Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01884/12.5BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:05/13/2021
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Manuel Escudeiro dos Santos
Descritores:PRÉDIO INTEGRADO NA ZONA HISTÓRICA DO PORTO; MONUMENTO NACIONAL; ISENÇÃO DE IMI.
Sumário:1 - Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis: os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável – cfr. artigo 44.º, n.º 1, alínea n), do EBF.

2 - Os imóveis situados nos Centros Históricos incluídos na Lista do Património Mundial da UNESCO classificam-se como sendo de interesse nacional, inserindo-se na categoria de “monumentos nacionais” – cfr. artigo 15.º, n.º 3 e n.º 7 da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro.

3 - Os prédios inseridos nos Centros Históricos Classificados beneficiam de isenção de IMI.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:R., SA
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
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1. RELATÓRIO

A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA (AT), veio interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a Ação Administrativa Especial proposta pela Recorrida R., S.A., contra o despacho de indeferimento do pedido de isenção de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), relativamente às frações A, C, D, G, H, I, M, N, Q, R, S e T do prédio urbano sito na Rua (...), Rua (...) e Calçada (…), freguesia de (...), concelho do Porto, inscrito na matriz urbana sob o n.º 3114.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:

“a) A decisão proferida pelo Tribunal a quo padece de erro de julgamento, atento o facto de não ter apreciado devidamente a prova inclusa nos autos e de não ter interpretado corretamente a lei aplicável ao caso vertente.
b) Ao contrário do defendido pela sentença ora recorrida, a certidão emitida pelo IPPAR, certificando que os prédios em causa fazem parte integrante do conjunto denominado “Zona Histórica do Porto”, a qual está classificada como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto n.º 67/97, de 1997/12/31, não significa, nem prova que, de per si cada prédio integrante do conjunto o esteja.
c) Tendo em conta que nos termos do art.º 44.º n.º 1, alínea n) do EBF, na redação dada pela Lei 53-A/2006, de 29/12, estão isentos de IMI: “Os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público, de valor municipal ou património cultural, nos termos da legislação aplicável”.
d) Conclui-se que um imóvel integrado num conjunto ou centro, classificado de interesse público, para efeitos de benefícios fiscais, não equivale a um imóvel individualmente classificado a que acresce que,
e) Sendo a competência da classificação dos imóveis do IGESPAR I.P, este certificou que o imóvel não está classificado individualmente, mas sim o conjunto “Zona Histórica do Porto".
f) A Convenção para Salvaguarda do Património Arquitetónico da Europa, ora apontada pela sentença, como não tendo sido levado em conta na interpretação da lei nacional, define no seu artigo 1.º, o que são monumentos, conjuntos arquitetónicos e sítios, não se podendo entender que aí se diz ou impõe, que sendo a classificação do conjunto, se possa extrapolar para o caso concreto, que sendo a “Zona Histórica do Porto” um conjunto, “um “agrupamento homogéneo de construções”, deve a expressão da alínea n) do n.º 1 “individualizados” ser interpretada como sendo referente a um todo homogéneo”.
g) A citada Convenção não é mais do que a fonte legislativa da classificação do património arquitetónico, que classifica e identifica os Imóveis, e que permite ao IGESPAR classificar o património nacional, em conformidade, mas,
h) A lei fiscal nacional seleciona quais os imóveis classificados que merecem ser objeto de isenção.
I) E não tendo a sentença feito uma interpretação teleológica da norma, entende a recorrente que o legislador fiscal nacional com as alterações que produziu à lei, fez a sua opção na seleção do que é objeto da norma de isenção: os prédios individualmente classificados de I.I.P.; e o aplicador da lei tem de respeitar e interpretar de acordo com os princípios consignados nos nºs 2 e 3 do artigo 9º do Código Civil.
J) A posição da AT veiculada através da Informação Vinculativa datada de 2013-02-25 da Direção de Serviços do IMI, no âmbito do pedido n.º 4.455, supra transcrita fundamenta cabalmente a sua posição;
k) As delegações Regionais da então Direção-Geral do Património Cultural, ao referirem que os prédios por estarem inseridos no conjunto são bens classificados, vai ao arrepio do entendimento da então Direção-Geral do Património Cultural, esclarece que Tratando-se de classificação em que se optou pela categoria de “Conjunto”, não é legitima nem legalmente possível a conclusão de se considerarem individualmente classificados os imóveis por ela abrangidos. ”
l) O erro de julgamento em que incorreu o Tribunal a quo é ainda revelado pela indiferença perante o facto do benefício fiscal que está em causa estar indissociavelmente recortado sobre o conceito fiscal de prédio previsto no artigo 2.ºdo CIMI.
m) Da definição retira-se que prédios nunca são conjuntos! B do artigo 2.º do CIMI que se colhe o sentido que o conceito de prédio tem no direito fiscal, o único válido para o intérprete de normas fiscais.
n) Logo, o Tribunal a quo nunca poderia subsumir o conjunto denominado de Centro Histórico do Porto, para efeitos do artigo 44.º/1-n) do EBF, no conceito de prédio patente no artigo 2.º do CIMI já que se trata de uma isenção de IMI.
o) O Tribunal a quo não interpretou corretamente a lei ao fazer equivaler o conceito (cultural) de “imóvel” patente na Lei do Património Cultural de 2001 com o conceito (fiscal) de “prédio” patente no artigo 2.º do CIMI e ínsito no artigo 44.º n.º 1, alínea n) do EBF. A noção de “conjunto” constitui uma realidade muito própria do direito do património cultural, mas já não do direito civil e do direito fiscal.
p) A posição defendida pela AT, contrariando a fundamentação de facto e de direito da sentença recorrida, encontra ainda respaldo na melhor doutrina e jurisprudência, nos termos supra citados.
q) Motivos pelos quais não deve ser mantida na ordem jurídica a sentença ora colocada em crise.
Termos em que, por todo o exposto supra e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao recurso interposto, revogando-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo, fazendo-se assim a costumada JUSTIÇA.
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A Recorrida terminou as suas contra-alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:

1.ª A douta sentença recorrida julgou procedente a ação administrativa especial deduzida pela Recorrida, na sequência de decisão de indeferimento do pedido de isenção de IMI relativa às frações do prédio urbano inscrito na respetiva matriz urbana sob o artigo 3114 da freguesia de (...), Porto, sito na Zona Histórica do Porto;
2.ª A Ilustre Representante da Fazenda Pública interpôs o presente recurso arguindo, desde logo, que a sentença recorrida não decidiu, como se lhe impunha, no sentido de que a prova documental junta aos autos não fez prova de que os prédios se encontram individualmente classificados, mas tão-só que estão inseridos no conjunto que está classificado de Imóvel de Interesse Público (IIP);
3.ª Sucede que não assiste razão à Ilustre Representante da Fazenda Pública;
4.ª Com efeito, resultam da prova documental elementos que permitem concluir que o imóvel objeto dos presentes autos está classificado (individualmente) como IIP, o que, ademais, surge evidente ao longo das alegações de recurso apresentadas pela Ilustre Representante da Fazenda Pública;
5.ª Assim, bem andou a sentença recorrida quando determinou que “Assim, deverá ter-se em consideração que, por força da classificação como de interesse público da denominada Zona Histórica do Porto, o âmbito da classificação incide, concretamente, sobre todos e cada um dos prédios abrangidos pela área em análise”;
6.ª E nem sequer se invoque que tal classificação teria que ser individualizada, pois a classificação é um mero ato final do procedimento administrativo, que se limita a determinar se determinado bem possui inestimável valor cultural, não sendo parte integrante do mesmo procedimento;
7.ª De facto, encontrando-se abrangido na Zona Histórica do Porto, ainda que pela categoria de “conjunto”, os imóveis nela abrangidos deverão ser individualmente classificados;
8.ª Com efeito, decorre do disposto na alínea n) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF, que estão isentos de IMI os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável, o que remete, desde logo, para a Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, diploma que estabelece as bases da política e do regime de proteção e valorização do património cultural;
9.ª Ora, relativamente aos bens culturais imóveis, o n.º 1 do artigo 15.º desta Lei determina que os mesmos podem pertencer às categorias de monumento, conjunto ou sítio, nos termos em que tais categorias se encontram definidas no direito internacional – remetendo, nesta parte, por sua vez, para a Convenção para a Salvaguarda do Património Arquitetónico da Europa, que define aquelas categorias;
10.ª Pelo que bem esteve a sentença ao determinar que, ao exigir a classificação individual dos imóveis, o EBF não deixou de “ter em consideração que, nos termos da legislação aplicável (designadamente, por força do regime constante do artigo 15.º, n.º 1 e 2 da Lei n.º 107/2001), as classificações como de interesse nacional, público ou municipal poderão incidir sobre bens imóveis que pertençam às categorias de monumento, conjunto ou sítio. Por conseguinte, estando perante uma situação de classificação de um bem imóvel (ainda que da categoria de conjunto) como de interesse público (…) temos como certo que tal se subsume à exigida classificação individual”;
11.ª Acresce que o IPPAR certificou que o imóvel em apreço faz parte integrante do conjunto da Zona Histórica do Porto, classificado como IIP, pelo que a individualização deve ser considerada como referente a um todo homogéneo e único, nos termos em que a legislação especial (nacional e internacional) a prevê e não como a AT a quer interpretar;
12.ª Por fim, embora a Ilustre Representante da Fazenda Pública se insurja contra o que resultou da análise da prova documental, o que é certo é que a prova documental é clara e as certidões do IPPAR não deixaram margens para dúvidas, tendo ficado demonstrado que o imóvel preenche os requisitos em apreço para a isenção de IMI;
13.ª Assim, em face do exposto, conclui-se pela improcedência do recurso apresentado pela Fazenda Pública, devendo manter-se a sentença recorrida;
14.ª Invoca ainda a Ilustre Representante da Fazenda Pública que não se interpretou corretamente a lei aplicável ao caso em apreço:
15.ª Também este argumento, com o devido respeito, é insuscetível de conduzir à revogação da sentença recorrida;
16.ª Ao contrário do que alega a Ilustre Representante da Fazenda Pública, não se trata de a sentença recorrida não se ter interpretado “corretamente a lei ao fazer equivaler o conceito (cultural) de imóvel patente na Lei do Património Cultural de 2001 como conceito (fiscal) de prédio”, pois, conforme resulta demonstrado supra, as normas para que o EBF remete encontram-se cumpridas;
17.ª Pelo que, em face do exposto, este último argumento da Ilustre Representante da Fazenda Pública deverá decair, improcedendo o recurso por si deduzido, maxime porque tal entendimento afigura-se inconstitucional, por violar o artigo 8.º, n.º 2 da CRP, o artigo 266.º, n.º 2 e ainda o princípio constitucional da igualdade tributária;
18.ª Na eventualidade de esse Ilustre Tribunal considerar que, contrariamente ao que resulta da sentença recorrida, os prédios em apreço devem ser classificados como monumentos nacionais – o que a Recorrida apenas admite por mero dever de patrocínio, sem, todavia, conceder – desde já se requer que esse Tribunal mantenha a isenção de IMI, maxime no seguimento do plasmado pela jurisprudência do CAAD proferida nos processos n.º 256/2014-T, n.º 325/2014-T e n.º 76/2015-T
19.ª Em conclusão, o entendimento da AT padece de ilegalidade, por violação do disposto na alínea n) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF e do artigo 15.º da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, pelo que deverá manter-se a decisão proferida pelo Tribunal recorrida, uma vez que não há qualquer erro de julgamento que possa ser imputado a este respeito à sentença recorrida;
20.ª Assim, em face do exposto, deverá concluir-se pela improcedência do recurso apresentado pela Fazenda Pública, devendo manter-se a sentença recorrida.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, por provado, mantendo-se a sentença recorrida, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!”
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O Digno Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal foi notificado nos termos e para os efeitos do artigo 146.º, n.º 1 do CPTA.


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Atendendo à existência do processo em suporte informático e à conjuntura atual de pandemia, dispensa-se os vistos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.
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DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO ─ Questões a apreciar:

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas, estando o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas as questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer [cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 do CPC, ex vi artigo 1.º e artigo 140.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).

Cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida padece de erro de julgamento ao concluir que o prédio em causa nos presentes autos preenche os requisitos para lhe ser reconhecida a isenção em sede de IMI, prevista no artigo 44.º, n.º 1, alínea n), do EBF.
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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. MATÉRIA DE FACTO
2.1.1. O Tribunal a quo decidiu a matéria de facto da seguinte forma:

“Com relevo para a decisão da causa, consideram-se provados os seguintes factos:
1) Em 11.06.2010, o Instituto de Gestão do Património Arquitetónico e Arqueológico – Direção Regional de Cultura do Norte emitiu, em nome da aqui Autora, Certidões de Benefícios Fiscais referentes às frações autónomas A, C, D, G, H, I, M, N, Q, R, S e T, todas do prédio urbano sito na Rua (...), Rua (…) e Calçada (…), descrito na 2.ª Conservatória de Registo Predial do Porto sob no número (…) e inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...) sob o artigo 3114, das quais se extrai relativamente a cada uma das mencionadas frações, para além do mais, o seguinte:
(…) Certifico que o imóvel identificado em B e B1 está classificado como Imóvel de Interesse Público (I.I.P.) pelo Decreto n.º 67/97, D.R. 301 de 1997/12/31.
Certifico que o imóvel identificado em B e B1 faz parte integrante do conjunto denominado ‘Zona Histórica do Porto’, classificado como Imóvel de Interesse Público (I.I.P.) e Portaria n.º 975/2006, DR 2.ª Série, n.º 113, de 12-06-2006. (…) – fls. 30 a 65 do processo físico, as quais se dão aqui por integralmente reproduzidas;
2) Em 19.07.2010, a Autora apresentou no Serviço de Finanças de Porto-2 um requerimento a solicitar a isenção de IMI relativamente às frações autónomas designadas pelas letras A, C, D, G, H, I, M, N, Q, R, S e T, do prédio urbano identificado no ponto anterior, ao qual anexou as certidões da Direção Regional de Cultura do Norte, tendo dado origem aos processos de isenção com os n.º 2270117, 2270129, 2270135, 2270141, 2270145, 2270188, 2270189, 2270200, 2270203, 2270208, 2270213 e 2270216, respetivamente – fls. 18 do processo físico, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida;
3) Sobre os processos de isenção mencionados no ponto anterior recaiu projeto de indeferimento, por despacho de 15.03.2011 do Chefe de Finanças do Porto-2, com o seguinte fundamento: Isenção com caráter automático mediante comunicação da classificação como monumento nacional, ou classificação individualizada como imóveis de interesse municipal a efetuar pelo IGESPAR ou pelas Câmaras Municipais. Revenda vigente em 2010 – fls. 19 do processo físico, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida;
4) Por despacho do Chefe de Finanças do Porto-2, datado de 29.04.2011, o projeto de decisão a que se refere o ponto anterior foi tornado definitivo, tendo sido indeferidos os pedidos de isenção apresentados pela Autora – fls. 19 do processo físico, a qual se dá aqui por integralmente reproduzida;
5) A Autora apresentou em 03.06.2011, junto do Serviço de Finanças do Porto-2, recurso hierárquico da decisão mencionada, o qual foi indeferido, por despacho da Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, com os fundamentos, constantes de informação e parecer juntos ao mesmo, seguintes:
Enquadramento Factual e Legal
A situação aqui objeto de apreciação é definir se os prédios em causa cumprem os requisitos para ter direito à isenção do IMI ao abrigo da alínea n), do n.º 1, do artigo 44.º do EBF.
Para se compreender melhor o regime reproduzem-se as normas em causa: a alínea n) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF diz o seguinte: ‘(Estão isentos de Imposto municipal sobre Imóveis:) Os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável’.
Quer isto dizer que, a partir de 1 de janeiro de 2007, data da entrada em vigor da referida Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, conforme determinado no seu artigo 163.º, somente estão em condições de beneficiar de isenção, ao abrigo da alínea n), do n.º 1, do artigo 44.º do EBF, os prédios classificados como monumentos nacionais, bem como aqueles que sejam individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal.
E com as alterações legislativas no âmbito da Lei N.º 3-B/2010, de 28 de abril (OE-2010) ao n.º 5, do artigo 44.º, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a isenção a que se refere a alínea n), do n.º 1, do referido artigo passou a ser de caráter automático, mediante comunicação da classificação como Monumentos Nacionais ou da classificação individualizada como imóveis de interesse público ou de interesse municipal, a efetuar pelo Instituto de Gestão do Património Arquitetónico e Arqueológico - IGESPAR-IP, ou pelas Câmaras Municipais, vigorando enquanto os prédios estiverem classificados, mesmo que estes venham a ser transmitidos.
Nos termos do n.º 6 do artigo 44.º do EBF para os efeitos previsto no número anterior (n.º 5), os serviços do IGESPAR e as Câmaras Municipais procedam à referida comunicação relativamente aos imóveis já classificados à data da entrada em vigor da presente lei:
- Oficiosamente, no prazo de 60 dias; ou
- A requerimento dos proprietários dos imóveis, no prazo de 30 dias a contar da data da entrada do requerimento nos respetivos serviços.
A classificação de qualquer imóvel decorre de um ato administrativo especificamente dirigido para o efeito, que é posteriormente publicado em decreto ou portaria, conforme prevê a Lei 107/2001, de 8 de setembro.
O IGESPAR é a entidade competente para a classificação do património arquitetónico e certificou que os prédios em causa fazem parte integrante do conjunto denominado ‘Zona Histórica do Porto’, a qual, está classificada como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto n.º 67/97, de 1997/12/31.
A Lei 107/2001, de 8 de setembro refere no seu artigo 9.º que ‘a definição e estrutura dos regimes dos benefícios fiscais relativos à proteção e valorização do património cultural são objeto de lei autónoma’.
Para efeitos de benefícios fiscais no âmbito do IMI, um imóvel integrado num conjunto classificado de interesse público, não equivale a um prédio individualmente classificado, tendo em atenção o estipulado no n.º 4, do artigo 2.º do CIMI onde refere que, ‘Para efeitos deste imposto, cada fração autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio’.
A recorrente não fez prova em como os prédios se encontram individualmente classificados, dado que o Decreto n.º 67/97, de 1997-12-31, classifica a ‘Zona Histórica do Porto’ e não os prédios individualmente, pelo que não podem beneficiar da isenção solicitada, por não reunirem os pressupostos exigidos na alínea n), do n.º 1, do artigo 44.º do EBF.
(…)
Parecer 333/2011
Confirmo e concordo.
O ato de indeferimento controvertido encontra-se validamente suportado na inexistência de classificação individual dos referidos prédios urbanos como sendo de interesse público, de valor municipal ou integrante do património cultural, pressuposto fundamental para a legalidade da declaração da isenção de IMI relativamente aos mesmos ao abrigo do artigo 44.º, n.º 1, alínea n), do EBF.
Na realidade, os diversos elementos probatórios apresentados pela recorrente (salientando-se as certidões emitidas pelo IGESPAR e a certidão emitida pela Câmara Municipal do Porto) somente apresentam a causalidade entre a localização dos referidos prédios e as áreas do anterior imóvel de interesse público conhecido por Zona Histórica do Porto, presentemente, imóvel classificado como de interesse nacional, sob a designação de monumento nacional (Aviso n.º 15173/2010, publicado no DR, 2.ª série, n.º 147, de 30.07.2010).
Em termos doutrinários, pugna-se pela existência de uma dicotomia entre o conceito de imóvel de interesse cultural, próprio do respetivo ramo de direito e apreensível nos normativos ínsitos na Lei n.º 107/2001, de 08.09, e o conceito de prédio para efeitos tributários, previsto no artigo 2.º do CIMI, apelando a níveis de incidência geográfica e de realidade física potencialmente divergentes entre si.
De natureza mais restrita, o conceito fiscal de prédio exige, pois, e respeitando-se a previsão do artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do EBF, que a eventual classificação do mesmo como património cultural decorre de um ato administrativo ou normativo individualmente dirigida para essa realidade física e concreta, abstraindo-se de qualquer outra potencial classificação que sinalize áreas de implementação gerais, como assim se verifica relativamente à Zona Histórica do Porto.
Consequentemente, ainda que dispondo este imóvel de natureza de património cultural, a mesma não aproveitará, sem adicionais diligências classificativas, a cada um dos prédios fiscalmente relevantes sitos na área de qualificação patrimonial designada no ato normativo anteriormente mencionado, pelo que, em termos fiscais, aquela classificação cede em face da necessidade da classificação individualizada, de cada um dos prédios identificados nos autos.
Não ficando plenamente demonstrado que os prédios subjacentes aos direitos de isenção controvertidos foram classificados nesses termos (desde logo, os elementos juntos ao processo não referenciam o edificado ou os seus elementos independentes como detentores dessa qualificação), não se verificam as condicionantes para a aplicação da isenção automática e permanente em causa.
Assim, atentos aos factos e fundamentos aduzidos na presente informação, não se vislumbrando vícios assacáveis ao ato controvertido, considero ser de indeferir o recurso hierárquico, subsistindo válido e eficaz o ato recorrido. (…) – fls. 20 a 23 do processo físico, as quais se dão aqui por integralmente reproduzidas;
6) O despacho mencionado no ponto anterior foi remetido ao mandatário da Autora por ofício com o n.º 3413/3182-10, datado de 10.04.2010 – fls. 15 do processo físico, a qual se dá aqui por integralmente reproduzido;
7) Em 16.07.2012 a Autora intentou a presente ação – fls. 1 do processo físico.
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Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir.
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MOTIVAÇÃO.
A decisão da matéria de facto efetuou-se, desde logo, com base no exame dos documentos e processos administrativos juntos aos autos, não impugnados, conforme discriminado nos vários pontos do probatório, bem como considerando a posição processual assumida por cada uma das partes nos respetivos articulados, sendo que as partes estão de acordo no essencial dos factos, divergindo apenas na sua interpretação jurídica.


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2.2. DE DIREITO

Alega a Recorrente que “[a]o contrário do defendido pela sentença ora recorrida, a certidão emitida pelo IPPAR, certificando que os prédios em causa fazem parte integrante do conjunto denominado “Zona Histórica do Porto”, a qual está classificada como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto n.º 67/97, de 1997/12/31, não significa, nem prova que, de per si cada prédio integrante do conjunto o esteja. (…) Tendo em conta que nos termos do art.º 44.º n.º 1, alínea n) do EBF, na redação dada pela Lei 53-A/2006, de 29/12, estão isentos de IMI: “Os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público, de valor municipal ou património cultural, nos termos da legislação aplicável”. (…) Conclui-se que um imóvel integrado num conjunto ou centro, classificado de interesse público, para efeitos de benefícios fiscais, não equivale a um imóvel individualmente classificado a que acresce que, (…) Sendo a competência da classificação dos imóveis do IGESPAR I.P, este certificou que o imóvel não está classificado individualmente, mas sim o conjunto “Zona Histórica do Porto".”

A sentença recorrida concluiu que “… o prédio em causa nos presentes autos encontra-se classificado como imóvel de interesse público, preenchendo os requisitos para lhe ser reconhecida a isenção em sede de IMI, consagrada no artigo 44, n.º 1, alínea n) do EBF.
Pelo que se impõe, tal como peticionado pela Autora, a condenação da Entidade Demandada na declaração do direito à aplicação da isenção de IMI, nos termos da norma mencionada, relativamente às frações A, C, D, G, H, I, M, N, Q, R, S e T do prédio urbano sito na Rua (...), Rua de Monchique, n.º 282 a 296 e Calçada S/ Douro, n.º 34 e 42”.

Vejamos:
A questão a decidir nos presentes autos consiste em determinar o sentido de alcance da norma do artigo 44.º, n.º 1, alínea n) do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

Esta questão já foi analisada no acórdão do STA, de 12/12/2018, recurso n.º 0134/14.4BEPRT 0501/17, consultável em www.dgsi.pt, nos termos seguintes:
“Como facilmente se depreende da argumentação expendida pela recorrente e pelo recorrido as dúvidas interpretativas do texto do artigo 44º, n.º 1, al. n) do EBF (que antes da renumeração e republicação correspondia do artigo 40º, cfr. Decreto-Lei n.º 108/2008, de 26/06) surgiu com a alteração que lhe foi introduzida pelo artigo 82º do Orçamento do Estado para 2007, Lei n.º 53-A/2006, de 29.12.2006.
Efetivamente, antes desta alteração do texto legal dispunha o artigo 40º, n.º 1, al. n), do EBF:
Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis os prédios classificados como monumentos nacionais ou imóveis de interesse público e bem assim os classificados de imóveis de valor municipal ou como património cultural, nos termos da legislação aplicável.
Posteriormente à entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2007, tal norma passou a ter a seguinte redação:
Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público, de valor municipal ou património cultural, nos termos da legislação aplicável.
Em simultâneo com a alteração deste texto legal o legislador no mesmo Orçamento do Estado editou mais duas normas que dispunham do seguinte modo, e cuja razão de ser se prende com esta alteração ao texto do artigo 40º, n.º 1, al. n):
Artigo 88.º
Disposições transitórias no âmbito dos benefícios fiscais
Às alterações introduzidas pela presente lei ao Estatuto dos Benefícios Fiscais aplica-se o regime transitório seguinte:
a) …
b) …
c) A administração fiscal notifica, no prazo de 180 dias após a entrada em vigor da presente lei, todos os sujeitos passivos, que se encontrem a beneficiar da isenção referida na alínea n) do n.º 1 do artigo 40.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, da cessação deste benefício por alteração dos seus pressupostos;
d) Os sujeitos passivos referidos na alínea anterior podem, no prazo de 90 dias a contar da data da notificação, requerer a isenção a que se refere o artigo 42.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais se reunirem todos os requisitos aí referidos e se para o mesmo prédio ainda não tiverem beneficiado deste regime…
Como se depreende da interpretação conjugada destas disposições legais o legislador ao elaborar o Orçamento do Estado para 2007 quis introduzir uma alteração significativa no regime de acesso às isenções de IMI de que poderiam beneficiar os prédios classificados em razão do seu interesse e importância cultural e/ou valor patrimonial.
Enquanto que na versão da norma anterior a este OE de 2007 o legislador não exigia, para efeitos fiscais, a classificação individual de cada um dos prédios, bastando-se, portanto, com a sua classificação nos termos da legislação aplicável, com esta alteração passou a exigir mais um requisito, o da classificação individual nos termos da legislação aplicável.
Contudo, apenas passou a exigir esta classificação individual para os imóveis que devam ser integrados nas categorias de interesse público, de valor municipal ou património cultural, não fazendo a mesma exigência para os imóveis que devam ser integrados na categoria de monumento nacional (no EBF o legislador faz referência a monumento nacional quando se pretende referir aos imóveis de interesse nacional porque é assim que nos termos do disposto no artigo 15º, n.º 3 da Lei n.º 107/2001, de 08 de setembro devem ser designados).
E esta distinção resulta claramente da vontade expressa do legislador ao editar a norma em questão, ou seja, o legislador não pretendeu exigir, para os imóveis que devam ser incluídos na categoria de monumento nacional (interesse nacional) e para efeitos desta isenção fiscal, que devam ser sujeitos a classificação individual, mantendo, portanto, quanto aos mesmos o regime que anteriormente se encontrava estabelecido. Aliás a “nova” redação do preceito mantém inalterada a primeira parte do artigo em questão -Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis os prédios classificados como monumentos nacionais- que se refere aos monumentos nacionais.
Esta interpretação resulta, também, expressamente do debate parlamentar e votação ocorridos a propósito deste preceito legal.
Tal como resulta da leitura do Diário da Assembleia da República I Série, nº 24, de 02.12.2006, págs. 29 e 30, a exigência da classificação individual dos imóveis que devem ser enquadrados na categoria de monumento nacional não foi expressamente aceite pelos deputados:
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta 740-P, de Os Verdes, de substituição da alínea n) do n.º 1 do artigo 40.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais constante do artigo 77.º da proposta de lei.
Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.
Era a seguinte:
n) Os prédios classificados a título individual como monumentos nacionais ou imóveis de interesse público e bem assim os classificados, também a título individual, como imóveis de valor municipal ou como património cultural, nos termos da legislação aplicável.
O Sr. Presidente: — Vamos proceder à votação da proposta 855-P, do PS, de emenda da alínea n) do n.º 1 do artigo 40.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais proposta no artigo 77.º.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.
É a seguinte:
n) Os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público, de valor municipal ou património cultural, nos termos da legislação aplicável.
O Sr. Presidente: — Com esta aprovação fica prejudicada a votação da alínea n) do n.º 1 do artigo 40.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais proposta no artigo 77.º [e que era a seguinte: n) Os prédios classificados como monumentos nacionais, nos termos da legislação aplicável].

Daqui se conclui, assim, que os imóveis que já anteriormente beneficiavam da isenção fiscal, por se encontrarem enquadrados na categoria designada por monumento nacional, não foram abrangidos pelas alterações legislativas operadas pelo OE de 2007, podendo por isso manter a isenção fiscal de que vinham a beneficiar, não havendo, portanto, quanto aos mesmos, que aplicar o regime transitório constante do artigo 88º, als. c) e d) do mesmo Orçamento do Estado.”

Vejamos agora o caso concreto dos autos.

Resulta da matéria de facto que o recurso hierárquico foi indeferido por despacho da Subdiretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, com os fundamentos, constantes de informação e parecer juntos ao mesmo, seguintes:
“Enquadramento Factual e Legal
A situação aqui objeto de apreciação é definir se os prédios em causa cumprem os requisitos para ter direito à isenção do IMI ao abrigo da alínea n), do n.º 1, do artigo 44.º do EBF.
Para se compreender melhor o regime reproduzem-se as normas em causa: a alínea n) do n.º 1 do artigo 44.º do EBF diz o seguinte: ‘(Estão isentos de Imposto municipal sobre Imóveis:) Os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável’.
Quer isto dizer que, a partir de 1 de janeiro de 2007, data da entrada em vigor da referida Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, conforme determinado no seu artigo 163.º, somente estão em condições de beneficiar de isenção, ao abrigo da alínea n), do n.º 1, do artigo 44.º do EBF, os prédios classificados como monumentos nacionais, bem como aqueles que sejam individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal.
E com as alterações legislativas no âmbito da Lei N.º 3-B/2010, de 28 de abril (OE-2010) ao n.º 5, do artigo 44.º, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a isenção a que se refere a alínea n), do n.º 1, do referido artigo passou a ser de caráter automático, mediante comunicação da classificação como Monumentos Nacionais ou da classificação individualizada como imóveis de interesse público ou de interesse municipal, a efetuar pelo Instituto de Gestão do Património Arquitetónico e Arqueológico - IGESPAR-IP, ou pelas Câmaras Municipais, vigorando enquanto os prédios estiverem classificados, mesmo que estes venham a ser transmitidos.
Nos termos do n.º 6 do artigo 44.º do EBF para os efeitos previsto no número anterior (n.º 5), os serviços do IGESPAR e as Câmaras Municipais procedam à referida comunicação relativamente aos imóveis já classificados à data da entrada em vigor da presente lei:
- Oficiosamente, no prazo de 60 dias; ou
- A requerimento dos proprietários dos imóveis, no prazo de 30 dias a contar da data da entrada do requerimento nos respetivos serviços.
A classificação de qualquer imóvel decorre de um ato administrativo especificamente dirigido para o efeito, que é posteriormente publicado em decreto ou portaria, conforme prevê a Lei 107/2001, de 8 de setembro.
O IGESPAR é a entidade competente para a classificação do património arquitetónico e certificou que os prédios em causa fazem parte integrante do conjunto denominado ‘Zona Histórica do Porto’, a qual, está classificada como Imóvel de Interesse Público pelo Decreto n.º 67/97, de 1997/12/31.
A Lei 107/2001, de 8 de setembro refere no seu artigo 9.º que ‘a definição e estrutura dos regimes dos benefícios fiscais relativos à proteção e valorização do património cultural são objeto de lei autónoma’.
Para efeitos de benefícios fiscais no âmbito do IMI, um imóvel integrado num conjunto classificado de interesse público, não equivale a um prédio individualmente classificado, tendo em atenção o estipulado no n.º 4, do artigo 2.º do CIMI onde refere que, ‘Para efeitos deste imposto, cada fração autónoma, no regime de propriedade horizontal, é havida como constituindo um prédio’.
A recorrente não fez prova em como os prédios se encontram individualmente classificados, dado que o Decreto n.º 67/97, de 1997-12-31, classifica a ‘Zona Histórica do Porto’ e não os prédios individualmente, pelo que não podem beneficiar da isenção solicitada, por não reunirem os pressupostos exigidos na alínea n), do n.º 1, do artigo 44.º do EBF (…)”.

Resulta do exposto que para a AT, partir de 1 de janeiro de 2007, data da entrada em vigor da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, conforme determinado no seu artigo 163.º, somente estão em condições de beneficiar de isenção, ao abrigo da alínea n), do n.º 1, do artigo 44.º do EBF, os prédios classificados como monumentos nacionais, bem como aqueles que sejam individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal. Após a entrada em vigor daquele diploma (2007.01.01), foi introduzido um novo elemento literal no texto do mesmo preceito, a classificação individual do prédio, o qual, por configurar uma alteração dos pressupostos que permitiram o reconhecimento da isenção.

Como facilmente se surpreende a AT entendeu que aos prédios do Recorrido aplicavam-se as regras inovadoras do OE de 2007 e, por isso, os prédios deveriam estar individualmente classificados.

Porém, tal entendimento, como vimos, só estaria correto no caso de os imóveis do Recorrido não se encontrassem abrangidos por anterior classificação designada como monumento nacional.

Como se refere na sentença recorrida e não foi questionado pela Recorrente, “[n]os termos do artigo 44, n.º 1, alínea n), do Estatuto dos Benefícios Fiscais (doravante EBF, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de julho, na redação aplicável ao caso sub judice), estão isentos de imposto municipal sobre imóveis (doravante IMI) os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável.
Por força do n.º 2, alínea d), da mesma norma, a isenção inicia-se no ano, inclusive, em que ocorra a classificação.
Com relevo para a situação em apreço, resulta ainda do n.º 5 do mencionado artigo 44.º que a isenção a que se refere a alínea n) do n.º 1 é de caráter automático, operando mediante comunicação da classificação como monumentos nacionais ou da classificação individualizada como imóveis de interesse público ou de interesse municipal, a efetuar pelo Instituto de Gestão do Património Arquitetónico e Arqueológico, I. P., ou pelas câmaras municipais, vigorando enquanto os prédios estiverem classificados, mesmo que estes venham a ser transmitidos.
Portanto, da norma que se acaba de citar resulta, desde logo, que a isenção de IMI aqui em discussão é atribuída a duas situações distintas: por um lado, aos prédios classificados como monumentos nacionais e, por outro, aos prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal.
Em qualquer dos casos, tal isenção é automática, não carecendo, por isso de reconhecimento por parte da Administração Tributária (AT), para tanto bastando a comunicação da classificação por parte do Instituto de Gestão do Património Arquitetónico e Arqueológico, I. P. (IGESPAR), ou pelas câmaras municipais, consoante os casos.
Em consonância com o caráter automático da isenção a conceder, veja-se ainda que a parte final do citado artigo 44, n.º 1, alínea n) remete para a legislação aplicável à classificação dos imóveis. O mesmo é dizer que à AT não caberá, in casu, qualquer competência quanto à atribuição da isenção de IMI a que se refere o artigo 44, n.º 1, alínea h) do EBF, devendo limitar-se a aceitar a classificação atribuída nos termos da legislação específica reguladora da matéria e atestada pelas entidades competentes para o efeito (na situação em análise, o IGESPAR).
Sucede porém que, no caso em apreço, a AT considera que, não obstante o teor das certidões do IGESPAR, a classificação atribuída ao imóvel em causa não releva para efeitos de aplicação da isenção requerida pela Autora, por entender que para o efeito não bastará a sua inserção na Zona Histórica do Porto, antes encontrando-se dependente de uma classificação individual do prédio como imóvel de interesse público ou municipal, por força do disposto na 2.ª parte da norma em análise.
Ora, cumpre referir, em primeiro lugar, que conforme decorre do teor das certidões emitidas pelo IGESPAR – Direção Regional de Cultura do Norte, o imóvel objeto dos presentes autos está classificado como Imóvel de Interesse Público (I.I.P.) pelo Decreto n.º 67/97, D.R. 301 de 1997/12/31 e, bem assim, que o mesmo faz parte integrante do conjunto denominado ‘Zona Histórica do Porto’, classificado como Imóvel de Interesse Público (I.I.P.) e Portaria n.º 975/2006, DR 2.ª Série, n.º 113, de 12-06-2006. (…).
Portanto, o conteúdo literal da certidão atribuída pela entidade competente para o efeito não se limita a referir que o imóvel sito na freguesia de (...) (mais concretamente todas e cada uma das frações relativamente às quais é pretendida isenção) se insere na Zona Histórica do Porto, mas também indicando que o próprio prédio, em si mesmo considerado, está classificado como imóvel de interesse público.
E assim não poderia deixar de ser, tendo em conta o disposto no Decreto n.º 67/97, de 31 de dezembro, nos termos do qual se deverá considerar o imóvel aqui em causa como de interesse público. O mencionado diploma procede à classificação de um conjunto de imóveis, aos quais foi reconhecido relevante interesse arquitetónico ou arqueológico, dividindo-os pelas classificações como monumentos nacionais, imóveis de interesse público e valores concelhios.
Nesse âmbito, foram classificados como imóveis de interesse público, para além dos demais mencionados no anexo II ao Decreto n.º 67/97, a Zona Histórica do Porto, situada nas freguesias de Miragaia, Vitória, Sé, Santo Ildefonso, Massarelos e São Nicolau, conforme planta de delimitação constante do anexo IV àquele diploma.
Assim, deverá ter-se em consideração que, por força da classificação como de interesse público da denominada Zona Histórica do Porto, o âmbito da classificação incide, concretamente, sobre todos e cada um dos prédios abrangidos pela área em análise.
Daí que a certidão do IGESPAR venha atestar, não só que o prédio da Autora se insere na denominada Zona Histórica do Porto, como também que o imóvel em si mesmo está classificado como de interesse público (cf. 1.ª parte da certidão, conforme ponto 1 do probatório).
Em reforço de tal conclusão, veja-se que o sentido da exigência contida na 2.ª parte do artigo 44, n.º 1, alínea n), do EBF, quanto à classificação individual dos prédios como imóveis de interesse público, terá de ser vista à luz da remissão da parte final da norma para a legislação aplicável à matéria aqui em análise.
Ou seja, por força da mencionada remissão, o conceito de prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal terá de ser preenchido por referência à legislação reguladora da classificação do património.
Com relevo para o caso em discussão, a Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro, que estabelece as bases da política e do regime de proteção e valorização do património cultural, define, dentro da categoria genérica de bens culturais (que, podendo ser móveis ou imóveis, representam testemunho material com valor de civilização ou de cultura, nos termos do seu artigo 14, n.º 1, três categorias de bens imóveis culturais: monumento, conjunto ou sítio (artigo 15, n.º 1).
Resulta do artigo 15, da Lei n.º 107/2001, para além do mais, o seguinte: 1 - Os bens imóveis podem pertencer às categorias de monumento, conjunto ou sítio, nos termos em que tais categorias se encontram definidas no direito internacional, e os móveis, entre outras, às categorias indicadas no título VII.
2 - Os bens móveis e imóveis podem ser classificados como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal.
3 – Para os bens imóveis classificados como de interesse nacional, sejam eles monumentos, conjuntos ou sítios, adotar-se-á a designação «monumento nacional» e para os bens móveis classificados como de interesse nacional é criada a designação «tesouro nacional».
4 - Um bem considera-se de interesse nacional quando a respetiva proteção e valorização, no todo ou em parte, represente um valor cultural de significado para a Nação.
5 – Um bem considera-se de interesse público quando a respetiva proteção e valorização represente ainda um valor cultural de importância nacional, mas para o qual o regime de proteção inerente à classificação como de interesse nacional se mostre desproporcionado.
6 – Consideram-se de interesse municipal os bens cuja proteção e valorização, no todo ou em parte, representem um valor cultural de significado predominante para um determinado município.
7 - Os bens culturais imóveis incluídos na lista do património mundial integram, para todos os efeitos e na respetiva categoria, a lista dos bens classificados como de interesse nacional.
8 - A existência das categorias e designações referidas neste artigo não prejudica a eventual relevância de outras, designadamente quando previstas no direito internacional. (realce nosso) Em desenvolvimento das bases da política e do regime de proteção e valorização do património cultural consagradas na Lei n.º 107/2001, veio o Decreto-Lei n.º 309/2009, de 23 de outubro, estabelecer o procedimento de classificação dos bens imóveis de interesse cultural, bem como o regime jurídico das zonas de proteção e do plano de pormenor de salvaguarda.
Tal diploma consagra no seu artigo 2 uma norma em tudo idêntica à do já citado artigo 15, n.º 1 da Lei n.º 107/2001, prevendo, para os bens imóveis classificados, as categorias de monumento, conjunto ou sítio. Mais acrescenta o respetivo artigo 3, n.º 1 que um bem imóvel pode ser classificado como de interesse nacional, de interesse público ou de interesse municipal.
Portanto, nos termos da legislação aplicável, para a qual remete o artigo 44, n.º 1, alínea n), do EBF, o conceito de bem imóvel, para efeitos da respetiva classificação como de interesse nacional, público ou municipal, tanto pode corresponder à categoria de monumento, conjunto ou sítio.”

Resulta, assim, que à entrada em vigor Lei n.º 107/2001, de 08 de setembro, os imóveis do Recorrido já se encontravam abrangidos por anterior classificação designada como monumento nacional e beneficiavam da isenção a que se refere o artigo 44.º, n.º 1, alínea n), do EBF.

Tal isenção era conferida aos prédios que se encontravam integrados no Centro Histórico do Porto que faz parte da lista do património mundial e, portanto, se encontravam integrados no grupo dos designados monumentos nacionais.

Daqui se conclui, como no acórdão ditado, que os imóveis em causa nos autos, por se encontrarem enquadrados na categoria designada por monumento nacional, não foram abrangidos pelas alterações legislativas operadas pelo OE de 2007, beneficiando, por isso, da isenção fiscal.

Termos em que o presente recurso não merece provimento.


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Nos termos do artigo 667.º, n.º 3, do CPC, formulamos o seguinte sumário:


1 - Estão isentos de imposto municipal sobre imóveis: os prédios classificados como monumentos nacionais e os prédios individualmente classificados como de interesse público ou de interesse municipal, nos termos da legislação aplicável – cfr. artigo 44.º, n.º 1, alínea n), do EBF.

2 - Os imóveis situados nos Centros Históricos incluídos na Lista do Património Mundial da UNESCO classificam-se como sendo de interesse nacional, inserindo-se na categoria de “monumentos nacionais” – cfr. artigo 15.º, n.º 3 e n.º 7 da Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro.

3 - Os prédios inseridos nos Centros Históricos Classificados beneficiam de isenção de IMI.

*
3. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida com a presente fundamentação.

*
Custas a cargo da Recorrente.
*
Porto, 13 de maio de 2021
(O Relator consigna e atesta, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, o voto de conformidade com o presente Acórdão das restantes integrantes da formação de julgamento, as Exmas. Senhoras Juízas Desembargadoras Bárbara Tavares Teles e Paula Maria Dias de Moura Teixeira).

Manuel Escudeiro dos Santos
Bárbara Tavares Teles
Paula Maria Dias de Moura Teixeira