CRS, GP2, GP4 e D-Jet. No que concerne aos testes prévios à homologação estarão envolvidos cerca de uma centena de capacetes e nos testes de rotina estarão envolvidos cerca de uma centena de capacetes em testes por modelo por ano, os quais são realizados na própria empresa. Em 2007, terão sido testados os 7 modelos, à média de 3 testes por semana de trabalho perfazendo cerca de 900 capacetes. No que concerne a capacetes inutilizados durante o processo produtivo, afirmou não conseguir precisar que quantidades poderão estar envolvidas. E mais não declarou. (...) vai ser assinado por nós, pelo declarante e por «CC» na qualidade de testemunha e de Técnico Oficial de Contas da « X, Lda. » ...” – (Cfr. auto de declarações, a fls. 83 e 84, do PAT em apenso);
6. Tendo sido elaborado projeto de relatório de inspeção tributária pela Direção de Finanças ..., o mesmo foi levado ao conhecimento da Impugnante através do ofício n.º ...73 de 5 de novembro de 2008, tendente, ademais, à respetiva notificação para o exercício de audição prévia – (Cfr. ofício, registo CTT e projeto de relatório de inspeção tributária, a fls. 213 a 215 do PAT em apenso);
7. Não tendo a Impugnante exercido audição prévia, em 4 de dezembro de 2008 foi elaborado o relatório de inspeção tributária pela Direção de Finanças ..., o qual mereceu a concordância por despacho do Chefe de Divisão (em regime de substituição) de 9 de dezembro de 2008, e levado ao conhecimento da Impugnante através de “notificação por funcionário” de 10 de dezembro de 2008, com o seguinte teor:
“(...) A empresa procede à aquisição de quase todos os componentes individuais dos capacetes (cascos, molas, palas, viseiras, aros, decalques, entre outros), à exceção da proteção interior em esferovite, para a qual possui uma linha de fabrico próprio, e dos forros, que na sua maioria são produzidos internamente pelas cerca de 6 costureiras do quadro e mais 2 subcontratadas. O processo de fabrico do capacete assenta, essencialmente, na montagem de todos os componentes, existindo algumas fases prévias e intercalares, tais como a lixagem, pintura, decoração e envernizamento do casco.
(...)
II.4. Apresentação dos Procedimentos Adotados
“Os resultados da presente acção inspectiva foram conseguidos com base nos elementos recolhidos na empresa CMS e nos procedimentos de verificação realizados. O procedimento inspectivo (n.º 1 do artigo 14.º do RCPIT) das Ordens de Serviço que suportam esta acção foi definido com carácter geral para os exercícios de 2005, 2006 e 2007.
A situação da empresa ao longo do triénio caracteriza-se por rendibilidades fiscais exíguas nos dois primeiros anos, alcançando mesmo um resultado fiscal negativo no exercício de 2007, conforme mapas em Anexos 3, 4 e 5, que se resume no quadro seguinte:
Descritivo2004200520062007
Margem Bruta (Vendas+Var. Prod. CMVMC)994.826,17€925.907,04€894.477,02€829.394,44€
Rác. MBruta (Mg./CMVMC)68,1%69,2%83,2%99,2%
Lucro Tributável28.141,87€34.882,52€6.426,80€-59.918,44€
Rentabilidade Fiscal1,1%1,5%0,3%-3,5%
Estas circunstâncias são explicadas pela performance negativa da vertente operacional, com os resultados da actividade a penalizarem de forma preponderante o desempenho final da empresa, conforme se vislumbra no quadro seguinte:
DESCRITIVO2004200520062007
Resultados Operacionais-12.959,8246.092,28-32.450,09-53.972,08
Resultados Financeiros-16.253,92-11.796,10-13.708,58-9.121,21
Resultados Correntes-29.213,7434.296,18-46.158,67-63.093,29
Resultados Extraordinários54.459,19106,3651.286,73-3.277,24
Resultado antes de Impostos25.245,4534.402,545.128,06-66.370,53
Imposto sobre o rendimento do exercício9.220,619.978,162.052,95361,33
Resultado Líquido do Exercício16.024,8424.424,383.075,11-66.731,86
Perante este cenário, foram encetados procedimentos com o objectivo de avaliar a credibilidade da informação financeira, de forma a aferir a consequente razoabilidade dos resultados fiscais apresentados pelo sujeito passivo, dos quais se destacam os seguintes:
a) Área de compras
– Aferição da coerência global dos registos contabilísticos;
– Verificação da realidade e exaustividade das operações contabilizadas;
– Validação da dedutibilidade das operações contabilizadas como custo do exercício.
b) Área de vendas e prestação de serviços
– Aferição da coerência global dos registos contabilísticos;
– Verificação da realidade e exaustividade das operações efectuadas;
– Validação da dedutibilidade fiscal dos custos inerentes.
c) Área de custos de exploração
– Aferição da coerência global dos registos contabilísticos;
– Verificação da efectiva realização das operações contabilizadas;
– Validação da dedutibilidade das operações contabilizadas como custo do exercício;
– Conferência da tributação autónoma prevista para determinados encargos;
– Conferência das retenções na fonte efectuadas.
d) Área de disponibilidades
– Aferição da coerência global dos registos contabilísticos;
– Verificação da efectiva realização das operações contabilizadas.
e) Área de imobilizado
– Aferição da coerência global dos registos contabilísticos;
– Verificação da efectiva realização das operações contabilizadas;
– Validação da dedutibilidade das amortizações do exercício;
– Validação do apuramento das amortizações do exercício;
– Conferência do apuramento e englobamento de mais e menos valias.
f) Área de capitais (próprios e alheios)
– Aferição da coerência global dos registos contabilísticos;
– Verificação da efectiva realização das operações contabilizadas;
– Validação da dedutibilidade de juros e outros custos associados ao financiamento alheio;
– Conferência da inclusão de variações patrimoniais positivas e negativas no lucro tributável.
Os procedimentos descritos e a análise das declarações em sede de IRC e da documentação do dossier fiscal permitiram identificar situações passíveis de correcções à matéria colectável apurada pelo sujeito passivo, as quais estão descritas nos pontos IV, a fls. 11.
(...)
IV. APLICAÇÃO DE MÉTODOS INDIRETOS
IV.1 Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indiretos
IV.1.1 Controlo dos fluxos financeiros do Caixa
Durante os exercícios do triénio em análise, os sócios da empresa CMS procederam à realização de suprimentos, alguns de montantes elevados. Nesse sentido, ambos os sócios, «AA» e a sua esposa «BB», foram notificados (ver Anexo 9) para justificar a origem dos meios financeiros utilizados na realização dos suprimentos a seguir identificados:
docdiariomêsanovalorsuporte
1cxJan200567.500,00€Cheque
325CxFev200560.000,00€Cheque
586CxMar200575.000,00€Numerário
587CxMar200514.500,00€Cheque
1521CxJul200510.000,00€Numerário
1621CxAgo200510.000,00€Numerário
2367CxNov20052.000,00€Numerário
2580CxDez20051.000,00€Numerário
346CxJan200680.000,00€?
5245Cxdez200712.000,00€cheque
Jan 332.000,00€
Em resposta à referida notificação, foi apresentado aos Serviços da Inspecção Tributária o ofício datado de 30 de Setembro de 2008 (ver Anexo 10), no qual apenas se identificou com precisão a origem dos meios financeiros associados aos dois primeiros cheques acima listados, como sendo “produto de parte da venda de apartamentos”, que efectivamente ocorreram em inícios de 2005. Relativamente aos restantes suprimentos, apenas foi referido qual o motivo que originou a necessidade de realizar tais entregas de dinheiro à sociedade, normalmente resultantes das dificuldades de tesouraria da empresa. Ou seja, no referido ofício não se justifica de forma adequada a origem dos dinheiros que suportaram a realização dos suprimentos, tendo sido adiantado em conversa com o sócio-gerente, na presença do Técnico Oficial de Contas, que seriam ainda respeitantes ao remanescente da venda de dois apartamentos em 2005.
Alguns dos referidos suprimentos terão sido concretizados mediante a entrega de valores em numerário directamente no Caixa da empresa, tal como se corrobora pelos documentos em Anexo 11, não existindo evidências do depósito dos mesmos.
Ora, de acordo com o n.º 1 do artigo 63º-C da Lei Geral Tributária (LGT) (artigo aditado pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro), “os sujeitos passivos de IRC, (...) estão obrigados a possuir, pelo menos, uma conta bancária através da qual devem ser, exclusivamente, movimentados os pagamentos e recebimentos respeitantes à actividade empresarial desenvolvida”, acrescentando o n.º 2 do mesmo artigo que “devem, ainda, ser efectuados através da conta ou contas referidas no n.º 1 todos os movimentos relativos a suprimentos, outras formas de empréstimos e adiantamentos de sócios, bem como quaisquer outros movimentos de ou a favor dos sujeitos passivos”.
Desta forma, não é possível atestar que os suprimentos supostamente realizados em numerário sejam efectivos, uma vez que não existe a movimentação das contas bancárias referidas, conforme exige a LGT. Acresce a este facto, a circunstância, recorrente e indiciadora de falsidade, do saldo do Caixa se encontrar negativo antes do registo contabilístico do suprimento e este ser o último movimento de cada um dos meses em que ocorrem os supostos suprimentos em numerário, tal como se evidencia pelos extractos de movimentos da conta POC “11.1 Caixa” abaixo:

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Para além disso, o número interno do documento é sempre seguido da letra A (1521– A, 1621-A e 2367-A)2, uma vez que já existia outro documento anterior com o mesmo número referente a uma operação totalmente distinta e houve necessidade de inserir a posteriori aqueles registos contabilísticos no final de cada um dos respectivos meses, após se ter detectado saldos negativos no Caixa. Por outro lado, não se compreende, a serem efectivos todos os suprimentos, porque razão apenas os supostamente realizados em numerário e sem concretização de depósito (1521-A, 1621-A, 2367-A e 2580) são os últimos movimentos do mês e no caso dos primeiros três sempre seguidos da letra A pelas razões já apontadas.
docdiariomêsanovalorsuporteDepósito
1cxJan200567.500,00€ChequeOk
325CxFev200560.000,00€ChequeOk
586CxMar200575.000,00€NumerárioOk
587CxMar200514.500,00€ChequeOk
1521CxJul200510.000,00€Numerário?
1621CxAgo200510.000,00€Numerário?
2367CxNov20052.000,00€Numerário?
2580CxDez20051.000,00€Numerário?
346CxJan200680.000,00€?Ok
5245Cxdez200712.000,00€chequeok
Jan 332.000,00€
Situação idêntica ocorre, em 2005, aquando de uma suposta restituição parcial de suprimentos, em numerário, através do documento ...20..., que também está obrigada ao cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 63º-C da LGT. Trata-se do último lançamento do mês de Setembro e foi registado já depois de se terem lançado documentos no mês de Outubro, decorrendo da necessidade de inserir um registo contabilístico relativo a um suposto reembolso aos sócios após se ter verificado que o saldo de Caixa afinal apresentava um valor excessivo, movimentos abaixo:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Acresce, ainda, o facto de ser estranho proceder-se à suposta restituição parcial de suprimentos no valor de 7.000,00 € em numerário (documento ...20...), mas relativamente a uma quantia bem inferior (2.000,00 €), restituída em 2007, já se ter emitido um cheque (n.º ...44 s/ Banco 1... – documento ...46), sendo que neste último caso não se trata do último documento do mês, nem contém a adição a posterior da letra A. Estes factos comprovam a existência de lançamentos meramente contabilísticos, sem aderência à realidade, em que o fluxo financeiro não se efectivou. Os registos decorrem da necessidade de compor os saldos da contabilidade, perante a sua evolução para valores negativos (fisicamente impossível) ou montantes excessivamente elevados para um saldo normal de Caixa, sendo reveladores de movimentos à margem da contabilidade, não estando assegurado que todos os recebimentos e pagamentos têm reflexo nas contas de disponibilidades da empresa. Perante estas evidências, procedeu-se à Notificação da empresa na pessoa do seu sócio-gerente, em 06 de Outubro de 2008, conforme Anexo 12, para se pronunciar sobre as quatro regularizações da conta Caixa 11.1 por contrapartida da conta 26.8.9 Outros Devedores e Credores. Em resposta à referida notificação, o sócio-gerente assegurou em Auto de Declarações de 20 de Outubro de 2008 (ver Anexo 13) que “o Técnico Oficial de Contas da empresa Sr. «CC» irá efectuar diligências no sentido de identificar a origem real dos valores dados como entradas de Caixa”. No dia 29 de Outubro de 2008, o Técnico Oficial de Contas «CC» contactou os Serviços da Inspecção Tributária para informar que necessitaria de mais tempo para apurar as justificações necessárias, tendo-se assumido que as mesmas seriam apresentadas em sede de direito de audição, caso se concretizasse. Assim, resta-nos concluir que os saldos da conta de Caixa não revelam de forma verdadeira e apropriada a posição financeira da empresa, não estando assegurada a fiabilidade da informação contabilística, na medida em que a mesma não está liberta de erros. Existem deficiências ao nível do controlo dos fluxos financeiros, com impacto na organização contabilística e controlo interno, as quais não permitiam conferir credibilidade à informação financeira e conduzem a “irregularidades (...) na organização ou execução” da “escrituração dos livros e registos”, conforme estipula a alínea a) do n.º 1 do artigo 88º da LGT, o que conduz à “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável”, conforme prevê a alínea b) do artigo 87º da LGT.
IV.1.2. Análise à evolução das margens brutas
A análise à evolução das margens brutas evidenciadas na Contabilidade (ver Anexo 4) demonstra uma variação anómala ao longo do período de 2005-2007.
Descritivo2004200520062007
Margem Bruta (Vendas+Var. Prod. CMVMC)994.826,17€925.907,04€894.477,02€829.394,44€
Rác. MBruta (Mg./CMVMC)68,1%69,2%83,2%99,2%
Julgamos não ser coerente a coexistência de um aumento da margem bruta sobre o custo das matérias consumidas, de 69,2% (em 2005) para 99,2% (em 2007), com a degradação abrupta dos resultados operacionais, com a manutenção dos preços médios de venda dos capacetes, conforme se comprova no quadro seguinte, e com as dificuldades comerciais aludidas quer pelo sócio-gerente, quer pelo responsável pelo mercado externo da empresa. Por outro lado, a análise aos documentos de aquisição de matérias-primas não evidenciam sequer uma redução dos preços, mas sim uma manutenção ou ligeiros acréscimos, e a estrutura de vendas por tipo de capacete é muito idêntica durante os três exercícios, conforme se percebe pelo peso percentual evidenciado no quadro abaixo:
200520062007
ArtigoQtdValorP. méd%QtdValorP. méd%QtdValorP. méd%
Capacete CRF64444.765,31€69,51€2,1%73651931,50€70,56€2,7%63844.487,86€69,73€2,9%
Capacete CRI22559117.564,05€45,94€5,4%168378223,99€46,48€4,1%139864.581,54€46,20€4,1%
Capacete CRI11254369.210,36€32,81€17,0%7267250.489,94€34,47€13,0%5675188.485,84€33,21€12,1%
Capacete CRS4542185.184,90€40,77€8,5%5950252.092,29€42,37€13,1%191081.140,27€42,48€5,2%
Capacete City18462201.524,32€10,92€9,3%16197196.108,59€12,11€10,2%13211162.215,72€12,28€10,4%
Capacete D-Jet00,00€0,00€0,0%4370147.187,49€33,68€7.6%6118209.953,28€34,31€13,5%
Capacete
GP2
20241481.623,77€23,79€22,2%13315328.683,19€24,69€17,0%11475273.213,00€23,81€17,5%
Capacete
GP3
2167.201,46€33,34€0,3%244233.365,50€13,66€1,7%130,50€30,50€0,0%
Capacete
GP4
5452214.997,49€39,43€9,9%5283196.448,80€37,19€10,2%5488188.896,28€34,42€12,1%
Capacete GP55168156.825,46€30,35€7,2%141251.958,88€36,80€2,7%93839.811,75€42,44€2,6%
Capacete GP5F267493.978,08€35,15€4,3%61647.995,57€77,91€2,5%32225.291,22€78,54€1,6%
Capacete J38172215.774,74€26,40€9,9%8613225.821,62€26,22€11,7%6185164.882,92€26,66€10,6%
Capacete Police1312685,00€20,50€0,1%982.204,00€22,49€0,1%801.800,00€22,50€0,1%
Capacete Storm III53511.235,46€21,00€0,5%2014.436,95€22,07€0,2%1573.663,19€23,33€0,2%
Capacete Storm313768.408,84€21,81€3,2%265261.560,94€23,21€3,2%250860.688,68€24,20€3,9%
Capacete XR-700,00€0,00€0,0%00,00€0,00€0,0%106348.942,42€46,04€3,1%
83.1872.170.979,24€26,10€100,0%70.8351.928.509,23€27,23€100,0%57.1671.558.084,47€27,25€100,0%
Fonte: dados obtidos dos ficheiros SAF-T Facturação dos exercícios de 2005, 2006 e 2007, recolhidos do sistema PHC utilizado pela CMS para gestão comercial, conforme se ilustra no Anexo 14.
Deste modo, não foi possível encontrar justificação para o aumento substancial das margens brutas sobre o custo das matérias consumidas, perante um cenário de manutenção da estrutura de vendas por tipo de capacete e dos preços médios de venda dos capacetes, aliada a uma oscilação exígua ou ligeiramente positiva nos custos das matérias-primas adquiridas. O próprio sócio-gerente da CMS, em resposta à notificação em resposta à notificação pessoal efectuado em 06 de Outubro de 2008 (ver Anexo 12), afirmou que “relativamente à valorização uniforme nos exercícios de 2004 a 2007 dos produtos acabados relacionados na notificação não existem justificações para a alteração dos custos de produção, porque não terá havido oscilações significativas nos preços das matérias-primas” (in Auto de Declarações de 20 de Outubro de 2008, em Anexo 13). Assim, julgamos estar perante “factos concretamente identificados através dos quais” é “patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada”, conforme prevê a alínea d) do n.º 1 do artigo 88º da LGT, em particular no que concerne aos exercícios de 2005 (69,2%) e 2006 (83,2%), por comparação com a margem bruta evidenciada pelos elementos contabilísticos do ano de 2007 (99,2%). Esta variação anómala põe em causa o apuramento da matéria tributável realizado pelo sujeito passivo CMS, determinando a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da mesma, conforme estipula a alínea b) do artigo 87º da LGT, cumprindo desta forma o pressuposto para recurso à avaliação indirecta.
IV.1.3. Controlo dos movimentos físicos das existências
No seguimento da análise à evolução das margens, o procedimento inspectivo enveredou pelo controlo físico das existências. Neste sentido, numa primeira vertente identificou-se a matéria-prima de eleição para permitir a realização de um controlo de quantidades, tendo-se elegido o casco do capacete por ser o componente comum a todos os produtos produzidos pela CMS. Trata-se de uma matéria-prima não degradável, com um suporte físico real de fácil identificação e controlo. Assim, procedeu-se à recolha de todas as aquisições de cascos para capacetes, nos exercícios de 2005, 2006 e 2007, com base nas facturas ou documentos equivalentes emitidos pelos fornecedores previamente identificados e registados na Contabilidade3, conforme se ilustra nos mapas em Anexo 15. No quadro seguinte apresenta-se o resumo dos dados recolhidos:
200520062007
FornecedorQtdP.U.mValorQtdP.U.mValorQtdP.U.mValor
I...578312,42€139.920,65€64.6982,67€173.054,48€71.8872,59€186.120,64€
G...61313,19€19.558,32€46453,36€15.617,03€n.a.n.a.n.a.
Ln.a.n.a.n.a.n.a.n.a.n.a.35872,37€8.501,19€
«LL»380630,03€114.289,50€48718,61€9.062,00€3632,50€1.170,00€
Total67.7684,04€273.768,47€69.8302,83€197.733,51€75.5102,59€195.791,83€
A evolução dos valores globais de cada ano apresenta um aumento da quantidade de cascos adquiridos, enquanto que o volume das compras vem diminuindo, o que determina uma redução do custo unitário médio do casco. Os valores de 2005 são explicados pela quantidade de cascos em fibra adquiridos ao fornecedor italiano «LL», cujo preço unitário é muito superior aos restantes cascos em plástico. Note-se que a produção de capacetes em fibra tem vindo a ser gradualmente descontinuada. De seguida, procedeu-se à análise dos inventários físicos elaborados pelo sujeito passivo CMS a 31 de Dezembro dos exercícios de 2004, 2005, 2006 e 2007 (ver Anexo 16), tendo-se apurado as seguintes existências finais de cascos (ver mapa em Anexo 17), incluindo cascos em produtos em vias de fabrico e cascos em produto acabado (capacetes):
Existências Finais2004200520062007
Quantidade58.37022.96411.99726.709
Com base nas compras de cascos apuradas para cada exercício do triénio em análise, segundo os elementos contabilísticos, e as existências de cascos em matéria-prima, produtos em vias de fabrico e produtos acabados, a 31 de Dezembro do quadriénio supra, fornecidas pelos inventários elaborados pelo sujeito passivo CMS, foi possível determinar de forma extra-contabilística o número de capacetes vendidos, tal como se vislumbra no quadro seguinte:

QUANTIDADES200520062007TOTAL
Existência Inicial (Cascos + Capacetes)58.37022.96411.997
COMPRAS Cascos67.76869.83075.510213.108
Existência Final (Cascos * Capacetes)22.96411.99726.709
VENDAS Capacetes103.17480.79760.798244.769
A evolução ao longo do triénio indicia de forma notória uma quebra na quantidade de capacetes vendidos, evidenciando um total de 244.769 capacetes vendidos no período 2005-2007. Por forma a validar o controlo físico das vendas de capacetes, procedeu-se à recolha dos ficheiros SAF-T relativos à facturação dos exercícios em análise (2005, 2006 e 2007), de modo a obter os elementos constantes das facturas, bem como de notas de crédito, conforme se evidencia nos mapas do Anexo 14. A análise dos referidos ficheiros permitiu obter as quantidades e valores das vendas por tipo de produto, sendo que relativamente aos capacetes apurou-se o seguinte:
(...) Total
QtdValorP. méd%
2018141.184,67€69,96€2,5%
5640260.369,58€46,16€4,6%
24196808.186,14€33,40€14,3%
12402518.417,46€41,80€9,2%
47870559.848,63€11,70€9,9%
10488357.140,77€34,05€6,3%
450311.083.519,96€24,06€19,2%
265940.597,46€15,27€0,7%
16223600.342,57€37,01€10,6%
7518248.596,09€33,07€4,4%
3612167.264,87€46,31€3,0%
22970606.479,28€26,40€10,7%
3096.689,00€21,65€0,1%
89319.335,60€21,65€0,3%
82978190.658,46€22,98€3,4%
106348.942,42€€0,00€0,9%
211.1895.657.572,95€26,79€100,0%

Fonte: dados obtidos dos ficheiros SAF-T Facturação dos exercícios de 2005, 2006 e 2007, recolhidos do sistema PHC utilizado pela CMS para gestão comercial, conforme se ilustra no Anexo 14. Em resumo, podemos afirmar que a Facturação do sujeito passivo CMS evidencia um total de 211.189 capacetes vendidos no triénio em análise, repartidos pelos 3 exercícios da seguinte forma:

VENDAS CAPACETES200520062007TOTAL
Quantidades Vendidas83.18770.83557.167211.189
Valor das Vendas Preço2.170.979,24 €1.928.509,23 €1.558.084,475.657.572,95
Médio de Venda26,10 €27,23 €27,25€€26,79 €
Ora, as quantidades acima evidenciadas afastam-se de forma evidente dos resultados do controlo físico atrás descrito, em que foram apuradas 244.769 unidades vendidas, conforme se relembra no quadro seguinte:

QUANTIDADES200520062007TOTAL
Existência Inicial (Cascos + Capacetes)58.37022.96411.997
COMPRAS Cascos67.76869.83075.510213.108
Existência Final (Cascos * Capacetes)22.96411.99726.709
VENDAS Capacetes103.17480.79760.798244.769
Perante este cenário, existe de forma notória uma omissão de proveitos nas contas do sujeito passivo CMS, mediante venda de capacetes à margem da Contabilidade, que em termos quantitativos ascenderia aos dados do quadro seguinte:

Omissão Vendas200520062007TOTAL
Quantidades vendidas Contabilidade83.18770.83557.167211.189
Quantidades vendidas controlo físico103.17480.79760.798244.769
Omissão quantidades19.9879.9623.63133.580
Note-se que não existem mecanismos de controlo da produção, nomeadamente através de ordens de fabrico, sendo que, de acordo com os responsáveis da empresa, todas as necessidades de produção são introduzidas na linha de montagem mediante simples papéis manuscritos. Deste modo, torna-se completamente impossível proceder a qualquer tipo de teste à produção para validar os consumos. Este facto demonstra elevadas deficiências ao nível do controlo da produção, denunciando um sistema de controlo interno bastante débil, o qual não permite aferir a credibilidade da informação mediante outro procedimento que não seja o controlo físico atrás descrito. Assim, o controlo efectuado demonstra de forma evidente a existência de vendas de capacetes sem a emissão da respectiva factura ou documento equivalente. Deste modo, julgamos estar perante “factos concretamente identificados através dos quais” é “patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada”, conforme prevê a alínea d) do n.º 1 do artigo 88º da LGT, em particular no que concerne aos exercícios de 2005 e 2006, por comparação com a omissão em quantidades patenteada em 2007. De realçar, que esta gradação é fortemente congruente com a evolução das margens brutas evidenciada no ponto IV.1.2, a fls. 15, em que existia um aumento gradual das mesmas, conforme se relembra no quadro seguinte:

Descritivo2004200520062007
Margem Bruta (Vendas+Var. Prod. CMVMC)994.826,17€925.907,04€894.477,02€829.394,44€
Rác. MBruta (Mg./CMVMC)68,1%69,2%83,2%99,2%
Ou seja, à medida que as quantidades omitidas à facturação diminuem, como se demonstrou anteriormente, as margens brutas fornecidas pela Contabilidade aumentam, o que é perfeitamente racional e atesta a credibilidade do controlo físico efectuado. Perante estas evidências, torna-se questionável a fiabilidade dos dados contabilísticos e, consequentemente, do apuramento da matéria tributável realizado pelo sujeito passivo CMS, o que implica a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da mesma e a necessidade de recorrer à aplicação da avaliação por métodos indirectos, conforme estipula o n.º 1 do artigo 88º e prevê a alínea b) do artigo 87º, ambos da LGT.
IV.1.4. Análise do custo de produção e valorização dos inventários
No decurso da acção inspectiva, notificou-se o sujeito passivo CMS (ver Anexo 18) para fornecer fichas técnicas de produção, contendo o detalhe das matérias-primas incorporadas e respectivo custo, referentes ao fabrico dos capacetes CRI, CRS, CITY, D-JET, GP2, GP4 e J3, por serem aqueles que detém maior peso no volume de vendas dos três anos em análise, conforme relembra o quadro seguinte:
(...)
Segundo as fichas técnicas de produção (ver Anexo 19) elaboradas pelo sujeito passivo, os custos de fabrico dos capacetes, a preços do exercício de 2007, ascendem aos valores constantes do quadro abaixo, resultando as seguintes margens brutas calculadas em função do preço médio de venda do mesmo exercício:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Ou seja, para uma amostra bastante representativa do volume de vendas de capacetes, na ordem dos 81,4%, apurou-se uma margem bruta em valores absolutos de 517.699,79 euros, que, em função do correspondente custo de produção no montante de 751.087,52 euros, perfaz uma margem bruta em termos relativos de 68,9%.
Ora, esta margem em percentagem afasta-se muito dos valores relevados pela Contabilidade, que no exercício de 2007 ascende a 99,2% (ver Anexo 4). Por outro lado, se extrapolarmos o valor do custo das matérias consumidas (CMVMC) para as vendas globais em função destes resultados [751.087,52 euros / (81,4%)], este ascenderia a 922.343,56 euros, o que supera inclusive o CMVMC apurado na Contabilidade de 2007 (836.184,88 euros). Assim, não se poderão considerar como razoáveis e coerentes as fichas de produção apresentadas pelo sujeito passivo, na medida em que colidem com os próprios elementos contabilísticos declarados pela própria empresa CMS. Acresce a esta circunstância, o facto da valorização dos produtos acabados em armazém se apresentar no inventário a 31 de Dezembro de 2007, na sua maioria, ainda mais elevada que a apurada nas fichas técnicas de produção elaborada pelos responsáveis da CMS, conforme quadro seguinte (coluna 9 por comparação com coluna 6), o que implicaria, logicamente, uma margem bruta em termos percentuais ainda mais baixa que os 68,9% atrás calculados.
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Nota: o inventário a 31 de Dezembro de 2007 apenas contém capacetes CRI, GP2, GP4,GP5 e J3, conforme Anexo 16. Nos casos em que existia mais que um preço unitário, foi considerado no quadro anterior o mais baixo.
A análise do quadro anterior permite concluir que existem reduções de margens em pontos percentuais significativos, tal como sobressai no caso do capacete CRI e GP2, curiosamente o terceiro e primeiro, respectivamente, com maior peso na estrutura de vendas em termos de valor, o que provocaria uma diminuição ainda mais drástica em relação à margem bruta de 68,9%, afastando-se fortemente da percentagem de 99,2% apresentada na Contabilidade. Por outro lado, não deixa de ser anómalo o facto da valorização dos produtos acabados se manter sempre constante ao longo dos quatros inventários a 31 de Dezembro analisados, conforme se demonstra no quadro seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
Nota: nos casos assinalados com (a) e (b) existe mais que um preço unitário.
Perante os factos relatados, resta-nos concluir que não existe uma preocupação devida aquando da valorização dos inventários, sendo notória a lacuna ao nível dos preços unitários dos produtos acabados. Estas circunstâncias influenciam de forma determinante os resultados contabilísticos do sujeito passivo e, consequentemente, o apuramento fiscal.
Recorde-se que em resposta à notificação pessoal efectuado em 06 de Outubro de 2008 (ver Anexo 12), o sócio-gerente da CMS afirmou que “relativamente à valorização uniforme nos exercícios de 2004 a 2007 dos produtos acabados relacionados na notificação não existem justificações para a alteração dos custos de produção, porque não terá havido oscilações significativas nos preços das matérias primas” (in Auto de Declarações de 20 de Outubro de 2008, em Anexo 13).
De acordo com a alínea a) do n.º 3 do artigo 17º do CIRC, a contabilidade deve “estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade, sem prejuízo da observância das disposições previstas neste Código”. Pelo exposto, é perceptível que a valorização dos produtos acabados ao custo de produção não cumpre os critérios de valorimetria do ponto 5.3. do Plano Oficial de Contabilidade, na medida em que se considera impossível não existir qualquer oscilação ao longo dos quatro anos analisados. Deste modo, existe uma violação clara das disposições relativas à normalização contabilística, com erros e inexactidões na contabilidade das operações.
Assim, podemos afirmar que os saldos das contas de Existências não revelam de forma verdadeira e apropriada a posição financeira da empresa, não estando assegurada a fiabilidade da informação contabilística, na medida em que a mesma não está liberta de erros. São incontestáveis as deficiências ao nível da valorização dos stocks, com impacto na informação contabilística, com repercussões negativas ao nível da credibilidade da informação financeira e conduzindo a “irregularidades (...) na organização ou execução” da “escrituração dos livros e registos”, conforme estipula a alínea a) do n.º 1 do artigo 88º da LGT. A situação conduz à “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável”, conforme prevê a alínea b) do artigo 87º da LGT.
IV.1.5. Controlo de documentos de transporte e notas de encomenda
Durante o decurso da acção inspectiva, procedeu-se à análise por amostra dos documentos de suporte à facturação do exercício de 2005. Desse procedimento ressaltam conclusões bem elucidativas da existência de vendas à margem da Contabilidade, conforme se descreve em seguida.
No dia 21-07-2005, o cliente «EE», requisitou vários capacetes, conforme nota de encomenda n.º ...89, em Anexo 20. Essa requisição deu origem à guia de remessa n.º ...42, de 08-08-2005 (ver Anexo 20), na qual se expediu os capacetes requisitados, com excepção de 6 capacetes CRS Racer que constam da guia de transporte n.º ...08 (ver Anexo 20), da mesma data. A análise da facturação emitida para este cliente apenas evidencia a factura n.º ...26, de 10-08-2005, da qual apenas constam os 6 capacetes enviados através da guia de remessa (ver Anexo 20), não existindo qualquer documento de facturação para os outros 6 capacetes da guia de transporte. Ou seja, dos 12 capacetes encomendados pelo cliente, apenas 6 foram facturados.
O facto da data da guia de transporte e da guia de remessa terem a mesma, apenas se justifica por se saber atempadamente que as quantidades inscritas na guia de transporte não seriam para emitir factura ou documento equivalente, tal como evidencia um traço separador na nota de encomenda (ver Anexo 20) e a anotação “g. transporte”.
Em circunstância idêntica, encontra-se a factura n.º ...17, de 06-07-2005 (ver Anexo 21), para o cliente «J», na qual se juntou um apontamento manual com a requisição do cliente. Esta requisição evidencia as quantidades constantes da factura, as quais possuem um averbamento a dizer “factura”, enquanto que “12 capacetes City Met Preto” que constam da guia de transporte ...46, de 06-07-2005, têm a indicação neste último documento “a facturar posteriormente”. Na verdade, da factura n.º ...17 não constam os referidos 12 capacetes e da factura seguinte, n.º ...77, de 11-07-2005 (ver Anexo 21), apenas 3 capacetes City pretos mas “mate” e não “met”. Assim, de uma encomenda de 32 capacetes apenas foram facturados 20 unidades.
Noutro caso, a guia de transporte n.º ...09, de 09-08-2005 (ver Anexo 22), evidencia a expedição de vários capacetes, na qual se inscreveu a seguinte menção “capacetes a facturar posteriormente”. Até à data limite de emissão de factura, prevista no artigo 36º do CIVA (anterior artigo 36º), não foi debitado qualquer valor ao referido cliente, sendo que da primeira factura emitida após a data da guia de transporte, factura n.º ...60, de 16-09-2005 (ver Anexo 22), apenas constam alguns daqueles capacetes, o que evidencia, uma vez mais, a existência de vendas à margem da Contabilidade.
Por outro lado, os Serviços de Inspecção Tributária tiveram acesso à cópia de 4 notas de encomendas do exercício de 2005, do cliente «N, Lda.» (ver Anexo 23), devidamente rubricadas pelo vendedor da CMS «FF», nas quais são requisitadas determinadas quantidades de capacetes e outros acessórios. No que respeita aos capacetes, foi efectuado o confronto das referidas notas de encomenda com a facturação emitida para aquele cliente em datas posteriores às das notas de encomenda durante o exercício de 2005, e foi possível concluir que existe omissão de vendas, conforme se percebe pelo mapa em Anexo 24. Neste mapa fez-se o cruzamento entre as quantidades e tipo de capacetes requisitados nas notas de encomenda com o detalhe das facturas emitidas. Mesmo considerando que não existem outras notas de encomenda, o que não será plausível, o total de capacetes encomendados ascende a 517 unidades, das quais apenas 246 terão sido facturadas, conforme se conclui pela análise do mapa em Anexo 24.
Assim, o controlo efectuado demonstra de forma evidente a existência de vendas de capacetes sem a emissão da respectiva factura ou documento equivalente. Deste modo, julgamos estar perante “factos concretamente identificados através dos quais” é “patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada”, conforme prevê a alínea d) do n.º 1 do artigo 88º da LGT, em particular no que concerne aos exercícios de 2005. A situação conduz à “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável”, conforme prevê a alínea b) do artigo 87º da LGT.
IV.2.2 Correcções por aplicação de métodos indirectos
IV.2.2.1 Em sede de IRC
Conforme já se demonstrou no ponto IV.1, a fls. 11, com base nas compras de cascos apuradas para cada exercício do triénio em análise, segundo os elementos contabilísticos, e as existências de cascos em matéria-prima, produtos em vias de fabrica e produtos acabados, a 31 de Dezembro do quadriénio 2004-2007, fornecidas pelos inventários elaborados pelo sujeito passivo CMS, foi possível determinar de forma extra-contabilística o número de capacetes vendidos, tal como se vislumbra no quadro seguinte:
QUANTIDADES200520062007TOTAL
Existência Inicial (Cascos + Capacetes)58.37022.96411.997
COMPRAS Cascos67.76869.83075.510213.108
Existência Final (Cascos * Capacetes)22.96411.99726.709
VENDAS Capacetes103.17480.79760.798244.769
A recolha dos ficheiros SAF-T relativos à facturação dos exercícios em análise (2005, 2006 e 2007), permitiu obter os elementos constantes das facturas, bem como de notas de crédito, conforme se evidencia nos mapas do Anexo 14, possibilitando o apuramento do número total de capacetes vendidos com emissão de factura ou documento equivalente no triénio em análise, repartidos pelos 3 exercícios da seguinte forma:
VENDAS CAPACETES200520062007TOTAL
Quantidades Vendidas83.18770.83557.167211.189
Valor das Vendas Preço2.170.979,24 €1.928.509,23 €1.558.084,47 €5.657.572,95 €
Médio de Venda26,10 €27,23 €27,25€€26,79 €
Perante este cenário, existe de forma notória uma omissão de proveitos nas contas do sujeito passivo CMS, mediante venda de capacetes à margem da Contabilidade, que em termos quantitativos ascenderia aos dados do quadro seguinte:
Omissão Vendas200520062007TOTAL
Quantidades vendidas Contabilidade83.18770.83557.167211.189
Quantidades vendidas controlo físico103.17480.79760.798244.769
Omissão quantidades19.9879.9623.63133.580
Quando confrontado com estes resultados, o sócio-gerente da empresa tentou justificar as divergências com o facto de ocorrerem desperdícios. Nesse sentido, solicitou-se a apresentação de elementos que corroborassem tal afirmação e que permitissem quantificar o número de cascos que não terão sido aproveitados para o ciclo de vendas. Assim, em Auto de Declarações de 20 de Outubro de 2008 (ver Anexo 13), suportado em informações fornecidas pelo Engenheiro de Produção, o sócio-gerente forneceu dados sobre o número de capacetes enviados para os laboratórios de forma a serem sujeitos a testes de homologação e testes de certificação, bem como o número de capacetes sujeitos a testes de rotina desenvolvidos internamente e número de capacetes necessários a enviar aos organismos de homologação para obter etiquetas obrigatórias para cada capacete. Com base nos dados obtidos (ver Anexo 13), procedeu-se ao apuramento das quantidades de capacetes envolvidos em testes, durante o período 2005-2007, que se passa a descrever em seguida. Assim, de acordo com o Auto de Declarações (ver Anexo 13), no que concerne aos testes para homologação é necessário enviar para os respectivos laboratórios as seguintes quantidades de capacetes consoante o tamanho:
TamanhosEuropaAustrália
XXS44
XS24
S24
M24
L24
XL24
XXL104
Amostra1n.a.
TOTAL2528
Uma vez que se homologaram 3 capacetes na Europa e 5 na Austrália, segundo o mesmo Auto de Declarações (ver Anexo 13), a quantidade de capacetes enviados para os laboratórios são as seguintes:
HOMOLOGAÇÕESEUROPAAUSTRALIA
CRIn.a.28
CRS2528
D-JET2528
GP2n.a.28
GP4n.a.28
XR-725n.a.
TOTAL75140
De realçar que nem todos os modelos são produzidos nos sete tamanhos previstos (XXS a XXL), mas ainda assim foi considerado esse cenário no quadro anterior, pelo que a quantificação será por excesso. No que respeita a testes de certificação na Europa, que são efectuados após a homologação, o Auto de Declarações (ver Anexo 13) afirma que “no caso de integrais são necessários 50 do tamanho maior e 10 do tamanho menor, e se forem abertos são 40 e 10, respectivamente”, “não existindo testes de certificação” na Austrália. Assim, a quantidade de capacetes enviados para os laboratórios é a seguinte, considerando que todos os capacetes são integrais, pelo que a quantificação será por excesso:
CERTIFICAÇÕESEUROPA
CRS XXS50
CRS XXL10
D-JET XXS50
D-JET XXL10
XR-7 XXS50
XR-7 XXL10
TOTAL180
Antes de se proceder ao envio dos capacetes para homologação, a empresa desenvolve internamente os seus testes, em laboratório próprio. De acordo com o Auto de Declarações (ver Anexo 13), “no que concerne aos testes prévios à homologação estarão envolvidos cerca de uma centena de capacetes”, sendo que apenas foi possível obter comprovativos de testes efectuados a 3 modelos de capacetes (ver documentos em Anexo 31), nos quais foram utilizadas as seguintes quantidades:
Testes prévios HomologaçõesTotal
J3111
CRI81
GP2141
Total333
Média111
Considerando o valor médio de capacetes envolvidos nos testes prévios à homologação, que resulta do quadro anterior, e uma vez que se homologaram 3 capacetes na Europa e 5 na Austrália, segundo o mesmo Auto de Declarações (ver Anexo 13), a quantidade de capacetes testados nos laboratórios da própria empresa terão sido as seguintes:
TESTES PRÉVIOS HOMOLOGAÇÕESEUROPAAUSTRALIA
CRIn.a.111
CRS111111
D-JET111111
GP2n.a.111
GP4n.a.111
XR-7111n.a.
TOTAL333555
De acordo com as declarações do sócio-gerente (ver Anexo 13), a CMS realiza, de forma periódica, testes de rotina aos vários modelos, em que “estarão envolvidos cerca de uma centena de capacetes em testes por modelo por ano, os quais são realizados na própria empresa. Em 2007, terão sido testados os 7 modelos, à média de 3 testes por semana de trabalho perfazendo cerca de 900 capacetes”. O número de semanas de trabalho consideradas pelos responsáveis da empresa foi de 44 semanas, apesar do próprio Engenheiro de Produção ter admitido que havia semanas em que não tinha disponibilidade de tempo para realizar tais testes.
Deste modo, durante os 3 anos analisados terão sido testados 924 capacetes por ano, correspondentes a “7 modelos, à média de 3 testes por semana de trabalho” (44 semanas), o que perfaz um total de 2.772 capacetes. Esta quantidade parece-nos claramente elevada e desproporcional às quantidades envolvidas, por exemplo, nos testes prévios à homologação. Apesar de se julgar razoável que a empresa realize tais testes de rotina, não nos parece coerente envolver um tão grande número de capacetes, em que o mesmo modelo é testado 3 vezes numa semana, durante todas as semanas de trabalho do ano. Ou seja, segundo a empresa, numa semana de trabalho são efectuados em média 21 testes, no entanto, não nos foi exibido um único documento ou registo que comprovassem a realização dos mesmos, nem sequer nas últimas semanas anteriores à data do Auto de Declarações. Ainda assim, e considerando que a quantidade peca por excesso e que não foram exibidas provas da execução dos testes de rotina, admite-se a realização dos mesmos com a periodicidade assumida em Auto de Declarações (ver Anexo 13).
Deste modo, a quantidade de capacetes utilizados em testes e que não são aproveitados para venda ou reintrodução no ciclo produtivo ascenderá a um total de 4.055 capacetes no cômputo dos três anos em análise, conforme se resume no quadro seguinte:
TESTESEUROPAAUSTRALIATotal
Homologações75140215
CRS Certificações180n.a.180
Testes prévios333555888
Testes rotinan.d.n.d.2.772
TOTAL 4.055
Para além da quantidade envolvida nos testes, de modo a obter uma etiqueta para colocar em cada capacete produzido, é necessário enviar previamente para os laboratórios de homologação um número de capacetes para avaliação. Assim, segundo o Auto de Declarações (ver Anexo 13), na Europa –para obtenção de etiquetas para produção são necessários 5 capacetes para o máximo de 3.200 unidades que se pretenda produzir” e na Austrália “são necessários 4 capacetes para um lote com um máximo de 204, sendo necessário os mesmos 4 para encomendas de inferiores”. Ou seja, em termos percentuais existe a seguinte proporção:
EtiquetasEUROPAAUSTRALIA
Capacetes/Produção5/32004/204
Relação Percentual0,16%1,96%
Tendo em consideração as vendas realizadas, que no caso da Austrália corresponderão aproximadamente à quantidade produzida, uma vez que se trabalha por encomenda para o mercado externo, o número de capacetes enviados para o laboratório de modo a obter as etiquetas ascenderá às seguintes quantidades:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
NOTA: A quantidade de lotes corresponde à divisão da quantidade vendida por 204, arredondada por excesso, e o número de capacetes enviados para testes à multiplicação de 4 pelo número de lotes. As quantidades vendidas resultam dos ficheiros SAF-T recolhidos e que se resumem em Anexo 32.
Note-se que a percentagem de capacetes testados em função das vendas nos 3 anos supera em todos eles a relação percentual de 1,96% (4/204) atrás exibida, pelo que os cálculos apresentados não pecam por defeito. Em relação à Europa, e depois de deduzir as quantidades vendidas para a Austrália, o número de capacetes enviados para o laboratório de modo a obter as etiquetas ascenderá às seguintes:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
NOTA: A quantidade de lotes corresponde à divisão da quantidade vendida por 3.200, arredondada por excesso, e o número de capacetes enviados para testes à multiplicação de 5 pelo número de lotes.
Note-se que a percentagem de capacetes testados em função das vendas nos 3 anos supera em todos eles a relação percentual de 0,16% (5/3200) atrás exibida, pelo que os cálculos apresentados não pecam por defeito. Quer no caso da Austrália, quer no caso da Europa, os cálculos foram efectuados por ano atendendo às quantidades vendidas, por ser impossível determinar a produção por tipo de capacete. Existirá alguma sobreavaliação das quantidades de capacetes testados, na medida em que, em especial para a Europa, a quantidade vendida de alguns capacetes (CRF, GP3, POLICE e STORM III) nos três anos não supera sequer os 3.200 capacetes e foi considerado em cada um dos anos o envio de capacetes para obtenção de etiquetas. Assim, os cálculos apresentados não pecam por defeito. Resumindo, o número de capacetes enviados para os laboratórios para obtenção de etiquetas repartir-se-á, durante o período 2005-2007, da seguinte forma:
EtiquetasEUROPAAUSTRALIATotal
200516540205
200615596155
200713524159
TOTAL455160519
Contudo, os cálculos apresentados foram obtidos em função das quantidades vendidas declaradas na Contabilidade, que já vimos não corresponderem ao total das vendas apuradas pelo controlo físico. Assim, importa extrapolar para o total das vendas de capacetes apurado, a quantidade de capacetes envolvidos na obtenção das etiquetas, tal como se demonstra no quadro seguinte:
Descrição200520062007Total
Vendas Contabilidade83.18770.83557.167211.189
Vendas Controlo Físico103.17480.79760.798244.769
Capacetes Etiquetas Cont205155159519
(4)=(3)*(2/1)Capacetes etiquetas C.F.254177169600
Em termos de conclusão, podemos afirmar que no decurso dos três anos em análise, a CMS comprou uma quantidade de cascos que deram origem a capacetes, dos quais 4.655 unidades foram utilizadas nos mais diversos testes, não tendo sido aproveitados para venda. No quadro seguinte apresenta-se a distribuição por cada um dos exercícios económicos, sendo que em todos os testes, excepto no caso das etiquetas, foi efectuado uma distribuição equitativa pelos 3 anos:
Testes200520062007TOTAL
Homologações727272215
Certificações606060180
Testes prévios296296296888
Testes rotina9249249242772
Sub-total1352135213524055
Etiquetas254177169600
TOTAL1606152915214655
Em termos de quantificação dos cascos inutilizados no decurso do processo produtivo, o sócio gerente afirmou em Auto de Declarações (ver Anexo 13), “não conseguir precisar que quantidades poderão estar envolvidas”. Foi solicitada a apresentação de guias de transporte relativas ao envio dos cascos inutilizados para os fornecedores dos cascos (reaproveitamento como matéria-prima), para unidades de recepção de produtos tóxicos, conforme impõe o Ministério do Ambiente, ou para outro destino que tenha sido dado aos mesmos, mas até à data do presente Relatório nada nos foi exibido.
Apenas se sabe que a única fase do ciclo de produção em que podem ser gerados produtos defeituosos é na pintura do casco. Esta linha de pintura é automática e, segundo informações do sócio-gerente, detém uma capacidade de cerca de 180 cascos por operação. Também se apurou que, na maioria das situações, é possível reintroduzir os cascos na linha de pintura, para uma segunda ou terceira demão, possibilitando o reaproveitamento dos mesmos. Nalguns casos, tal não será possível devido a deficiências na secagem da tinta.
Não sendo possível quantificar de forma mais exacta, resta-nos considerar a existência de produtos defeituosos em função de uma percentagem da quantidade produzida. Tendo em conta as existências iniciais e finais de produtos acabados constante dos inventários (ver Anexo 17) e as quantidades vendidas de capacetes apuradas pelo controlo físico, determinou-se o volume de produção de capacetes em cada um dos anos em análise, conforme quadro seguinte:
QUANTIDADES200520062007
Existência Inicial Prod acabados1576708234
Vendas capacetes10317480.79760.798
Existência Final Prod. acabados708234605
Produção Capacetes102.30680.32361.169
Assim, se considerarmos uma percentagem de 1% para cascos defeituosos, e recordando que não nos foi exibido um único documento ou registo que comprovasse a existência de produtos defeituosos, a quantidade de cascos que não terão sido aproveitados para o ciclo de vendas elevar-se-á a um total de 7.094 unidades no cômputo dos três anos em análise e redistribuir-se-á por cada exercício da seguinte forma:
TESTES200520062007TOTAL
PRODUÇÃO Capacetes102.30680.32361.169243.798
Cascos Defeituosos (1% Produção)1.0238036122.438
Cascos p/ Testes1.6061.5291.5214.656
TOTAL CASCOS INUTILIZADOS2.6292.3322.1337.094
% Inutilizados vs. Produção2,6%2,9%3,5%2,9%
A percentagem de cascos inutilizados face à produção parece-nos bastante razoável, e próxima dos referenciais em empresas do mesmo sector, não sendo incoerente o facto de evoluir positivamente ao longo do período, na medida em que foi considerado a uniformidade de testes de rotina nos três anos, conforme Auto de Declarações (ver Anexo 13). De realçar que os testes de rotina serão aqueles que inutilizam o maior número de cascos, conforme quadro seguinte:
DESCRIÇÃO200520062007TOTAL
HOMOLOGAÇÕES727272216
CERTIFICAÇÕES606060180
TETES PRÉVIOS296296296888
TESTES ROTINA9249249242.772
ETIQUETAS254177169600
DEFEITUOSOS1.0238036122.438
TOTAL2.6292.3322.1337.094
Desta forma, considerando a existência de cascos inutilizados, não aproveitados para o ciclo das vendas, por serem alvo de testes internos e externos ou por sofrerem danos na linha de produção, a omissão em termos de quantidades eleva-se aos dados do quadro seguinte:

Omissão vendas200520062007TOTAL
(1) Omissão quantidades19.9879962363133580
(2) Cascos inutilizados2629233221337094
(3)=(1-2) Quantidades vendas omitidas173587630149826.486
Recorde-se que não existem mecanismos de controlo da produção, nomeadamente através de ordens de fabrico, o que torna impossível proceder a qualquer tipo de teste à produção para validar os consumos. As deficiências ao nível do controlo da produção não permite aferir a credibilidade da informação mediante outro procedimento que não seja o controlo físico atrás descrito. Para efeitos de valorização das quantidades omitidas será considerado o preço médio de venda dos capacetes, que foi calculado com base na facturação, conforme se relembra no quadro seguinte: (...)
Assim, atendendo à quantidade de capacetes vendida à margem da Contabilidade e ao preço médio obtido com base na facturação emitida pela CMS, é possível determinar o valor das omissões de proveitos em cada um dos três exercícios em análise, para efeitos de tributação em sede de imposto sobre o rendimento, conforme se ilustra no quadro seguinte:
Omissão vendas200520062007TOTAL
(1) Quantidade vendas omitidas173587630149826.486
(2) Preço médio capacetes26,10€27,23€27,25€
(3)=(1)*(2) Quantidades vendas omitidas452.993,55€207.728,81€40.833,69€701.556,05€
IV.2.2.1.1 Exercício de 2005
Perante o exposto no ponto IV.2.2.1, a fls. 29, resta-nos concluir que se concretizou uma supressão de 452.993,55 euros ao volume de negócios no exercício de 2005, com evidente prejuízo ao nível do imposto sobre o rendimento apurado, valor que importa acrescer ao lucro tributável declarado pela CMS na respectiva declaração de rendimentos modelo 22 de IRC..
(...)
IV.2.2.1.4 Resumo das Omissões de Proveitos
Atendendo à quantidade de capacetes vendida à margem da Contabilidade e ao preço médio obtido com base na facturação emitida pela CMS, foi possível determinar o valor das omissões de proveitos em cada um dos três exercícios em análise, para efeitos de tributação em sede de imposto sobre o rendimento, conforme se ilustra no quadro seguinte:
Omissão vendas200520062007Total
(1) Quantidade vendas omitidas173687630149826.486
(2) Preço médio capacetes26,10€27,23€27,25€
(3)=(1)x(2) Quantidade vendas omissas452.993,55€207.728,81€40.833,69€701.556,05€
Anteriormente, foi realçado que gradação das omissões era fortemente congruente com a evolução das margens brutas evidenciada no ponto IV.1.2, a fls. 15, em que existia um aumento gradual das mesmas, conforme se relembra no quadro seguinte:
Descritivo2004200520062007
Margem Bruta (Vendas+Var. Prod. CMVMC)994.826,17€925.907,04€894.477,02€829.394,44€
Rác. MBruta (Mg./CMVMC)68,1%69,2%83,2%99,2%
Ou seja, à medida que as quantidades omitidas à facturação diminuem, como se demonstrou anteriormente, as margens brutas fornecidas pela Contabilidade aumentam, o que é perfeitamente racional e atesta credibilidade ao controlo físico efectuado. Por outro lado, também foi inicialmente referido que não possível encontrar justificação para o aumento substancial das margens brutas sobre o custo das matérias consumidas, perante um cenário de manutenção da estrutura de vendas por tipo de capacete e dos preços médios de venda dos capacetes, aliada a uma oscilação exígua ou ligeiramente positiva nos custos das matérias-primas adquiridas, o que foi corroborado pelo próprio sócio-gerente da CMS, em Auto de Declarações (ver Anexo 13). Contudo, se recalcularmos as margens brutas sobre o custo das matérias consumidas acrescendo o valor das omissões, as percentagens já se tornam mais coerentes e uniformes ao longo dos três anos em análise, atestando credibilidade às correcções apuradas, conforme quadro seguinte:
Descrição200520062007
(1) Vendas produtos (contabilidade)2.267.724,89€2.016.488,76€1.673.140,82€
(2) Variação Produção (Contabilidade)-3.398,40€-46.275,31€-7561,50€
(3) Custo matérias consumidas (contabilidade)1.338.419,45€1.075.736,43€836.184,88€
(4)=(1+2-3) Margem Bruta (contabilidade)925.907,04€894.477,02€829.394,44€
(5)=(4/3) % Mg bruta s/CMVMV (contabilidade)69,2%83,2%99,2%
(6) Omissões proveitos452.993,55€207.728,81€40.833,69€
(7)=(4+6) Margem bruta (contabilidade+omissões)1.378.900,59€1.102.205,83€870.228,13€
(8)=(7/3) %Mg bruta s/CMVMC (contabilidade+omissões)103,0%102,5%104,1%
Perante as correcções efectuadas, as margens brutas sobre o CMVMC oscilam entre 102,5% e 104,1%, no triénio 2005-2007, percentagens estas que se aproximam mais das margens apresentadas por outras empresas do distrito do mesmo sector, apesar de ficar, mesmo assim, ainda aquém das mesmas.
(...)
VII. Outros elementos relevantes
Conforme se explicitou no ponto II.2.1., a fls. 6, a presente ação inspetiva resultou do pedido de colaboração da Direção de Serviços das Relações Internacionais (DSRI), atavés do Ofício n.º ...44, de 27 de agosto de 2007, relativo ao Processo n.º ...07, no sentido de se apurar a existência de práticas de “subfacturação nas transações comerciais estabelecidas com empresas brasileiras” (...). Assim, foi elaborada informação interna, datada de 20 de junho de 2008, a qual foi enviada àqueles serviços com vista à troca de informações com as Autoridades Fiscais do Brasil, passando-se de seguida a resumir as principais conclusões.
A « X, Lda. » tem um único cliente no Brasil, em São Paulo, designado «K, LTD»., ... ...01, apesar de ter emitido faturação para outros importadores, enquanto o seu cliente final «K, LTD» não obteve determinadas licenças de importação.
Desde o ano de 2004, a « X, Lda. » tem vindo a utilizar um procedimento ao nível da faturação de capacetes e respetivos acessórios, no que concerne às exportações para o Brasil, que se caracteriza pela emissão de duas faturas, a primeira em nome do importador, enquanto o seu cliente não obteve a licença de importação, ou em nome do cliente após a obtenção em 2007 da referida licença, e uma segunda sempre em nome do seu cliente «K, LTD» ressalvando um caso em que a segunda foi emitida em nome de «L, Ltda.»
A primeira fatura é a que servia de suporte à operação alfandegária na qual era debitado um preço unitário por capacete ou por acessório que se encontrava subtraído de um remanescente de valor considerável que era posteriormente debitado na segunda fatura em nome do cliente «K, LTD», documento este que nunca passava pelos controlos alfandegários.
Durante os exercícios de 2004, 2005 e 2006 a «K, LTD» recorreu a importadores licenciados, aos quais a « X, Lda. » emitia a fatura que passava pelos controlos alfandegários, conforme se vislumbra no quadro da página seguinte. A partir de 2007, a «K, LTD» obteve licença de importação, pelo que passaram a ser emitidas duas faturas em seu nome, com o preço unitário dos capacetes e acessórios repartidos pelas mesmas, sendo que apenas uma, normalmente a de valor mais baixo é que suportava a operação aduaneira.
(...)
O quadro acima evidencia que a « X, Lda. » praticou um volume global de faturação para o Brasil no montante de 856.000,91 euros, durante os quadriénios em análise (2004 a 2007), dos quais apenas 300.876,03 euros foram declarados para efeitos de controlos alfandegários, os quais correspondem ao somatório das faturas emitidas aos importadores.
(...) Em resumo, a « X, Lda. » não regista qualquer omissão de proveitos por via do esquema utilizado na emissão de duas faturas por cada transação, existindo antes uma repartição do preço de venda unitário dos capacetes por dois documentos de faturação, possibilitando assim ao seu cliente no Brasil o pagamento de direitos alfandegários menores. Na verdade, os valores declarados para efeitos de exportação de produtos encontram-se subtraídos nos montantes correspondentes às segundas faturas, que ascendem a 555.124,88 euros...” (Cfr. RIT, despacho e notificação, a fls. 1 a 45 e 197 a 203 do PAT em apenso);
8. A Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável em requerimento que deu entrada junto do Serviço de Finanças ... em 7 de janeiro de 2009 – (Cfr. requerimento, a fls. 233 a 243 do PAT em apenso);
9. Tendo-se realizado reunião para o debate contraditório entre os peritos do contribuinte e da Administração Tributária no dia 27 de fevereiro de 2009, sem que tenha sido atingido acordo entre os mesmos, tendo sido elaborada na mesma data a respetiva ata, com o seguinte teor:
“1 Análise à evolução das margens brutas
(...) É minha convicção de que os elementos apresentados neste quadro, numa leitura rápida espelha um “descontrolo” da actividade da empresa que depois de os conjugar com os argumentos do relatório que dão origem à aplicação dos métodos indirectos, não deixa margem para dúvidas em como a empresa nos exercícios em análise omitiu valores significativos ao nível das vendas, resultando deste procedimento prejuízo efectivo para o Estado.
... A empresa, não se justifica, sobre uma grande variação de margem +. 30%.
A leitura que eu faço, é que à medida que o Resultado do Exercício vai diminuindo a empresa vai tendo maior “liberdade” de apresentar margens de lucro, mais próxima das que efectivamente pratica. ...
2 Rendibilidades fiscais:
Exíguas em 2005 e 2006
Exercício de 2007 – negativa.
As rentabilidades fiscais, acompanham em sentido inverso a evolução do Rácio anterior, que é consequência da diminuição dos resultados gerados.
3 Suprimentos, motivo “dificuldades de tesouraria da empresa”
De acordo com o n.º 2 do artigo 63º-C da Lei Geral Tributária (LGT) “devem, ainda, ser efectuados através da conta ou contas referidas no n.º1 art. 63º-C – LGT todos os movimentos relativos a suprimentos, outras formas de empréstimos e adiantamentos de sócios, bem como quaisquer outros movimentos de ou a favor dos sujeitos passivos”. Assim, como parte das entradas para suprimentos foram em numerário, não foi e não é possível comprovar se essas entregas por parte dos sócios-gerentes, são entradas efectivas.
4 Controlo dos movimentos físicos das existências
... Face às muitas divergências atrás apontadas, ao cuidado /rigor imposto pela Inspecção, no controlo e apuramento das quantidades e valores, é minha convicção, que a empresa omitiu efectivamente as vendas de capacetes apuradas, diminuindo desta forma, o Resultado da actividade e consequentemente o imposto a entregar nos Cofres do Estado. Salienta-se o facto de todas as quantidades e valores utilizados serem da própria contabilidade, uma vez que resultam da recolha de ficheiros SAF-T.
Métodos Indirectos: –
Face ao exposto, todos as situações atrás descritas – ponto “3”, concorrem para a “impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável”, conforme o artigo 87º e art. 88º da LGT.
(...)
3. 2 – ANÁLISE DO “PEDIDO DE REVISÃO” DO CONTRIBUINTE:
E, Comentário por parte do Perito da A T.
3.2.1 – Pontos 1 a 4 – Refere-se aos argumentos da Inspecção:
Ao 1º fundamento invocado pela Inspecção para recorrer a métodos indirectos – partindo do controlo dos fluxos financeiros de Caixa:
Alegadamente, os saldos de caixa não revelarem de forma verdadeira e apropriada a posição financeira da empresa...;
A conclusão, que tal situação “conduz impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável...; Aos Suprimentos, parte entrega em numerário, não existindo evidência do depósito dos mesmos; Ponto 5 – Conclusão do contribuinte:
A empresa tem contabilidade organizada. Se tivesse sido feita a análise exaustiva aos movimentos do Caixa nos meses de Julho e Agosto – entradas em numerário, ter-se-ia verificado que tais valores correspondem na sua quase totalidade a efectivos movimentos de dinheiro, ainda que tenham dado origem a movimentos contabilísticos em contas erradas.
Comentário do Perito da AT.:
Motivos que obriga uma empresa a dispor de contabilidade organizada são: Para que as demonstrações financeiras devam evidenciar uma imagem fiel verdadeira e apropriada da situação económica-financeira da empresa e fornecer informação relevante e comparável, seguindo os princípios contabilísticos fundamentais. Torna-se evidente, que todas as operações devem ser reflectidas na contabilidade sob pena de gerar alterações de nível qualitativo e quantitativo. De acordo com a alínea a) do n.º 3 do artigo 17º do CIRC, a contabilidade deve “estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respetivo sector de actividade, sem prejuízo da observância das disposições previstas no Código”. Principio Constitucional – de acordo com o n” 2 do art. 104º CRP, “A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real.
3.2.2 – Pontos 6 a 20:
3.2.2.1 – “Movimentos contabilísticos em contas erradas....”
Comentário do Perito da AT.:
Então, para que serve a contabilidade?!. A resposta está dada no ponto anterior.
3.2.2.2 – Apresenta 2 casos do movimento do CAIXA em contas erradas – movimentos incorrectos nas contas do Sócio, justificando um saldo contabilístico inferior ao real em 10.000,00€
Comentário do Perito da AT.: Como é que a empresa tendo um saldo de Caixa supostamente superior ao contabilístico, não se preocupa com as divergências e não vai procurar / verificar / rectificar os saldos?!
3.2.2.3 – Recebimento de clientes – 3 pagamentos relevados contabilisticamente em Agosto, quando foram pagos em Setembro, de modo a evitar saldos credores de Caixa, em fins de Agosto. 3.2.2.4 – Entrada de dinheiro em Caixa (numerário) destinava-se a evitar que a conta Caixa apresentasse saldo credor. Comentário do Perito da AT.: É este o procedimento da empresa, andar a “compor” o saldo de Caixa?!.
3.2.2.5 – Acabando por dizer que não têm quaisquer implicações em resultados, o que vale que são fiscalmente inócuas.
3.2.2.6 – Como notas finais, ainda sobre o Caixa: Embora os movimentos contabilísticos envolvam registos no Caixa, tal não significa que a empresa não dê cumprimento ao art. 63º – C da LGT, acabando por ir parar às contas da empresa.
Comentário do Perito da AT.:
O que se oferece dizer em relação ao art. 63º-C é somente o que obriga o nº 2 do mesmo artigo, já atrás descrito. A empresa, justifica-se com contas mal movimentadas de caixa, clientes, registos antecipados de caixa e não se justifica sobre o fundamental, que é o que está em causa – A ORIGEM DOS SUPRIMENTOS – as entradas de caixa em numerário e outras, por parte dos sócios. Assim, mantêm-se os mesmos argumentos apresentados no Relatório, onde se conclui que a Conta Caixa não revela de forma verdadeira e apropriada a posição financeira da empresa..., como não permite conferir credibilidade à informação financeira e conduzem a irregularidades (...) na organização ou execução da escrituração.
3.2.3 – CONTROLO DOS MOVIMENTOS FÍSICOS DAS EXISTÊNCIAS
3.23.1 – Pontos 21 a 52:
3.2.3.1.1 – Controlo dos movimentos físicos das existências, através das quantidades movimentadas;
3.2.3.1.2 – O método merece no essencial, o acordo do s.p., porém as conclusões assim obtidas revelam-se inesperadas e surpreendentes por (irreais), que o reclamante só encontra 2 justificações: – Furto de que pudesse ser alvo; – Pressupostos que, embora retirados da contabilidade, não correspondiam à realidade.
Comentário do Perito da AT.:
Em relação aos furtos, a serem verdadeiros deveriam estar evidenciados na contabilidade. Se fossem em quantidades elevadas, deveriam ter sido participado às autoridades policiais ou outras. Como não estão contabilizadas nem participadas, não me parece viável esta justificação até porque um capacete não é fácil de esconder à saída da fábrica.
3.2.3.1.3 – Concretamente, está a pensar-se no cuidado com que são feitos os inventários, sobretudo ao nível da identificação dos bens em stock e nas incorrecções daí decorrentes.
– Existem 2 grupos de cascos:
– Um, a estrutura do capacete –
Outro, cascos de esferovite, que também são designados como cascos – para enchimento do capacete.
3.2.3.1.4 – Apresenta, depois um controlo do movimento dos cascos com reporte a 2003; 2004; 2005; 2006 e 2007.
3.2.3.1.5 – Apresenta um mapa com um controlo dos capacetes desde 2003 a 2007, no seu ponto 30, onde se verificam valores totalmente diferentes, ao ponto de, só em 2007, apurarem uma pequena divergência de cerca de 3.428 capacetes.
Comentário do Perito da AT.:
Em relação a 2003 e 2004, em minha opinião não são exercícios em apreciação. O contribuinte por várias vezes refere a palavra “rigor”, rigor em inventários, rigor nas contagens. Com tanto rigor e com inundações pelo meio, porque é que só em 31/12/2008, é que despertaram ou se lembraram de “re” apurar, as “Existências” de 2003 a 2007? O rigor, deve ser a todos os níveis, a começar na contabilidade, com os documentos, com os inventários (matérias-primas, produtos em vias de fabrico, produtos fabricados), com as despesas de pessoal, outras e com declarações obrigatórias que devem ser entregues à AT. Outro aspecto a realçar, é o “RIGOR” do ponto 30, do pedido de revisão, o qual deu origem ao seguinte: . 2003, 52.794 capacetes – quantidades para venda, contra 84.750 capacetes vendidos / facturados, ou seja, uma diferença para menos de 31.956 capacetes. Para 2004, 94.343 capacetes para venda – quantidades para venda, contra 85.218 capacetes vendidos / facturados, ou seja, uma diferença para mais de 9.125 capacetes. Onde está credibilidade da contabilidade?. Tão grandes divergências? – E minha convicção que não serão verdadeiras as quantidades agora apresentadas.
3.2.3.1.5 – No ponto 48, vem a dizer, “é pois, indiscutível, que o problema essencial da reclamante reside na falta de cuidado com que elaborou os inventários ...”. Ponto 57, “embora se admita a existência de incorrecções ao nível dos inventários, fruto de pouco rigor...”
Comentário do Perito da AT.:
E do conhecimento de todas as pessoas ligadas às contabilidades (TOCs), como é do conhecimento dos Inspectores Tributários, que os inventários são um “excelente” meio de se “trabalharem os Resultados” e assim, pagar-se menos IRC, Como ainda, os inventários são um “excelente” meio para camuflar vendas não facturadas.
3.2.3.1.5 – Margens líquidas de lucro elevadíssimas.
O relatório, justifica que essas percentagens se aproximam das margens apresentadas por outras empresas do distrito do mesmo sector, apesar de ficarem, mesmo assim, aquém das mesmas.
Comentário do Perito da AT.: Pelos cálculos que são apresentados no relatório, atendendo que foram retirados da contabilidade, há evidências de que as %s agora apuradas se ajustam ao sector.
3.3. – Aberto o “DEBATE”
“– Perito do contribuinte: –
Foi-lhe perguntado se tinha novos elementos a apresentar ou se tinha alguma coisa mais a acrescentar para além do que sido apresentado. Respondeu que não.
No entanto, argumentou que a inspecção estava incorrecta e a empresa não vendia por fora. Admitiu que os inventários não estavam correctos. –
Era impossível, que a empresa tivesse vendido por fora os valores propostos pela inspecção. Focou a inundação de 2003. –
Em relação ao Caixa – Suprimentos, afirmou que os valores estão justificados, à excepção dos 10.000,00€
– Focou, que a percentagem agora apurada pela Inspecção de 103% – 2005, 2006 – 102,5% e 2007 – 104,1%, é exagerada.
– Focou ainda, a manterem-se os valores agora propostos não haveria acordo.
– Perito da AT.: –
Foquei os elementos do Quadro da fl. 30 do Relatório, como sendo o reflexo da contabilidade, uma vez que apresenta elevadas diferenças nas margens de lucro bruto e da rentabilidade fiscal, sem que para tal tenha sido apresentado um argumento (s) justificativos de tais variações. Aliás, mantenho o que atras ficou descrito na referência a este quadro.
– Quanto à percentagem de lucro bruto, foi dito ao Perito do contribuinte que estas percentagens são muito inferiores às que efectivamente praticou, por razões já apontadas.
(...)
– Em relação às percentagens não se compreende que as mesmas em apenas 3 exercícios, tenham subido 30%, quando em minha opinião deveriam estar a manterse ou a baixar, justificado pela diminuição das vendas.
Quanto ao Caixa – Suprimentos, os valores que entrarem na empresa, deverão ser através de cheque (s) e não em numerário – nº 2, art. 63º-C LGT.
– Em relação às Mgs, a tendência das mesmas (em minha opinião), seria manter-se ou mesmo baixar, atendendo a que as vendas diminuíram em 30,4%, entre 2005 e 2007, seguindo a lei da procura e da oferta.
– A partir do momento que disse que não haveria acordo, o debate parou, por já não se justificar continuar.
1. Face ao descrito neste Pedido de Revisão, não foi possível aceitar os argumentos apresentados pelo Perito de Contribuinte, pelo que não foi chegar a acordo. (...)” – (Cfr. ata da reunião de peritos, a fls. 298 a 321 do PAT em apenso);
10. No seguimento de referida reunião, em 15 de abril de 2009, o Diretor de Finanças ... proferiu despacho de fixação da matéria tributável com os fundamentos vertidos no parecer n.º 26/2009 da Direção de Finanças ..., de 3 de abril de 2009, com o seguinte teor:
“(...) D.3 – Posição do perito da Administração Tributária
(...) aos movimentos de caixa:
“Como é que a empresa tendo um saldo de Caixa supostamente superior ao contabilístico, não se preocupa com as divergências e não vai procurar/verificar e retificar os saldos?
É este o procedimento da empresa, andar a “compor” o saldo da Caixa? A empresa, justifica-se com contas mal movimentadas de caixa, clientes, registos antecipados de caixa e não se justifica sobre o fundamental, que é o que está em causa – A ORIGEM DOS SUPRIMENTOS – as entradas de caixa em numerário e outras, por parte dos sócios. (...) a conta Caixa não revela de forma verdadeira e apropriada a posição financeira da empresa..., como não permite conferir credibilidade à informação financeira e conduzem a irregularidades (...) na organização ou execução da escrituração.
Ao controlo dos movimentos físicos das existências:
Em relação aos furtos (...) Como não estão contabilizadas nem participadas, não me parece viável esta justificação (...). Outro aspecto a realçar é o “Rigor” do ponto 30, do pedido de revisão, o qual deu origem ao seguinte:
2003, 52.795 capacetes – quantidades para venda, contra 84.750 capacetes vendidos/faturados, ou seja, uma diferença para menos de 31.956 capacetes.
Para 2004, 94.343 capacetes para venda – quantidades para venda, contra 85.218 capacetes vendidos/faturados, ou seja, uma diferença para mais de 9.125 capacetes.
Onde está a credibilidade da empresa?
Tão grandes divergências? (...) Os inventários são um “excelente” meio de se “trabalharem os resultados” e assim, pagar-se menos IRC, como ainda, os inventários são um excelente meio para camuflar vendas não faturadas” (...) Em relação às percentagens não se compreende que as mesmas em apenas 3 exercícios, tenham subido 30% quando em minha opinião deveriam estar a manter-se ou a baixar, justificado pela diminuição das vendas”.
“(...) E – Apreciação da matéria tributável
E.1 – Pressupostos para aplicação de métodos indiretos
(...) Assim, o reclamante tendo a sua escrita organizada segundo as exigências legais tem a seu favor uma presunção estabelecida na lei. Contudo, esta presunção cessa quando haja indícios fundados de que, apesar da correta organização da contabilidade, esta não reflete os verdadeiros negócios efetuados e consequentemente a real matéria tributável.
A inspeção tributária no ponto IV.1 do relatório (pág. 11 à 23), expõe claramente vários argumentos que implicam o recurso à avaliação indireta. Resumidamente, são aqui enumerados:
Controlo dos fluxos financeiros do Caixa:
No triénio em análise contabilizou-se, na conta Caixa, 320.000,00 euros a título de suprimentos dos sócios à empresa. Notificados para justificar a origem dos meios financeiros, apenas justificaram os débitos efetuados no mês de janeiro e fevereiro de 2005, como sendo resultantes do produto da venda de apartamentos. Note-se que parte dos suprimentos foi concretizada “em dinheiro”. Com esta prática, o sujeito passivo não deu cumprimento ao n.º 1 e 2 do artigo 63.º-C da LGT. Transcreve-se, por pertinente, o seguinte parágrafo do relatório de inspeção: “Desta forma, não é possível atestar que os suprimentos supostamente realizados em numerário sejam efetivos, uma vez que não existe a movimentação das contas bancárias referidas, conforme exige a LGT. Acresce a este facto, a circunstância, recorrente e indiciadora de falsidade, do saldo do Caixa se encontrar negativo antes do registo contabilístico do suprimento e este ser o último movimento de cada um dos meses em que ocorrem os supostos suprimentos em numerário (...)” – página 12 do relatório da I.T.
Por outro lado, constata-se que estes lançamentos são os últimos do mês, registados através de documentos internos cujo número (já existente e referente a uma operação distinta) é seguido por uma letra, indiciando a existência de lançamentos fictícios, decorrentes da necessidade de compor o aldo de caixa, perante a sua evolução para saldos negativos. O oposto também se confirma, isto é, o último lançamento do mês de Setembro (1920-A) foi registado, após o registo do lançamentos do mês de outubro, titulando uma suposta restituição de suprimentos, em numerário, de 7.000,00 euros, perante a necessidade de compor montantes excessivamente elevados para um saldo normal de caixa.
Perante estas situações conclui-se que os saldos de Caixa não revelam de forma verdadeira e apropriada a situação financeira da empresa. Estas deficiências ao nível do controlo dos fluxos financeiros, não conferem credibilidade à escrita do sujeito passivo;
Análise à evolução das margens brutas:
Não foi encontrada justificação para o aumento substancial das margens brutas sobre o custo das matérias consumidas (Mg bruta/CMVMC), de 69,2%, em 2005, para 99,2% em 2007, atendendo à manutenção da estrutura de vendas por tipo de capacete e respetivos preços de venda praticados, no triénio, aliada a uma oscilação diminuta nos custos das matérias primas adquiridas;
Controlo dos movimentos físicos das existências:
Este controlo foi efetuado aos cascos para capacetes, por ser o componente comum a todos os produtos produzidos pela empresa.
Controlo dos movimentos físicos das existências:
Este controlo foi efetuado aos cascos para capacetes, por ser o componente comum a todos os produtos produzidos pela empresa.
o Apuraram-se as quantidades vendidas através da fórmula: Existência inicial (Ei) + Compras – Existência Final (Ef), tendo-se relacionado todas as compras com base nas faturas e/ou documentos equivalentes e notas de crédito associadas;
o Procedeu-se à recolha dos ficheiros de faturação da empresa, de modo a obter as quantidades vendidas e respetivos valores de venda.
Por comparação, obtiveram-se as diferenças evidenciadas no quadro seguinte, demonstrativas da omissão de proveitos (...) assim demonstra-se de forma clara a existência de vendas de capacetes sem a correspondente fatura ou documento equivalente;
Análise do custo de produção e valorização dos inventários:
Não existe uma preocupação devida aquando da valorização dos inventários, sendo percetível que a valorização dos produtos acabados ao custo de produção não cumpre os critérios de valorimetria do Plano Oficial de Contabilidade (POC);
Controlo de documentos de transporte e notas de encomenda:
Foi efetuado um controlo aos documentos de suporte à faturação, descrevendo-se de
seguida um dos vários exemplos detetados:
Da nota de encomenda n.º ...89, que requisitava 12 capacetes foram emitidos pelo
reclamante dois documentos:
o A guia de remessa n.º ...42 que mencionava 6 capacetes; e com a mesma data desta,
o A guia de transporte n.º ...08 indicando os outros 6 capacetes encomendados.
Da análise da faturação emitida a este cliente identificou-se a fatura n.º ...26, onde apenas constavam faturados os capacetes mencionados na guia de remessa. Ou seja, dos 12 capacetes encomendados apenas 6 foram facultados. Dos vários exemplos descritos no relatório da Inspeção (páginas 22 e 23), conclui-se que dum total de 517 capacetes encomendados, apenas 246 foram faturados. Perante este cenário, é evidente a prática de venda de produtos sem a emissão da correspondente fatura ou documento equivalente.
Além do já referido, temos a acrescentar os seguintes comentários:
Com o objetivo de obter uma imagem verdadeira e apropriada da situação financeira e dos resultados das operações da empresa, esta está obrigada aos Princípios Contabilísticos enumerados no Plano Oficial de Contabilidade, realçando-se o Princípio da especialização (...) ao analisarmos os inventários anexos ao relatório da inspeção, concluímos que existe uma elevada discriminação dos produtos, sendo estes devidamente identificados, quer por referencias quer por designações individuais, conseguindo-se facilmente identificar os cascos, estrutura do capacete, dos cascos de esferovite. Logo, não se compreende a afirmação do perito do contribuinte expressa nos pontos 26 e 27 da petição do pedido de revisão, pois ao contrário do afirmado, quanto mais discriminados e caracterizados os produtos, maior rigor é reconhecido aos inventários e só assim são evitados possíveis erros, como por exemplo duplicações na inventariação das existências.
Por outro lado, o declarado nos pontos 30, 39, 46 e 47 da referida petição, leva-nos a concluir que a apresentação daquelas diferenças foi uma vã tentativa de justificar o “injustificável”:
Por um lado, apresenta um quadro com diferenças acumuladas de 2003 a 2007, onde se lê que de uma diferença de 31.956 unidades, em 2003, está é esbatida, obtendo-se 3.428 unidades em 2007. Por outro lado, refere que as diferenças imputáveis a 2008 neutralizam, por completo as acumuladas em 31/12/2007 (3.428), invertendo-lhe o sinal (ponto 47), quando a diferença do ano de 2008 ascende a 24.286 unidades. Não se compreende a apresentação daquelas quantidades, principalmente se atendermos ao facto do contribuinte afirmar que a análise efetuada deveria iniciar-se em 2003, pois só conferia rigos aos inventários deste ano (ponto 31 da petição) e à inventariação física elaborada à data de 31/12/2008 (ponto 45 da petição). (...) Perante os facto descritos, através dos quais se torna evidente a realização de vendas sem o correspondente registo contabilístico verifica-se não ser possível proceder à quantificação do lucro tributável real do sujeito passivo. (...)”. – (Cfr. despacho e parecer, junto do processo de reclamação para a comissão de revisão, a fls. 325 a 340 do PAT em apenso);
11. Pelo perito da Impugnante foi elaborado laudo com o seguinte teor:
“As anomalias imputadas à reclamante resultam, basicamente de erros na inventariação dos stocks, cometidos ao longo dos anos de 2003 a 2008. Deste modo (e como resulta do pedido de revisão) o controlo anual efectuado com base nos inventários, como foi o caso conduz a resultados reconhecidamente errados. Haveria, portanto que encontrar uma margem média de lucro que traduzisse a realidade da reclamante, que seria obtida tratando globalmente o período onde os inventários merecessem crédito. Para tentar obter resultados com credibilidade, o período em causa era o que decorria entre Janeiro de 2003 e Dezembro de 2 008; admite-se, porém que o universo de referência seja mais restrito, abrangendo, apenas os anos de 2004 a 2007, anos que foram objecto de análise no decurso do exame. Persistir no controlo anual, tal como fez a Fiscalização é fechar os alhos à realidade, ficcionando valores que, por aberrantes, ninguém minimamente sensato admite. De acordo com tais conclusões, em 2004 a reclamante teria vendido, por fora cerca de 20% da sua produção o que não deixa de causar alguma estupefacção; Situação que se mantem para 2005, apesar de as hipotéticas omissões representarem, agora apenas cerca de 10% (que valem mais de € 200.000,00). A comparação com a concorrência (invocada no relatório da Fiscalização) deve ser convenientemente analisada: Importaria verificar se a alegada existência de mais elevadas margens brutas na concorrência tem correspondência nos montantes dos lucros tributáveis e se o método de custeio é semelhante nas empresas que se pretendem comparar. Em conclusão: Só a margem ponderada, na reclamante, relativa a um período suficientemente longo poderá servir de critério de avaliação do comportamento da empresa, jamais se aceitando correcções feitas anualmente, com base em pressupostos que se sabem, antecipadamente, não traduzirem a realidade.” (Cfr. laudo, a fls. 324 do PAT em apenso);
12. Posteriormente, foram emitidas em nome da Impugnante as seguintes demonstração de liquidação/notas de cobrança/demonstração de compensação:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(Cfr. demonstração de liquidação e nota de cobrança/demonstração de compensação, a fls. 342 e 343 do PAT em apenso);
Mais se provou que:
13. Quanto às quantias identificadas no mapa de fls. 11 do Relatório de inspeção tributária, respetivamente de €67.500,00 e €60.000,00, as mesmas resultaram da venda de apartamentos pelo sócio gerente da Impugnante «AA» – (Cfr. artigos 13.º e 42.º da petição inicial, anexo 10 do RIT, a fls. 67 do PAT em apenso e prova testemunhal);
14. Relativamente ao ano de 2005 resultam do extrato bancário n.º 12/2005 relativo à conta bancária titulada pela Impugnante os seguintes movimentos:
DataDescrição movimentovalor
12/12/2005transferência80.000,00€
15/03/2005B08444/0111514.500,00€
15/03/2005B08444/0114675.000,00€
(Cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial, a fls. 19 e 20 dos autos);
15. Em 14 de julho de 2005 foi emitido pela Impugnante em nome da empresa «P, LTD.» o recibo n.º ...23 relativo à fatura n.º ...57, no montante de €6.936,70 – (Cfr. artigo 22.º da p.i e recibo, a fls. 244 do PAT em apenso);
16. Nos dias 16, 22 e 26 de agosto de 2005 foram depositados na conta bancária titulada pela Impugnante no Banco 2... os seguintes valores: €2.220,29, €5.528,00 e €2.270,95 – (Cfr. artigo 26.º da p.i. e comprovativos de entrega de valores, a fls. 246 e 247 do PAT em apenso);
17. Em 1 de janeiro de 2003 foi efetuada uma contagem rigorosa de stocks com vista a determinar os prejuízos sofridos, em virtude da ocorrência de uma inundação nas instalações da Impugnante e a fim de receber a respetiva indemnização da seguradora – (Cfr. artigo 62.º da p.i. e prova testemunhal);
18. Em 31 de dezembro de 2008, na sequência da ação inspetiva identificada no ponto 2 foi realizada nova contagem rigorosa dos stocks – (Cfr. artigo 63.º da p.i. e prova testemunhal);
19. Normalmente os inventários das existências não eram elaborados de forma rigorosa, sendo realizados pelos funcionários que estivessem disponíveis à data, sem quaisquer instruções específicas da Impugnante e incorrendo em erros de contagem de stocks – (Cfr. artigos 58.º e 60.º da p.i., prova testemunhal e artigo 5.º, n.º 3, alínea a) do CPC);
20. Para evitar saldos de caixa credores em consequência do desfasamento temporal entre os recebimentos de clientes e os respetivos depósitos, eram realizados movimentos de regularização, em que no momento do depósito era registado o movimento contrário – (Cfr. artigos 25.º e 28.º da p.i. e prova testemunhal);
21. Relativamente às vendas efetuadas pela Impugnante para o Brasil e a pedido dos clientes, para efeitos de redução das taxas alfandegárias, eram emitidas duas faturas para a mesma venda, com o mesmo número, cada uma com valores correspondentes a 50% do valor global da venda, acompanhando uma das faturas a mercadoria e a outra sendo remetida via postal – (Cfr. artigos 70.º e 71.º da p.i. e prova testemunhal);
22. Relativamente aos clientes «EE» e «J» as vendas eram realizadas normalmente à consignação, sendo o número de capacetes vendidos enviados a coberto de uma guia de transporte sendo fracionado em diversas faturas – (Cfr. artigos 81.º a 84.º da p.i., documentos n.ºs 4 e 5 juntos com a p.i, a fls. 24 a 30 dos autos e prova testemunhal);
23. Quanto ao cliente MotoAcessórios Famalicense foram emitidas 4 guias de encomenda relativas a 517 unidades, sendo que apenas em relação a 246 foram emitidas faturas em momento posterior pela Impugnante (Cfr. anexos 23 e 24 do RIT, a fls. 148 a 159 do PAT em apenso);
24. A presente impugnação foi remetida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro em 5 de agosto de 2009 – (Cfr. comprovativo de entrega de documento e carimbo aposto na petição de impugnação, a fls. 2 e 3 dos autos).
Factos não provados
1. As demais quantias identificadas no mapa de fls. 11 do Relatório de inspeção tributária depositadas em contas bancárias em nome da Impugnante tiveram origem em meios financeiros disponibilizados pelos respetivos sócios gerentes.
Motivação da matéria de facto
A decisão da matéria de facto teve por base a posição das partes, os documentos juntos e não impugnados, o teor do processo administrativo instrutor em apenso e a prova testemunhal produzida, conforme referido em cada um dos pontos do probatório.
Os depoimentos das testemunhas mostraram-se, na sua generalidade, credíveis, espontâneos e consonantes com os documentos juntos aos autos, demonstrando conhecimento direto dos factos.
A testemunha «CC» exerce funções de Técnico Oficial de Contas na Impugnante desde o ano de 2004, revelando no seu depoimento o conhecimento dos factos relevantes para a decisão da causa e que resultam provados, nomeadamente os pontos 13 e 17 a 20 do probatório, os quais foram por si corroborados e explicados.
A testemunha «GG», por sua vez, exerceu funções de administrativo na Impugnante desde maio de 2002, tendo sido o seu depoimento considerado quanto aos pontos 17 a 19, 21 e 22 (parcialmente quanto à empresa «D»), tendo corroborado a existência de uma inundação nas instalações da Impugnante que determinou a contagem rigorosa dos stocks com vista ao recebimento de uma indemnização por parte da seguradora, afirmando que normalmente as contagens de stock não eram rigorosas, existindo alguma confusão quanto à identificação dos materiais por parte dos funcionários que realizam as contagens. Do mesmo modo, afirmou quanto às vendas realizadas para o Brasil que a pedido dos clientes e para reduzir as taxas alfandegárias, acompanhava a venda apenas uma fatura da qual constava o valor das mercadorias reduzido a 50%, remetendo posteriormente a fatura do remanescente pelo correio.
Corroborou igualmente a existência de vendas à consignação, mormente quanto à empresa «D», referindo existir um desfasamento temporal entre a venda e a faturação que apenas ocorria quando o produto era efetivamente vendido pelo cliente.
A testemunha «HH», funcionário da Impugnante desde março de 2001, em concreto, exerceu as funções de responsável pela produção desde essa data, tendo sido o seu depoimento considerado quanto aos pontos 17 a 19 do probatório sobre os quais referiu a existência de uma inundação que determinou a contagem rigorosa dos stocks nessa data (fins de 2002, início de 2003), tendo existido nova contagem com o mesmo rigor em 2008 após a ação inspetiva. Afirma que normalmente as contagens não eram rigorosas, sendo realizadas por qualquer funcionário que se encontre disponível e sem quaisquer instruções específicas da Impugnante.
A testemunha «II» exerce as funções de comercial na Impugnante, tendo o seu depoimento sido considerado relativamente ao ponto 22 do probatório, corroborando a existência de vendas à consignação quanto ao cliente «EE» e «D».
Quanto à matéria de facto não provada, o Tribunal formou a sua convicção pela falta de elementos documentais que sustentem a origem dos suprimentos realizados pelos sócios e bem assim a correspondência entre as entradas e saídas de dinheiro da conta de disponibilidades da Impugnante. Do mesmo modo, relativamente à prova testemunhal, mormente do TOC da Impugnante, não convenceu o Tribunal nesta parte, na medida em que o seu depoimento foi genérico, tendo apenas referido, quando confrontado com o relatório de exame, a fls. 11 que os movimentos do mesmo constantes podiam ser movimentos de suprimentos, especialmente os cheques relativos a quantias maiores. Referiu, ainda, que os cheques passam pela empresa e depois são levados ao banco (debitando a caixa e creditando o banco), no entanto, não existem documentos que suportem tal conclusão relativamente aos movimentos concretamente em causa nos autos.»

2.2. De direito
A Recorrente (« X, Lda. ») insurge-se contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 29 de julho de 2020, pela qual foi julgada totalmente improcedente a impugnação judicial contra a liquidação de IRC referente ao ano de 2005, no valor global de € 138.020,85.
Fundamentou a Recorrente a sua impugnação, imputando à liquidação ilegalidades que se reconduzem à ilegalidade das correções operadas em sede de IRC, a saber, vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto por não verificação dos requisitos para recurso a métodos indiretos, pela verificação de excesso na quantificação e pelo facto de não terem sido considerados os argumentos por si esgrimidos no procedimento de revisão, conforme decorre da delimitação do objecto fixado na sentença sob recurso.
A sentença sob recurso, conhecendo dos mesmos, considerou estarem reunidos os pressupostos para o recurso pela AT na determinação da matéria tributável por métodos indirectos, prosseguindo na apreciação da operação de quantificação da matéria tributável considerou que o método adoptado pela AT é admissível e adequado e que as correcções efectuadas não padecem de errónea quantificação e, por último, que não se verifica qualquer omissão de pronúncia em sede de procedimento de revisão.
Cumpre começar por dizer que a decisão cuja legalidade aqui releva para aferir da validade das liquidações adicionais impugnadas não é a que directamente decorreu do RIT, mas sim a que pôs termo ao incidente de revisão da matéria tributável movido em devido tempo pela Recorrente (cf. artigos 91º e 92º da LGT e 117º do CPPT). Aliás, o Tribunal a quo, reflecte isso no esforço de transcrição que carreou para os factos provados, transcrevendo não só as partes mais relevantes do RIT como também as dos laudos dos peritos, da acta e despacho final do procedimento de revisão que remete para a fundamentação e elementos constantes daquele em parte.
Assim, o despacho que decidiu o procedimento de revisão confirma e aí se louva na integralidade do RIT, considerando que se encontram reunidos os pressuposto para a avaliação indirecta, nos termos da alínea b) do artigo 87º e na alínea a) e d), do artigo 88º ambos da LGT, manteve os valores inicialmente fixados, em nada inova relativamente ao RIT – pressupostos, fundamentação e critérios, no qual, pelo que todas as considerações feitas quer pela sentença recorrida, quer por nós ao RIT equivalem a pronúncia sobre a decisão efectivamente determinante da liquidação impugnada, decorrente da Revisão.
Em sede recursória, pretende a Recorrente (« X, Lda. ») que este Tribunal julgue se o Tribunal a quo errou na apreciação e valoração da matéria de facto e, consequentemente, no julgamento de direito, ao considerar (i) verificados os pressupostos que legitimavam o recurso aos métodos indirectos e ao considerar (ii) da correcção do critério utilizado e da não ocorrência de excesso de quantificação da matéria tributável.
Alega a Recorrente que a sentença enferma de “erro de julgamento”, por o julgador ter efectuado uma errónea aplicação da factualidade, que o levou a sufragar pela legalidade da utilização de métodos de avaliação indirecta e respectiva quantificação da matéria tributável.
Ora, o erro de julgamento recai sobre um elemento dos dois que estruturam a decisão jurisdicional: a fundamentação de facto e a fundamentação de direito. O denominado erro de facto, por contraposição ao erro de direito, pode resultar de errada apreciação do material probatório que a ocorrer se estende a fixação da materialidade fáctica relevante para a decisão e/ou conduzir a uma desacertada interpretação dessa materialidade.
Como assertivamente se elucida, no acórdão do TCA Sul de 10.07.2014, proferido no âmbito do processo n.º 7813/14, “No primeiro caso o erro consubstancia-se numa indevida utilização da livre convicção, erro esse que deve ser demonstrado pelo recorrente através do exercício de um duplo ónus: um, (i) o de circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso indicando claramente os segmentos da decisão que considera padecerem de erro de julgamento; outro, (ii) fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa.”.
Ora, quando a selecção dos factos não é colocada em questão em sede de recurso, mas apenas se coloca a ênfase impugnatória na subsunção dos factos ao direito aplicável tendo em vista uma solução jurídica diferente da decretada, o erro que se suscita não é um erro na apreciação da prova, mas sim um erro de julgamento de direito.
No caso vertente a Recorrente não ataca a selecção dos factos feita pela sentença nem sequer sustenta que ocorreu uma indevida consideração das provas produzidas nos autos em ordem a determinar um resultado probatório diferente do fixado. Aliás, se o tivesse feito teria de concluir-se que a impugnação da matéria de facto não tinha sido correctamente estruturada segundo o regime legal aplicável, para que fosse possível a este Tribunal ad quem alterá-la. Pelo contrário o que a Recorrente esgrima, se bem interpretamos as suas alegações e conclusões, é a incongruência na apreciação e julgamento da matéria de facto levada a cabo pelo Tribunal a quo, isto é, que os factos dados como provados conduzem a um resultado jurídico diferente daquele a que chegou a sentença. Mais se diga, apresentando uma argumentação análoga, espelho da seguida em sede de petição.
Assim sendo, importa reter por ora, é que não cumpre a este Tribunal ad quem proceder a qualquer alteração ou aditamento ao probatório consignado na sentença – que a Recorrente não impugna, cumprindo tão só aferir do eventual erro na apreciação e valoração da matéria de facto e consequentemente, no julgamento de direito e nas soluções jurídicas preconizadas na sentença (i) quanto aos pressupostos para a determinação da matéria tributável em sede de IRC, com recurso aos métodos indirectos, e (ii) do critério e quantificação da matéria tributável.
2.2.1. Do erro de julgamento no que respeita aos pressupostos do recurso aos métodos indirectos
Considera a Recorrente que errou o Tribunal a quo no seu julgamento na medida em que não ponderou ou ponderou erradamente “(...) dos fluxos financeiros de Caixa no período em causa” considerando “que alguns dos suprimentos efetuados foram concretizados mediante a entrega de valores em numerário não existindo evidência do depósito na conta bancária, como exigido por lei,/ Concluindo pela existência de lançamentos meramente contabilísticos sem aderência à realidade” valorando a evolução atípica das margens de lucro sustentada pela AT ignorando que “Os inventários que serviram de base ao apuramento de tais margens de lucro foram, por si mesmo, considerados incorretos/ Os inventários incorretos não permitem, dada a metodologia utilizada no apuramento da margem bruta (MB absoluta= Vendas – CMV); (MB percentual = MB/CMV), fundamentar conclusões idóneas” (vide conclusões B) a K)).
Vejamos:
Nos termos do art.º 81.º da Lei Geral Tributária (LGT):
1 - A matéria tributável é avaliada ou calculada diretamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previstos na lei”.
Por seu turno, o artigo 83.º do mesmo diploma determina que:
1 - A avaliação directa visa a determinação do valor real dos rendimentos ou bens sujeitos a tributação.
2 - A avaliação indirecta visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha”.
É desiderato constitucionalmente consagrado que a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real (cfr. artigo 104.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa). Reflexo desse princípio determina o artigo 85.º, n.º 1, da LGT, que a avaliação indirecta é subsidiária da avaliação directa.
Portanto, temos que a avaliação directa tem como ponto de partida as declarações dos contribuintes e/ou os dados apurados na sua contabilidade, que se presumem verdadeiros – cfr. o artigo 75.º, n.º 1, da LGT. Contudo, como decorre desse mesmo normativo, no seu n.º 2, a presunção de veracidade da contabilidade cessa quando revelar “… omissões, erros, inexatidões ou indícios fundados de que não reflectem ou impeçam o conhecimento da matéria tributável real do sujeito passivo”.
Atenha-se, todavia, que não é qualquer omissão, erro ou inexatidão das declarações ou da contabilidade do sujeito passivo que permite o recurso a métodos indirectos de avaliação da matéria coletável, sendo exigido que tais irregularidades sejam de tal forma relevantes que tornem inviável a quantificação directa. Logo, se, apesar de haver irregularidades contabilísticas, for possível quantificar directamente a matéria coletável, deve-se lançar mão dos métodos directos. Ou seja, sendo certo que a avaliação directa parte das declarações dos contribuintes ou dos dados constantes da contabilidade, a mesma ainda assim pode fundar-se noutros elementos objetivos, que permitam, com segurança, concluir no sentido da ocorrência do facto tributário e da sua quantificação concreta afastando o recurso a avaliação indirecta, aliás o que a lei privilegia.
Temos então, que o nosso ordenamento prevê que a avaliação da matéria tributável se possa realizar directa ou indirectamente, sendo que o recurso à avaliação indirecta funciona como ultima ratio, só podendo ocorrer quando se revele impossível o recurso à avaliação directa, esta a primeira premissa a reter, da qual se infere que o recurso a uma ou outra das formas de avaliação não é uma opção discricionária da AT: ou se verificam condições para a avaliação directa ou, não existindo, nos termos já assinalados supra, é possível recorrer à avaliação indirecta.
Daí o caráter subsidiário da avaliação indirecta, previsto no artigo 85.º da LGT, avaliação esta que deverá ocorrer apenas nos casos previstos nos artigos 87.º e 89.º do mesmo diploma legal. Tal decorre da LGT, para que especificamente remetiam os, à época, artigos 52.º do CIRC e 90º do CIVA.
Assim, perante rendimentos em que se verifique não ser possível a avaliação directa, a AT pode recorrer a métodos de avaliação indirecta, sendo que o facto de se recorrer à tributação por métodos indirectos não significa que a totalidade da contabilidade do sujeito passivo seja desconsiderada, mas tão-só a parte que se considera não reflectir a realidade e cuja presunção de veracidade é, por isso, afastada.
Para que seja legítimo o recurso à tributação por via dos métodos indirectos, segunda premissa, cabe à AT o ónus da prova de que se reúnem os pressupostos da sua aplicação, consubstanciando-se tal ónus probatório na demonstração da existência de situações fácticas, designadamente irregularidades contabilísticas, que assumam alcance tal que impossibilitam o recurso a métodos directos de avaliação.
Assim, nos termos do artigo 87.º, n.º 1, da LGT:
A avaliação indirecta só pode efetuar-se em caso de:
(…) b) Impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto…”.
Esta situação prevista na alínea b) supratranscrita remete-nos para o artigo 88.º da LGT, nos termos do qual:
A impossibilidade de comprovação e quantificação direta e exata da matéria tributável para efeitos de aplicação de métodos indirectos, referida na alínea b) do artigo anterior, pode resultar das seguintes anomalias e incorreções quando inviabilizem o apuramento da matéria tributável:
a) Inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração, falta ou atraso de escrituração dos livros e registos ou irregularidades na sua organização ou execução quando não supridas no prazo legal, mesmo quando a ausência desses elementos se deva a razões acidentais;
b) Recusa de exibição da contabilidade e demais documentos legalmente exigidos, bem como a sua ocultação, destruição, inutilização, falsificação ou viciação;
c) Existência de diversas contabilidades ou grupos de livros com o propósito de simulação da realidade perante a administração tributária e erros e inexatidões na contabilidade das operações não supridos no prazo legal.
d) Existência de manifesta discrepância entre o valor declarado e o valor de mercado de bens ou serviços, bem como de factos concretamente identificados através dos quais seja patenteada uma capacidade contributiva significativamente maior do que a declarada”.
In casu, de acordo com o RIT e decisão de Revisão, o recurso aos métodos indirectos, em termos de fundamentação legal, baseou-se no referido artigo 88.º, n.º 1, alíneas a) e d), da LGT
Feito este enquadramento, que não difere do pré-estabelecido pelo Tribunal a quo, vejamos dos indícios, e o que a propósito dos mesmos se escreveu na sentença recorrida, para alcançarmos em que medida a fundamentação escorrida é posta em causa pela Recorrente, temos que ali se discorreu nos seguintes termos:
«No que respeita, em primeiro lugar, ao controlo dos fluxos financeiros do Caixa, temos que a Administração Fiscal, face à existência de suprimentos realizados pelos sócios da Impugnante procedeu à sua notificação em ordem à justificação da origem dos meios financeiros que suportaram tais operações, chegando à conclusão de que apenas resultou justificada de forma precisa a origem de dois cheques, nos valores de €67.500,00 e €60.000,00. Quanto às restantes quantias, considerou que a Impugnante apenas referiu o motivo pelo qual realizou tais entregas de dinheiro à sociedade, considerando a final que os saldos da conta de caixa não revelam de forma verdadeira e apropriada a posição financeira da empresa e que existem deficiências ao nível do controlo dos fluxos financeiros, com impacto na organização contabilística e controlo interno.
Por seu turno, a Impugnante, quanto a esta matéria, alega que os referidos suprimentos se demonstram através dos documentos contabilísticos (mormente documento n.º 1 junto à petição inicial), referindo que se a Administração Fiscal tivesse realizado uma análise exaustiva dos movimentos da conta caixa dos meses de julho e agosto de 2005 teria verificado a existência de movimentos efetivos, ainda que tendo dado origem a movimentos contabilísticos em contas erradas e que, de todo o modo, a Administração Fiscal não requereu esclarecimentos à Impugnante.
Vejamos.
Como decorre do probatório e foi reconhecido pela própria Administração Fiscal, encontra-se justificada a origem dos suprimentos relativos aos valores de €67.500,00 e €60.000,00, a qual resultou da venda de apartamentos pelo sócio gerente da Impugnante «AA» (cfr. ponto 13 do probatório), no entanto, tal precisão não decorre quanto aos demais suprimentos (ponto 1 dos factos não provados).
Efetivamente, como refere a Impugnante é possível verificar através do documento n.º 1 junto à petição inicial que foi efetuado um conjunto de depósitos e transferências na respetiva conta bancária, sem que, no entanto, se possa retirar de tal documentação a origem dos meios financeiros para tanto utilizados (ponto 14 do probatório). Na verdade, resulta apenas que foram depositados determinados valores em numerário ou mediante transferência bancária, na aludida conta sem se identificar a sua proveniência, para mais, decorrendo igualmente do RIT e respetivos anexos, concretamente dos extratos de movimentos da conta “POC 11.1” Caixa que, por diversas vezes, o caixa se apresentou credor/negativo, situação que não corresponde à normalidade contabilística.
Neste conspecto, resultou provado nos presentes autos que para evitar saldos de caixa credores em consequência do desfasamento temporal entre os recebimentos de clientes e os respetivos depósitos, eram realizados movimentos de regularização, em que no momento do depósito era registado o movimento contrário (ponto 20 do probatório), não existindo, contudo, um registo controlado e claro dessas movimentações, o que não foi igualmente clarificado em sede inspetiva pela Impugnante que, notificada para tanto, apenas referiu que o respetivo Técnico Oficial de Contas iria apurar as respetivas justificações, sem que as mesmas fossem apresentadas ou sequer exercido o respetivo direito de audiência prévia (pontos 4, 5 e 7 do probatório).
Quanto aos suprimentos atinentes ao exercício de 2005 os mesmos apenas constam do documento n.º 1 junto à petição inicial como correspondendo a transferências e/ou depósito de cheques nada referindo quanto à sua proveniência (ponto 14 do probatório).
Do mesmo modo, no decorrer dos presentes autos, a Impugnante também não logrou provar a origem de todos suprimentos realizados pelos sócios gerentes, apenas se bastando com a alegação de que deveria ter a Administração Fiscal solicitado as explicações necessárias relativamente a tais operações. Ora, não só a Administração Fiscal solicitou tais esclarecimentos, como a Impugnante não os apresentou nem exerceu o respetivo direito de audição (pontos 4 e 7 do probatório e 1 dos factos não provados).
Para além da origem dos suprimentos, temos ainda que existe um conjunto de operações em relação às quais não é possível estabelecer com certeza e fiabilidade a respetiva correspondência com a disponibilidade da empresa, não tendo igualmente a Impugnante logrado provar a sua efetividade.
Na verdade, sendo certo que resulta dos autos que foi emitido um recibo pela Impugnante ao cliente «P, LTD.»., no montante de €6.926,70 e que foram realizados depósitos em bancos nos montantes de €5.528,62, €2.220,90 e €2.270,95 (pontos 15 e 16 do probatório), ainda assim a Impugnante não logra demonstrar que os montantes (em concreto, após o depósito destes montantes foram lançados €10.000,00) lançados em momento posterior a tais depósitos correspondem a um suprimento efetivo e não a uma mera forma de “compor” o caixa.
De notar, ainda, que para além de não ser clara a proveniência e a justificação dos lançamentos que resultam de fls. 11 do RIT (ponto 7 do probatório) e de não existir suporte documental dos mesmos, a Impugnante reitera na própria petição inicial que o registo contabilístico dos mesmos não foi sequer realizado de forma correta (artigo 22.º e 29.º da p.i.).
Não pode, assim, a Impugnante afirmar que tais incorreções são fiscalmente inócuas, pois desde logo, resulta que a respetiva contabilidade não goza de credibilidade e clareza suficientes que permitam através da sua consulta determinar de forma exata e direta a matéria tributável.
E mesmo que a Administração Fiscal encetasse uma análise exaustiva dos movimentos da conta Caixa dos meses de julho e agosto de 2005 constantes do RIT a conclusão seria a mesma, pois como refere a Impugnante os movimentos ocorridos em tais datas deram origem a movimentos contabilísticos em contas erradas, sendo que em nenhum dos casos aquela logra demonstrar que os suprimentos realizados correspondem a fluxos efetivos (ponto 7 do probatório).
Não basta, pois, a existência de depósitos bancários (sem suporte documental para além de meros extratos), exigindo-se a demonstração de que tais operações corresponderam efetivamente a entradas e saídas de dinheiro da conta de disponibilidades da Impugnante.
Na medida em que tal correspondência não se mostra clara, denotando incongruências, associadas, ainda, à falta de suporte documental suficiente e exato, atento o facto de a própria Impugnante referir que determinados movimentos foram registados em contas erradas (artigo 20.º da petição inicial), resulta impossível a determinação direta e exata da matéria tributável com base nestes elementos, mormente para efeitos de controlo dos proveitos.
No que respeita à evolução das margens brutas e à análise do custo de produção e valorização dos inventários, a Administração Fiscal concluiu que entre os anos de 2004 a 2007 houve um aumento da margem bruta sobre o custo das matérias consumidas com a degradação dos resultados operacionais e a manutenção dos preços médios de venda dos capacetes. Considera a Administração Fiscal que as margens brutas apuradas afastam-se consideravelmente das que foram reveladas pelos elementos contabilísticos da Impugnante.
A este propósito, efetivamente verifica-se que entre o ano de 2005, em que a margem bruta foi de 69,2% e de 2007, em que esta foi de 99,2% existiu um aumento significativo de tal margem, sem que o preço médio dos capacetes sofresse qualquer aumento considerável (ponto 7 do probatório), sendo que a Impugnante não logrou justificar tal circunstância, nem em sede inspetiva, nem nos presentes autos.
Do mesmo modo, no âmbito da ação inspetiva, a Impugnante foi notificada para apresentar as fichas técnicas de um conjunto de tipos de capacetes, mormente, CRI, CRS, CITY, D-JET, GP2, GP4 e J3, tendo sido juntos os referidos elementos e dos quais resulta o seguinte, em confronto com o que resulta do RIT (pontos 3 e 7 do probatório):

Tipo de capaceteCusto produção fichas técnicasCusto produção inventário 2005
CRI13,45€24,40€
CRS21,82€
CITY5,97€
D-JET18,94€
GP216,82€26,47€
GP426,31€29,75€
J316,32€17,28€

Na verdade, compulsados os valores referidos supra, temos que resulta uma diferença considerável entre os valores constantes das fichas técnicas de produção e aqueles que constam dos inventários, sendo que notificada para o esclarecer a Impugnante referiu em auto de declarações que “relativamente à valorização uniforme nos exercícios de 2004 a 2007 dos produtos acabados relacionados na notificação não existem justificações para a alteração dos custos de produção, porque não terá havido oscilações significativas nos preços das matérias primas” (pontos 3 e 4 do probatório), facto que denota a falta de controlo por parte da Impugnante da valorização de stocks e das existências, não o tendo, igualmente, demonstrado nos presentes autos impossibilitando a análise por parte da Administração Fiscal de tais dados em confronto com os proveitos declarados, inviabilizando assim a determinação da matéria tributável de forma direta e exata.
O mesmo sucedendo com os movimentos físicos das existências em que a Administração Fiscal denotou que a evolução dos valores globais de cada ano apresenta um aumento da quantidade de cascos adquiridos, enquanto o volume das compras vem diminuindo, o que determina uma redução do custo unitário do casco (explicado quanto ao ano de 2005 pelo facto de a quantidade de cascos adquirida ao fornecedor «LL» implicar um preço unitário muito superior aos restantes cascos em plástico).
Ora, temos, então, que após a análise dos inventários físicos a 31 de dezembro do ano de 2005 a Administração Fiscal apurou com base nos elementos contabilísticos, existências finais de cascos (incluindo cascos em produtos em vias de fabrico e em produto acabado) no valor de 22.964 e existências iniciais no valor de 58.370, face à compra nesse mesmo ano de 67.768 cascos e a venda de 103.174 (ponto 7 do probatório).
Perante tais dados, foram analisados os ficheiros SAFT (com base nas faturas emitidas e notas de crédito) tendo sido apurada a venda em 2005 de 83.187 capacetes, ou seja, menos do que as vendas que resultam do controlo físico das existências (103.174), pelo que a Administração Fiscal concluiu pela omissão de quantidades para o ano de 2005 no valor de 19.987 capacetes.
Quanto a este aspeto, a Impugnante refere que apesar de tais dados terem sido coligidos com base nos respetivos elementos contabilísticos, certo é que a análise efetuada pela Administração Fiscal desses mesmos dados não corresponde à realidade da empresa.
Desde logo, refere que os números avançados pela Administração Fiscal se justificam pelo facto de os inventários não serem contabilizados de forma rigorosa, especialmente atendendo à confusão entre cascos (de estrutura) e cascos (de enchimento), sublinhando que em 1 de janeiro de 2003 e 31 de dezembro de 2008 foram realizadas duas contagens rigorosas.
No fundo, para a Impugnante não existem omissões, mas antes incorreções nos inventários.
Vejamos.
Resulta dos autos que efetivamente os inventários realizados pela Impugnante não se pautavam pelo rigor ou pela existência de instruções, sendo realizadas por qualquer funcionário que estivesse disponível (ponto 19 do probatório), sendo que apenas em duas ocasiões a Impugnante refere ter havido uma contagem rigorosa de stocks, concretamente, nas datas referidas supra (pontos 17 e 18 do probatório).
Desde logo, de notar que tais contagens rigorosas foram realizadas em anos distintos ao exercício ora em crise (2005), sendo que eventuais erros derivados da atuação pouco rigorosa da Impugnante não devem ser oponíveis à Fazenda Pública, no sentido de afastar sem mais o recurso à avaliação da matéria tributável com recurso a métodos indiretos.
De todo o modo, o que resulta dos autos é que existia alguma confusão por parte dos funcionários que realizavam a contagem na correspondência entre a designação correta dos produtos e a designação que os mesmos lhes conferiam, sendo esta que era vertida para as respetivas listagens.
No entanto, temos que esse facto demonstra a falta de controlo por parte da Impugnante das respetivas contagens, o que torna dúbia a clareza dos seus inventários, pelo que tendo a Administração Fiscal baseado a sua análise na documentação fornecida e existente na contabilidade da Impugnante, não restaria outra solução para além de recorrer aos métodos indiretos.
Na verdade, não controlando a própria Impugnante os seus inventários, aceitando de forma acrítica e cega as listagens resultantes da contagem realizada pelos funcionários, não poderia a Administração Fiscal controlar igualmente de forma direta a correspondência entre os dados constantes dos inventários e os dados hipotéticos que resultariam de uma contagem rigorosa relativamente aos stocks de 2005, 2006 e 2007.
No que respeita ao controlo de documentos de transporte e notas de encomenda, refere-se a Administração fiscal essencialmente a três clientes da Impugnante, a saber, «EE», «J» e «N, Lda.», tendo concluído que em relação a este último, o total de capacetes encomendados ascende a 517 unidades, das quais apenas 246 terão sido faturadas (ponto 7 do probatório).
Relativamente a esta questão, resulta dos autos que a Impugnante realizava vendas à consignação, ou seja, que os capacetes vendidos eram enviados a coberto de uma guia de transporte, sendo fracionado em diversas faturas, consoante o cliente fosse efetivamente vendendo as unidades adquiridas (ponto 22 do probatório), o mesmo acontecendo com a cliente «N, Lda.», sendo que apesar de encomendados 517 capacetes, só foram faturados os efetivamente vendidos que ascendem a 246 unidades (ponto 23 do probatório).
Desta feita e quanto a este ponto, resulta que efetivamente não decorre dos elementos contabilísticos da Impugnante a correspondência entre as unidades encomendadas pelos aludidos clientes e as unidades faturadas, resultando estas muito inferiores àquelas.
Sendo assim, é evidente que a Administração Fiscal não se encontrava em condições de retirar, de forma direta, a conclusão de que existiam vendas à consignação.
De todo o modo e ainda que quanto aos clientes supra referidos resulte provado que efetivamente eram realizadas vendas à consignação, tal facto não se mostra suficiente para afastar o recurso aos métodos indiretos pela Administração Fiscal com base nos restantes elementos.» (fim de transcrição; sublinhados nossos)
Este escrutínio e apreciação dos indícios-factos carreados pela AT, consentânea da valoração e apreciação do alegado e provado pela Impugnante em sede de procedimento inspectivo, em sede de processo de Revisão e nestes autos de Impugnação, assente numa análise exaustiva, meticulosa e concludente, autorizou o Tribunal recorrido a decidir que “ (...) perante o exposto, atendendo ao facto de a Impugnante não ter fornecido todos os elementos e esclarecimentos suficientes e, ainda a circunstância de a informação fornecida à Administração Fiscal se mostrar manifestamente insuficiente e denotar diversas omissões, insuficiências e contradições, considera-se que a Administração Fiscal logrou provar não só que os elementos fornecidos pelo contribuinte apresentam insuficiências ou omissões, mas também e essencialmente que essas deficiências tornam impossível determinar e quantificar a matéria tributável do sujeito passivo.”
Advém que em sede de recurso, o entendimento vertido na sentença sob recurso mantem-se incólume perante as afirmações inconsistentes e destituídas de conteúdo da Recorrente apresentadas em sede de recurso versus fundamentação da sentença, efectivamente o afirmado não logra pôr em causa apreciação e valoração veiculada pelo Tribunal a quo, sendo que não incumbe a este Tribunal ad quem reapreciar ex novo o decidido.
Note-se que a impugnante também não alega, substanciando que, não obstante a enunciada falta de credibilidade documental das operações e de relato financeiro, sempre era possível à AT determinar a sua matéria tributável por via directa, com base em outros elementos credíveis, da sua própria contabilidade, antes pelo contrário insiste de que devem ser relevadas as incorreções que até reconhece para inviabilizar o recurso aos métodos indirectos, o que se nos afigura insustentável em conformidade com o propugnada no julgamento transcrito.
A decisão de recurso a métodos indirectos, no caso em apreço, não merece, pois, qualquer censura, não se vendo como poderia a AT, no contexto factual descrito, actuar diferentemente.
2.2.2. Do critério e excesso na quantificação
No que respeita ao critério eleito pela AT para proceder à determinação da matéria tributável relativa ao ano de 2005 aqui em causa – descrito e concretizado no ponto IV.2.2.do relatório da inspecção, transcrito no ponto 7. do probatório e que consistiu em estimar as discrepâncias entre as quantidades consumidas e as quantidades vendidas – entendemos que não está a AT impedida de a ele recorrer, pois que o n.°1 do artigo 90.° da Lei Geral Tributária não tem carácter taxativo e o método escolhido mostra-se racional e fundamentado em factos concretamente apurados assim como procurou ter em conta os dados conhecidos relativos à actividade da contribuinte naquele mesmo ano.
A pretensão da Recorrente de questionar o método de determinação indirecta da matéria tributável não pode colher, pois que cabe à AT, dentro dos limites da lei, eleger aquele que repute mais adequado à determinação da matéria tributável, cabendo ao Tribunal verificar a sua correcta interpretação e aplicação em caso de litígio entre a AT e o sujeito passivo. Assim, o método adoptado pela AT para a determinação da matéria tributável, não é nem inadmissível nem se mostra, em abstracto, ostensivamente inadequado
Daí que não seja correcto afirmar-se que o Tribunal a quo “reconheceu a incorrecção dos inventários” e não retirou daí as devidas ilações, como argumenta a Recorrente (vide conclusões N) a W)), é que como consta da sentença: « (...) em relação ao argumento esgrimido pela Impugnante de que os inventários eram realizados sem rigor (ponto 19 do probatório), temos que apenas resulta dos autos que efetivamente existia tal falta de rigor, no entanto, não se podendo retirar sem mais de tal facto que o mesmo provocou um excesso na quantificação da matéria tributável pela Administração Fiscal, tanto mais que não avança quaisquer números alternativos relativos aos exercícios em análise. /Com efeito, apenas tendo ficado provado que existia falta de rigor nas contagens, nada mais resulta que demonstre que tal falta de rigor teve repercussões efetivas na quantificação e se teve, em que medida, sendo que resulta do RIT que não existiam mecanismos de controlo da produção, sendo todas as necessidades de produção introduzidas de montagem através de papéis manuscritos (ponto 7 do probatório).»
Poderá tal situação conduzir, contudo, a um excesso na quantificação da matéria colectável apurada, sendo que, quando assim seja e se o pretender, cabe ao contribuinte o ónus da prova do excesso da quantificação, o que não logrou a Recorrente alegar, e consequentemente demonstrar. E o que se verifica é que nenhum facto consta do probatório que permita concluir pelo excesso de quantificação da matéria tributável.
De facto, a Impugnante, ora Recorrente, preocupou-se mais em tentar descredibilizar o critério de quantificação valorado pela AT do que em evidenciar factos concretos partindo dos quais o Tribunal a quo pudesse concluir, num juízo de normalidade assente em regras da experiência comum, pelo manifesto, notório ou ostensivo erro ou excesso de quantificação da matéria tributável.
Com efeito, dispõe o n.º 3 do artigo 74.º da LGT que “Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação”.
E, mais se diga, em prol do decidido que pela sua natureza o método indirecto está sempre afectado por alguma incerteza na quantificação da matéria tributável, distinta da precisão alcançada pelo método directo, baseado na análise da contabilidade do sujeito passivo, quando considerada fiável, ou em outros elementos de prova do valor real do rendimento sujeito a tributação (art.83º nºs 1/2 LGT), ou seja, estamos sempre perante um critério e uma quantificação assente em elementos de uma contabilidade inverosímil, consciente de que a mesma enferma de incorrecções devidamente assinaladas, cumpre AT com os elementos que considera verossímeis alcançar uma quantificação o mais próxima possível da realidade que os mesmos permitem alcançar.
Por último, uma menção no que se refere ao alegado nas conclusões V) e W) em que a Recorrente coloca a tónica na prossecução investigatória a que a AT está obrigada na busca da verdade material, afastando-se da questão nos termos em que havia sido apresentada perante o Tribunal de 1ª instância “Da omissão de pronúncia no procedimento de revisão”, a não ser por esse motivo alvo de apreço por este Tribunal ad quem que pautamos como questão nova atenta a sua formulação.
O recurso está, pois, condenado ao fracasso, sendo de confirmar a sentença recorrida por não padecer dos vícios que lhe são apontados.
2.3. Conclusões
I. Em caso de determinação da matéria tributável por métodos indirectos, compete à administração tributária o ónus da prova da verificação dos pressupostos da sua aplicação, cabendo ao sujeito passivo o ónus da prova do excesso na respectiva quantificação (artigo 74.º, n.º 3 da LGT).
II. Concluindo-se que, no caso, a Administração Tributária demonstrou a ocorrência dos necessários pressupostos legais à utilização de métodos indirectos, por um lado e, por outro, apresentando-se adequadamente fundamentados os critérios de que a Administração Tributária se serviu na tarefa de quantificação, era à impugnante que se impunha demonstrar que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade, demonstração essa que não logrou fazer, sem olvidar que, mesmo a subsistir qualquer dúvida, o que se postula por comodidade de raciocínio, ela sempre teria de ser processualmente valorada contra a recorrente, ou seja, contra a parte onerada com a prova.
3. DECISÃO
Em face do exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso.
Custas pela Recorrente.

Porto, 02 de março de 2023

Irene Isabel das Neves
Ana Paula Santos
Margarida Reis