Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00944/11.4BEAVR
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/16/2015
Tribunal:TAF de Aveiro
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO;
LEI Nº 66-B/2007;
Sumário:1 – Como resulta dos nºs 3 e 4 do artigo 42º, e nº 1 do artigo 56° da Lei n.º 66-B/2007, a competência para avaliar um qualquer funcionário pertence ao superior hierárquico imediato ou, na sua ausência ou impedimento, ao superior hierárquico do nível seguinte, privilegiando-se a avaliação efetuada por quem detém contacto funcional com o Avaliado.
2 - É requisito essencial da avaliação, o contacto funcional entre Avaliador e Avaliado durante um período mínimo de seis meses, só sendo afastado tal requisito, perante a verificação de situação funcional que, apesar de não ter permitido contacto direto pelo período temporal referido, admita, por decisão favorável do Conselho Coordenador da Avaliação, a realização da avaliação.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Município de VC
Recorrido 1:Sindicato Nacional dos trabalhadores da Administração Local
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao presente Recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I Relatório
O Município de VC..., no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local - STAL, em representação do seu Associado AJT, tendente, designadamente, a impugnar o despacho do Presidente da Câmara Municipal, de 16 de Setembro de 2011, relativo à Avaliação de Desempenho face ao ano de 2010, inconformado com o Acórdão proferido em 20 de Dezembro de 2012, através do qual foi julgada “procedente a presente Ação administrativa especial, anulando-se o ato impugnado”, veio interpor recurso jurisdicional face ao mesmo, proferido em primeira instância e em coletivo, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro.

Formulou o aqui Recorrente/Município nas suas alegações de recurso, apresentadas em 28 de Fevereiro de 2013, as seguintes conclusões (Cfr. Fls. 177 a 182 Procº físico):

“a) A matéria assente demonstra que a avaliação foi efetuada pelo superior hierárquico do avaliado, porquanto a divisão apenas tinha uma coordenação;

b) Não resultou provada a ausência de contacto funcional entre avaliador e avaliado, sendo que apenas se chegou a esta conclusão incorreta pela existência de uma coordenadora;

c) Provado, porque não diretamente contrariado e negado pelo Sócio do Recorrido, que a avaliação foi efetuada com a colaboração da coordenadora, à semelhança do regime instituído para a sucessão de avaliadores;

d) Pelo que, a avaliação foi efetuada por quem tinha legalmente competência para tanto e preenchia os legais requisitos.

e) Ao declarar verificada a ilegalidade por violação do disposto nos artigos 42.º, n.º 2 e 3 e 56.º, n.º 1 da Lei 66-B/2007 de 28 de Dezembro, a sentença incorreu em erro por incorreta interpretação e aplicação daqueles normativos à matéria de facto assente.

NESTES TERMOS, deve a sentença ser revogada, absolvendo-se o Réu do pedido de declaração de ilegalidade do ato recorrido, assim se fazendo JUSTIÇA”

O Recurso Jurisdicional veio a ser admitido, por despacho de 28 de Fevereiro de 2013 (Cfr. Fls. 189 Procº físico).

O aqui Recorrido não veio apresentar contra-alegações.
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 3 de Setembro de 2013, veio a emitir Parecer em 12 de Setembro de 2013, no qual, a final, se pronuncia no sentido de dever “ser negado provimento ao presente Recurso jurisdicional” (Cfr. Fls. 201, 201v e 202 Procº físico).
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, “erro de julgamento por incorreta interpretação e aplicação do disposto nos artº 42º, nºs 2 e 3 e 56º, nº 1 da Lei º 66-B/2007, de 28 de Setembro”.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo, considerou a seguinte factualidade, entendendo-se a mesma como adequada e suficiente:
“A) O associado do A. é trabalhador do R., com a categoria de assistente operacional, da carreira assistente operacional – facto não impugnado
B) Durante o ano de 2010, o associado do A. esteve afeto à Divisão de Serviços Urbanos e Ambiente – facto não impugnado.
C) A coordenação da referida Divisão estava a cargo, desde 3 de Dezembro de 2009, da Engª HMSB. – cfr. doc. 1 junto com a p.i..
D) A referida Engª HMSB controlava a assiduidade do sócio do A. e restantes colegas de trabalho da Divisão de Serviços Urbanos e Ambiente, dando-lhes ordens necessárias à execução do serviço da Unidade, controlando a execução das mesmas e coordenando o trabalho do pessoal afeto à referida Divisão – facto não impugnado.
E) Quem avaliou o associado do Autor no ano de 2010 foi o Vereador JPVA — cfr. doc. n° 5, fls. 1 junto com a Petição Inicial.
F) No dia 31/3/2010, o sócio do Autor teve conhecimento dos “Objetivos” e das “Competências Comportamentais” segundo os quais seria avaliado no ano em causa - cfr. doc. n° 5, fls. 3 e 4 junto com a Petição Inicial.
G) Tendo sido o referido Vereador JPVA na qualidade de Avaliador que lhe deu a conhecer tais “Objetivos” e “Competências Comportamentais” - cfr. doc. n° 5, fls. 3 e 4.
H) Na componente dos “Objetivos” o sócio do Autor teve a nota de 4 valores - cfr. doc. n° 5, fls. 3.
I) Na componente das “Competências” o sócio do Autor teve a pontuação de 3,33 assim distribuída:
No campo da “realização e orientação para os resultados”, 3 valores;
No campo da “adaptação e melhoria contínua” 3 valores;
No campo da “orientação para a segurança (Higiene e Segurança no trabalho) 3 valores;
No campo do “trabalho de equipa e cooperação”, 3 valores;
No campo do “relacionamento interpessoal”, 3 valores;
E no campo da “responsabilidade e compromisso com o serviço” a pontuação de 5 valores - cfr. doc. n° 5, fls 4.
J) O sócio do Autor teve a menção Final quantitativa de 3,733, e a menção Final qualitativa de “Desempenho Adequado” — cfr. doc. n° 5, fls. 4.
L) O Vereador da C.M. de VC..., em 20 de Abril de 2011, proferiu despacho de homologação da avaliação de desempenho do associado do A., data em que este conhecimento da referida avaliação de desempenho – cfr. doc. 5 fls. 6
M) O referido ato homologatório da avaliação atribuída ao associado do Autor foi revogado por posterior despacho de 26 de Maio de 2011, porquanto a avaliação foi sujeita a homologação sem que fosse dado prazo para ser suscitada a intervenção da Comissão Paritária. – cfr. fls. 66 dos autos.
N) O associado do A., em 8 de Junho de 2011, requereu a intervenção da Comissão Paritária – cfr. fls. 67 do P.A.
O) A Comissão Paritária, reunida no dia 24 de Junho de 2011, deliberou não encontrar “…razões plausíveis que justifiquem a alteração da classificação da avaliação” – cfr. fls. 69/70 do P.A. que se dão por reproduzidas.
P) O representado do A., em 16 de Agosto de 2011, dirigiu reclamação ao Presidente da Câmara Municipal de VC... – cfr. fls. 73 do P.A..
Q) No dia 16 de Setembro de 2011, o Presidente da Câmara Municipal de VC..., proferiu despacho com o seguinte teor:
“Tendo por base o parecer emitido pelo CCA, a fundamentação e as evidências demonstradas, determino que não haverá provimento da reclamação pelo que a classificação final deve manter-se” (ato impugnado) – cfr. fls. 74 dos autos.
R) O Presidente da Câmara Municipal de VC..., através de despacho proferido em 17 de Janeiro de 2011, delegou no Vereador JPVA a competência para aprovar e alterar o mapa de férias e restantes decisões relativas a férias da DSUA, bem como justificar e injustificar as faltas dos trabalhadores da mesma Divisão – cfr. doc. de fls. 49 dos autos.

IV – Do Direito
Vem, em síntese, peticionada a anulação do ato praticado pelo Presidente da Câmara de VC..., de 16/09/2011, que indeferiu a reclamação apresentada pelo aqui representado, relativamente à sua Avaliação de Desempenho face ao ano de 2010.

Invoca-se erro de julgamento, resultante do facto de, supostamente, não se encontrar legalmente prevista a ausência de contacto funcional entre avaliador e avaliado.

A posição adotada no acórdão recorrido terá assim violado os artº 42º, nºs 3 e 4 e 56º nº1 da Lei nº 66-B/2007, de 28/12.

Resulta dos autos que o avaliador do representado do STAL, sendo vereador da Câmara, é por natureza seu superior hierárquico, o que não significa, no entanto, que tenha tido com este contacto funcional durante o período de 6 meses, como é exigido pelos referidos artºs 42º nº 3 e 4 e 56º nº 1 da Lei nº 66-B/2007.

Sendo exigido um contacto funcional direto por um período mínimo de 6 meses, tal pressuporá, necessariamente, um relacionamento funcional próximo, única forma do avaliador poder reunir os conhecimentos suficientes e necessários para avaliar o trabalho do avaliado em termos qualitativos e quantitativos, como vista a verificar do preenchimento dos objetivos definidos.

Resulta demonstrado que quem manteve contacto funcional com o avaliado foi a Coordenadora do seu serviço, pelo que desde já se pode afirmar que se verifica o imputado vicio de violação de lei, por infração dos artºs 42º nº 3 e 4 e 56º, nº 1 da Lei nº 66-B/2007, de 28/12, pois que aquele não teve qualquer intervenção na controvertida avaliação.

Mas vejamos a questão mais em pormenor, transcrevendo-se os normativos relevantes, por forma a permitir uma mais eficaz visualização do aqui controvertido.

Artº 42° da Lei n° 66-B/2007
“Requisitos funcionais para avaliação”, o seguinte:
“1 - No caso de trabalhador que, no ano civil anterior, tenha constituído relação jurídica de emprego público há menos de seis meses, o desempenho relativo a este período é objeto de avaliação conjunta com o do ano seguinte.
2 - No caso de trabalhador que, no ano civil anterior, tenha relação jurídica de emprego público com, pelo menos, seis meses e o correspondente serviço efetivo, independentemente do serviço onde o tenha prestado, o desempenho é objeto de avaliação nos termos do presente título.
3 - O serviço efetivo deve ser prestado em contacto funcional com o respetivo Avaliador ou em situação funcional que, apesar de não ter permitido contacto direto pelo período temporal referido no número anterior, admita, por decisão favorável do Conselho Coordenador da Avaliação, a realização de avaliação.
4 — No caso previsto no nº 2, se no decorrer do ano civil anterior e ou período temporal de prestação de serviço efetivo se sucederem vários Avaliadores, o que tiver competência para avaliar no momento da realização da avaliação deve recolher dos demais os contributos escritos adequados a uma efetiva e justa avaliação.
(…)”
Artº 56° da Lei nº 66-B12007
“Avaliador”
1 — A avaliação é da competência do superior hierárquico imediato ou, na sua ausência ou impedimento, do superior hierárquico de nível seguinte, cabendo ao Avaliador:
a) Negociar os objetivos do Avaliado, de acordo com os objetivos e resultados fixados para a sua unidade orgânica ou em execução das respetivas competências, e fixar os indicadores de medida do desempenho, designadamente os critérios de superação de objetivos, no quadro das orientações gerais fixadas pelo Conselho Coordenador da Avaliação;
b) Rever regularmente com o Avaliado os objetivos anuais negociados, ajustá-los, se necessário, e reportar ao Avaliado a evolução do seu desempenho e possibilidades de melhoria;
c) Negociar as competências que integram o segundo parâmetro de avaliação, nos termos da alínea b) do artigo 45.° e do artigo 48.°;
d) Avaliar anualmente os trabalhadores diretamente subordinados, assegurando a correta aplicação dos princípios integrantes da avaliação;
e) Ponderar as expectativas dos trabalhadores no processo de identificação das respetivas necessidades de desenvolvimento;
f) Fundamentar as avaliações de Desempenho relevante e Desempenho inadequado, para os efeitos previstos na presente lei.
(…)”

Efetivamente, como resulta dos nºs 3 e 4 do artigo 42º, e nº 1 do artigo 56° da Lei n.º 66-B/2007, a competência para avaliar um qualquer funcionário pertence ao superior hierárquico imediato ou, na sua ausência ou impedimento, ao superior hierárquico do nível seguinte, privilegiando-se a avaliação efetuada por quem detém contacto funcional com o Avaliado.

Ora, na situação controvertida, a avaliação do representado, não obstante haver um superior hierárquico imediato, veio a ser efetivada pelo superior subsequente, no caso, o identificado Vereador, com o qual aquele não detinha qualquer contacto funcional, no mínimo por seis meses.

Resulta manifesto das normas do artigo 42.° supra transcritas, ser requisito essencial da avaliação, o contacto funcional entre Avaliador e Avaliado durante um período mínimo de seis meses, só sendo afastado tal requisito, perante a verificação de “situação funcional que, apesar de não ter permitido contacto direto pelo período temporal referido no número anterior, admita, por decisão favorável do Conselho Coordenador da Avaliação, a realização da avaliação”.

Assim, ainda que se admita que o Avaliador/Vereador é superior hierárquico da Divisão onde se integra o Representado do Recorrido, o que é facto é que não resulta dos autos que aquele tenha mantido contacto funcional com este, durante um período mínimo de seis meses.

Na realidade, o contacto funcional subjacente aos normativos já reiteradamente referidos, pressupõe um contacto funcional direto, pelo período mínimo de, pelo menos, seis meses, entre Avaliado e Avaliador, só assim se assegurando que este esteja na posse de conhecimentos seguros, tendentes a avaliar a quantidade e qualidade do trabalho daquele.

Não resulta igualmente dos elementos disponíveis que tenha ocorrido uma situação funcional, que não obstante a ausência de contacto direto, tenha sido viabilizada por decisão favorável do Conselho Coordenador da Avaliação.

Em face de tudo quanto precedentemente ficou expendido, não se mostra censurável o entendimento adotado pelo tribunal a quo, ao concluir pela procedência do vício de violação de lei por violação dos artigos 42º nºs 3 e 4 e 56º nº1 da Lei nº 66-B/2007, de 28 de Dezembro, determinante da anulação do ato objeto de impugnação.

* * *

Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Norte, negar provimento ao Recurso, confirmando a Sentença objeto de Recurso.
Custas pelo Recorrente.

Porto, 16 de Janeiro de 2015
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Maria do Céu Neves