Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01334/12.7BEPRT-A
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/14/2014
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Descritores:PROCEDIMENTO CAUTELAR SUSPENSÃO DE EFICÁCIA
FUMUS BONI IURIS - ART. 120.º, N.º 1, AL. B) CPTA
PERICULUM IN MORA
Sumário:I. Estando em causa, face ao desenvolvimento dos autos, providência conservatória em que a situação não teve enquadramento na al. a) do n.º 1 do art. 120.º CPTA prevê-se um distinto grupo de condições de procedência e que se mostram consagrados no mesmo número na al. b) e n.º 2, condições de procedência essas que, embora com diferentes cambiantes, se podem reconduzir:
a) A duas condições positivas de decretamento: «periculum in mora» - receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente; e «fumus boni iuris» (“aparência do bom direito”) - avaliação, em termo sumários, da existência do direito invocado pelo requerente ou da(s) ilegalidade(s) que o mesmo invoca e provável procedência da ação principal;
b) A um requisito negativo de deferimento que assenta numa ponderação de todos os interesses em presença (públicos e/ou privados) - proporcionalidade dos efeitos da decisão de concessão ou da sua recusa.
II. O requisito do “periculum in mora” encontrar-se-á preenchido sempre que exista fundado receio que, quando o processo principal termine e sobre ele venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada ou cabal às situações jurídicas e pretensão objeto de litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja porque tal evolução gerou ou conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.
III. Um ato cuja execução envolva como consequência a cessação da atividade dum estabelecimento comercial tal implica a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente cautelar visa assegurar no processo principal, já que a perda de clientela origina lucros cessantes indetermináveis com rigor, pelo que tal realidade configura um claro preenchimento do requisito do “periculum in mora”, mormente, na sua vertente do facto consumado e inclusive na dos prejuízos de difícil reparação.
IV. No âmbito das providências cautelares conservatórias o juízo a empreender pelo julgador na aferição do requisito da probabilidade de existência do direito [«fumus boni iuris»] na vertente do “fumus non malus iuris” é um juízo que se qualifica como sendo de “mera viabilidade” da pretensão formulada ou a formular [legislador fala em que “não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão…”].*
* Sumário elaborado pelo Relator
Recorrente:Município do Porto
Recorrido 1:DFFJ... e Outro(s)...
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
“MUNICÍPIO DO PORTO”, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 02.10.2013, proferida no processo cautelar contra o mesmo movido e bem assim o contrainteressado ASV... por DFFJ..., ambos igualmente identificados nos autos, que determinou a suspensão de eficácia do “… Despacho do Senhor Vereador com o Pelouro da Proteção Civil, Fiscalização e Juventude, de 19.03.2012, pelo qual lhe foi ordenada a cessação da utilização do espaço sito à PR... , n.º 17, em que tem instalado o seu estabelecimento de bebidas e que lhe foi notificado pelo ofício da Divisão Municipal de Fiscalização de Obras Particulares do Departamento Municipal de Fiscalização de 20.03.2012 …”.
Formula o ente requerido, aqui recorrente, nas respetivas alegações [cfr. fls. 333 e segs. e fls. 405 e segs. na sequência de convite por despacho do Relator de fls. 399/400 - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário], as seguintes conclusões que se reproduzem:
...
A. A sentença do tribunal a quo enferma dos vícios de erro de julgamento e de errónea interpretação e aplicação das normas jurídicas, maxime do artigo 120.º, n.º 1, alíneas a) e b) e n.º 2 do CPTA.
B. A providência requerida é concedida sem mais sempre que resulte evidente a procedência da pretensão formulada, ou a formular, no processo principal, ou seja, quando se revele praticamente inquestionável a ilegalidade do ato em causa. Ora, o tribunal a quo entendeu, e bem a nosso ver, que estava afastada a aplicação da referida disposição legal.
C. Cumpre averiguar se na presente situação ocorrem os requisitos enunciados na alínea b) do n.º 1 do artigo 120.º do CPTA, a que adicionam os previstos no n.º 2 mesmo artigo, a saber: fumus boni iuris, na sua formulação negativa; o periculum in mora; a superioridade dos danos resultantes da sua concessão, relativamente aos que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adoção de outras providências.
D. E aqui se inicia a discordância do Recorrente com o entendimento do tribunal a quo.
E. A análise que deve ser feita pelo tribunal no âmbito do artigo 120.º do CPTA é naturalmente perfunctória, mas a lei exige que se analisem atentamente os argumentos que são apresentados pelas duas partes neste pleito.
F. No caso em apreço, os alegados prejuízos «absolutamente irreparáveis» e os vícios de falta de fundamentação (artigos 124.º e 125.º do CPA e do artigo 268.º, n.º 3 da CRP) invocados pela ora Recorrida não são suficientes para abalar a decisão da ação principal.
G. O Recorrido não afasta a falta de alvará de utilização específico para a atividade desenvolvida no local, e que motivou o ato administrativo cuja eficácia pretende suspender.
H. O Recorrido somente se escuda na pretensa falta de fundamentação para colocar em crise o ato administrativo em apreço, não cuidando sequer de o concretizar minimamente.
I. A notificação recebida é perfeitamente percetível, contendo os elementos de facto e de direito que motivaram a decisão administrativa, e é inclusivamente bem entendido pelo Recorrido, como se encontra aliás demonstrado na petição inicial.
J. A decisão de cessação da utilização deste estabelecimento comercial está relacionada com o desrespeito pela autoridade municipal e pelas exigências legais necessárias ao desenvolvimento da sua atividade comercial.
K. A falta de condições do estabelecimento comercial do Recorrido mobilizou não apenas a atuação do Requerido, mas também (num outro nível e em relação a outras questões) da ARS Norte.
L. Invocou ainda o Recorrido que o ato administrativo sub judice é «injusto e parcial», esquecendo por completo os princípios da legalidade e da igualdade (aliado até ao princípio da livre concorrência) que norteiam a ação da fiscalização municipal.
M. É manifesta a falta de fundamento da pretensão a formular pelo Recorrido na ação principal, pelo que não se encontra verificado o requisito do fumus boni iuris, verificando-se um erro de julgamento e uma errónea interpretação e aplicação do artigo 120.º, n.º 1, alínea b) do CPTA.
N. Entendeu ainda o tribunal a quo que existe um risco fundado de constituição de uma situação de facto consumado («periculum in mora»).
O. Mas, no seguimento do raciocínio acima desenvolvido, a constituição do facto consumado é uma falsa questão, uma vez que se entende que os alegados vícios que colocam em crise o ato administrativo em apreço não o irão anular na ação principal.
P. Assim, observa-se novamente um erro de julgamento e uma errónea interpretação e aplicação do artigo 120.º, n.º 1, alínea b) do CPTA.
Q. No que tange ao disposto no n.º 2 do artigo 120.º do CPTA, entende o Recorrente que a gravidade da situação consubstanciada na cessação de utilização cuja eficácia se pretende suspender é superior ao interesse do Recorrido, uma vez que criaria uma imagem de impunidade que se deseja evitar e colocaria em causa os efeitos do respeito pela legalidade urbanística que se pretendem acautelar.
R. Assim, verifica-se um erro de julgamento e uma errónea interpretação e aplicação do artigo 120.º, n.º 2 do CPTA.
S. Por todo o exposto, deverá o tribunal ad quem revogar a sentença recorrida, por tal estar ferido de errónea interpretação e aplicação das normas jurídicas, bem como de erro de julgamento, julgando improcedente o pedido de suspensão da eficácia do ato administrativo sub judice....”.
O requerente, ora recorrido, apresentou contra-alegações [cfr. fls. 365 e segs. e 439] nas quais pugna pela total manutenção do julgado sem haver formulado qualquer síntese conclusiva.
A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal notificada nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 146.º e 147.º ambos do CPTA veio apresentar parecer onde sustenta o improvimento do recurso [cfr. fls. 378/381 v.], posicionamento esse que objeto de contraditório apenas mereceu resposta discordante do recorrente [cfr. fls. 396].
Sem vistos, dado o disposto no art. 36.º, n.ºs 1, al. e) e 2 do CPTA, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente sendo certo que se, pese embora por um lado, o objeto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do CPC [na redação decorrente do DL n.º 303/07, de 24.08 - cfr. arts. 05.º e 07.º, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 41/2013 -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC] [atuais arts. 05.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 e 639.º do CPC/2013] “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.
As questões suscitadas e de que cumpre decidir resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida ao proceder a pretensão cautelar formulada pelo aqui recorrido incorreu em erro no julgamento de direito dada a infração, mormente, do disposto nos arts. 120.º, n.ºs 1, al. b) e 2 do CPTA [cfr. respetivas alegações e conclusões supra reproduzidas].
3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Resulta da decisão recorrida como assente o seguinte quadro factual:
I) O requerente tem instalado no prédio sito na PR..., n.º 17, Porto, um estabelecimento comercial de bebidas - facto que resulta admitido face ao posicionamento das partes nos respetivos articulados, e, bem assim, emerge da análise de fls. 10 e seguintes dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
II) Por despacho do Vereador do Pelouro da Pelouro da Proteção Civil, Fiscalização e Juventude, da Câmara Municipal do Porto, datado de 19.03.2012, foi ordenada a cessação da utilização do espaço sito à PR..., n.º 17, em que o requerente tem instalado o seu estabelecimento de bebidas, conforme emerge da análise de fls. 10 e seguintes dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
III) O fundamento legal para a cessação de utilização do estabelecimento comercial do requerente foi o facto do mesmo se encontrar a funcionar sem a necessária autorização, conforme emerge da análise de fls. 04 e seguintes do «P.A.» apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
IV) O despacho referido em III) foi notificado ao requerente por ofício da entidade requerida, com a referência n.º I/50553/12/CMP, conforme emerge da análise de fls. 04 e seguintes do «P.A.» apenso aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
V) Dá-se por reproduzido todo o teor dos documentos que integram os autos [inclusive o «P.A.» apenso].
«»
3.2. DE DIREITO
Presente o quadro factual antecedente cumpre, agora, entrar na análise das questões suscitadas em sede desta instância de recurso jurisdicional “sub judice”.
ð
3.2.1. DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA
O TAF do Porto em apreciação das questões e da pretensão cautelar deduzida pelo requerente, aqui recorrido, contra os R.dos, na qual se peticionava a suspensão de eficácia do ato administrativo referido em II) e III) dos factos apurados, entendeu, pronunciando-se sobre o mérito daquela pretensão, que “in casu” estavam reunidos/preenchidos os requisitos enunciados pelo art. 120.º, n.ºs 1, al. b) e 2 do CPTA, termos em que decretou a pretensão cautelar peticionada.
ð
3.2.2. DA TESE DO RECORRENTE
Argumenta este que a decisão judicial proferida é ilegal por haver incorrido em erro de julgamento com violação, nomeadamente, do disposto no art. 120.º, n.ºs 1, al. b) e 2 do CPTA, já que, no seu entendimento, não estavam e não estão preenchidos quer os requisitos positivos do “fumus boni iuris” e do “periculum in mora”, quer o requisito negativo da ponderação de interesses, pelo que conclui no sentido da improcedência da pretensão cautelar deduzida.
ð
3.2.3. DO OBJETO DO RECURSO JURISDICIONAL
Invoca o recorrente no quadro da síntese conclusiva que produziu e com a qual delimitou o objeto de recurso que a decisão judicial ora objeto de impugnação padece de erro de julgamento.
I. É comummente aceite e sabido que o legislador através da reforma operada pelo CPTA procurou evitar que o tardio julgamento do processo principal pudesse determinar a inutilidade da sua decisão ou fosse responsável pela colocação do interessado numa situação de facto consumado ou numa situação em que o volume ou a qualidade dos prejuízos sofridos inviabilizasse a possibilidade de reverter à situação que teria se a ilegalidade não tivesse sido cometida.
II. Daí que e de molde a evitar a verificação ou produção de tais perigos, assegurando dessa maneira a utilidade da sentença, veio no art. 112.º do CPTA a consagrar-se ou a autorizar-se o decretamento de medidas cautelares enquanto medidas destinadas a garantir que a decisão a proferir no processo principal possa produzir os efeitos que lhe são próprios e, dessa forma, repor a legalidade ofendida.
III. Assente que se mostra que a adoção de providência cautelar pretendida não tem enquadramento na al. a) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA prevêem-se no mesmo normativo e para o caso concreto da situação em presença um distinto grupo de condições de procedência que se mostram consagrados nos n.ºs 1, al. b) e 2, aí se enunciando condições de procedência que, embora com diferentes cambiantes, se podem reconduzir: a) A duas condições positivas de decretamento [«periculum in mora» - receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente; e «fumus boni iuris» (“aparência do bom direito”) - reportado ao facto de não ser manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular no processo principal ou de que inexistam circunstâncias que obstem ao conhecimento de mérito - “fumus non malus iuris]; e, b) A um requisito negativo de deferimento que assenta numa ponderação de todos os interesses em presença [públicos e/ou privados] - proporcionalidade dos efeitos da decisão de concessão ou da sua recusa.
IV. Face ao dissídio que constitui objeto de apreciação cumpre centrar nossa atenção na análise do requisito do “periculum in mora”, sendo que o mesmo nas palavras do legislador traduz-se no “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar [ou ver reconhecidos] no processo principal”.
V. As providências cautelares visam impedir, como tivemos já oportunidade de referir, que durante a pendência de qualquer ação principal a situação de facto se altere de modo a que a decisão nela proferida, sendo favorável ao requerente, perca toda a sua eficácia ou parte dela (obviar a que a decisão judicial não se torne numa decisão «puramente platónica»).
VI. Nessa medida, o requisito encontrar-se-á preenchido sempre que exista fundado receio que, quando o processo principal termine e sobre ele venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada ou cabal às situações jurídicas e pretensão objeto de litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja porque tal evolução gerou ou conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.
VII. Não é, todavia, um qualquer perigo de dano que justifica ou pode fundar a decretação duma providência cautelar porquanto se terá de exigir um perigo qualificado de dano, isto é, um perigo de dano que derive ou decorra da demora processual.
VIII. Nas palavras de M. Aroso de Almeida “... se não falharem os demais critérios de que depende a concessão da providência, ela deve ser, pois, concedida desde que os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade. É este o único sentido a atribuir à expressão «facto consumado». Nestas situações, em que a providência é necessária para evitar o risco da infrutuosidade da sentença a proferir no processo principal, o critério não pode ser, portanto, o da suscetibilidade ou insuscetibilidade da avaliação pecuniária dos danos, mas tem de ser o da viabilidade do restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar: pense-se no risco da demolição de um edifício ou da liquidação de uma empresa. (…) Do ponto de vista do periculum in mora, a providência também deve ser, entretanto, concedida quando, mesmo que não seja de prever que a reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível pela mora do processo, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio da produção de «prejuízos de difícil reparação» no caso de a providência ser recusada, seja porque a reintegração no plano dos factos se perspetiva difícil, seja porque pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar ou, pelo menos, de reparar integralmente. Ainda neste último caso, justifica-se a adoção da providência para evitar o risco do retardamento da tutela que deverá ser assegurada pela sentença a proferir no processo principal (…). (…) Note-se que a redação, quer da alínea b), quer da alínea c), do n.º 1 do artigo 120.º é diferente daquela que, para a atribuição de providências cautelares não especificadas em processo civil, consta do artigo 381.º, n.º 1 do CPC, que é mais exigente, ao falar de uma «lesão grave e dificilmente reparável» (...). Assume-se, pois, aí, que nem todos os prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação justificam a adoção de providências cautelares, mas só aqueles que, pela sua gravidade, a jurisprudência venha a selecionar, para o efeito de considerar dignos de tutela preventiva. Não é assim em contencioso administrativo …” [in: “Manual de Processo Administrativo”, 2010, págs. 475 e 476] [no mesmo sentido M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha in: “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, 3.ª edição revista, págs. 804 e segs., nota 4].
IX. Nesta sede, em que se trata de aferir, nomeadamente, da possibilidade de se produzirem “prejuízos de difícil reparação” o critério a atender deixou, pois, de ser aquele que jurisprudencialmente era aceite em matéria de análise do requisito positivo da al. a), do n.º 1 do art. 76.º da LPTA, ou seja, o da suscetibilidade ou insuscetibilidade da avaliação pecuniária dos danos, para passar a ser o da maior ou menor dificuldade que envolve o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar, já que o juiz deve ponderar as circunstâncias concretas do caso em função da utilidade da sentença e não decidir com base em critérios abstratos [cfr. J.C. Vieira de Andrade in: “A Justiça Administrativa (Lições), 12.ª edição, págs. 309 e 310; M. Aroso de Almeida in: ob. cit., págs. 474 e 475; M. Aroso de Almeida e C.A. Fernandes Cadilha in: ob. cit., pág. 805; Ana Gouveia Martins in: “A tutela cautelar no Contencioso Administrativo - Em especial, nos procedimentos de formação de contratos”, págs. 501/503; Acs. do STA de 09.06.2005 - Proc. n.º 0412/05, de 10.11.2005 - Proc. n.º 0862/05, de 01.02.2007 - Proc. n.º 027/07, de 14.07.2008 - Proc. n.º 0381/08, de 12.02.2012 - Proc. n.º 0857/11 in: «www.dgsi.pt/jsta»; Ac. do TCAN de 14.09.2012 - Proc. n.º 03712/11.0BEPRT in: «www.dgsi.pt/jtcn»].
X. Aliás e como refere J.C. Vieira de Andrade o “… juiz deve, pois, fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica …” [in: ob. cit., pág. 309].
XI. Importa, ainda, ter presente que devem ser atendidos todos os prejuízos relevantes para os interesses do requerente, quer o perigo respeite a interesses públicos, comunitários ou coletivos, quer estejam em causa apenas interesses individuais.
XII. O fundado receio a que a lei se refere é o receio “… apoiado em factos que permitam afirmar, com objetividade e distanciamento, a seriedade e atualidade da ameaça e a necessidade de serem adotadas medidas tendentes a evitar o prejuízo. Não bastam, pois, simples dúvidas, conjeturas ou receios meramente subjetivos ou precipitados assentes numa apreciação ligeira da realidade, embora, de acordo com as circunstâncias, nada obste a que a providência seja decretada quando se esteja ainda face a simples ameaças advindas do requerido, ainda não materializadas, mas que permitam razoavelmente supor a sua evolução para efetivas lesões ...” [cfr. António S. Abrantes Geraldes in: “Temas da Reforma do Processo Civil, vol. III, 3.ª ed., pág. 103].
XIII. Daí que se quanto ao juízo de probabilidade da existência do direito invocado se admite que o mesmo possa ser de mera verosimilhança, já quanto aos critérios a atender na apreciação do “periculum in mora” os mesmos devem obedecer a um maior rigor na apreciação dos factos integradores de tal requisito visto que a qualificação legal do receio como “fundado” visa restringir as medidas cautelares, evitando a concessão indiscriminada de proteção meramente cautelar com o risco inerente de obtenção de efeitos que só podem ser obtidos com a segurança e ponderação garantidas pelas ações principais.
XIV. À semelhança da petição inicial numa ação administrativa [comum ou especial], o requerente de uma providência cautelar deve expor as razões de facto e de direito que fundamenta a sua pretensão, derivando do disposto no art. 114.º, n.º 3, al. g) do CPTA que no “… requerimento, deve o requerente: ... Especificar, de forma articulada, os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da respetiva existência …” e sendo que decorre do art. 264.º, n.º 1 do CPC/2007 que às “… partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções …” [atual n.º 1 do art. 05.º do CPC/2013].
XV. Impõe-se, pois, ao requerente da providência o ónus de alegar a matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida [art. 342.º do CC], não podendo o tribunal substituir-se ao mesmo.
XVI. O requerente terá de tornar credível a sua posição através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objetivas nas quais sustenta a verificação dos requisitos da providência já que, da conjugação dos arts. 112.º, n.º 2, al. a), 114.º, n.º 3, als. f) e g), 118.º e 120.º todos do CPTA, não se mostra consagrada uma presunção "iuris tantum" da existência dos aludidos requisitos como simples decorrência da execução dum ato, pelo que o requerente não está desobrigado ou desonerado de fazer a prova e demonstração dos factos integradores dos pressupostos ou requisitos em questão, alegando, para o efeito, de modo especificado e concreto tais factos, já que não é idónea uma alegação de forma meramente conclusiva e de direito ou com utilização de expressões vagas e genéricas.
XVII. Com efeito, o ónus geral de alegação da matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência requerida cabe ao requerente [cfr. arts. 342.º do CC, 114.º, n.º 3, al. g), 118.º e 120.º do CPTA, 384.º, n.º 1 do CPC/2007 (atual art. 365.º, n.º 1 do CPC/2013)] [cfr., entre outros, Acs. STA de 14.07.2008 - Proc. n.º 0381/08, de 19.11.2008 - Proc. n.º 0717/08, de 22.01.2009 - Proc. n.º 06/09 in: «www.dgsi.pt/jsta»; Acs. do TCAN de 11.02.2011 - Proc. n.º 01533/10.6BEBRG, de 08.04.2011 - Proc. n.º 01282/10.5BEPRT-A, de 08.06.2012 - Proc. n.º 02019/10.4BEPRT-B, de 14.09.2012 - Proc. n.º 03712/11.0BEPRT, de 30.11.2012 - Proc. n.º 00274/11.1BEMDL-A, de 25.01.2013 - Proc. n.º 02253/10.7BEBRG-A, de 25.01.2013 - Proc. n.º 01056/12.9BEPRT-A, de 08.02.2013 - Proc. n.º 02104/11.5BEBRG, de 17.05.2013 - Proc. n.º 01724/12.5BEPRT, de 31.05.2013 - Proc. n.º 00019/13.1BEMDL in: «www.dgsi.pt/jtcn»], bem como o ónus do oferecimento de prova sumária de tais requisitos.
XVIII. Ressuma, pois, do atrás exposto e no que releva em sede desta providência cautelar que os prejuízos de difícil reparação serão os que advirão da não decretação da pretensão cautelar de suspensão de eficácia do ato em crise e que, pela sua irreversibilidade, torna extremamente difícil a reposição da situação anterior à lesão, gerando danos que, pese embora suscetíveis de quantificação pecuniária, a sua compensação se revela contudo insuficiente para repor ou reintegrar a esfera jurídica do requerente, devolvendo-lhe a situação em que o mesmos se encontraria não fora a execução havida daquele ato.
XIX. Já se estará em presença duma situação de facto consumado quando se revele de todo em todo impossível a reintegração específica da esfera jurídica daquele mesmo requerente tendo por referência a situação jurídica e de facto para ele existente no momento da respetiva lesão.
XX. Este Tribunal tem vindo sucessivamente a entender que um ato cuja execução envolva como consequência a cessação da atividade dum estabelecimento comercial tal implica a produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente cautelar visa assegurar no processo principal, já que a perda de clientela origina lucros cessantes indetermináveis com rigor [cfr., v.g., entre outros, os Acs. do TCA Norte de 14.02.2007 - Proc. n.º 01820/06.8BEPRT, de 22.02.2007 - Proc. n.º 01822/06.4BEPRT, de 01.03.2007 - Proc. n.º 01818/06.6BEPRT, de 08.03.2007 - Proc. n.º 01844/06.5BEPRT, de 08.03.2007 - Proc. n.º 01862/06.3BEPRT, de 08.03.2007 - Proc. n.º 01845/06.3BEPRT, de 15.03.2007 - Proc. n.º 01863/06.1BEPRT, de 23.10.2008 - Proc. n.º 02591/06.3BEPRT, de 13.01.2011 - Proc. n.º 00827/10.5BEPRT-A, de 11.10.2013 - Proc. n.º 00265/13.8BEPRT in: «www.dgsi.pt/jtcn»].
XXI. E tal realidade configura um claro preenchimento do requisito do “periculum in mora”, mormente, na sua vertente do facto consumado e inclusive na dos prejuízos de difícil reparação.
XXII. Também o STA no seu acórdão de 09.04.2003 [Proc. n.º 0418/03 in: «www.dgsi.pt/jsta»], proferido é certo num quadro legal diverso mas cuja doutrina permanece válida, sustentou que os prejuízos resultantes do encerramento de um estabelecimento comercial que envolvem, entre outros, a perda da respetiva clientela, são, em regra, de difícil reparação, argumentando-se então e a propósito que “… neste universo de prejuízos, destaca-se a perda de clientela que, sendo credível, é um dano que, no juízo sumário e indiciário de causalidade adequada e de prognose que cumpre fazer se apresenta, desde logo, como uma consequência que com toda a probabilidade resultará da execução do ato suspendendo. A doutrina refere (MARCELLO CAETANO, "Manual... " I, 10.ª ed., p. 565) que os prejuízos resultantes da inibição do exercício de comércio, indústria ou profissão liberal ou da perda de clientela são, em regra, de difícil reparação e tem sido orientação constante deste Tribunal suspender os atos que os impliquem (vide, por todos, os acórdãos de 1997.04.22 - rec. n.º 42087, de 1999.06.22 - rec. n.º 45063 e de 2002.04.17 - rec. n.º 537/02) …”.
XXIII. Cientes dos considerandos antecedentes temos que resulta da factualidade provada que o ato administrativo suspendendo impõe a cessação da exploração do estabelecimento do requerente cautelar.
XXIV. Ora tal acarretará para o requerente cautelar, aqui recorrido, necessários prejuízos de difícil reparação visto a perda de clientela originar lucros cessantes indetermináveis com rigor, termos em que não enferma a decisão judicial recorrida do erro de julgamento que lhe é assacado quando assim concluiu, na certeza de que os reparos avançados pelo recorrente nesta sede não se mostram minimamente consistentes por não dirigidos àquilo que constitui o julgado e não se prenderem com os contornos do requisito em análise.
XXV. Passemos, agora, à aferição do acerto do julgado quanto à verificação do requisito do “fumus boni iuris”.
XXVI. Atente-se, desde já, que nos procedimentos cautelares de natureza conservatória a prova bastante deste requisito é uma prova provisória, uma prova que se basta com o “fumus boni iuris” invocado ou a invocar na ação principal, enquanto juízo de simples verosimilhança, que se carateriza no confronto com o exigido naquela ação por um menor grau de probabilidade [ainda que sério e fundado] da verificação da existência do facto e da violação do direito/interesse legalmente protegido.
XXVII. Segundo defendia J. Alberto dos Reis o “… tribunal, antes de emitir a providência, não se certifica, com segurança, da existência do direito que o requerente se arroga: limita-se … a formar um juízo de verosimilhança, a verificar a aparência do direito …” [em “A Figura do Processo Cautelar” in: BMJ n.º 03, pág. 72].
XXVIII. Daí que no âmbito das providências cautelares conservatórias o juízo a empreender pelo julgador na aferição do requisito da probabilidade de existência do direito [«fumus boni iuris»] na vertente do “fumus non malus iuris” é um juízo que se qualificaria como sendo de “mera viabilidade” da pretensão formulada ou a formular [legislador fala em que “não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão…].
XXIX. Como impressivamente se sustentou no acórdão do STA de 22.01.2009 [Proc. n.º 028/09 in: «www.dgsi.pt/jsta»] “… a apreciação do fumus boni iuris em processo cautelar é limitada à verificação da existência do direito invocado pelo requerente pela aparência, sem aprofundamento da questão jurídica …” ou ainda no acórdão daquele mesmo Supremo de 07.01.2009 [Proc. n.º 1098/08 consultável no mesmo local] quando refere que “… a decisão jurisdicional a adotar na providência cautelar é limitada à finalidade auxiliar de emprestar efeito útil à decisão a emitir no processo principal, limitada temporalmente e tomada em condições de urgência, sem a segurança e ponderação que são próprias da decisão da causa e, no que respeita ao direito …, consiste numa apreciação tão sumária que fica pela aparência de o direito invocado existir, em virtude de não ostentar traços que desde logo o excluam …”.
XXX. Também no acórdão daquele Tribunal de 28.10.2009 [Proc. n.º 0826/09 também consultável no mesmo sítio], reiterando entendimento jurisprudencial que ali invoca, sustentou-se também que o “fumus boni juris tem uma formulação positiva e uma formulação negativa. Na formulação positiva é preciso acreditar na probabilidade de êxito do recurso principal. Tem de se verificar uma aparência de que o recorrente ostenta, de facto, o direito que considera lesado pela atuação administrativa; na formulação negativa basta que o recurso principal não apareça à primeira vista desprovido de fundamento …” [cfr., igualmente, Ac. de 03.04.2008 - Proc. n.º 018/08].
XXXI. E no acórdão do Pleno do STA de 06.02.2007 [Proc. n.º 0783/06 in: «www.dgsi.pt/jsta»] havia-se afirmado, a propósito da caraterização da análise do “fumus boni iuris” enunciado na al. b) do n.º 1, que “… o tribunal vai averiguar, tão só, se não é manifesta a improcedência e se não existem circunstâncias que obstem ao conhecimento do mérito. Não fazia parte e portanto não podia ser incluído no juízo sobre o «fumus», mais do que essa verificação, não podendo o tribunal, designadamente, proceder a uma graduação da probabilidade de sucesso da pretensão do requerente. (…) Daí que seja irrelevante invocar um elevado grau de probabilidade de sucesso, como seja irrelevante saber quais os vícios imputados ao ato e a sua natureza (nulidade ou anulabilidade). É, de resto, por tal questão não ser decidida que, advém a fase de ponderação de interesses (prevista no art. 120.º, 2 do CPTA. (…) Não podendo saber-se, desde logo, qual é a boa solução da causa, os danos provocados pela fatalidade da espera da decisão final, vão ser suportados por quem sofrer menos. É também a incerteza sobre a ilegalidade do ato que justifica uma graduação do «fumus» diferente nas providências antecipatórias e nas providências conservatórias (…). (…) Sendo assim, para a ponderação dos interesses sacrificados com a demora da decisão da causa principal, deixa de ser relevante apreciar qualquer vício do ato administrativo em causa, bem como o grau de probabilidade da procedência de tais vícios …”.
XXXII. Não é em sede cautelar que cumpre conhecer em e com profundidade dos fundamentos de ilegalidade invocados ou a invocar em sede de ação administrativa principal sob pena de total subversão das regras do contencioso.
XXXIII. No juízo reclamado ao julgador cautelar pelo normativo em análise não poderá o mesmo misturá-lo com aquilo que é o juízo que deve ser feito a título principal, visto aquele tratar-se dum juízo perfunctório, sumário, formulado sob reserva de se poder chegar a uma conclusão diversa em sede do processo principal.
XXXIV. Munidos das considerações acabadas de tecer e do entendimento nelas veiculado temos para nós que, ao invés do considerado na decisão judicial recorrida, este requisito não se mostrará em concreto preenchido.
XXXV. É que estando-se em face de providência cautelar de natureza conservatória e em que o juízo a efetuar quanto ao requisito/condição do «fumus non malus iuris» reveste da amplitude e dos contornos atrás enunciados, temos que os fundamentos de ilegalidade invocados pelo aqui recorrido [ilegalidades relativas: à falta de fundamentação de direito (arts. 268.º, n.º 3 da CRP, 124.º e 125.º CPA); à infração dos arts. 05.º, n.º 2 e 06.º do CPA (princípios da proporcionalidade, da imparcialidade e da justiça); à violação do direito à livre iniciativa privada quanto à instalação e exploração do estabelecimento e do direito à propriedade do estabelecimento (arts. 61.º e 62.º da CRP)] e respetiva motivação factual, nos quais se estriba a pretensão deduzida na ação principal e que se mostra documentada a fls. 15/26 dos autos, resultam como manifestamente improcedentes.
XXXVI. Numa apreciação meramente perfunctória, que é aquela que importa realizar nesta sede, temos que a situação descrita nos autos e os fundamentos que sustentam a pretensão do requerente, ora recorrido, apresentam-se como improcedentes já que, desde logo, o ato em crise conterá idónea fundamentação, mormente, de direito quando considerando não possuir o “estabelecimento de bebidas a necessária autorização de utilização” faz apelo ao disposto no art. 109.º do RJUE para fundar a ordem de cessação de utilização, sendo que se o requerente cautelar discorda dessa fundamentação e/ou dos pressupostos de facto/direito em que o ato suspendendo assenta tal traduz-se numa ou noutras ilegalidades que não se mostram invocadas. Para além disso não se revela do quadro factual alegado e que possa vir a ser apurado que no caso ocorra minimamente a violação de qualquer dos princípios ou comandos constitucionais invocados, na certeza de que nem a situação descrita os sustenta com um mínimo suficiência nem os mesmos se apresentam como absolutos impondo-se a consideração e ponderação com outros valores e bens constitucionais que são prosseguidos com a medida urbanística prevista no art. 109.º do RJUE.
XXXVII. Para além disso, analisada a petição inicial da ação administrativa principal temos que o requerente cautelar nem discute ou sequer põe em causa que ao estabelecimento comercial em questão lhe faltam as necessárias licenças/autorizações para estar aberto ao público, já que o mesmo não invoca que as possui e/ou que não esteja legalmente obrigado a possuí-las, na certeza de que resulta do procedimento administrativo em presença de que o estabelecimento havia sido alvo de inspeção pela ASAE e pela Autoridade de Saúde Unidade de Saúde apresentando várias deficiências/incumprimentos do ordenamento vigente que não habilitam ao seu adequado funcionamento [cfr. fls. 03 e 14 a 18 do «P.A.» apenso].
XXXVIII. Vista a pretensão formulada temos a mesma, num juízo perfunctório/ sumário, como inteiramente destituída de capacidade para obter êxito.
XXXIX. Daí que, ao invés do decidido, a pretensão impugnatória deduzida pelo recorrido apresenta-se, à primeira vista e para efeitos da al. b) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA, como desprovida de fundamento e, dessa forma, tem-se como não preenchido o requisito/condição em questão.
XL. Procede, por conseguinte, neste âmbito a argumentação/pretensão do recorrente o que se impõe concluir com todas as legais consequências, mormente, pela improcedência da pretensão cautelar deduzida, na certeza de que se mostra inútil entrar na análise do requisito negativo previsto no n.º 2 do art. 120.º do CPTA dado se tratarem de requisitos de verificação cumulativa.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em:
A) Conceder provimento ao recurso jurisdicional “sub judice” e, em consequência, revogar a decisão judicial recorrida no segmento objeto de impugnação;
B) Julgar a presente pretensão cautelar totalmente improcedente, por não provada, não ordenando a suspensão de eficácia do ato administrativo em crise.
Custas em ambas as instâncias a cargo do requerente cautelar, aqui ora recorrido, sendo que nas mesmas na fixação da taxa de justiça, não revelando os autos especial complexidade, se atenderá, respetivamente, aos valores resultantes das tabelas II) e da I) secção B) anexas ao Regulamento Custas Processuais (doravante RCP) [cfr. arts. 446.º, 447.º, 447.º-A, 447.º-D, do CPC/2007, 04.º “a contrario”, 07.º, 12.º, n.º 2, 25.º e 26.º todos do referido Regulamento - tendo em consideração as alterações introduzidas ao mesmo RCP -, e 189.º do CPTA].
Valor para efeitos tributários: 30.000,01 € [cfr. fls. 08 dos autos e art. 12.º, n.º 2 do RCP].
Notifique-se. D.N..
Restituam-se, oportunamente, os suportes informáticos que, eventualmente, hajam sido gentilmente disponibilizados.
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pelo relator [cfr. art. 138.º, n.º 5 do CPC/2007 “ex vi” art. 01.º do CPTA].
Porto, 14 de março de 2014
Ass.: Carlos Carvalho
Ass.: Ana Paula Portela
Ass.: Fernanda Brandão