Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00550/21.5BECBR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:07/01/2022
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Antero Pires Salvador
Descritores:PROCEDIMENTO CAUTELAR, SUSPENSÃO EFICÁCIA, PERICULUM IN MORA
Sumário:1 . O “periculum in mora”, a que alude a 1.ª parte do nº 1 do art.º 120.º do CPTA, traduz-se no fundado receio de que, quando sobre o processo principal venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar a resposta adequada às situações jurídicas em litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tomou a decisão totalmente inútil, seja, pelo menos, porque essa evolução conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.
2 . Para que o Tribunal afira da verificação de uma situação irreversível ou de muito difícil reparação com a execução do acto suspendendo, não basta referir o montante a despender, importa que sejam alinhados factos concretos donde se possa minimamente aferir da verificação deste requisito, de modo objectivo, para aferir da probabilidade de ocorrência de um resultado irreversível e não apenas um mero receio de que tal venha a acontecer.

3 . Não se questionando a dificuldade e valor da remoção dos resíduos, importa alegar e demonstrara quais os factos concretos, objectivos que inculcam que essa execução importa prejuízos de difícil ou impossível reparação, incomportáveis com a demora da decisão da acção principal.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:

I
RELATÓRIO

1 . “J... S.A", com sede no Lugar ..., ..., ..., inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Coimbra, datada de 28 de Março de 2022, que julgou improcedente a providência cautelar de suspensão de eficácia de acto administrativo, interposta contra COMISSÃO de COORDENAÇÃO e DESENVOLVIMENTO REGIONAL do CENTRO - CCDRC, com sede na Rua ..., ... --- onde requeria a suspensão de eficácia da decisão do Vice Presidente da CCDRC, de 11/10/2021 e notificada à requerente em 14/10/2021 que ordenou, no prazo de sessenta dias, a remoção de todos os resíduos depositados no terreno sito na Portela ..., georreferenciados com as coordenadas (...): 40º 08 44 15; N; 08º 24 44, 36 O”, da freguesia ..., concelho ..., nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do Decreto-Lei 228/2012, de 25 de Outubro, com obrigação de dar posterior conhecimento à Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional mediante apresentação de cópias das guias electrónicas de acompanhamento de resíduos (e-GAR) removidos do local identificado, comprovando o seu envio para destino licenciado, conforme Portaria n. º145 2017, de 26 de Abril, alterada pela Portaria n.º 28 2019, de 18 de Janeiro ---, sendo contra interessado AA, residente na Rua ..., Portela ..., ..., ....
*
Nas suas alegações, a recorrente "J... S.A" formulou as seguintes conclusões:
"1 – A presente apelação mostra-se sustentada na aplicação do disposto no artigo 141º, 142º, 143º e 151º do C.P.T.A., e é legal e vai em tempo.
2 – A competência deste tribunal, para a decisão da causa principal, e assim da presente providência cautelar, é conferida pela manifesta ilegalidade da ordem administrativa, até por manifesta ofensa do julgado, em sede de processo contra-ordenacional, e por referência do disposto ao artigo 4º nº 1 da alínea l) do ETAF.
3 – A competência do tribunal, apenas se aceita para conhecer da ilegalidade da actuação da requerida, o que, sempre decorreu ao entendimento, de se ter prescindido da produção de prova, com aceitação dos factos alegados, assim por falta de impugnação dos requeridos, e, assim na declarada produção de acto administrativo injustificado, face à decisão transitada do processo de contra-ordenação referido nos autos, sempre se imporá imediata procedência da providência cautelar requerida.
4 – Tudo por estarem manifestamente demonstrados todos os requisitos e fundamentos da procedência quer seja os do “periculum in mora” “fumus boni iuris”, e inexistência de qualquer prejuízo maior, para o interesse público da presente demandada. Por outro lado,
5 – A recorrente alega factos (artigo 71º a 82º da petição inicial) tendentes a demonstrar os pressupostos do “periculum in mora”.
6 – E tais factos têm de ser dados por provados, por não impugnados, e devido ao facto de o tribunal, sem fundamentação especial, ter prescindido da produção de prova, e nessa medida a providência cautelar julgada procedente com todas as legais consequências legais.
7 – De verdade, vendo-se a A. recorrente, obrigada a cumprir a ordem administrativa, manifestamente ilegal, como resulta dos autos, a mesma sofrerá por muitos anos graves e enormes prejuízos decorrentes do valor da execução com um montante elevado de € 238.000,00 (duzentos e trinta e oito mil euros), quando no presente caso, é nula e manifesta a violação de qualquer interesse público relevante.
8 – No presente caso é notória a litigância de um facto, porventura inexistente, contendo em si apenas e só, o reclamado direito indemnizatório, de quem, eventualmente de forma dolosa e pré-intencional, se introduz no imóvel, criando um caso pensado e preparado ao longos dos anos e que não tem a tutela do direito.
9 – Quaisquer danos, eventualmente existentes, mostram-se prescritos face ao disposto no artigo 498º nº 1 do C.C., pois teriam ocorrido nos anos de 2009 a 2011. Aliás, e para além disso,
10 – A recorrente, concretizou e especificou os prejuízos irreparáveis e de difícil reparação, pois os mesmos são em geral, segundo o decurso normal das coisas, e dos ditames da experiência comum, consequência adequada e típica e normal da execução do acto.
11 – O tribunal não pode ignorar, segundo as regras da experiência e de senso comum, que movimentar 5000 m3 de terra, e transportá-la a 40 km do local, custará sem margem para dúvida a invocada importância de € 238.000,00.
12 – O tribunal também saberá, que declarada a ilegalidade de actuação da recorrida, o que se espera, tem a recorrente como inequívoco a devolução daquela importância e mais encargos, mas de manifesta e difícil reparação, pois constitui claro calvário para lhe ser devolvido o valor investido, obrigando a recorrente a outras ações indemnizatórias com os consequentes acréscimos de despesas e prejuízos, o que a procedência da providência evitará. Por outro lado,
13 – Se o tribunal entendia não estarem demonstrados factos, não poderia ter anulado a produção de prova testemunhal, pois nos autos, contrariamente ao afirmado, existem factos alegados, quanto à matéria do “periculum in mora”. (artigo 71 a 82 da petição inicial)
14 – É que, a afirmação de que não existem factos alegados, viola manifestamente o direito de acesso aos tribunais e a tutela jurisdicional efectiva, por parte do recorrente, direito que lhe é reconhecido no artigo 87º do C.P.T.A.
15 – Impõe-se, assim, caso o tribunal de recurso entenda não dar por provado tais factos, sem recorrer à prova testemunhal, nos termos do artigo 118º do C.P.T.A., revogar-se a mesma sentença, e ser determinada a produção de prova testemunhal, no tribunal de 1ª instância, tudo com as legais consequências.
16 – Aliás no processo de contra-ordenação julgado e transitado em julgado, apenas resultou provado, que “deixaram no prédio alguns resíduos de construção e demolição” facto que nunca seria compatível com os termos e dimensão da decisão administrativa impugnável.
E assim, devem sempre,
17 – Serem aditados à matéria de facto provados os seguintes factos:
a) – A ordem administrativa impõe a remoção de um terreno com área de 30.250 m2;
b) – Com transporte para vazadouro autorizado;
c) – Terreno jamais movimentado ou ocupado nesta área;
d) – Que a A. recorrente apenas ali teve um estaleiro, junto à Estrada, e que não ocupava mais de 1000 m2 e nos anos 2009 a 2011;
e) – Tal vazadouro autorizado, situa-se em P... a cerca de 30/40 km do mesmo terreno, e a cargo da empresa P..., Lda;
f) – A modelação de terreno foi executado a pedido do proprietário de 2009/2011;
g) – Para beneficiação do terreno não arável;
h) – Actos não violadores actualmente do ambiente e saúde e bens pessoais dos residentes naquele local, que não conhecem sequer os factos dos autos;
i) – A requerida, não ponderou os interesses em conjunto no sentido de saber se eventuais RCD’s, ali existentes, qual a sua autoria, qual a sua implantação, qual o efectivo prejuízo público;
j) – As terras ou movimentações foram colocadas por ordem do proprietário, tendo em vista repor o declive e irregularidades do terreno aí existente ao tempo dos factos, e para conseguir uma melhor aptidão agrícola;
k) – A decisão administrativa é nula por assentar em factos inverídicos ou mesmo inexistentes, e assente em indícios, por exclusão de partes;
l) – O valor da mobilização e transporte de terras é de € 238.500,00, conforme documentos junto aos autos;
m) – O terreno dos autos ali existe há mais de dez anos sem qualquer reparo social da comunidade;
18 – E assim face a tal matéria de facto dada por provada, até por inexistência de impugnação, deve também perante a manifesta ilegalidade da decisão administrativa, ser julgada procedente a suspensão da eficácia do acto, com todas as legais consequências.
19 – No presente caso existem indícios provados, de que a intervenção preventiva da presente decisão, é necessário para impedir a consumação das situações lesivas à recorrente, que de outro modo sempre resultarão da demora do processo principal já instaurado.
É que,
20 – No presente caso, como já se referiu, para a comunidade local, nenhuma situação de prejuízo social iminente existe, de alarme, ou prejuízos para o bem-estar, e saúde dos aí residentes. É que, e também,
21 – A prova de produção de prejuízos de difícil reparação, resulta sempre de um juízo de probabilidade e não de certeza.
22 – No presente caso estará sempre em causa a aplicação do disposto no Dec. Lei 102-D/2020, Dec.Lei 147/2008, artº 118, e 120 do C.P.T.A, e artº 498 nº 1 e 500 nº 2 e 3 do C.C para efeito da aplicação do disposto no artº 13º do Dec. Lei 228/2012.
23 – É que mesmo qualquer tipo de responsabilidade da recorrente, em relação a terceiros, verificáveis no âmbito da responsabilidade civil extracontratual, e mesmo ambiental, não existe e sempre se mostrará prescrita, com todas as legais consequências.
24 – A aliás douta sentença, violou além do mais o disposto nos artº 112 nº 1, 118 nº 3 e 5, e 120 do C.P.T.A, e artº 498 do C.C. e artº 33 do Dec. Lei 147/2008, e artº 500 nº 1, 2, e 3 do C.C. e artº 362 do C.C. e artº 362 do C.P.C. e Dec. Lei 228/201.”
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Notificadas as alegações, apresentadas pela recorrente, supra transcritas nas respectivas conclusões, veio a CCDRC apresentar contra alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões:
"1ª) A douta sentença recorrida julgou improcedente a providência cautelar deduzida pelo ora recorrente, por este não ter feito prova do requisito do “periculum in mora”;
2ª) O ora recorrente impugna, neste recurso, a matéria de facto dada como provada na douta sentença recorrida, concretamente, os “factos” alegados na Petição Inicial nos artigos 71º a 82º;
3ª) Não tem, no entanto, o recorrente qualquer razão, desde logo porque não estamos perante “factos”, mas sim juízos conclusivos;
4ª) E ainda que se considerasse haver, na matéria em causa, “factos”, eles nada acrescentam ou demonstram relativamente ao “periculum in mora”.
5ª) Sendo indiscutível, como é dito na douta sentença recorrida, que o recorrente não faz qualquer prova, por mínima que seja, de que a manutenção do ato suspendido lhe provoca prejuízos de difícil reparação;
6ª) Na verdade, o recorrente limita-se a afirmar que teria um determinado custo com a “limpeza” do terreno, sem provar que ao incorrer em tal eventual custo, isso gerirá prejuízos de difícil reparação;
7ª) Assim, a douta sentença recorrida não merece qualquer censura.
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A Digna Procuradora Geral Adjunta, neste TCA, notificada nos termos do art.º 146.º n.º 1 do CPTA, emitiu douto, completo e fundamentado Parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.
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Notificado o Parecer, veio, em 22/6/2022, a A./Recorrente pronunciar-se, em termos que infra desenvolveremos.
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Sem vistos, mas com envio do projecto aos Ex.os Juízes Desembargadores Adjuntos, foram os autos remetidos à Conferência para julgamento.
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2 . Efectivando a delimitação do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, acima elencadas, nos termos dos arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, ns. 3 e 4 e 685.º A, todos do Código de Processo Civil, “ex vi” dos arts.1.º e 140.º, ambos do CPTA.

II
FUNDAMENTAÇÃO
1 . MATÉRIA de FACTO

A sentença do TAF de Coimbra considerou provada a seguinte factualidade:
1) Em 4 de fevereiro de 2019, pela CCDR, foi emitida decisão com o n.º 26/2019/DSAJAL no processo de contraordenação n.º ...18/DSAJAL, tendo como arguida a ora requerente, que entre o mais, refere o seguinte:
“(...)
I. DOS FACTOS
No dia 25 de julho de 2018, pelas 15h10, técnicos da Direção de Serviços de Fiscalização da CCDRC, deslocaram-se ao terreno dito na Portela ..., ..., ..., no sentido de apurar se a ora arguida, J... S.A, melhor identificada nos autos, tinha dado cumprimento à ordem administrativa emitida através de ofício n.º DSF 419/18 de 15 de junho.
No local verificaram que mantinha a deposição de resíduos de construção e demolição (RCD) aterrados, que se encontravam à superfície e parcialmente soterrados.
A ordem administrativa determinava a remoção de todos os resíduos de construção e demolição e a apresentação das guias de acompanhamento de resíduos comprovando o seu envio para destino autorizado.
(...)
DECIDE-SE:
a) Condenar a arguida ao pagamento de uma coima que se fixa no mínimo legal: €2.000 (dois mil euros), por violação do disposto no n.º 1 do art.º 25.º da Lei n.º 59/2006, de 29 de agosto, alterada e republicada pela Lei n.º 114/2015, de 28 de agosto, tendo em conta a imputação da infração a título de mera negligência e ao facto de ser primária em matéria contraordenacional(...)”
- (cfr. facto provado por documento - vide decisão junta como ... 3 da oposição a fls. 247-252 do processo eletrónico);
2) Em 12.04.2021, pela Presidente da requerida, foi emitido ofício de notificação, com a referência ...21, para efeitos de exercício do direito de audiência prévia da requerente quanto à proposta de ordem, referente a deposição/abandono de resíduos de construção e demolição (RCD’s), em propriedade sita em Portela ..., freguesia ..., concelho e distrito ... (...): 40º08’44,15”N; 08º24’44,36”que, entre o mais, refere o seguinte:
“(...) Conforme fotografias anexas, é possível verificar a existência de resíduos amontoados e dispersos ao longo do terreno, resultado de prospeções efetuadas no local e outros que se mantém à superfície. Os RCD depositados no local supra referido terão resultado das obras de saneamento da freguesia ..., levadas a cabo entre 2010 e 2011, pela F... SA” — Construção de Redes de Transporte de Á..., de ... e de Outros Fluidos, para a empresa Á...., dona da obra.
Os resíduos depositados/abandonados no local, não estão a ser geridos em condições ambientalmente corretas, por forma a evitar ou reduzir os riscos para a saúde humana e para o ambiente, através da poluição da água, do ar, do solo, afetação da fauna ou da flora ou danos na paisagem, conforme registo fotográfico em anexo, dado estarem depositados diretamente sobre o solo e sujeitos às Intempéries.
O abandono ilegal de Resíduos de Construção e Demolição (RCD), contraria o disposto no Decreto-Lei n.º 46/2008, e de acordo com o n.º 1 do art.º 18º do mencionado diploma, constitui uma contraordenação ambiental muito grave.
Assim, continua a verificar-se o abandono/armazenagem de resíduos, o que constitui infração ao estabelecido no n.º 1, do artigo 23.º da Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de setembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 7312011, de 17 de junho.
De acordo com o n.º 2 e n.º 3, do art.º 9.º do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de setembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 7312011, de 17 de junho, é proibida a realização de operações de tratamento de resíduos não licenciadas nos termos do referido diploma bem como o seu abandono.
No nosso ofício DSF 419/18 de 15 de junho foram Vªs. Ex.ªs advertidos que em caso de incumprimento, para além da contraordenação que incorreram, seriam novamente notificados para os mesmos efeitos incorrendo agora numa contraordenação grave nos termos do n.º 2 e n.º 3, do artigo 25.º da Lei n.º 50/2006, de 29 de agosto, alterada e republicada pela Lei n.º 114/2015 de 28 de agosto, em situação de novo incumprimento. Em consequência, e atendendo a que o pagamento da coima referida não isenta o Infrator do cumprimento do dever para o qual foi notificado, informamos que é intenção destes Serviços notificar V.ª Ex.ª nos lermos e para os efeitos da alínea b) do n.º 2 do artigo 13º do DL n.º 228/2012, de 25 de outubro, na sua atual redação, e do n.º 1 do art.º 69.º do DL, n.º 178/2006, de 5 de setembro alterado pelo D.L. n.º 73/2011, de 17 de junho, para no prazo de sessenta (60) dias proceder à:
1. Remoção e envio para destino autorizado, de todos os Resíduos de Construção e Demolição (RCD), depositados na área com o ponto central de coordenadas (...): 40º 08’ 44, 15”N; 08º 24’44,36”O, em propriedade sita em Portela ..., freguesia ..., concelho e distrito ... reconstituindo a situação anterior à prática da infração. A área da deposição dos RCD encontra-se melhor identificada nas imagens em anexo.
2. Apresentação nestes Serviços, das cópias das guias eletrónicas de acompanhamento de resíduos (e-GAR) removidos do local identificado, comprovando o seu envio para destino licenciado, conforme Portaria n.º 145/2017, de 26 de abri;
3. Apresentação dos certificados emitidos pelo operador de gestão de RCD, recebidos na sua instalação, nos termos constantes do anexo III, do Decreto-lei n.º 46/2008, de 12 de março, como disposto no artigo 16.º do referido diploma (...)”
- (cfr. facto provado por documento – vide ofício de notificação para o exercício do direito de audiência prévia junto com a oposição da requerida, como Doc.6, a fls. 278-286 do processo eletrónico);
3) Em 26.04.2021, a requerente enviou à requerida, através de correio eletrónico, requerimento para exercício do direito de audiência prévia no qual peticionou o seguinte:
“(...) 1 Seja declarada a falta de autoridade da notificante, para os termos da presente, nos precisos termos do disposto no artigo 13 do Dec. Lei 228/2012, uma vez que a lei apenas dispõe para o futuro.
2 - Seja declarada a incompetência material da notificante face à interpelação da notificação por parte da DRAPC, alegada nos autos, até porque a requerente não pode ser punida mais do que uma vez pelos mesmos factos (art.º 29 nº 5 C.R.P). E ainda assim caso não seja dado deferimento ao anteriormente requerido,
3 - Seja a notificada, autorizada a desencadear a devida vistoria ao local (Prédio Privado), tendente a melhor selecionar os factos, no sentido de poder responder aos termos da presente notificação. (...)”
- (cfr. facto provado por documento – vide requerimento junto como Doc. 5 com a oposição da requerida a fls. 253-273 do processo eletrónico);
4) Em 15.09.2021, foi emitida a informação DSF n.º ...21 de 15.09.2021 onde consta, entre o mais, o seguinte:
“...Na sequência da Proposta de Ordem n.º 276/2021 por nós emanada data de 14.04.2021, veio o J... S.A. ora arguido, representado pelo seu mandatário, solicitar, em sede de audiência prévia, uma vistoria ao terreno sito Portela ..., georreferenciado com as Coordenadas (...): 40º 08’ 44,15”N; 08º 24’ 44,36”O, “a fim de tomar posição definitiva sobre a remoção dos resíduos”
Com este intuito, providenciou esta Comissão Coordenação e Desenvolvimento Regional, diligências para a sua realização a qual se veio a concretizar em 23.08.2021, pelas 14h00.
(...)
Constatou-se, sim, a presença de resíduos em todo o terreno, tanto superficialmente como no interior de algumas escavações existentes com cerca de 1 metro, mormente pequenos pedaços de asfalto, tampas de água, tubos, ferros e a existência de um pneu enterrado. Conforme relatório fotográfico da ora arguida e na linha de outras fotografias já denunciadas, que por razões de economia processual aqui se dão por integralmente reproduzidas.
Importa, contudo, realçar que foi observado pelos técnicos da CCDR a presença de resíduos por todo o terreno, divergindo, todavia, do alegado pela ora arguida, em sede exposição do relatório, de vistoria [...] pequenos extratos (poucos) de cimento e betuminoso.
(...)
É factual a presença dos resíduos no terreno e, não havendo prova direta, a prova indiciária recolhida, não deixa lugar a qualquer dúvida que a autoria do depósito dos resíduos em aterro, no local seja da ora arguida:
I. Pelo único estaleiro permanecente no local;
II. Até à presente data não foi alegado por outrem que ali se tivera colocado resíduos;
III. As alegações da ora arguida, admitindo ter colocado em aterro os resíduos no local e com autorização do anterior proprietário, vinca a responsabilidade do ato ilícito e;
IV. Os resíduos no terreno corresponderem a resíduos provenientes das obras realizadas pela ora arguida. (Cfr. relatório fotográfico apresentado pela mesma em anexo).
Neste desiderato, a permanência de resíduos depositados/abandonados em grande parte do terreno, não estão a ser geridos em condições ambientalmente corretas, por forma a evitar ou reduzir os riscos para a saúde humana e para o ambiente, através da poluição da água, do ar, do solo, afetação da fauna ou da flora ou danos na paisagem.
Tal situação de degradação ambiental detetada, viola o princípio da proteção da saúde humana e do ambiente, conforme estipulado no artigo 6.º do Anexo I do Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro, uma vez que é evidente que não está assegurado nem salvaguardado, entre outros, que a gestão de resíduos seja realizada recorrendo a processos ou métodos que não sejam suscetíveis de gerar efeitos adversos sobre o ambiente, nomeadamente do solo.
Em face do exposto, não é merecedor do nosso melhor entendimento, os argumentos expedidos em sede de Audiência Prévia da Proposta de Ordem 276/2021, porquanto, se consideram os fundamentos improcedentes, mostrando-se assim, indispensável a efetivação da Ordem...”.
- (cfr. informação junta como Doc. 1 do requerimento cautelar de fls. 28-52 do processo eletrónico);
5) Em 04.10.2021, pelo Diretor de Serviços da Fiscalização da CCDRC, foi emitido parecer de concordância com a Informação n.º DSF 202/2021, aludida no ponto anterior, que mereceu despacho de concordância, em 11.10.2021, do Vice-Presidente da CCDRC com o seguinte teor: “Desp.T. conhecimento. Concordo. Emita-se a ordem de remoção.”
- cfr. facto provado por documento – vide despacho de fls. 28-52 do processo eletrónico);
6) Em 09.10.2019, pelo Juízo Local Criminal ... – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca ..., foi proferida sentença nos autos de recurso de contraordenação no processo com o n.º 2437/19.... onde consta, entre o mais, o seguinte:
“(...)
I. Nos autos de contra-ordenação presentes, foi a arguida J... S.A, melhor identificada nos autos, condenada por decisão da autoridade administrativa – Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro – na coima de € 2.000,00, pela prática de uma contra-ordenação p.e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 25.º n.º 1, 22.º n.º 2, al. b), da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na sua redacção introduzida pela Lei n.º 114/2015, de 28.08.
(...)
Discutida a causa resultaram provados os seguintes factos:
1. A arguida executou nos anos de 2009 a 2011, em ..., uma obra de construção de rede de transporte de Á... e saneamento para a empresa Á..., dona da obra.
2. Tal obra foi terminada e entregue em 2011.
3. Aquando da execução dessa obra, a arguida arrendou um prédio sito na Portela ..., denominado Vale da ..., inscrito na matriz predial rústica sob o art. ...46 da freguesia ..., concelho ..., para utilizar como estaleiro de obra, para depósito de materiais e máquinas, sendo tal prédio o descrito no auto de notícia de fls. 12. correspondendo às coordenadas 40º 08’44 15’N; 08º24’44,36”O.
4. Aquando da realização da obra, a arguida depositou e incorporou no prédio que arrendara supraidentificado em 3., procedendo ao seu aterro, resíduos/sobrantes provenientes da obra, para nivelamento do prédio, com conhecimento e autorização da dona/senhoria.
5. No dia 16.02.2018, na sequência de uma ação de fiscalização levada a cabo pelos serviços da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, foi constatado no prédio supra identificado em 3., a deposição e aterro de resíduos de construção.
6. Tais resíduos de construção cuja existência aí foi constatada na sequência da referida ação de fiscalização, resultaram da obra executada pela arguida, supra identificada em 1., e que a mesma havia depositado e aterrado nesse prédio.
7. Na sequência da referida acção de fiscalização, foi emitida pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, ordem administrativa escrita, através do ofício n.º DSF 419/18, de 15 de Julho de 2018, endereçada à arguida, e por esta recepcionada, para a mesma, no prazo máximo de 30 dias proceder à:
- Remoção e envio para destino autorizado de todos os resíduos de construção e demolição (RCD’s) depositados no ponto de coordenadas (...) 40º 08’44 15’N; 08º24’44,36”, correspondente ao prédio supra identificado em 3., reconstituindo a situação anterior à prática da infracção;
- Apresentar nesses Serviços, cópias das guias electrónicas de acompanhamento de resíduos (e-GAR’s) removidos do local identificado, comprovando o seu envio para local licenciado.
- Apresentar os certificados emitidos pelo operador de gestão de RCD’s, recebidos na sua instalação.
11. Na sequência de tal ordem administrativa dirigida à arguida, esta, nos dias 03,04,05 e 09 de Julho de 2018, procedeu à remoção parcial dos resíduos de construção e demolição referenciados nessa ordem administrativa, e 6. Supra, conduzindo-os para aterro de empresa licenciada, acompanhados das respectivas e-GAR’s, e certificados emitidos pelos operador de gestão de RCD’s, recebidos na sua instalação.
12. Deixando porém no prédio em referência alguns resíduos de construção e demolição referidos nessa ordem administrativa.
13. No dia 25 de Julho de 2018, a autoridade administrativa deslocou-se ao local da situação do prédio supra identificado em 3., para verificação do cumprimento da referida ordem administrativa.
14. Verificando que a arguida não deu cumprimento integral à mesma, deixando no identificado prédio, alguns dos resíduos de construção de demolição referidos na ordem administrativa, e 6. Supra, que aí permaneciam à data de 25.07.2018.
15. Ao não dar cumprimento integral à ordem administrativa supra referida em 7., a arguida não tomou os cuidados que se lhe impunham, como podia e devia, e de que era capaz, agindo com descuido e imprevidência, no não acatamento da ordem emitida por uma autoridade administrativa, que sabia ser legítima e que lhe foi regularmente transmitida.
16. A arguida não tem antecedentes contra-ordenacionais.
17. Não se apurou o benefício económico retirado pela arguida com o não acatamento da ordem administrativa.
18. Não se apurou a situação económica da arguida
(...)
Da globalidade da prova produzida, resulta à saciedade, que a arguida, na sequência da ordem administrativa, não procedeu à retirada da totalidades dos RCD existentes em tal prédio, por ela produzidos, e nesse por ela incorporados (que vieram à superfície com a crivagem que a mesma fez no prédio em 2017/2018), incumprindo assim, a ordem administrativa.
(...)
Ante a factualidade provada, e face às normas supra citadas conclui-se, sem margem para dúvidas, que os materiais depositados e incorporados pela arguida no prédio supra identificado em 3. dos factos provados, integram o conceito jurídico de resíduo para efeitos de aplicação do disposto no 18.º Decreto-Lei n.º 46/2008, de 12 de Março e do Decreto_lei n.º 178/2006 de 05 de Setembro.
E, da factualidade provada resulta igualmente que a arguida foi a produtora de tais RCD.
Da factualidade provada dúvidas não subsistem que a arguida incorporou, aterrando, resíduos de construção e demolição da obra que realizou, no prédio que utilizou como estaleiro da obra, e supra identificado em 3. dos factos provados.
(...)
V. DECISÃO
Pelo exposto, e alterando a decisão administrativa, condeno a arguida pela prática de uma contra-ordenação p.e.p. pelas disposições conjugadas dos artigos 25.º n.º 1, 22.º n.º 2, al.b) da Lei n.º 50/2006, de 29 de Agosto, na redacção introduzida pela Lei n.º 114/2015. De 28.08, na coima especialmente atenuada, no montante de €1.000,00 (mil euros)”
- (cfr. facto provado por documento – vide decisão judicial junta como Doc. 4 da oposição da requerida a fls. 274-277 do processo eletrónico);
7) Em 12.10.2021, pelo Vice-Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC), no uso de competências delegadas, por despacho de delegação de competências com o n.º 7469/2021, foi emitido ofício de notificação com o seguinte teor:
“(...) Face ao exposto, tendo em conta a gravidade da situação, na sequência do meu despacho proferido na informação DSF n.º ...21 de 2021.09.15 (cópia em anexo), notifico V. Ex.ª nos termos e para os efeitos da alínea b) do n.º 2 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 228/2012, de 25 de outubro, na sua atual redação, para no prazo de 60 (sessenta) dias:
1. Proceder à remoção de todos os resíduos depositados no terreno sito: Portela ..., georreferenciado com as coordenadas (...): 40 08’ 44 15” N: 08º 24’ 44 36 O”, com posterior conhecimento a esta Comissão de Coordenação de Desenvolvimento Regional.
2. Apresentar nestes Serviços cópias das guias eletrónicas de acompanhamento de resíduos (e-GAR) removidos do local identificado, comprovando o seu envio para destino licenciado, conforme Portaria n.º 145/2017, de 26 de abril, alterada pela Portaria n.º 28/2019, de 18 de janeiro.
Findo o prazo para cumprimento da ordem, caso se verifique a inobservância da mesma, fica V. Ex.ª sujeito à coima correspondente às contraordenações graves, conforme estabelecido no n.º 3 do artigo 22.º e n.º 2 do artigo 25.º da Lei Quadro das Contraordenaçôes Ambientais, aprovada pela Lei 50/2006 de 20 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 114/2015, de 28 de agosto.
Mais fica notificado de que decorrido o prazo, sem que o ordenado se ache pontual e integralmente cumprido, estes Serviços participarão o facto ao Ministério Público com vista à instauração do competente procedimento criminal nos termos do art.º 348º do Código Penal, ficando sujeito à pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias”
- (cfr. ofício de notificação junto como Doc.1 do requerimento inicial a fls. 28-52 do processo eletrónico);
8) Em 14.10.2021, a requerente foi notificada do ato referido no ponto anterior.
- (facto provado por confissão cfr. cabeçalho da p.i.);
9) Em 25.10.2021, pela S..., Lda., a pedido da requerente, foi elaborada “Proposta para remoção de terras em terreno RAN (reserva agrícola nacional), numa área de 5000m2, sito em Portela ..., freguesia ..., para vazadouro licenciado em P...” no valor de € 238.000,00 sem IVA.
- (cfr. proposta de orçamento junto com o requerimento inicial como Doc. 25 a fls. 168-172 do processo eletrónico).

2 . MATÉRIA de DIREITO

Tendo em consideração, por um lado, as conclusões das alegações da recorrente, e por outro, a sentença do TAF de Coimbra que, de modo fundamentado, fáctica e juridicamente julgou improcedente a providência cautelar de suspensão de eficácia onde a recorrente pretendia a suspensão de eficácia da decisão do Vice Presidente da CCDRC que, em síntese, lhe ordena a retirada de resíduos depositados indevidamente em terreno sito na Portela ..., ..., ..., as questões a decidir, nesta sede recursiva, são as seguintes:
---- aditamento de nova prova;
--- verificação dos requisitos do periculum in mora, e, se necessário, do fumus boni iuris e ponderação de interesses, previstos no art.º 120 do CPTA.
*
Vejamos!
Quanto à ampliação da prova .
Pretende a recorrente que sejam aditados à factualidade dada como provada os factos constantes dos arts. 71.º a 82.º da petição inicial, alegadamente tendentes a demonstrar os pressupostos do periculum in mora.
Vejamos!
Importa, desde já, salientar que a sentença do TAF de Coimbra, ora em reapreciação recursiva, fundamentadamente, julgou a providência improcedente, unicamente por inverificação de um dos pressupostos cumulativos, previstos no art.º 120.º do CPTA, concretamente, o periculum in mora.
Assim, importa apenas avaliar se os factos que a recorrente pretende ver aditados são relevantes para aferir da bondade da sentença, ou seja, se têm a ver com este requisito, na medida em que só se verificado este requisito se terá de analisar o fumus boni iuris, com recurso à apreciação sumaria das invalidades suscitadas e, neste caso e sequência, só se necessário, avaliar da completude ou não da alegação de modo a fazer essa sumaria cognitio, como é apanágio das providências cautelares e, em último caso, verificados este dois requisitos, efectivar a ponderação dos interesse em jogo.
Ora, lidos estes artigos da pi, aliás, e em consonância com os aditamentos consequentes que a recorrente pretende ver aditados e descritos no ponto 17 das conclusões das suas alegações supra transcritas, verificamos que só o art.º 78.º tem a ver com o periculum in mora, sendo correspondente à al. l) do ponto 17 das conclusões das alegações, além de que os demais são atinentes ao fumus boni iuris ou conexos com este art.º 78.º, além de conclusivos.
Porém, o facto constante do art.º 78.º foi dado como provado no ponto 9 da factualidade provada - cfr. Docs. ns. 25 a 27 juntos com a pi - pelo que nada há que aditar ao probatório.
**
Resolvida esta questão,
centremo-nos no periculum in mora.
O “periculum in mora”, a que alude a 1.ª parte do nº 1 do art. 120.º do CPTA, traduz-se no fundado receio de que, quando sobre o processo principal venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar a resposta adequada às situações jurídicas em litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tomou a decisão totalmente inútil, seja, pelo menos, porque essa evolução conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis. Os conceitos sob cotejo a relevar, isto é, a situação de facto consumado e a produção de prejuízos de difícil reparação, são distintos na medida em que o primeiro implica a impossibilidade de se proceder à restauração natural da situação em conformidade com a legalidade, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente. Por sua vez, o prejuízo de difícil reparação pode ocorrer, no caso de a providência ser recusada, se se verificarem danos que se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou porque a reintegração se perspectiva difícil.
Sobre a apreciação da verificação dos critérios de concessão da providência, Vieira de Andrade (em “A Justiça Administrativa” 4º ed. p. 298), refere que, “O juiz deve, pois, fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por entretanto se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstem à reintegração especifica da sua esfera jurídica. Neste juízo, o fundado receio há-de corresponder a uma prova, em principio a cargo do requerente de que tais consequências são suficientemente prováveis para que se possa considerar “compreensível” ou justificada a cautela que é solicitada”.
Assim, impõe-se sempre um juízo sobre o risco da ocorrência, fundado na apreciação das circunstâncias específicas do caso concreto e na factualidade trazida pelo Requerente, que permitam aferir se a situação de risco é efectiva e não uma mera conjuntura de verificação eventual, recaindo sobre este o ónus de fazer prova sumária dos requisitos do periculum in mora, bastando-se o legislador com uma prova sumária dos fundamentos do pedido (ver arts. 342.º n.º1 do Cód. Civil, 114.º n.º3 al. g) do CPTA -cfr. Ac. do TCA-N, de 11/05/2006, in Proc. n.º 910/05.0BEPRT).
*
A sentença recorrida equacionou devidamente a questão, salientando mesmo que não foi considerado o balanço junto na petição - Doc. n.º 25 E não Doc. 28, como, certamente por lapso, se referiu - cfr. ponto 9 dos factos provados. - na medida em que nada foi alegado com referência a este documento, indicando concretamente o que pretendia provar com o mesmo, acrescendo que, quanto a esta concreta decisão de desconsideração do balanço junto - porventura importante para, se devidamente enquadrado e justificado, porventura evidenciar algo referente ao periculum in mora - a recorrente nada diz o que significa que não discorda desta concreta decisão judicial, impondo-se-nos assim consequente e logicamente também a sua desconsideração.
Mas atentemos na fundamentação jurídica da decisão judicial do TAF de Coimbra, sendo que com isso, nos dispensamos de outras considerações, por despiciendas e repetitivas.
Consta da sentença, depois de efectuada uma análise dogmática acerca dos requisitos previstos no n.º1 do art.º 120.º do CPTA:
" ...
Vejamos então se se verificam os três requisitos necessários para o decretamento da providência cautelar de natureza conservatória pretendida pelo requerente.
Do periculum in mora
Alega a requerente que a decisão proferida pela CCDRC lhe “...provoca prejuízo de dificílima ou mesmo impossível reparação...” pois o terreno onde se situava o seu estaleiro, dista cerca de 30/40 Km do vazadouro autorizado P..., Lda, custando-lhe, o transporte dos resíduos para vazadouro autorizado, o avultado montante de € 238.500,00, pelo que a execução da ordem prejudicará a sua rendibilidade, com prejuízo para a sua estrutura económica constituída por equipamentos e 53 postos de trabalho. Apreciando e decidindo.
A requerente invoca, de forma conclusiva, que a decisão da CCDRC lhe provoca “prejuízo de dificílima ou mesmo impossível reparação”, mas sem cuidar de o concretizar. Sublinha o Tribunal que não descreve um único facto relativo ao prejuízo em questão.
É certo que a requerente alegou que considera avultado o preço que lhe foi orçamentado para o transporte dos resíduos para o vazadouro autorizado, no montante de € 238.500,00 (facto provado 9.), mas fica por esta alegação.
Mais alegou que, o pagamento da quantia em questão prejudicará a sua “rendibilidade” com prejuízo para a sua estrutura económica constituída por equipamentos e 53 postos de trabalho.
Ora a requerente não concretizou, nem densificou, de que forma o pagamento do valor orçamentado se traduz em prejuízo de “...dificílima ou mesmo impossível reparação...”, designadamente, de que forma afetará a sua força de trabalho, os seus compromissos com credores e fornecedores, a sua solvabilidade, a sua capacidade de continuar a operar, a sua “estrutura económica”, os seus equipamentos e os seus 53 trabalhadores.
A requerente limitou-se a referir que o pagamento do montante em questão prejudicará a sua “rendibilidade”, sendo tal afirmação de natureza conclusiva, pelo que se desconhece de que modo e com que fundamento quando a ação principal for decidida os seus alegados prejuízos não poderão ser reparados, em caso de procedência da ação. De resto, nada nos autos nos permite concluir desse modo em vez de se tratar, antes, de uma questão de diminuição da sua “rendibilidade”, isto é de “renda” ou lucro.
Naturalmente não se questiona que o pagamento da quantia de € 238.500,00 seja uma despesa, sobretudo quando não previsível, que pode causar menos liquidez a qualquer empresa, mas para que se verifique, no caso concreto, o periculum in mora necessário é que se invoque e prove o perigo fundado de ocorrência de uma situação irreversível ou de muito difícil reparação.
Considerando que, no caso, a requerente não alegou nem provou qualquer facto que permita ao Tribunal verificar a ocorrência de uma situação de provável irreversibilidade ou de muito difícil reparação, considera-se como não verificado o requisito do periculum in mora necessário ao decretamento da pretendida providência.
Ora, tendo em conta que os requisitos do decretamento da providência têm caráter cumulativo e que basta a não verificação de um deles para se decidir pelo indeferimento da pretensão cautelar, fica assim prejudicada a apreciação do requisito do fumus boni iuris (cf. artigo 120.º, n.º 1 do CPTA)".
**
Que mais dizer, se, como se evidencia da peça recursiva e refere sapientemente o M.º P.º no seu Parecer, a recorrente não alinha novos argumentos, nem contradita as proposições contidas na sentença que pretende ver revogada?!
Onde se mostra factualizado, objectivado o periculum in mora, enquanto fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de dificil reparação para os interesses que a Requerente visa acautelar no processo principal, sendo cero que lhe cabe o ónus de alegar e demonstrar os factos pertinentes que permitam a formulação de juízo sobre esse fundado receio?!
Como pretende demonstrar que a retirada dos resíduos - pese embora o valor elevado apresentado (238.000,00€) - lhe causa prejuízos de dificílima ou mesmo impossível reparação? Quais os elementos contabilísticos que permitem aferir desse verosimelhança?! De que modo será afectada a sua "rendibilidade"?
Para que o Tribunal afira da verificação de uma situação irreversível ou de muito difícil reparação com a execução do acto suspendendo, não basta referir o montante a despender, importa que sejam alinhados factos concretos donde se possa minimamente aferir da verificação deste requisito, de modo objectivo, para aferir da probabilidade de ocorrência de um resultado irreversível e não apenas um mero receio de que tal venha a acontecer.
Não se questiona a dificuldade e valor da remoção dos resíduos mas quais os factos concretos, objectivos que inculcam que essa execução importa prejuízos de difícil ou impossível reparação, incomportáveis com a demora da decisão da acção principal?!
Caso obtenha vencimento na acção principal, estando em causa uma entidade pública não vemos dificuldade acrescida em recuperar a quantia dispendida com a ilegal e indevida remoção dos resíduos.
Também não se verifica qualquer violação do direito ao acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efectiva, na medida em que a recorrente teve acesso aos tribunais e a obter a pertinente e adequada tutela, mas para tanto impunha-se, indubitavelmente, que justificasse factual e objectivamente os pressupostos para preenchimento deste requisito, sem o qual, necessariamente, não pode obter a suspensão do acto em causa.
Sibi imputet!
***
Importa, antes de se concluir, fazer referência à Resposta da A./recorrente ao Parecer do M.º P.º.
Esta Resposta nada tem a ver com o Parecer, sendo antes um requerimento anómalo.
Vejamos!
Esta providência cautelar foi instaurada pela recorrente contra a CCDRC, visando a suspensão de um acto do Vice Presidente da CCDRC, pedindo a final a citação esta entidade.
Na Resposta ao Parecer do M.º P.º, vem questionar a constitucionalidade do art.º 25.º, n.º4 do CPTA, referindo o Centro de Competências Jurídicas do Estado.
Depois, a ilegitimidade passiva da CCDR, fazendo referência ao processo contra-ordenacional ... incompetência da demandada...etc...
Em suma, as questões suscitadas não merecem qualquer apreciação por desenquadradas processualmente, devendo ter sido, quando muito, suscitadas em sede de alegações de recurso.
**
Sem necessidade de outras considerações, impõe-se apenas, concluir pelo não provimento do recurso e consequente manutenção da sentença recorrida, sendo que -
como vimos - não se mostrando provado o requisito cumulativo - periculum in mora -, terá de ser indeferido o pedido de suspensão do acto administrativo suspendendo, tornando-se, assim, desnecessário apurar a verificação dos restantes pressupostos de decretamento da providencia cautelar de suspensão, nomeadamente o fumus boni iuris - aparência do bom direito - e a ponderação de interesses.


III
DECISÃO

Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e assim manter a sentença recorrida.
*
Custas pela recorrente.
*
Notifique-se.
DN.
Porto, 1 de Julho de 2022

Antero Salvador
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho