Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00214/23.5BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:11/17/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Paulo Ferreira de Magalhães
Descritores:DESPEJO ADMINISTRATIVO; FALTA DE PAGAMENTO DE RENDAS;
FALTA DE INTERESSE EM AGIR;
AUTOTUTELA EXECUTIVA;
Sumário:
1 - Os tribunais administrativos são competentes para conhecer das matérias relativas à invalidade ou cessação dos contratos de arrendamento de renda apoiada, mas já não em matéria de despejo, por estar essa competência atribuída aos órgãos administrativos.

2 – No que é atinente ao despejo dos inquilinos, dispõe o artigo 28.º da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, na redação conferida pela Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto, que caso não seja cumprida voluntariamente a obrigação de desocupação e entrega da habitação, cabe ao senhorio levar a cabo os procedimentos subsequentes, nos termos da lei, atribuindo a competência da decisão do despejo aos dirigentes máximos, dos conselhos de administração ou dos órgãos executivos das entidades referidas no artigo 2.º, n.º 1.

3 - Quando o despejo tenha por fundamento a falta de pagamento de rendas, encargos ou despesas, a decisão de promoção da correspondente execução deve ser tomada em simultâneo com a decisão do despejo, o que significa que é conferida competência legal a um orgão administrativo para determinar, não apenas o despejo, mas a sua execução, e neste conspecto, o poder de decidir o despejo e de o executar, sob autotutela declarativa e executiva.

4 - O regime legal estabelecido pelo legislador não se reveste de uma mera faculdade a que o Autor ora Recorrente pode ou não recorrer, pois que atento o princípio da juridicidade, está vinculado por um especial dever de prosseguir na estrita observância da legalidade procedimental disposta pelo legislador, em ordem ao cabal exercício das suas competências, para o que não podem relevar razões de oportunidade ou meramente discricionárias.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Comum
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:


I - RELATÓRIO


INSTITUTO DA HABITAÇÃO E DA REABILITAÇÃO URBANA, IP, [devidamente identificado nos autos] Autor na acção que intentou contra «AA», e «BB» [também devidamente identificado nos autos], na qual foi requerido que (i) seja decretada a cessação do contrato de arrendamento, por resolução, e a entrega do imóvel livre e devoluto de pessoas e bens e, bem assim, que (ii) estes sejam condenados a pagar ao Autor a quantia de EUR 1.702,48 (mil, setecentos e dois euros e quarenta e oito cêntimos), a título de rendas vencidas e não pagas, acrescida de juros de mora calculados à taxa supletiva legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento e entrega efectiva do imóvel e (iii) subsidiariamente, a condenação dos Réus no pagamento das rendas em atraso, mas, de igual forma, de 20 % do correspondente valor em dívida, inconformado com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual foi julgada procedente a excepção dilatória atinente à falta de interesse em agir, e indeferida liminarmente a Petição inicial, veio interpor recurso de Apelação.

*

No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem:


“[…]
CONCLUSÕES
A) Todas as alterações à a Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro por parte da Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto (e observem-se de modo muito particular as alterações aos arts. 6.º, 17.º, 19.º, 20.º, 23.º, 24.º, 25.º, 26.º, 28.º, 34.º e 37.º) visaram, de forma clara e sem exceção, conferir ou aprofundar direitos aos arrendatários.
B) Uma parte destas alterações, como se extrai desde logo e de forma muito evidente da análise dos arts. 28.º e 34.º, consistiu precisamente em retirar aos senhorios os meios de autotutela que lhes permitiam alcançar os fins visados com a propositura da ação de despejo.
C) Subjacente a esta alteração terá estado, tanto quanto é possível perceber, o entendimento de que os direitos processuais dos arrendatários encontrarão uma maior proteção no âmbito do processo judicial do que no âmbito do processo administrativo.
Veja-se:
D) Começando pelo art. 17.º, tenha-se desde logo presente que o n.º 3 é e sempre foi inequívoco ao estabelecer que Compete aos tribunais administrativos conhecer das matérias relativas à invalidade ou cessação dos contratos de arrendamento apoiado(sublinhado nosso); Por outro lado, observando atentamente o n.º 1 do art. 17.º, constata-se que, com a alteração promovida pela Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto, a aplicação do Código Civil aos contratos de arrendamento apoiado deixou de ser meramente subsidiária.
E) Passando ao art. 25.º, veja-se que a Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto, veio introduzir a referência expressa aos arts. 1083.º e 1084.º do Código Civil no contexto das causas de resolução do contrato de arrendamento, que não existia anteriormente. Com esta alteração no n.º 1 do art. 25.º, deu-se cobertura legal expressa à resolução do contrato pelo senhorio com fundamento no não pagamento de rendas ou pela mora do arrendatário, ao abrigo do art. 1083.º, n.ºs 3 e 4, do Código Civil.
F) Ao mesmo tempo, a Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto, veio também revogar o n.º 3 do art. 25.º, que previa que “Na comunicação referida no número anterior, o senhorio deve fixar o prazo, no mínimo de 60 dias, para a desocupação e entrega voluntária da habitação, não caducando o seu direito à resolução do contrato ainda que o arrendatário ponha fim à causa que a fundamentou”.
G) Com a revogação do n.º 3 do art. 25.º (conjuntamente com a revogação dos n.ºs 7 e 8 do art. 34.º, de que falaremos adiante), foi esvaziada de qualquer efeito prático a comunicação prevista no n.º 2 do art. 25.º.
H) E isto porque, por um lado, o senhorio deixa de fixar naquela comunicação qualquer prazo para a desocupação e, por outro, mais importante até, aquela comunicação deixa de ser apta a pôr termo à caducidade do direito à resolução.
I) Se por via do art. 17.º, n.º 2, da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, o Código Civil é diretamente aplicável a este tipo de contratos, os senhorios estão necessariamente sujeitos à caducidade do direito à resolução prevista no art. 1085.º do Código Civil (cujos prazos se caracterizam, especialmente no seu n.º 2, pela exiguidade).
J) Pois bem, à luz do art. 331.º, n.º 1, do Código Civil, só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo(sublinhado nosso).
K) Acontece que com a revogação do art. 25.º, n.º 3, deixou de existir a norma que atribuía àquela comunicação do art. 25.º, n.º 2, o efeito impeditivo da caducidade, o que deixa os senhorios com uma única saída: o recurso à via judicial.
L) Por outro lado, a respeito do art. 28.º, onde anteriormente se dizia que “cabe a essa entidade ordenar e mandar executar o despejo, podendo, para o efeito, requisitar as autoridades policiais competentes”, consta agora que “cabe a essas entidades levar a cabo os procedimentos subsequentes, nos termos da lei” (sublinhado nosso). Ao retirar a possibilidade de “ordenar e mandar executar o despejo” e remeter para “os procedimentos subsequentes, nos termos da lei”, o legislador está a remeter os senhorios para o cumprimento do disposto no Código Civil e nas leis de processo, o que aliás se coaduna na perfeição com as já mencionadas alterações operadas no art. 17.º, n.º 1, e no art. 25.º, n.º 1.
M) Mas há mais: no âmbito da alteração ao n.º 1 do art. 28.º, foi também suprimida a possibilidade de os senhorios requisitarem as autoridades policiais competentes para o despejo coercivo dos imóveis.
N) Observando as implicações e as dificuldades de ordem prática inerentes a qualquer ação de despejo, muitas vezes aqui exponenciadas pelo contexto muito específico do património habitacional em causa, sempre seria impensável para qualquer das entidades enumeradas no art. 2.º, n.º 1, da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, a realização de qualquer despejo sem o apoio das autoridades policiais. Daí esta possibilidade ter constado da primeira versão do n.º 1 do art. 28.º.
O) Também aqui só se vislumbra um motivo, racional e objetivo, para o legislador ter suprimido esta possibilidade de requisição das autoridades policiais: o legislador optou por afastar o despejo administrativo, enveredando pelo despejo pela via judicial (onde, diga-se de passagem, a possibilidade de recurso às autoridades policiais já está expressamente prevista nos arts. 757º e 861º do CPC).
P) Acresce que o art. 28º, n.º 4, da Lei nº 81/2014, de 19 de dezembro, que estabelecia que “quando o senhorio for uma entidade diversa das referidas no n.º 1 do artigo 2.º, o despejo é efetuado através da ação ou do procedimento especial de despejo previstos no NRAU, e na respetiva regulamentação” foi objeto de revogação. Donde, verifica-se que depois de num primeiro momento ter traçado de forma expressa uma diferença entre a tramitação do despejo por parte das entidades enumeradas no art. 2.º, n.º 1, da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro (entidades de direito público), e a tramitação do despejo por parte de entidades diversas daquelas (entidades de direito privado), o legislador veio abolir essa mesma diferença.
Q) A abolição dessa diferença de tramitação conduz obrigatoriamente a que, quer se tratem entidades enumeradas no art. 2.º, n.º 1, da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, quer se tratem de entidades diversas daquelas, passam todas a estar sujeitas ao mesmo regime. Não se cogitando minimamente em que termos poderia uma entidade de direito privado instruir e dar seguimento a um despejo administrativo, também por aqui não se vislumbra outra alternativa que não seja concluir que a opção legislativa consagra o primado do despejo por via judicial no âmbito do regime do arrendamento apoiado.
R) Por fim, relativamente ao art.º 34.º, há que realçar a revogação dos n.ºs 7 e 8 por parte da Lei n.º 32/2016 de 24 de agosto, que deixou os senhorios, de forma absolutamente notória, sem qualquer fundamento legal para ordenar e para operacionalizar um despejo administrativo: a) com a revogação do n.º 7 do art. 34.º, foi pura e simplesmente retirada aos senhorios a possibilidade de poder obter título bastante para proceder ao despejo administrativo, b) e com a revogação do n.º 8 do art. 34.º, deixaram de estar previstos os termos em que, ainda que por remissão para o Decreto-Lei n.º 280/2007, de 7 de agosto, era possível aos senhorios concretizar o despejo administrativo.
S) À luz do supra exposto, e com todo o respeito por entendimento diverso, a verdade é que, extrair da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, que os senhorios padecem de falta de interesse em agir no despejo pela via judicial, não só consubstancia uma errada aplicação da Lei, como coloca os senhorios numa situação de absoluta impossibilidade de despejar os arrendatários incumpridores (com consequências óbvias que não se cingirão apenas à esfera restrita dos senhorios), na medida em que a Lei atualmente não confere de facto outra alternativa.
T) De todo o modo, sem prescindir quanto ao supra exposto, mesmo que os senhorios dispusessem de meios de autotutela declarativa e executiva para alcançar os fins visados com a ação instaurada, o que, como já vimos, não sucede, nem por isso se devem considerar impedidos de recorrer aos meios judiciais para obter o pretendido despejo.
U) Desde logo, porquanto o princípio da tutela jurisdicional efetiva se encontra consagrado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa, nos termos do qual a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos.
V) A interpretação do disposto no art. 28.º da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, no sentido de que, concedendo autotutela ao senhorio, exclui a possibilidade de recorrer às instâncias jurisdicionais para a defesa dos seus interesses e direitos legítimos, é violadora daquele princípio constitucionalmente consagrado.
W) Por outro lado, o Recorrente tem, como qualquer outra pessoa coletiva ou singular, a garantia de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 2.º do CPC, nos termos do qual tem o direito de obter uma decisão judicial que aprecie a sua pretensão e que a faça executar, sendo certo que, nos termos do mesmo preceito, a todo o direito correspondente a ação adequada a obter o reconhecimento do invocado direito.
X) Ademais, ao arrendamento a que respeitam os presentes autos é aplicável o regime jurídico do arrendamento apoiado, o qual, como acima se referiu, é regido pela Lei nº 81/2014, de 19 de dezembro, pelos regulamentos nesta previstos e pelo Código Civil (art. 17.º, n.º 1). Não pode, assim, deixar de se considerar o regime resultante do Código Civil.
Y) Na verdade, não só o art. 17.º, n.º 1, Lei nº 81/2014, de 19 de dezembro, impõe a aplicação das normas do Código Civil de forma direta, como o próprio art. 25.º, n.º 2, invoca de forma expressa o art. 1084.º, n.º 2, do Código Civil.
Z) O artigo 1084.º, n.º 2, do Código Civil, permite que a resolução pelo senhorio do contrato de arrendamento quando fundada na falta de pagamento de rendas se efetue por comunicação à contraparte onde fundamentadamente se invoque a obrigação incumprida.
AA) Sucede que, como se julga ser jurisprudência hoje pacífica, a possibilidade de resolução do contrato de arrendamento por comunicação por parte do senhorio não inviabiliza o recurso a ação judicial com o mesmo fim, sendo legítima a opção por qualquer uma das vias por parte do senhorio, pelo que, estando em causa a aplicação das mesmíssimas normas do Código Civil, nunca poderão ser adotadas soluções diferentes apenas porque a tipologia dos contratos de arrendamento é diferente ou, pior ainda, porque a natureza jurídica dos senhorios é diferente.
BB) Tal configuraria uma flagrante violação do princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado no art. 13.º da CRP.
CC) Existindo situações em que só através da via judicial se obtém a resolução contratual (e, mais do que isso o despejo coercivo, atentas as limitações constitucionais), não é possível sustentar, com coerência, a exclusividade e imperatividade da via extrajudicial prevista no artigo 25º a 28º do citado diploma legal, sendo certo que conclusão contrária implicaria uma limitação injustificada do direito de ação do aqui Recorrente previsto no artigo 20º da CRP.
DD) Está-se assim perante uma errada aplicação do pressuposto processual inominado do interesse em agir, e, consequentemente, a sentença está em violação com o disposto na Lei 81/2014 de 19 de dezembro com as alterações dadas pela Lei nº 32/2016 de 24 de agosto, com os artigos 179º e 180º do CPA, os artigos 1083º e 1084º ambos do Código Civil, tendo sido ainda preterido o princípio constitucional do acesso ao direito e à justiça, vertido no artigo 13º e 20º da C.R.P.

Nestes termos e nos melhores de direito deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida e, consequentemente, ordenando-se o prosseguimento da ação instaurada para decretamento da resolução do contrato de arrendamento e pagamento da dívida. […].”

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Os Recorridos não apresentaram Contra Alegações.

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O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso interposto, fixando os seus efeitos.

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O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.

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Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 639.º e 635.º n.ºs 4 e 5, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se limita a cassar a decisão judicial recorrida pois que, ainda que venha a declarar a sua nulidade, sempre tem de decidir [Cfr. artigo 149.º, n.º 1 do CPTA] “… o objecto da causa, conhecendo do facto e do direito.”, reunidos que estejam os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

Assim, as questões suscitada pelo Recorrente e patenteadas nas conclusões apresentadas consistem, em suma e a final, em apreciar e decidir, sobre se a Sentença recorrida padece erro de julgamento em matéria de direito.

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III - FUNDAMENTOS
IIIi - DE FACTO

No âmbito da factualidade considerada pelo Tribunal recorrido em sede do despacho saneador proferido, dela consta o que por facilidade [tendo subjacente o disposto no artigo 663.º, n.º 6, do CPC] para aqui se extrai como segue:

“[…]
Para estribar a sua pretensão, o Autor substancia, em suma, que em 01.05.2020 celebrou com os Réus um contrato de arrendamento apoiado, pelo qual deu de arrendamento a estes o prédio urbano sito Rua ..., ...), ...., Bairro ... ....
Mais alega o Autor que, nessa sequência, os Réus não procederam ao pagamento de rendas no valor de EUR 1.702,48 correspondente a 26 rendas vencidas e não pagas desde Novembro de 2020, motivo pelo qual, de acordo com o artigo 14.º da Lei n.º 06/2006, de 27 de Fevereiro, tem direito a resolver tal contrato e a exigir-lhes os respectivos devidos juros de mora.
[…]”
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IIIii - DE DIREITO

Está em causa a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 20 de fevereiro de 2023, que apreciou a pretensão deduzida pelo Autor contra os Réus «AA», e «BB», no sentido de ser decretada a cessação do contrato de arrendamento, por resolução, e a entrega do imóvel livre e devoluto de pessoas e bens, e bem assim, que sejam condenados a pagar ao Autor a quantia de €1.702,48, a título de rendas vencidas e não pagas, acrescida de juros de mora calculados à taxa supletiva legal desde a data da citação até efectivo e integral pagamento e entrega efectiva do imóvel, e subsidiariamente, serem os Réus condenados no pagamento das rendas em atraso, mas, de igual forma, de 20 % do correspondente valor em dívida, e pela qual foi julgada procedente a excepção dilatória atinente à falta de interesse em agir, tendo a Petição inicial sido liminarmente rejeitada.

Como assim dispõe o artigo 627.º, n.º 1 do CPC, as decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos, para efeitos de poderem ser evidenciadas perante o Tribunal Superior as irregularidades de que a Sentença pode enfermar [que se reportam a nulidades que afectam a Sentença do ponto de vista formal e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade], assim como os erros de julgamento de facto e/ou de direito, que por si são resultantes de desacerto tomado pelo Tribunal na formação da sua convicção em torno da realidade factual, ou da interpretação e aplicação do direito, em termos tais que o decidido não está em correspondência com a realidade fáctica ou normativa.

Constituindo os recursos jurisdicionais os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, por via dos quais os recorrentes pretendem alterar as sentenças recorridas, nas concretas matérias que os afectem e que sejam alvo da sua sindicância, é necessário e imprescindível que no âmbito das alegações de recurso os recorrentes prossigam de forma clara e objectiva as premissas do silogismo judiciário em que se apoiou a decisão recorrida, por forma a evidenciar os erros em que a mesma incorreu.

Aqui chegados.

Cotejadas as conclusões das Alegações de recurso apresentadas pelo Recorrente, delas se extrai que a sua pretensão está ancorada, no essencial, no entendimento que prossegue de que a auto tutela administrativa deixou de ter consagração legal, por força da alteração do artigo 28.º da Lei n.º 81/2014, operada pela Lei n.º 32/2016 de 24 de agosto, cuja atual redação determina que lhe cabe levar a cabo os procedimentos subsequentes, nos termos da lei, o que afasta expressamente o despejo administrativo, e bem assim, que foi violado o princípio da igualdade, assim como o núcleo essencial em torno do acesso ao direito e aos tribunais.

Nesse sentido, referiu que a prossecução do entendimento de que em face do disposto na Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, os senhorios padecem de falta de interesse em agir no despejo pela via judicial, não só consubstancia uma errada aplicação da Lei, como coloca os senhorios numa situação de absoluta impossibilidade de despejar os arrendatários incumpridores, por a Lei actualmente não conferir outra alternativa, mas sempre e de todo o modo, que mesmo que os senhorios dispusessem de meios de autotutela declarativa e executiva para alcançar os fins visados com a ação instaurada, que nem por isso se devem considerar impedidos de recorrer aos meios judiciais para obter o pretendido despejo, porque o princípio da tutela jurisdicional efetiva se encontra consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, nos termos do qual a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, e que a interpretação do disposto no artigo 28.º da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, no sentido de que estando concedida autotutela ao senhorio, está excluída a possibilidade de recorrer às instâncias jurisdicionais para a defesa dos seus interesses e direitos legítimos, é violadora daquele princípio constitucionalmente consagrado, assim como do direito de obter uma decisão judicial que aprecie a sua pretensão e que a faça executar.

Mais referiu que o artigo 17.º, n.º 1 da Lei nº 81/2014, de 19 de dezembro, não só impõe a aplicação das normas do Código Civil de forma directa, como o próprio artigo 25.º, n.º 2, invoca de forma expressa o artigo 1084.º, n.º 2, do Código Civil, permitindo que a resolução pelo senhorio do contrato de arrendamento, quando fundada na falta de pagamento de rendas, se efectue por comunicação à contraparte onde fundamentadamente se invoque a obrigação incumprida.

Referiu ainda ser jurisprudência pacífica, a possibilidade de resolução do contrato de arrendamento por comunicação por parte do senhorio, o que não inviabiliza o recurso a ação judicial com o mesmo fim, sendo legítima a opção por qualquer uma das vias por parte do senhorio, pelo que, estando em causa a aplicação das mesmas normas do Código Civil, que não poderão ser adoptadas soluções diferentes apenas porque a tipologia dos contratos de arrendamento é diferente ou porque a natureza jurídica dos senhorios é diferente, o que configuraria uma flagrante violação do princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado no artigo 13.º da CRP.

Concluiu a final que se está perante uma errada aplicação do pressuposto processual inominado do interesse em agir, e dessa forma, que a Sentença recorrida está em violação com o disposto na Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, com as alterações dadas pela Lei n.º 32/2016 de 24 de agosto, com os artigos 179.º e 180.º do CPA, os artigos 1083.º e 1084.º ambos do Código Civil, tendo sido ainda preterido o princípio constitucional do acesso ao direito e à justiça, vertidos nos artigos 13.º e 20.º da CRP.

Neste conspecto, cumpre para aqui extrair a essencialidade da fundamentação aportada pelo Tribunal a quo, como segue:

Início da transcrição
“[…]
Ora, neste campo, convém, desde logo, assinalar que o contrato de arrendamento apoiado se trata de um contrato administrativo, nos termos do n.º 2 do artigo 17.º da citada Lei, cujo objecto é, no entanto, passível de acto administrativo, já que a atribuição do direito a uma habitação depende da prática de um acto administrativo que o formalize na sequência de concurso (artigos 5.º a 16.º-A) e defina o respectivo conteúdo (artigos 18.º a 24.º), ainda que dentro dos limites que se mostram consagrados pelo legislador, além do mais, na citada Lei (note-se, porém, que o Código dos Contratos Públicos, incluindo a sua substantiva Parte III, lhe é inaplicável em virtude do disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 4.º deste diploma).
Em todo o caso, o legislador, no artigo 28.º da citada Lei, não deixou qualquer dúvida no sentido de que, quando exista fundamento para a sua resolução e consequente despejo, cabe às entidades previstas no n.º 1 do artigo 2.º - como é o caso do IHRU -, levar a cabo os procedimentos subsequentes, o que naturalmente passa pela emissão de um acto administrativo para efeitos do artigo 148.º do CPA e, sendo caso disso, da subsequente execução coerciva (de obrigação pecuniária ou de prestação de facto), em conformidade com o disposto nos artigos 175.º e seguintes do CPA, tudo por via do n.º 1 do artigo 2.º do CPA.
[…]
A este título, o n.º 3 do artigo 28.º da citada Lei n.º 81/2014, de 19/12 esclarece que, quando tal despejo tenha por fundamento a “falta de pagamento de rendas, encargos e despesas” (v.g. referentes à administração, conservação e fruição de partes comuns), a decisão de promoção da correspondente execução deve ser também tomada em simultâneo com a ordem de despejo.
Aliás, o próprio n.º 3 do artigo 17.º da Lei n.º 81/2014 apenas confere aos tribunais administrativos a competência para apreciar da eventual “invalidade ou cessação dos contratos de arrendamento apoiado”, o que, a contrario, significa que a estes tribunais não compete, nem ordenar o despejo, nem proceder à declaração do eventual direito do senhorio ao pagamento de rendas vencidas ou demais prestações pecuniárias, bem como determinar os termos da sua execução.
Em face do que se acaba de descrever, não sobram dúvidas de que o legislador conferiu à Administração o poder de unilateralmente decidir pela resolução do contrato de arrendamento e o despejo e/ou declarar e impor o pagamento das rendas que se mostrem em dívidas, executando-o, munindo-a, assim, sem sombra de dúvidas, de autênticos poderes de auto-tutela declarativa (artigo 148.º do CPA) e auto-tutela executiva (artigos 173.º a 183.º do CPA).
[…]
Neste campo, importa não olvidar que o interesse em agir se trata de um pressuposto processual pelo qual a parte justifica a carência da tutela judiciária, e que decorre da situação, objectivamente existente, de necessidade de protecção judicial do interesse (substantivo) do autor, visando-se evitar, por um lado, que as pessoas sejam precipitadamente forçadas a vir a juízo para organizarem a defesa dos seus interesses, numa altura em que a situação da parte contrária o não justifica, e por outro, sobrecarregar os tribunais com acções desnecessárias [cf. vejam-se, entre outros, MANUEL DE ANDRADE, in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pp. 79 a 86; ANSELMO DE CASTRO, in Direito Processual Civil Declaratório, vol. II, 1982, pp. 251 a 255; ANTUNES VARELA, in Manual de Processo Civil, 1985, pp. 179 a 189; VIEIRA DE ANDRADE, in A Justiça Administrativa, 8ª ed., pp. 306 a 310; AROSO DE ALMEIDA, in O Novo Regime de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª ed., pp. 59 a 61].
No entanto, em face do que supra vai exposto, grassa, pois, à evidência que, no caso, o Autor carece de qualquer interesse processual para peticionar a declaração de resolução do contrato de arrendamento apoiado e, bem assim, o pagamento das prestações pecuniárias cuja declaração do direito almeja obter, já que, como se viu, neste capítulo, o legislador o dotou dos necessários poderes jurídico-administrativos para, nesse aspecto, definir, impor e executar unilateralmente tais obrigações aos Réus.
Pressuposto processual inominado este, cuja falta, sendo manifesta e insuprível, leva inevitavelmente ao indeferimento liminar da petição inicial, nos termos da leitura conjugada do n.º 1 do artigo 590.º do CPC e, bem assim, da alínea e) do n.º 1 do artigo 278.º do CPC e do n.º 4 do artigo 89.º do CPTA.
[…]”
Fim da transcrição

Conforme deflui da Sentença recorrida, e com reporte à causa de pedir e ao pedido deduzido a final da Petição inicial, o Tribunal a quo julgou que por dispor o Autor de meios de auto tutela, declarativa e executiva, que carecia de interesse em agir para efeitos do pedido formulado nos autos, tendo rejeitado liminarmente a Petição inicial.

A Sentença recorrida apoiou-se em vários Acórdãos proferidos quer por este TCA Norte, quer pelo TCA Sul, cuja jurisprudência não coloca em causa nesta sua pretensão recursiva, ainda que em termos mínimos.

Um desses Acórdãos deste TCA Norte, em que se amparou o Tribunal a quo foi o proferido no âmbito do Processo n.º 02143/21.8BEPRT, em 23 de junho de 2022, onde efectivamente foi apreciada e decidida questão similar à que ora se discute, e pelo qual foi confirmada a Sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância.

Nesse processo vinha interposto recurso de Apelação da Sentença por via da qual o Tribunal a quo indeferiu liminarmente a Petição inicial apresentada pela Autora [que era uma empresa pública municipal, sendo que nos presentes autos, o facto de o Autor ser um instituto público, essa diversa natureza jurídica em nada releva], com fundamento na falta do pressuposto processual atinente ao interesse em agir, por ter julgado que aquela não tinha necessidade de intentar uma acção nos tribunais administrativos, em busca de tutela jurisdicional efectiva, por dispor de um mecanismo de autotutela declarativa e executiva, previsto na Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro e no artigo 179.º do CPA, por lhe ser permitido declarar o seu direito a receber rendas, e na falta de cumprimento voluntário, o direito de proceder à sua cobrança coerciva.

Ora, desse Acórdão foi interposto recurso de revista para o STA, que em formação constituída para efeitos de apreciação preliminar sumária, decidiu por seu Acórdão datado de 15 de dezembro de 2022, pela admissão desse recurso.

No dia 19 de Outubro de 2023, o STA proferiu Acórdão nesse recurso de revista, onde conheceu do mérito da pretensão recursiva da Recorrente, a cujo julgamento aderimos sem reservas [com as adaptações que mostrem necessárias, designadamente em sede da matéria de facto], e cuja fundamentação também aqui se dá por enunciada tendo em vista alcançar uma interpretação e aplicação uniformes do direito [cfr. artigo 8.º, n.º 3 do Código Civil], como segue:

Início da transcrição
“[...]
42 – E não havendo dúvidas que a Autora, ora Recorrente, pode promover a execução para pagamento das rendas em atraso, quando estas são a causa da decisão de despejo e resolução do contrato, ao abrigo das disposições conjugadas, supra citadas e transcritas, também é certo que não deixa de o poder fazer quando o não são.
43 – Pois que, o artigo 28.º, n.º 3, pressupõe essa autotutela declarativa referente ao pagamento de rendas em atraso, impondo apenas, nos casos em que seja este o fundamento do despejo, que as duas decisões sejam proferidas em simultâneo.
44 – A decisão de promoção da execução por rendas em atraso, enquadrada como está no NRAAH, de entre os demais poderes de autotutela declarativa em sede de resolução de contrato e de despejo, consubstancia, assim, um título executivo complexo, à semelhança do que hoje sucede no regime do contrato de arrendamento civil,
ex vi artigos 25.º, n.º 1 e 17.º n.º 1, do NRAAH.
45 – No artigo 14.º-A do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) determina-se que o contrato de arrendamento, quando acompanhado do comprovativo de comunicação ao arrendatário do montante em dívida, é título executivo para a execução para pagamento de quantia certa correspondente às rendas, aos encargos ou às despesas que corram por conta do arrendatário. (Sobre o âmbito deste título executivo no sentido de que comporta a “indemnização” prevista no artigo 1045.º, n.ºs 1 e 2 do CC, v. por todos, o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, P. 7285/18.4T8CBR-B.C1, de 04.09.2019 e demais jurisprudência ali citada e, na Doutrina, Menezes Leitão, Arrendamento Urbano, 9.ª edição, Almedina, 2019, p. 223, §2.)
46 – O que é exemplo e se mostra coerente, aliás, em ambos os regimes, com a ambiência de desjudicialização dos litígios e cobranças inerentes a assuntos de arrendamento.
47 – E justifica que o sentido da expressão usada no n.º 3 do artigo 28.º, de «
decisão de promoção da correspondente execução», seja atributivo de uma autotutela declarativa, por maioria de razão, quando esta decisão seja desacompanhada de uma decisão de despejo.
48 – Nestes termos e por todos os fundamentos expostos, considera-se que a Autora, ora Recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 28.º, n.º 3 do NRAAH, beneficia de poderes de autotutela administrativa declarativa que lhe permitem o recurso imediato ao regime para execução do pagamento de quantias pecuniárias, por força de ato administrativo, junto dos tribunais tributários, tal como previsto no artigo 179.º do CPA.
49 – Sem necessidade de recorrer previamente aos tribunais administrativos para obter uma sentença declarativa que possa valer, em caso de incumprimento voluntário desta, como título executivo.

50 – Pois que, também à luz do princípio da irrenunciabilidade da competência, não pode a Autora deixar de exercer os seus poderes de autotutela declarativa, sempre que os respetivos pressupostos estejam definidos na lei, tal como se demonstra estarem no caso em apreço – cf. artigo 36.º, n.º 1, do CPA.
[...]“
Fim da transcrição

Encerrando o âmbito da pretensão recursiva do Recorrente IHRU uma base que é comum aqueles referidos Acórdãos, quer do TCA Sul, quer deste TCA Norte, e sendo de salientar ainda aquele recente Acórdão proferido pelo STA no Processo n.º 02143/21.8BEPRT, não pode proceder a pretensão recursiva do Recorrente, por tampouco julgarmos saírem violados, ainda que indiciariamente, os invocados princípios constitucionais, a que se reportam os artigos 13.º e 20.º da CRP, pois que o regime legal estabelecido pelo legislador não se reveste de uma mera faculdade a que o Autor ora Recorrente pode ou não recorrer, pois que atento o princípio da juridicidade, está vinculado por um especial dever de prosseguir na estrita observância da legalidade procedimental disposta pelo legislador, em ordem ao cabal exercício das suas competências, para o que não podem relevar razões de oportunidade ou meramente discricionárias.

Aqui renovando a linha jurisprudencial acima enunciada, julgando que por dispor o Autor de meios legais de autotutela, declarativa e executiva para a necessária e devida actuação visando os contratos de arrendamento por si outorgados [Cfr. artigo 28.º da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, na redação conferida pela Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto], e deles [meios] não tendo deitado mão, ocorre assim a sua falta de interesse em agir, por não ser indispensável o recurso à acção judicial para a salvaguarda dos seus direitos e interesses [do Autor], ou seja, por não carecer o Autor de tutela jurisdicional efectiva [Cfr. artigo 2.º do CPTA].

Termos em que, a pretensão recursiva do Recorrente tem assim de improceder na sua totalidade, por ter o Tribunal a quo julgado com acerto em torno da constatada falta de interesse em agir do Autor ora Recorrente, não padecendo a Sentença recorrente dos erros de julgamento que lhe vêm por si apontados [Cfr. conclusão DD], designadamente a preterição dos princípios constitucionais da igualdade de tratamento e do acesso ao direito e à justiça, a que se reportam os artigos 13.º e 20.º da CRP, tendo a solução jurídica a que chegou o Tribunal a quo que manter-se, por não ser merecedora da censura jurídica que lhe dirige o Recorrente.

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E assim formulamos as seguintes CONCLUSÕES/SUMÁRIO:

Descritores: Despejo administrativo; Falta de pagamento de rendas; Falta de interesse em agir; Autotutela executiva.

1 - Os tribunais administrativos são competentes para conhecer das matérias relativas à invalidade ou cessação dos contratos de arrendamento de renda apoiada, mas já não em matéria de despejo, por estar essa competência atribuída aos órgãos administrativos.

2 – No que é atinente ao despejo dos inquilinos, dispõe o artigo 28.º da Lei n.º 81/2014, de 19 de dezembro, na redação conferida pela Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto, que caso não seja cumprida voluntariamente a obrigação de desocupação e entrega da habitação, cabe ao senhorio levar a cabo os procedimentos subsequentes, nos termos da lei, atribuindo a competência da decisão do despejo aos dirigentes máximos, dos conselhos de administração ou dos órgãos executivos das entidades referidas no artigo 2.º, n.º 1.

3 - Quando o despejo tenha por fundamento a falta de pagamento de rendas, encargos ou despesas, a decisão de promoção da correspondente execução deve ser tomada em simultâneo com a decisão do despejo, o que significa que é conferida competência legal a um orgão administrativo para determinar, não apenas o despejo, mas a sua execução, e neste conspecto, o poder de decidir o despejo e de o executar, sob autotutela declarativa e executiva.

4 - O regime legal estabelecido pelo legislador não se reveste de uma mera faculdade a que o Autor ora Recorrente pode ou não recorrer, pois que atento o princípio da juridicidade, está vinculado por um especial dever de prosseguir na estrita observância da legalidade procedimental disposta pelo legislador, em ordem ao cabal exercício das suas competências, para o que não podem relevar razões de oportunidade ou meramente discricionárias.

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IV – DECISÃO

Nestes termos, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, os juízes da Subsecção Administrativa Comum da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, Acordam em conferência em NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto pelo Recorrente Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IP, confirmando a Sentença recorrida.

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Custas a cargo do Recorrente – Cfr. artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

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Notifique
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Porto, 17 de novembro de 2023.

Paulo Ferreira de Magalhães, relator
Celestina Caeiro Castanheira
Luís Migueis Garcia