Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:02546/16.BELSB
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/04/2017
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Alexandra Alendouro
Descritores:PROVIDÊNCIA CAUTELAR. ANTECIPAÇÃO DO JUÍZO SOBRE A CAUSA PRINCIPAL
Sumário:
Se a adopção da providência cautelar requerida tutela de forma efectiva, ainda que provisória, interesses que o requerente cautelar pretende assegurar com a decisão favorável da acção principal, não há que antecipar o juízo sobre a causa principal ao abrigo do art.º 121º do CPTA.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO e ESTADO PORTUGUÊS
Recorrido 1:CENTRO DE DESENVOLVIMENTO EDUCATIVO DE C..., LDA
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Providência Cautelar Antecipatória - Recurso jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:
*
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO e ESTADO PORTUGUÊS interpõem recurso jurisdicional da sentença proferida pelo TAF de Coimbra, ao abrigo do artigo 121º do CPTA [antecipação do conhecimento da causa principal], na providência cautelar de regulação provisória de situação jurídica intentada contra os mesmos, pelo CENTRO DE DESENVOLVIMENTO EDUCATIVO DE C..., LDA, que decidiu:

“reconhecer que, nos termos da cláusula 1º do contrato de associação, celebrado entre a Requerente e o Estado português em 20 de Agosto de 2015, contratou-se o número de turmas de início de ciclo em cada ano lectivo de vigência do contrato";

“condenar o Ministério da Educação a homologar as turmas de 5.º e 7.º anos de escolaridade que a Requerente constitua em observância das normas legais aplicáveis à constituição de turmas, até ao limite de seis turmas, sendo duas no ano de inicio do 2.º CEB, o 5º ano de escolaridade, e as demais distribuídas por cada um dos anos 6.º, 7.º, 8.º e 9º anos de escolaridade, em cada um dos anos letivos de 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018, bem como as turmas de continuidade até à conclusão dos ciclos de ensino iniciados em cada um dos anos letivos de vigência do contrato", bem como,

“condenar o Estado português a financiar as turmas de 5.º, 6.º, 7.º, 8.º e 9.º anos de escolaridade a funcionar no estabelecimento da Requerente nos anos letivos de 2015/2016 e 2016/2017, que, por reunirem os requisitos legais, venham a ser homologadas pelo Ministério da Educação, e as turmas de 5º ao 9.º anos de escolaridade que venham a ser validamente constituídas e homologadas no ano letivo de 2017/2018, até ao limite de seis turmas, em cada um dos anos letivos de 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018, bem como as turmas de continuidade até à conclusão dos ciclos de ensino iniciados em cada um dos anos letivos de vigência do contrato".

*
Nas alegações de recurso, o Recorrente MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO formulou as seguintes CONCLUSÕES:
“A) Por Sentença Judicial o Juiz de Direito João Evangelista Fonseca entendeu (1) “reconhecer que, nos termos da cláusula 1.º do contrato de associação, celebrado entre a Requerente e o Estado português em 20 de Agosto de 2015, contratou-se o número de turmas de início de ciclo em cada ano lectivo de vigência do contrato”; (2) “condenar o Ministério da Educação a homologar as turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade que a Requerente constitua em observância das normas legais aplicáveis á constituição de turmas, até ao limite de 10 (dez) turmas de 5.º ano de escolaridade, 9 (nove) turmas de 7.º ano de escolaridade e 9 (nove) turmas de 10.º ano de escolaridade, em cada um dos anos lectivos de 2016/2017 e 2017/2018, bem como as turmas de continuidade até à conclusão dos ciclos de ensino iniciados em cada um dos anos lectivos de vigência do contrato”, bem como (3) “condenar o Estado Português a financiar as turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade a funcionar no estabelecimento da Requerente no ano lectivo de 2016/2017, que, por reunirem os requisitos legais, venham a ser homologadas pelo Ministério da Educação, e as turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade que venham a ser validamente constituídas e homologadas no ano lectivo de 2017/2018, até ao limite de 10 (dez) turmas de 5.º ano de escolaridade, 9 (nove) turmas de 7.º ano de escolaridade e 9 (nove) turmas de 10.º ano de escolaridade, em cada um dos anos lectivos de 2016/2017 e 2017/2’18, bem como as turmas de continuidade até á conclusão dos ciclos de ensino iniciados em cada um dos anos lectivos de vigência do contrato”,

B) Em simultâneo, foi decidido antecipar nestes autos o juízo sobre a acção principal, nos termos e para os efeitos do artigo 121.º, n.º 1, do CPTA.

C) Os pedidos formulados pela Recorrida eram distintos do efectivo objecto de condenação judicial, havendo sido recusado o decretamento provisório das providências cautelares por si formuladas em 09.01.2017.

D) A Sentença objecto de recurso colide directa ou indirectamente com vinte e cinco Sentenças Judiciais, que decretaram a improcedência de pedidos análogos aos formulados pela Recorrida, duas de 11.07.2016, e uma de 18.07.2016, proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (Unidade Orgânica 1 – Juiz CASTRO FERNANDES), nos processos judiciais n.º 345/16.8BECBR, 327/16.0BECBR, 287/16.7 BECBR, outra de 25.07.2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (Juiz ELIANA DE ALMEIDA PINTO), no processo judicial n.º 641/16.4BELRA, outra de 05.08.2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela (Juiz TELMA MARTINS DA SILVA), no processo judicial n.º 175/16.7BEMDL, outras três, de 12.08.2016, proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (Unidade Orgânica 1 – Juiz FILIPE VERÍSSIMO DUARTE), nos processos judiciais n.º 770/16.4BELRA, 742/16.9BELRA e 613/16.9BELRA, outra de 25.08.2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (Juiz ANA PAULA MARTINS), no processo judicial n.º 1063/16.2BEBRG, e outras três de 31.08.2016, 19.09.2016 e 26.09.2016, proferidas pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (Juiz ANA ESTIMA), nos processos judiciais n.º 670/16.8BEAVR, 584/16.1BEAVR e 799/16.2BEAVR, outra de 27.09.2016, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (Juiz MARA MAGALHÃES SILVEIRA), no processo judicial n.º 1296/16.1BEBRG, outra do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (Juiz INÊS GUEDES DE ABREU), no processo judicial n.º 620/16.1BEAVR, duas últimas de 29.09.2016, também do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro (Juiz FILIPA SOUSA REGADO), nos processos judiciais n.º 625/16.2BEAVR e 574/16.4BEAVR, outra de 13.10.2016, do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (Unidade Orgânica 1 – Juiz JORGE PELICANO), no processo judicial n.º 1582/16.0BELSB, outra de 14.10.2016 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (Unidade Orgânica 1 – Juiz JOÃO EVANGELISTA FONSECA), no processo judicial n.º 473/16.0BECBR, outra de 21.10.2016 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (Unidade Orgânica 1 – Juiz MARIA ANA FERRAZ), no processo judicial n.º 892/16.1BELRA, outra de 10.11.2016 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (Juiz JORGE COSTA), no processo judicial n.º 1079/16.9BEBRG; outra de 14.11.2016, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga (Juiz DIANA FERNANDES DA SILVA), no processo judicial n.º 1155/16.1BEBRG; outra de 05.12.2016, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (Juiz QUINTINO LOPES FERREIRA), no processo judicial n.º 1862/16.3BELSB, outra de 09.03.2017, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (Juiz TERESA ALMEIDA), no processo judicial n.º 1788/16.2BELSB, e uma derradeira de 26.04.2017 também do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa (Juiz ANABELA ARAÚJO), no processo judicial n.º 1740/16.8BELSB.

E) Havendo quinze acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, confirmado onze destas Sentenças, e revogado três Sentenças contrárias, por ilegalidade, a saber, três acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 07.10.2016 (Relatores: FREDERICO MACEDO BRANCO e FERNANDA BRANDÃO), um acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 04.11.2016 (Relator: JOAQUIM CRUZEIRO), um acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 18.11.2016 (Relator: MACEDO BRANCO), três acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 16.12.2016 (Relatores: ALEXANDRA ALENDOURO e MIGUÉIS GARCIA), três acórdãos do Tribunal Central Administrativo Norte, de 13.01.2017 (Relatores: ALEXANDRA ALENDOURO e MIGUÉIS GARCIA), um acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 27.01.2017 (Relator: FERNANDA BRANDÃO), um acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 02.02.2017 (Relator: MARCHÃO MARQUES), um acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 10.03.2017 (Relator: MIGUÉIS GARCIA), e, um acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 24.03.2017 (Relator: ROGÉRIO MARTINS),

F) E um acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 12.01.2017 (Relator: CARLOS ARAÚJO), e dois acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19.01.2017 (Relator: FERREIRA CANELAS), igualmente confirmado outras três Sentenças Judiciais objecto de recurso.

G) Não existe uma única decisão judicial em sentido contrário transitada em julgado no ordenamento jurídico português, sendo todavia a Sentença objecto de recurso cópia servil da Sentença proferida pelo TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA, 3.ª Unidade Orgânica, no processo n.º 781/16.0BEAVR (Juiz: Carla Pereira Portela), a qual foi objecto de recurso pela Recorrente para o Tribunal Central Administrativo Sul.

H) O logro dos fundamentos para aplicação do disposto no art. 121.º do CPTA é evidente, sendo desde logo contraditório com o indeferimento do decretamento provisório da providência cautelar, decretado em 09.01.2017, pelo mesmo Juiz de Direito, bem como pela complexidade das questões (reconhecida pelo próprio Tribunal).

I) Tal retira-se, ainda, da necessidade de prova constituenda formulada pela própria Recorrida.

J) Em síntese, e seguindo o ensinamento de VIEIRA DE ANDRADE, não se verificam os pressupostos processuais contidos no art. 121.º do CPTA,

K) Razão pela qual a esmagadora maioria dos pedidos de aplicação do art. 121.º do CPTA no mesmo âmbito foram até ao momento rejeitados pelos Tribunais de 1.ª Instância, sendo a única decisão de 1.ª Instância em sentido contrário apreciada pelos Tribunais superiores revogada por douto acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 10.03.2017 (Relator: MIGUÉIS GARCIA), no processo n.º 357/16.1BECBR, o qual foi confirmado por acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo, de 08.06.2017.

L) Assim, a decisão judicial é ilegal e deve ser objecto de necessária revogação, com anulação dos subsequentes trâmites processuais.

M) Com o fito de produzir uma decisão judicial imediata, o Tribunal a quo acabou – como o próprio reconhece, por apreciar apenas única “questão de direito”, ou seja, o mesmo não conheceu da totalidade do pedido formulado pelo Requerente / Autor.

N) Dispõe o art. 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, que “é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”, idêntica orientação se retirando do disposto no art. 95.º, n.º 1, do CPTA, consoante o douto Tribunal Central Administrativo Sul não pode deixar de reconhecer.

O) Em simultâneo, ao condenar na homologação de turmas, o Tribunal a quo condena em pedido que não foi, em momento algum, formulado judicialmente pela Recorrida.

P) Dispõe o art. 615.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Civil, que “é nula a sentença quando o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido”, idêntica orientação se retirando do disposto no art. 95.º, n.º 2, do CPTA, nulidade que expressamente se invoca.

Q) Em cúmulo, apenas no momento da Sentença foi a competência do Tribunal por si apreciada, não existindo trânsito em julgado de qualquer decisão judicial sobre o tema, consoante resulta dos arts. 102.º e 644.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Civil.

R) A decisão a este respeito proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa não foi sequer levada ab initio ao conhecimento da Recorrente, sendo que a mesma arguiu tempestivamente a incompetência do Tribunal a quo, e este, ao invés de definir a sua competência, procedeu como se a sua própria competência tivesse sido – ou devesse ser – definida por outro Tribunal,

S) Pelo que … a Recorrente deveria ter promovido nos presentes autos … um recurso autónomo de uma decisão de outro Tribunal (!).

T) O absurdo jurídico é evidente: não houve qualquer decisão transitada em julgado do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que decidisse a questão da sua competência e da qual a Recorrente pudesse, em rigor, não recorrer, mas reclamar – cfr. o art. 105.º, n.º 1 e 4, do Código de Processo Civil.

U) A ser aceite tal solução, o Juiz João Evangelista Fonseca haveria eliminado do ordenamento jurídico português a figura do “conflito de competência” através da criação de uma nova categoria dogmática: a “competência judicial heterodeterminada por Tribunal de igual hierarquia”.

V) O Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra é incompetente para o conhecimento do presente litígio, atento os arts. 19.º, n.º 2, e 20.º, n.º 6, do CPTA, e a Cláusula 8.ª do Contrato de Associação, pelo que, também por esta via, a decisão judicial tomada não pode deixar de se ter por revogada, com anulação de todos os termos processuais posteriores.

W) Havendo o Tribunal a quo recusado a produção de qualquer prova (e, necessariamente, contraprova no mesmo âmbito), o certo é que não foi em momento algum dado como provado um elemento essencial no presente âmbito: a existência de turmas constituídas ou a constituir por parte da Requerente, o que desde logo impossibilita a existência de qualquer condenação no mesmo âmbito.

X) Não se verifica o requisito contido no art. 120.º, n.º 1, do CPTA, a respeito do fumus boni iuris, muito menos se podendo considerar existir fundamento substantivo para um condenação sumária, como a realizada pelo Tribunal a quo.

Y) Apenas é admissível que tal contrato seja perspetivado a respeito do ciclo de ensino que se iniciou no ano letivo de 2015/2016 e que terminará em 2017/2018, e não a respeito de outros ciclos de ensino.

Z) Tal resulta, desde logo, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de junho, maxime: 1) do fundamento da celebração dos contratos de associação: “necessidade de garantir a oferta educativa aos alunos” – cfr. o art. 3.º, n.º 1, da Portaria; 2) da periodicidade trienal e não quinquenal do procedimento administrativo – cfr., novamente, o art. 3.º, n.º 1, da Portaria; 3) da possibilidade de, excepcionalmente, no decurso do triénio, ser autorizado novo procedimento administrativo – cfr. o art. 3.º, n.º 2, da Portaria; 4) de apenas desse modo serem inteligíveis as vicissitudes contratuais, necessariamente distintas, de extensão e renovação de contratos de associação – cfr. os arts. 1.º, n.º 2, 9.º, n.º 6, e 15.º da Portaria; 5) de ser fixada uma duração trienal ao contrato, sendo afastada qualquer sobrevigência do mesmo – cfr. o art. 9.º, n.º 2, alínea e) da Portaria; e 6) da renovação de contratos de associação ter por base, o “ano letivo seguinte”, e não os “anos letivos seguintes” – cfr. o art. 15.º, n.º 3, alínea a), da Portaria.

AA) A Sentença recorrida viola, assim, o art.º 17.º, n.º 3 do EEPC e toda a normatividade positivada na Portaria n.º 172-A/2015 que se reporta, sempre e só, à possibilidade de contratar apenas um ciclo de ensino e não vários ciclos de ensino no mesmo procedimento contratual ditando, neste sentido expressamente: o n.º 2 do artigo 1.º; o n.º 1 do artigo 3.º; o n.º 6 do artigo 9.º; o n.º 2 do artigo 13.º; o n.º 1 do artigo 22.º; o n.º 2 da Cláusula 2.ª do Anexo I (minuta do contrato); o n.º 2 da Cláusula 3.ª do Anexo I (minuta do contrato).

BB) Por outra via, do art. 13.º, n.º 2, da Portaria apenas poderá resultar, consoante do reconhecido no Parecer n.º 11/2016 do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, de 25.05.2016, homologado pela Senhora Secretária de Estado Adjunta e da Educação em 27.05.2016 e publicado no Diário da República, 2.ª série, n.º 105, 2.ª Série, I Suplemento, de 01.06.2016, ao abrigo do art. 43.º da Lei n.º 47/86, de 15 de Outubro, uma eventual extensão dos seus efeitos a ciclos de ensino bianuais (5.º e 6.º anos) que, eventualmente, se tenham iniciado no decurso da sua vigência, sendo que a mesma norma nem sequer impõe tal factualidade, ou seja, que tais ciclos devam necessariamente existir.

CC) Isso mesmo foi, aliás, já reconhecido pela Sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa de 13.10.2016, no processo judicial n.º 1582/16.0BELSB (Juiz JORGE PELICANO), bem como pela Sentença do Tribunal Administrativo de Círculo Lisboa de 26.04.2017, no processo judicial n.º 1740/16.8BELSB (Juiz: ANABELA ARAÚJO).

DD) O denominado “argumento aritmético” é, em rigor, inexistente: na interpretação da Recorrida – lamentavelmente sancionada pelo Tribunal de 1.ª Instância – o contrato de associação deveria porém estabelecer que seriam 15 e não 6 as turmas a constituir, atenta as continuidades das turmas nos anos letivos seguintes, pelo que a sentença recorrida com tal interpretação incorre em violação do princípio da unidade da despesa pública/ proibição de não fracionamento da despesa.

EE) O referido contrato de associação produziria igualmente efeitos, não de 01.09.2015 a 31.08.2018, mas antes de 01.09.2015 a 31.08.2020, e deveria prever, na Cláusula 2.ª, n.º 1, alínea c), a obrigação de pagamento do primeiro outorgante na ordem de € 1.207.500,00, pelo que a Sentença recorrida com tal interpretação incorre em violação do principio da transparência e da publicidade da despesa pública.

FF) O n.º 2 do art. 17.º do EEPC impõe a obrigação do Estado de “assegurar a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino pelas turmas ou alunos por ele abrangidas” pelo que a interpretação que surge como objetivamente razoável e tecnicamente correta é aquela que permite, através do mesmo título contratual, garantir o apoio financeiro de todo um ciclo de ensino, objeto do contrato.

GG) Não se vê como boa técnica jurídica titular a contratação do(s) primeiro(s) ano(s) de determinado(s) ciclo(s) de ensino, sujeitar a mesma contratação a fiscalização prévia do Tribunal de Contas e deixar sem qualquer suporte regulamentar, contratual ou financeiro, os anos escolares subsequentes.

HH) Tal representaria deixar fora do contrato cerca de dois terços das prestações principais visadas e dois terços do respetivo preço contratual. Ora tal não é razoável do ponto de vista legal e técnico-jurídico nem do ponto de vista da formalização das vontades negociais.

II) Porque a despesa é inteiramente previsível, e o seu fracionamento está expressamente vedado pelo art. 16.º do Decreto-Lei n.º 197/99 (autorização de despesa), e pelo n.º 2 do art. 48.º da Lei n.º 98/97 (Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas) aquela interpretação não é admissível.

JJ) A interpretação que vingou na Sentença recorrida corresponde a uma artificiosa divisão de contratos, com a inerente artificiosa divisão da despesa, inadmissível à luz das regras enformadoras do princípio da unidade da despesa.

KK) A entidade pública no momento da contratação tem a obrigação de incluir no contrato todas as prestações (inícios de ciclo e continuidades) que se encontrarem finalisticamente orientadas para o mesmo propósito e tanto mais se inteiramente previsíveis por legalmente determinadas.

LL) Verifica-se, assim, na orientação jurisprudencialmente acolhida, violação do art. 16.º do Decreto-Lei n.º 197/99 (autorização de despesa), do n.º 2 do art. 48.º da Lei n.º 98/97 (Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas), do art. 11.º do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de julho (regime de administração financeira do Estado), dos arts. 5.º, n.º 3, 6.º, n.º 2, 9.º, n.º 2, e 13.º da Lei n.º 8/2012, de 21 de fevereiro (vulgo “Lei dos compromissos”), e do art. 7.º, n.º 3, e 13.º do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho, no que respeita ao princípio da unidade da despesa associada a tais contratos de associação.

MM) Violar-se-ia ainda, e grosseiramente, o princípio da transparência (cfr. o art. 3.º, n.º 3 da Portaria n.º 172-A/2015), bem como as exigências impostas pelas normas de execução do Orçamento de Estado para 2015 que exigem a publicidade dos encargos plurianuais (cfr. o art. 5.º da Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto – Lei de Enquadramento Orçamental).

NN) A unidade contratual legalmente imposta determina a unidade da despesa, sendo indevido o fracionamento da mesma, pois deve obrigatoriamente considerar-se “o valor global dos atos e contratos que estejam ou aparentem estar relacionados entre si”, pelo que a Sentença recorrida com a interpretação acolhida viola o disposto no n.º 2 do art 48.º da Lei n.º 98/97.

OO) O apoio financeiro às turmas de continuidade não corresponde a uma necessidade súbita, e, mesmo que o fosse, não justificaria a omissão de tal encargo financeiro no contrato de associação, consoante já reconhecido pelo ac. n.º 33/2013, de 12 de dezembro, do Tribunal de Contas.

PP) A interpretação contratual correctiva proposta na Sentença tem por consequência, no limite, que os compromissos – legalmente vinculados, sublinhamo-lo – de apoio financeiro às turmas de continuidade, não foram inscritos no suporte informático central da Direção Geral do Orçamento, mas apenas os “pretendidos” inícios de ciclo, o que determinaria a sua nulidade nos termos do disposto no n.º 3 do art. 5.º da Lei n.º 8/2012, e no n.º 3 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 127/2012.

QQ) Normas financeiras que, nos termos do art. 13.º (prevalência) da mesma Lei n.º 8/2012 [têm] natureza imperativa, prevalecendo sobre quaisquer outras normas legais ou convencionais, especiais ou excecionais, que disponham em sentido contrário”.

RR) Prevalecendo os princípios da interpretação conforme à Lei e do aproveitamento dos actos e contratos da administração pública, é inelutável que a decisão judicial recorrida seja revogada, prevalecendo a interpretação preconizada pela Recorrente, a qual respeita concomitantemente o art.º 17.º, n,º 2 do EEPC, ao garantir no texto contratual o apoio financeiro às turmas que iniciaram o seu ciclo de ensino em 2015/2016 e às mesmas turmas na sua continuidade de ciclo, permitindo assim a validade do negócio jurídico, dentro do respetivo prazo contratual e com respeito pelo valor máximo do compromisso publicamente registado em conformidade com as regras de execução orçamental e de assunção de compromissos por entidades públicas.

SS) A Recorrida não pode, sequer, invocar qualquer expetativa contratual em sentido contrário: toda a contratação anterior possuiu uma base anual, sendo o fenómeno de sobrevigência contratual – com distinta natureza jurídica de pós-eficácia contratual – excepcional.

TT) As Portarias são, em termos técnicos, Regulamentos Administrativos, e não Contratos entre Ministérios e Associações representativas do Sector, não existindo qualquer negociação prévia à Portaria que deva ser considerada em termos interpretativos, porque, pura e simplesmente, a Portaria é um ato normativo unilateral, heteronomamente imposto aos seus destinatários, e não um ato de autonomia privada.

UU) Foram violados pela Sentença proferida todos os arts. referidos nas precedentes Conclusões.

Nestes termos, e nos demais de Direito julgados aplicáveis, deverá ser concedido provimento ao presente recurso de Apelação interposto pelo Recorrente, sendo:

a) Revogada a decisão judicial de aplicação do disposto no art. 121.º do CPTA, com anulação de todos os trâmites processuais subsequentes; subsidiariamente,

b) Revogada a Sentença Judicial por nulidade da mesma, atento o disposto nos arts. 615.º, n.º 1, alíneas d) e e), e 95.º, n.ºs 1 e 2, do CPTA; subsidiariamente ainda

c) Revogada a Sentença Judicial por incompetência territorial do Tribunal, com anulação de todos os trâmites processuais subsequentes; e

d) Revogada a Sentença por manifestos erros de julgamento, objecto de elenco integral nas conclusões supra apresentadas (…)”

*
Nas alegações de recurso, o Recorrente ESTADO PORTUGUÊS, representado pelo Ministério Público, formulou as seguintes CONCLUSÕES:
“1 - Na sentença Judicial datada de 16.05.2017 [02.06.17], agora em crise o Mmº Juiz decidiu: a) - “reconhecer que, nos termos da cláusula 1.º do contrato de associação, celebrado entre a Requerente e o Estado português em 20 de Agosto de 2015, contratou-se o número de turmas de início de ciclo em cada ano lectivo de vigência do contrato”;
b) - “condenar o Ministério da Educação a homologar as turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade que a Requerente constitua em observância das normas legais aplicáveis á constituição de turmas, até ao limite de 10 (dez) turmas de 5.º ano de escolaridade, 9 (nove) turmas de 7.º ano de escolaridade e 9 (nove) turmas de 10.º ano de escolaridade, em cada um dos anos lectivos de 2016/2017 e 2017/2018, bem como as turmas de continuidade até à conclusão dos ciclos de ensino iniciados em cada um dos anos lectivos de vigência do contrato”, e,
c) - “condenar o Estado Português a financiar as turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade a funcionar no estabelecimento da Requerente no ano lectivo de 2016/2017, que, por reunirem os requisitos legais, venham a ser homologadas pelo Ministério da Educação, e as turmas de 5.º, 7.º e 10.º anos de escolaridade que venham a ser validamente constituídas e homologadas no ano lectivo de 2017/2018, até ao limite de 10 (dez) turmas de 5.º ano de escolaridade, 9 (nove) turmas de 7.º ano de escolaridade e 9 (nove) turmas de 10.º ano de escolaridade, em cada um dos anos lectivos de 2016/2017 e 2017/2’18, bem como as turmas de continuidade até á conclusão dos ciclos de ensino iniciados em cada um dos anos lectivos de vigência do contrato‖,

2 - A não audição de uma das partes em juízo sobre a antecipação da decisão no processo cautelar conforme dispõe o art. 121º, nº1 do CPTA implica nulidade de toda a tramitação subsequente com baixa dos autos ao abrigo do art.195º, nº1 e 2 do CPC.

3 – Foi decidido antecipar nestes autos de natureza cautelar a decisão sobre a acção principal, atento o art. 121º do CPTA.

4 – Todavia, já havia sido proferido Despacho Judicial proferido em 16.09.2016 a indeferir o decretamento provisório, onde ficou exarado não haver uma especial urgência para o efeito, assim como ficou afastada a simplicidade do caso e a instrução completa nos mesmos, (sendo a complexidade reconhecida pelo próprio Tribunal) donde se deve concluir que não estão verificados os pressupostos para a aplicação do art. 121º do CPTA.

5 – Na linha do Acórdão proferido no TACN em 10.03.2017, no Proc 357/15.BECBR já havia sido registado que a antecipação da decisão no processo cautelar não deverá ser regra, mas excepção, vindo a ser indeferida tal possibilidade, com baixa dos autos, tendo sido negada revista a este Acórdão no recente Recurso nº 569/17, de 08.06.2017, proferido no STA.

6 – Nesta matéria há já várias sentenças que vieram acolher a improcedência de tais pedidos, apresentados nos processos cautelares, dada a natureza excepcional na aplicabilidade do art. 121º do CPTA (cfr. Ac. do TCAN, de 18.03.2011, proc. nº01924/10.2BEPRT).

7 – Assim tal decisão é ilegal e deverá ser revogada, com anulação dos subsequentes actos processuais.

8 – Ainda, na sentença foi apenas analisada e decidida uma questão de direito, conforme o próprio Mmº Juiz recorrido reconhece, não tendo conhecido dos restantes pedidos apresentados pelo Autor.

9 – Tal situação implicará nos termos do art. 615º, nº1 d) do CPC a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, conforme ainda art. 95º, nº1 do CPTA, nulidade que se invoca.

10 – Na sentença foi indeferida a excepção dilatória alegada pelo R/Estado Português sobre a ilegitimidade passiva do mesmo, ao arrepio dosa arts.8º-A, nº3, 10º, nº2 e 7 do NCPTA.

11 – Com efeito, em disposição inovatória relativamente ao anterior, foi estabelecido no art. 8º-A, nº3 do NCPTA, que para além dos demais casos estabelecidos na lei processual civil, os ministérios e os órgãos da Administração Pública têm personalidade judiciária correspondente à legitimidade activa e passiva que lhe é conferida pelo presente Código.

12 E, no preceito relativo à legitimidade passiva (art.10º do CPTA), depois da enunciação da regra geral do seu nº1, continuou a estabelecer o nº2 – excepção àquela regra geral – que nos processos intentados contra entidades públicas, parte demandada é a pessoa colectiva de direito público, salvo nos processos contra o Estado (…) que se reportem à acção ou omissão de órgãos dos respectivos ministérios (…), em que parte demandada é o ministério ou ministérios (…), a cujos órgãos sejam imputáveis os actos praticados ou sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os actos jurídicos ou observar os comportamentos pretendidos.

13 – Devendo este preceito legal continuar a ser interpretado restritamente para abranger as situações em que a Administração actue no âmbito das suas prerrogativas de autoridade, assim se excluindo, à semelhança do que sucedia no regime anterior, as situações em que a Administração intervém em posição tendencialmente paritária e despida daquelas prerrogativas (acções de contratos e de responsabilidade civil extracontratual do Estado).

14 – Pois que, apesar de actualmente não existir a expressa especificação que a estas era anteriormente efectuada na primeira parte do nº 2 do art. 11º do anterior CPTA (que mais não era do que a reafirmação da regra geral do art.10º, nº1 e da primeira parte do nº2, e da consequente representação do Estado pelo Ministério Público), o certo é que no actual CPTA, foi mantida, no essencial, a redacção da excepção consagrada no art.10º, nº2, 2ª parte, continuando, assim a valer a doutrina e jurisprudência anteriormente firmada a esse respeito – v.g. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernando Cadilha, in Comentário ao CPTA, Almedina, 3ª edição revista, 2010, págs. 85 e 86, Acórdãos do TCAN DE 21/02/2008, proc. nº 339/06.0BEBRG-A e de 222.02.2007, proc. nº 02242/04.0BEPRT.

15 – Ora, no caso dos autos, é manifesto que tanto o pedido principal, como os pedidos subsequentes, se enquadram no âmbito da excepção no art. 10º, nº2, 2ª parte do CPTA. Reportando-se, tanto num caso como nos outros à acção ou omissão de órgãos do ministério demandado.

16 – Dito de outra forma, daqui resulta sem dúvida que a legitimidade passiva para os pedidos de condenação formulados pela Autora caberá ao próprio Ministério da Educação, enquanto o ministério sobre cujos órgãos recaia o dever de praticar os actos jurídicos ou observar dos comportamentos pretendidos‖.

17 Cabendo-lhe, ainda, consequentemente, a legitimidade passiva para os pedidos formulados sobre os pontos 3), 4) e 5) dos pedidos, que com os antecedentes 1), 2) foram cumulados, nos termos e por força do disposto no art. 10º, nº7 do NCPTA, que veio agora estabelecer expressamente, em conformidade com a doutrina e jurisprudência que se foi anteriormente formando na matéria, que quando o pedido principal deva ser deduzido contra um Ministério, este também tem legitimidade passiva em relação aos pedidos que com aquele sejam cumulados.

18Assim, e por força da extensão da personalidade judiciária e da legitimidade passivas que resultam expressamente do disposto nos arts. 8º-A, nº3, 10, nº2, 2ª parte e nº7, do NCPTA, deveria ter sido demandado, apenas e tão só, o indicado Ministério da Educação, e não também a pessoa colectiva Estado Português, representado pelo Ministério Público.

19 – Todavia, diga-se ainda que o Mmº Juiz recorrido refere na sentença sobre tal matéria que “No que respeita aos pedidos deduzidos contra o Estado Português, não estamos perante qualquer situação unilateral em que a Administração tenha feito uso de poderes de autoridade, mas sim perante matéria contratual; estamos perante pedidos relativos à interpretação e execução de um contrato outorgado entre o ora Requerente e o Estado Português, pelo que este é parte legítima nos presentes autos, nos termos dos artigos 10º, nºs 1 e 2, 77º-A, nº3 a) e 112º, nº1 todos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.”

20 Concluindo, afinal, em contradição com o acima exarado (sublinhado nosso) pela condenação do Ministério da Educação a proferir essa estatuição autoritária, ou seja, a proferir acto administrativo (...) a homologar as turmas de 5º e 7º anos de escolaridade que a Requerente constitua em observância das normas legais aplicáveis à constituição de turmas, até ao limite de seis turmas, sendo duas no ano de início do 2º CEB, o 5º ano de escolaridade, e demais distribuídas por cada um dos anos 6º, 7º, 8º e 9º anos de escolaridade, em cada um dos anos lectivos de 2015/2016, 2016/2017 e 9º anos de escolaridade, em cada um dos anos lectivos de 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018, bem como as turmas de continuidade até á conclusão dos ciclos de ensino iniciados em cada um dos anos lectivos de vigência do contrato;

21 Pelo exposto, ou se entende que o Ministério se apresenta com poderes de autoridade e em que a Administração tenho feito uso de tais poderes, o que à partida o Mmº Juiz a quo entende que não, conforme vem exarado na sua sentença recorrida, argumento que vai no sentido do Estado ser parte legítima.

Ou não, e assim sendo não se compreende a condenação do Ministério a proferir esse acto administrativo de homologação, pois nesse caso ter-se-ia que concluir pela ilegitimidade passiva do Estado. Como se considera que deveria ter acontecido, nos termos e por força do art. 10º, nº 7, do CPTA.

22 – Em suma, não se entende a condenação do Estado nos termos em que o foi devendo sim ter sido alvo de condenação, apenas e tão só, o Ministério da Educação, conforme acima o explanámos, esse sim, o Organismo que actuou com poderes de autoridade e, como tal responsável pelos actos que praticou neste âmbito e que agora estão a ser analisados, conforme vem referido na sentença, agora em crise.

23 – Devendo, pelo exposto, considerar-se que o Réu Estado Português é parte ilegítima na presente acção, com a sua absolvição da instância, nos termos do disposto no art. 89º, nº2 e nº4 do NCPTA (cfr. ainda arts. 278º, nº1 d), 576º, nº2 e 577º, e) do CPC), sendo nesta parte ser revogada a sentença e substituída por outra neste sentido, em conformidade com as normas legais citadas que foram violadas, porque não seguidas.

24 – No que concerne ao litígio refere o Mmº Juiz “a quo” que a questão essencial se prende em apurar se o contrato celebrado entre a requerente e o Estado Português, em 20 de Agosto de 2015, confere o direito de iniciar novos ciclos de ensino nos anos lectivos 2016/2017, e 2017/2018, como quer fazer crer a Requerente, ou apenas o direito de completar os ciclos de ensino iniciados em 2015/2016, conforme é entendimento do Ministério da Educação e do Estado Português.

25 – Afigura-se-nos que tal contrato apenas confere à requerente o direito de completar os ciclos de ensino iniciados no ano lectivo de 2015/2016, desde logo como tal resulta da Portaria nº172-A/2015, de 05 de Junho quando alude no art. 3º, nº1 sobre os fundamentos da celebração de contratos de associação: “necessidade de garantir a oferta educativa aos alunos”; Ou da mesma norma legal sobre a periocidade trienal e não quinquenal do procedimento administrativo - (cfr. art.3º, nº1); Ou da possibilidade de, excepcionalmente, no decurso do triénio, ser autorizado novo procedimento administrativo – art. 3º, nº2 da Portaria; Ou de apenas desse modo serem inteligíveis as vicissitudes contratuais, necessariamente distintas, de extensão e renovação de contratos de associação – cfr. os arts. 1º, nº 9º, nº6 e 15º da Portaria; ou ainda de ser fixada uma duração trienal ao contrato, sendo afastada qualquer sobrevigência do mesmo – cfr. os arts.9º, nº2 e) da Portaria, e, finalmente sobre a renovação de contratos de associação ter por base o “ano lectivo seguinte”, e não “os anos lectivos seguintes” – cfr. art.15º, nº3 da Portaria.

26 Diga-se ainda que do art.13º, nº2 da Portaria tão só se retira conforme reconhecido no Parecer nº11/2016 do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, de 25.05.2016, uma eventual extensão dos seus efeitos a ciclos de ensino bianuais (5º e 6º anos) que, eventualmente se tenham iniciado no decurso da sua vigência, sendo que a norma nem sequer impõe que tais ciclos devam ou tenham que existir.

27 – Tal foi o entendimento da Sentença do Tribunal Administrativo de Círculo Lisboa de 26.04.2017, no processo judicial n.º 1740/16.8BELSB (Juiz: ANABELA ARAÚJO): “limitando-se o novo regime a assegurar a continuidade dos estudos alunos que se encontram a meio dos ciclos”, não estando em causa “as necessidades da Recorrente, mas as necessidades do serviço de ensino público”, concluindo-se pela existência de “fumus malus”.

28 – Dito de outra forma, é inquestionável que o contrato de associação celebrado entre Recorrida e Recorrente diz respeito, apenas e só, a um ciclo de ensino, e não a vários ciclos de ensino, ou seja, diz respeito ao ciclo de ensino que se iniciou no ano lectivo de 2015/2016 e que terminará em 2017/2018.

29 – A sentença recorrida viola assim o art.º 17.º, n.º 3 do EEPC e toda a normatividade positivada na Portaria n.º 172-A/2015 que se reporta, sempre e só, à possibilidade de contratar apenas um ciclo de ensino e não vários ciclos de ensino no mesmo procedimento contratual ditando, neste sentido expressamente: o n.º 2 do artigo 1.º; o n.º 1 do artigo 3.º; o n.º 6 do artigo 9.; o n.º 2 do artigo 13.º; o n.º 1 do artigo 22.º; o n.º 2 da Cláusula 2.ª do Anexo I (minuta do contrato); o n.º 2 da Cláusula 3.ª do Anexo I (minuta do contrato).

30 – No que concerne ao argumento “matemático” expendido na sentença, agora em crise, entendemos que será de afastar, já que em primeiro lugar não se encontra estabelecido no contrato, conforme vem definido, e resultaria que o contrato de associação produzisse efeitos não de 01.09.2015 a 31.08.2018, mas a 01.09.2015 a 31.08.2020.

31 – Aliás, a Portaria n.º 172-A/2015 não regulamenta expressamente, não menciona sequer e nem apresenta qualquer minuta que vise titular o apoio financeiro ao que comummente se designam as “continuidades” previstas no n.º 2 do artigo 17.º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, e no regime transitório o art. 22.º da Portaria n.º 172-A/2015 assegura que os contratos de associação em vigor à data da publicação da mesma consideram-se em execução até ao final do respectivo ciclo.

32 – Não obstante, quanto aos novos contratos a celebrar ao seu abrigo, nenhuma palavra é dita sobre como dar cumprimento ao preceituado no n.º 2 do art. 17.º do EEPC, impondo este preceito a obrigação do Estado de “assegurar a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino pelas turmas ou alunos por ele abrangidas” a interpretação que surge como objetivamente razoável e tecnicamente correta é aquela que permite, através do mesmo título contratual, garantir o apoio financeiro de todo um ciclo de ensino, objecto do contrato.

33 – Com efeito, não se vislumbra como boa técnica jurídica titular a contratação do(s) primeiro(s) ano(s) de determinado(s) ciclo(s) de ensino, sujeitar a mesma contratação a fiscalização prévia do Tribunal de Contas e deixar sem qualquer suporte regulamentar, contratual ou financeiro, os anos escolares subsequentes, o que representaria deixar fora do contrato cerca de dois terços das prestações principais visadas e dois terços do respetivo preço contratual. Ora tal não é razoável do ponto de vista legal e técnico-jurídico nem do ponto de vista da formalização das vontades negociais.

34 – Ainda a Resolução de Conselho de Ministros n.º 42-A/2015, de 19.06.2015, constitui uma simples autorização de despesa nos termos e para os efeitos previstos no Decreto-Lei n.º 197/99: não configura qualquer obrigação contratual de realização da mesma despesa.

35 – Ou seja, violação do art. 16.º do Decreto-Lei n.º 197/99 (autorização de despesa), do n.º 2 do art. 48.º da Lei n.º 98/97 (Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas), do art. 11.º do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de julho (regime de administração financeira do Estado), dos arts. 5.º, n.º 3, 6.º, n.º 2, 9.º, n.º 2, e 13.º da Lei n.º 8/2012, de 21 de fevereiro (vulgo “Lei dos compromissos”), e do art. 7.º, n.º 3, e 13.º do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho.

36 – O Decreto-Lei n.º 36/2015, que estabelece as disposições necessárias à execução do Orçamento de Estado para 2015, “reforça a necessidade de garantir um efectivo e rigoroso controlo da execução orçamental, pois dele depende a boa aplicação da política definida no Orçamento do Estado para 2015, e o cumprimento das metas orçamentais estabelecidas”.

37 – Ora, impõem as regras gerais de autorização de despesa pública que “a despesa a considerar é a do custo total da locação ou da aquisição de bens e serviços” e ainda que é “proibido o fraccionamento da despesa com a intenção de a subtrair ao regime previsto no presente diploma” (cfr. o art. 16.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de junho, em vigor ex vi da Resolução da Assembleia da República n.º 86/2011).

38 – No mesmo sentido, a Lei n.º 98/97, de 26 de agosto, que aprovou a Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas, impõe, na alínea b) do n.º 1 do seu artigo 46.º que “estão sujeitos à fiscalização prévia do Tribunal de Contas (…) os contratos de obras públicas, aquisição de bens e serviços, bem como outras aquisições patrimoniais que impliquem despesa nos termos do art.º 48.º, quando reduzidos a escrito por força da lei.” e que “para efeitos da dispensa no número anterior [fiscalização prévia], considera-se o valor global dos atos e contratos que estejam ou aparentem estar relacionados entre si.” (cfr. n.º 2 do artigo 48.º da Lei n.º 98/97).

39 – Pelo exposto a interpretação recorrida é contrária às normas acima referidas, conduzindo a uma violação do princípio da unidade da despesa associada a tais contratos de associação.

40 – Com efeito é certo que o nº2 do art. 17º do EEPC obriga a que as turmas de continuidade sejam financiadas até à conclusão do respectivo ciclo; o que vai ao arrepio de tais normas é que o contrato de associação em causa abranja 3 (três) ciclos de ensino autónomo.

41 – Assim sendo, a unidade contratual legalmente imposta determina a unidade da despesa, sendo indevido o fraccionamento da mesma, pois deve obrigatoriamente considerar-se “o valor global dos actos e contratos que estejam ou aparentem estar relacionados entre si” (cfr. n.º 2 do artigo 48.º da Lei n.º 98/97).

42 – A interpretação que vingou na Sentença recorrida corresponderia a uma artificiosa divisão de contratos, com a inerente artificiosa divisão da despesa, inadmissível à luz das regras enformadoras do princípio da unidade da despesa.

43 – Porque a despesa é inteiramente previsível, e o seu fraccionamento está expressamente vedado pelo art. 16.º do Decreto-Lei n.º 197/99 (autorização de despesa), e pelo n.º 2 do art. 48.º da Lei n.º 98/97 (Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas) aquela interpretação não é admissível, nos termos legalmente vigentes, e conduziria a violações ao princípio da transparência, da unidade da despesa associada a tais contratos de associação.

44 – A interpretação preconizada pelo Recorrente, por sua vez, respeita concomitantemente o art. 17.º, n.º 2 do EEPC, e integralmente aquelas normas financeiras, ao garantir no texto contratual o apoio financeiro às turmas que iniciaram o seu ciclo de ensino em 2015/2016 e às mesmas turmas na sua continuidade de ciclo, não excedendo o valor máximo contratualmente previsto, nem o prazo contratual.

45 – Contrariamente ao determinado na sentença que violaria todas as disposições legais acima referidas.

46 – Pelo exposto houve erro de julgamento e por isso deve a Sentença ser revogada.

47 – E, consequentemente:

Deverá ser concedido provimento ao presente recurso e declarada:

a) A nulidade nos termos do art. 195º, nº1 do CPC, por omissão de audição do Ministério Público em representação do Estado Português conforme o dito art. 121º, nº1 do CPTA;

b) Revogada a decisão judicial por aplicação inadequada do art. 121º do CPTA, com anulação de todos os trâmites processuais;

c) Revogada a Sentença Judicial por nulidade da mesma por omissão de pronúncia, atento os arts. 615º, nº1 d) do CPC e 95º, nº1 do CPTA;

d) Revogada a decisão que Indeferiu por não provada a excepção dilatória da ilegitimidade passiva do Estado Português, e substituída por outra que a julgue verificada e consequentemente absolva o Réu/Estado Português da Instância atento os arts. 89º, nº2 e nº4 do NCPTA (cfr. ainda arts. 278º, nº1 d), 576º, nº2 e 577º, e) do CPC), e, sem prescindir,

e) Revogada a Sentença que condenou o Estado Português no pedido – al. c) e d), devendo ser substituída por outra que o absolva do pedido.

*
A Recorrida CENTRO DE DESENVOLVIMENTO EDUCATIVO DE C..., LDA apresentou contra-alegações e recurso subordinado.
*
Quanto às contra-alegações não formulou conclusões, impugnado as particulares questões colocadas nos recursos, concluindo que a sentença sub judice não merece qualquer reparo no que tange, em síntese, à antecipação da causa de pedir, à interpretação do contrato de associação de 20/08/2015 no sentido de conferir à Recorrida o direito de iniciar novos ciclos de ensino nos anos lectivos 2016/2017, e 2017/2018, e não apenas de completar os ciclos de ensino iniciados em 2015/2016, bem como ao número de turmas adicionais contratualizadas pelo contrato de associação de 29/7/2016, celebrado na sequência do procedimento excepcional de 2016.
*
Em alegações do recurso subordinado, a Recorrida conclui do seguinte modo:
1) O ato administrativo de não validação da turma B) do 5º ano de escolaridade, para 2016/2017, deve ser declarado nulo ou pelo menos anulado, por o mesmo ter sido exclusivamente fundamentado no facto de a 2ª turma do 5º ano de escolaridade exceder o número de turmas contratualizado, para 2016/2017, (fundamento que o tribunal de 1ª instância entendeu, e bem, não ser verdadeiro);

2)Deve igualmente o tribunal substituir-se ao ME e emitir desde já a necessária validação/homologação da turma A) do 7º ano de escolaridade (ato devido), para 2016/2017, por a turma em causa estar constituída regularmente e em funcionamento, mormente no que se refere ao número de alunos por turma com alunos com necessidades educativas especiais;

3) E concomitantemente deve igualmente o Estado Português ser desde já condenado a pagar € 80 500,00, por turma, acrescido dos juros de mora desde o vencimento de cada uma das prestações até efetivo e integral pagamento, tudo conforme peticionado.
Face ao exposto, e por tudo o mais que V. Exas. doutamente suprirão, deve ser negado provimento aos recursos do ME e do Estado Português, e deve ser dado provimento ao recurso subordinado da requerente/autora, com todas as consequências legais.”.

*
Em Contra-Alegações ao recurso subordinado, o Recorrente MP sustenta que o mesmo deve ser indeferido in totum, nos seguintes termos:

“Compulsada a sentença de 1ª instância proferida a 03 de junho de 2017, a mesma foi totalmente provida no sentido pretendido pelo ora Autor/Recorrente inexiste fundamento para este recurso subordinado agora interposto pelo ora Autor/Recorrente, nos termos do artigo 633º, nº 1 do CPC aplicável ex vi artigo 1º do CPTA.

Por outro lado, atenta a posição do ora Autor/Recorrente verificamos que o mesmo pretende agora neste recurso subordinado (a nulidade/anulabilidade) de atos. Logo, não se pode agora, pela janela, pretender aquilo que não se pediu, pela porta principal, pelo que este recurso subordinado não tem fundamento.

E consequentemente, deve ser considerado não procedente, por não provado, o pagamento de qualquer importância monetária a esse título, dado que carece de fundamento legal para o efeito.

No mais, fazemos nossas com a devida vénia as doutas contra-alegações do ME que vierem a ser produzidas, bem como o teor do seu douto requerimento, desde já, entrado no TCA Norte, em 07 de agosto de 2017, que para todos os efeitos legais se dão por integralmente reproduzido.”.

*
Em Contra-Alegações ao recurso subordinado o Recorrente ME sustenta que o mesmo deve ser liminarmente ser recusado, nos seguintes termos:

A) Recorrida não formulou no presente procedimento cautelar qualquer pedido de declaração de nulidade e/ou anulação de actos administrativos, motivo pelo qual não existe fundamento para a apreciação sequer, do Recurso subordinado por si apresentado

Não obstante,

B) O pedido de anulação de acto administrativo revela-se naturalmente extemporâneo, atento o disposto no art. 101 do CPTA.

C) O único fundamento empregue pela Recorrida na mesma sede – erro nos pressupostos de facto e de Direito — não determina, atento o disposto no art. 161.º do CPA a nulidade de qualquer acto administrativo, não havendo sido remotamente provado, ou sequer invocado tal putativo erro da administração.

D) Todos os actos praticados pela Administração foram devidamente fundamentados, sendo plenamente válidos e eficazes perante os seus destinatários.

E) Inexiste igualmente fundamento para a prática de qualquer "acto administrativo devido" pelo Tribunal a quo.

F) Nestes termos, e nos demais de Direito julgados aplicáveis, deverá liminarmente ser recusado provimento ao Recurso Subordinado apresentado pela Recorrida.

*

Com dispensa de vistos prévios, cumpre decidir.
**
II – QUESTÕES A DECIDIR:
Face às conclusões das alegações dos recursos apresentados pelos Recorrentes e do recurso subordinado apresentado pela Recorrida, delimitativas do respectivo objecto – cfr. artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA, 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do CPC ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA cabe apreciar e decidir, de imediato, as questões cuja verificação impeça o conhecimento de quaisquer outras (incompetência territorial do Tribunal a quo; nulidade processual por preterição do contraditório; erro de julgamento imputado à decisão de antecipação da causa de pedir) e, no caso da sua improcedência, os erros de julgamento assacados à decisão da causa principal pelos Recorrentes e pela Recorrida (no recurso subordinado).
***
III – FUNDAMENTAÇÃO
DE FACTO
Consta da sentença a quo:
“Com base nas posições assumidas pelas partes e documentos juntos aos autos, ficaram provados os seguintes factos:

1. Com data de 04 de junho de 1998, foi concedida à Requerente autorização definitiva para funcionamento de um estabelecimento de ensino particular e cooperativo denominado “Escola PT”, nas valências de Pré-Escolar, 1.º Ciclo do Ensino Básico, 2º Ciclo do Ensino Básico e 3.º Ciclo do Ensino Básico – cfr. fls. 115 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas, o mesmo se dizendo em relação às demais que seguem.

2. Por despacho do Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, proferido em 15/06/2015, nos termos do n.º 1, do artigo 5.°, da Portaria n.º 172-A/2015, de 5 de Junho, foi autorizada a abertura do concurso de atribuição de apoio financeiro do Estado destinado à seleção das entidades proprietárias dos estabelecimentos de ensino particular e cooperativo que, no âmbito do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de Novembro, que aprovou o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo (EEPC), reúnem as condições e requisitos necessários à celebração de contratos de associação - cfr. fls. 174 e ss. dos autos.

3. No Aviso de abertura do procedimento concursal refere-se que a atribuição de apoio financeiro é para os anos letivos 2015/2016,2016/2017 e 2017/2018 “tal como consignado no n.º 1 do art.º 3.° da Portaria n.0 172-A/2015, e anos subsequentes nos termos do número 2 do artigo 17.° do Decreto-Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro.

Em conformidade, salvaguardando os princípios da transparência, da igualdade e da concorrência, é aberto o procedimento concursal, fixando as regras e procedimentos aplicáveis à atribuição de apoio financeiro do Estado a estabelecimentos de ensino particular e cooperativo, garantindo a frequência de alunos em igualdade de circunstâncias da oferta pública e reconhecendo os referidos contratos de associação como fazendo parte das opções oferecidas às famílias no âmbito da sua liberdade de escolha no ensino do seu educando, nos termos definidos no EEPC.

É nesse quadro, e tomando em conta a oferta existente relativamente a contratos de associação, que se definem as áreas geográficas identificadas no anexo I ao presente aviso, do qual faz parte integrante, através da divisão territorial da freguesia. Concomitantemente, na definição do número de alunos e turmas a considerar no procedimento concursal agora aberto, foram considerados como referência os alunos e o número de turmas que têm integrado essa opção educativa nas áreas identificadas, nomeadamente nos anos iniciais de cada ciclo de escolaridade.

Assim, consta no anexo I, a definição das áreas geográficas, o número de turmas a concurso e os correspondentes ciclos de ensino. (...)” — cfr. fls. 174 e ss dos autos

4. No Anexo I, do referido Aviso consta:

Anexo I
Áreas Geográficas de implantação da oferta (1); número de turmas colocadas em concurso; ciclos de ensino e anos de escolaridade abrangidos
Áreas Geográficas de implantação da Oferta
Número de turmas em concurso por ciclo de ensino e ano de escolaridade
União de Freguesias / Freguesia(s)
2º ciclo
3º eido
Ensino
secundário
5º ano
7º ano
10º ano
(...)
C... e Pocariça, Cadima, Ourentã, Cordinhã (concelho de C...)
1
1
- cfr. fls, 181 verso e ss. dos autos.

5. Através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 42-A/2015, de 11 de junho de 2015, foi autorizada a realização da despesa respeitante aos apoios decorrentes da celebração de contratos de associação, relativa aos anos económicos de 2015 a 2020, correspondente a um máximo de 1740 turmas por cada ano letivo, com um valor anual de 80.500 EUR por turma, até ao montante global de 537 176 500,00 EUR — cfr. DR n.º 118/2015, Io Suplemento, Série I, de 2015-06-19.

6. Com data de 20 de agosto de 2015, entre o Estado Português, através da Direção geral da Administração Escolar e o Centro de Desenvolvimento Educativo de C..., titular da autorização de funcionamento para a Escola PT, foi celebrado Contrato de Associação, com a finalidade de possibilitar aos alunos a frequência de escolas do ensino particular e cooperativo em condições idênticas às verificadas no ensino ministrado nas escolas públicas, no respeito pela especificidade do respetivo projeto educativo, que aqui se dá por integralmente reproduzido e do qual se extrai o seguinte – cfr. fls. 157 e ss. dos auto (...)

Cláusula 1. Objeto
1 — O presente Contrato de Associação tem por objeto a concessão, pelo PRIMEIRO OUTORGANTE ao SEGUNDO OUTORGANTE, do apoio financeiro necessário à constituição do número máximo de 6 (seis) turmas, do 2.º CEB, 3.° CEB, a funcionarem no Escola PT, nos anos letivos de 2015/2016,2016/2017 e 2017/2018, nas mesmas condições de gratuitidade do ensino público.
2 — O apoio a conceder durante a execução do contrato é atribuído ao número de turmas que efetivamente venham a ser constituídas e validadas, em cada ano letivo.
Cláusula 2.ª
Obrigações do PRIMEIRO OUTORGANTE
(...)
c) Pagar ao segundo outorgante, através de transferência bancária o apoio financeiro contratado por este instrumento, no valor de € 483.000,00 (quatrocentos e oitenta e três mil euros), em prestações mensais, correspondente 6 turmas, relativo ao período de 1 de setembro de 2013 a 31 de agosto de 2018, para o número de identificação bancária (NIB) indicado pelo SEGUNDO OUTORGANTE;
(...)
2 - Nos termos do n.º 2 do artigo 17.° do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangido.
(...)
Cláusula 10.a
Produção de efeitos
Este contrato produz efeitos de 1 de setembro de 2013 a 31 de agosto de 2018” - cf. Fls. 157 e ss. dos autos).

7. Em 27/05/2016, a Secretária de Estado Adjunta e da Educação homologou, “nos termos e para os efeitos do art.° 43.°, n.º 1 do EMP”, o Parecer do Conselho Consultivo da PGR n.º 11/2016, que apresenta as seguintes conclusões:

“1ª Os contratos de associação celebrados entre o Estado Português, através da Direção-Geral da Administração Escolar e as entidades titulares de estabelecimentos do ensino particular e cooperativo de nível não superior revestem a natureza de contratos administrativos.

2ª A Administração não detém o poder de fixar com obrigatoriedade o sentido dos contratos administrativos, sendo as declarações do contraente púbico sobre a interpretação destes contratos meras declarações negociais — Cfr. artigo 307.°, n.º 1, do Código dos Contratos Públicos.

3ª Estando em causa a celebração de contratos de associação para os anos letivos de 2015/2016, de 2016/2017 e de 2017/2018 precedida de procedimento concursal em que o número de turmas colocadas a concurso o foi, em cada área geográfica, por ciclo de ensino e ano de escolaridade, sendo contemplados o 2." ciclo e o 3." ciclo do ensino básico e o ensino secundário, ocorre que, quer o 3.° ciclo do ensino básico, quer o ensino secundário, têm a duração de três anos, mas o 2.° ciclo do ensino básico tem a duração de apenas dois anos (5.° e 6.° anos de escolaridade).

4ª Assim, sendo os contratos trienais, o 3.º ciclo do ensino básico e o ensino secundário ajustam-se perfeitamente ao período de vigência dos contratos, sendo certo que, de acordo com o n.º 2 da cláusula 2.ª dos contratos, «nos termos do n.º 2 do artigo 17.° do EEPC, o PRIMEIRO OUTORGANTE garante a manutenção do contrato até à conclusão do ciclo de ensino das turmas por ele abrangidos).

5ª Mas tal já não sucede relativamente ao 2.° ciclo do ensino básico, dado que, no ano letivo de 2017/2018, ainda abrangido pelos contratos, terá de iniciar -se novamente o 5.0 ano de escolaridade.

6ª Ora, tendo sido fixados, no aviso de abertura do concurso, idênticos números de turmas para os três anos letivos abrangidos e reportando-se o apoio financeiro ao período compreendido entre 1 de setembro de 2013 e 31 de agosto de 2018, sendo nos contratos de associação contemplado o pagamento do financiamento de turmas do 2.° ciclo do ensino básico durante o ano letivo de 2017/2018, ter-se-á de concluir que, em tais contratos, se contempla o funcionamento de turmas do 5.° ano de escolaridade (primeiro do dois anos que integram o 2.° ciclo do ensino básico) nesse ano letivo, sendo certo que, nos termos do artigo 13.°, n.º 2, da Portaria n.º 172 -A/ 2015, de 5 de junho, «no final do contrato, os seus efeitos mantêm -se até à conclusão do correspondente ciclo de ensino».

7ª Não se contemplando em tais contratos, no que ao 3.º Ciclo do ensino básico e ao ensino secundário concerne, o direito de os estabelecimentos de ensino particular e cooperativo iniciarem novos ciclos de ensino — 7.° e 10.° anos de escolaridade.

8ª Nos termos do artigo 164.°, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, integra -se na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República legislar sobre as bases gerais de ensino, sendo as leis de bases leis de valor reforçado (artigo 212.°, n.°s 2 e 3, da Constituição).

9ª E, nos termos do artigo 198.º da Constituição, no exercido de funções legislativas, compete, designadamente, ao Governo fazer decretos- -leis de desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam [n.º 1, alínea c)], devendo estes decretos-leis de desenvolvimento invocar expressamente a lei de bases ao abrigo da qual são aprovados (n.º 3).

10a Foi o que o Governo fez ao editar o Decreto -Lei n.º 152/2013, de 4 de novembro, que aprovou o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior invocando expressamente que o fazia no desenvolvimento do disposto no artigo 17.° da Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo, aprovada pela Lei n.º 9/79, de 19 de março, no qual se prescrevera, designadamente, «dever o Governo publicar, por decreto-lei, o Estatuto dos Ensinos Particular e Cooperativo, de acordo com os princípios estabelecidos nesta lei».

11ª E não poderia o Governo, em tal decreto-lei de desenvolvimento, pôr em causa o disposto na Lei de Bases do Ensino Particular e Cooperativo.

12ª Ora, estabelecendo-se no artigo 6.°, alínea i), do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior que compete ao Ministério da Educação e Ciência <permitir o acesso das famílias às escolas particulares e cooperativas, através da celebração de contratos e da concessão de apoios financeiros, bem como zelar pela sua correta aplicação, permitindo progressivamente o acesso às escolas particulares em condições idênticas às das escolas públicas», ocorre que, nos termos do artigo 6.°, n.º 2, alínea d), da Lei n.º 9/ 79, é atribuição do Estado «conceder subsídios e celebrar contratos para o funcionamento de escolas particulares e cooperativas, de forma a garantir progressivamente a igualdade de condições de frequência com o ensino público nos níveis gratuitos e a atenuar as desigualdades existentes nos níveis não gratuitos o

13ª E, para feitos do disposto no artigo 6.° da Lei n.º 9/79, o Estado celebra contratos e concede subsídios a escolas particulares e cooperativas, celebrando, designadamente, contratos não só «com estabelecimentos que, integrando-se nos objetivos e planos do Sistema Nacional de Educação e sem prejuízo da respetiva autonomia institucional e administrativa, se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar», mas também «com estabelecimentos que obedeçam aos requisitos anteriores mas que se encontrem localizados em áreas suficientemente equipadas de estabelecimentos públicos» (artigo 85, n.º 2, alíneas a) e b), respetivamente, da Lei n.º 9/ 79), sendo concedida prioridade à celebração de contratos e atribuição de subsídios aos estabelecimentos que se localizem em áreas carenciadas de rede pública escolar (n.°3 do mesmo artigo).

14ª Ser concedida prioridade é, pois, o que se estabelece na Lei n.º 9 / 79, sendo certo que no artigo 14.°, n.º 1, Decreto -Dei n.º 553/80, de 21 de novembro (anterior Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo) é que se estabelecia que «os contratos de associação são celebrados com escolas particulares situadas em zonas carenciadas de escolas públicas.

15º Sendo certo que no n.º 4 do artigo 105º do Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo de nível não superior, que tem por epígrafe Princípios da contratação, se estabelece que, na celebração dos contratos, o Estado deve ter em conta as necessidades existentes.

16º Por seu turno, a Portaria n.º 172 -A/2015, de 5 de junho, limitou-se a fixar as regras e procedimentos aplicáveis à atribuição de apoio financeiro pelo Estado a estabelecimentos de ensino particular e cooperativo de nível não superior, previstos na alínea c) (contratos de associação) do n.º 1 do artigo 95 do mesmo Estatuto e, nos termos do n.°2 do artigo 95 dessa Portaria, o aviso de abertura dos procedimentos, fixando as condições e os termos em que podem ser apresentadas as candidaturas, contém, obrigatoriamente, «a área geográfica de implantação da oferta» [alínea d)], mais contendo, também obrigatoriamente, «o número de vagas para alunos ou turmas postas a concurso» [alínea b)] e «os ciclos de ensino abrangidos, com a correspondência com o número de turmas postas a concurso» [alínea c)].

17º Sendo na opção pelo número de turmas postas a concurso e pelos ciclos de ensino abrangidos, nas áreas geográficas que forem indicadas, que se coloca a questão de ter em conta as necessidades existentes.

18º Assim sendo, nem o Decreto -Dei n.º 152/2013, nem a Portaria n.º 172 -A/2015, ostentam incompatibilidade com a Lei n.º 9/79, devendo ser aplicados em conformidade com o nela estabelecido e tendo especialmente em consideração o disposto nos seus artigos 6.° e 8.a (cf. D.R. 2.a Série, n.º 105, de 1 de junho de 2016).

8. Em 07 de novembro de 2016, o requerente remeteu o requerimento inicial dos presentes autos – cfr. fls. 3 dos autos.

9. Em 22 de novembro de 2016, o Autor remeteu por correio eletrónico a petição inicial da Ação Administrativa que corre termos neste Tribunal com o n.º 2705/16.5 BELSB – cfr. fls. dos autos do processo n.º 2705/16.5 BELSB.

Motivação da decisão de facto:
A matéria de facto indiciariamente dada como provada nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. A formação da nossa convicção, para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados indiciariamente como provados, resulta das posições assumidas pelas partes nos seus articulados, e ainda dos documentos juntos aos autos, alguns dos quais constam do processo administrativo.
Inexistem quaisquer outros factos com interesse para a questão em discussão nos presentes autos.”.

*
B/DE DIREITO

Questão da alegada incompetência territorial do TAF de Coimbra
Nos presentes autos, o Requerido/Recorrente ME invocou a incompetência territorial do TAF a quo para o conhecimento do neles peticionado, com base no disposto na Cláusula 8.ª do Contrato de Associação celebrado em 20/08/2015, que estabelece como competente o TAC de Lisboa para “a resolução de quaisquer litígios emergentes do contrato, designadamente os relativos à sua interpretação, execução, incumprimento, invalidade, resolução ou redução (…)”.

O tribunal a quo, em sede do ponto “2. Saneamento” da decisão recorrida julgou o seguinte:
“Da alegada incompetência territorial:
O ME alegou a incompetência territorial deste tribunal em virtude de o contrato de associação celebrado em 20/08/2015, conter cláusula que determina que é competente o Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa.

Com efeito, tal questão foi já decidida por aquele TAC de Lisboa a fls. 72 e ss., que não mereceu qualquer recurso e em face do que se convalidou na ordem jurídica, encontrando-se, desta forma, decidida tal questão com o trânsito em julgado da decisão em causa.”

Contra o assim decidido vem o Recorrente ME opor-se, sustentando, em suma, que a decisão do TAC de Lisboa não transitou em julgado – cfr. conclusões Q) a V) – e que, assim, devia o TAF a quo ter julgado procedente a excepção de incompetência territorial por si suscitada, de acordo com a cláusula contratual acima referida.

Pelo que, não o tendo feito, deverá este tribunal revogar a decisão recorrida, com anulação de todos os termos processuais posteriores.

Não lhe assiste razão.

A decisão liminar de incompetência territorial proferida pelo TAC de Lisboa, em 08.11.16, quer nos autos cautelares, quer nos correspondentes autos principais, com consequente remessa do processo para o TAF de Coimbra, foi notificada ao Recorrente ME, por ofício datado de 10.01.17, na sequência de despacho proferido em 09.01.2017 pelo juiz a quo – cfr. SITAF – o que, aliás, o Recorrente admite nas conclusões de recurso.

Ora, nos termos do disposto no artigo 105.º, n.º 4, do CPC de 2013 ex vi artigo 1.º e 135.º do CPTA a decisão que aprecia a incompetência territorial do tribunal para conhecer de acção administrativa é impugnável para o Presidente do TCA respectivo.

Assim, de tal decisão não cabe recurso, mas apenas reclamação – cfr. Acórdão do TCAS, de 13-09-2016, Pº 13636/16.

A Recorrente, conforme alega, não reclamou da decisão do TAC de Lisboa, nos termos legalmente previstos, pelo que tal decisão transitou em julgado – cfr. artigo 628.º do CPC que estabelece que o trânsito em julgado ocorre logo que uma decisão seja insusceptível de impugnação por meio de reclamação ou através de recurso ordinário.

Verificada tal insusceptibilidade, forma-se caso julgado, que se traduz, como sabemos, na impossibilidade da decisão proferida ser substituída ou modificada por qualquer tribunal, incluindo aquele que a proferiu.

Especificamente sobre caso relativo a incompetência territorial, vide Acórdão do STA de 028/17, 01-02-2017, com o seguinte sumário:

“Transitada decisão a julgar um tribunal administrativo incompetente, em razão do território, tal questão fica definitivamente resolvida, não podendo o tribunal «ad quem» retomá-la e julgar territorialmente competente o tribunal «a quo»”.

Face ao exposto, e sem mais considerandos, improcedem os fundamentos de impugnação, nesta parte, da decisão a quo.

*

Dos recursos da decisão de antecipação do juízo sobre a causa principal

Primeira questão: nulidade processual nos termos do disposto no artigo 195º do CPC

Alega o Recorrente MP, em representação do Estado, que não foi ouvido, diversamente do que sucedeu com o Recorrente ME, sobre a intenção do tribunal antecipar o juízo sobre a causa principal, em violação do disposto no artigo 121.º, n.º 1, do CPTA e, consequentemente, do princípio do contraditório.

E que assim foi omitida formalidade prevista na lei, com influência no exame ou na decisão da causa, que se consumou com a prolacção da sentença recorrida, constituindo nulidade processual que invalida a decisão de antecipação da causa principal e os termos subsequentes, conforme o disposto no artigo 195.º do CPC.

Vejamos.

Efectivamente, resulta dos autos que o requerimento apresentado pela Requerente/Autora a solicitar a antecipação do juízo sobre a causa principal foi remetido directamente apenas ao ilustre Mandatário do Ministério da Educação, não tendo o Tribunal ordenado a notificação da Recorrente ME para se pronunciar sobre a requerida antecipação.

De todo o modo, e como o refere o juiz a quo no despacho em que se pronunciou sobres as nulidades suscitadas nas alegações de recurso, atenta a posição contestante do Ministério Público na sua pronúncia de fls. 799 (SITAF) quanto ao pedido de decretamento provisório das providências cautelares requeridas, formulado no Requerimento inicial, e a Oposição ao requerimento cautelar, “não se afigurava outra resposta à questão em causa, que não fosse a de pugnar pelo indeferimento da pretensão de antecipação do juízo da causa”.

É certo que a audição prévia do Estado quanto à antecipação do juízo da causa principal traria consigo os fundamentos que, na sua perspectiva, impediam a referida antecipação e a consequente ponderação pelo juiz.

No entanto, atenta a posição do Estado neste processo, a qual, em defesa do interesse público, converge com a posição do ME – como se constata até pela remissão que aquele foi fazendo, em sede dos articulados, para os do ME – e considerando o teor da decisão recorrida, de antecipação do juízo sobre a causa principal – a irregularidade cometida não se revela capaz de influenciar o teor e o sentido da decisão em causa.

Seja como for, mesmo que assim se não pudesse entender, a irregularidade em causa mostra-se no momento suprida e, em consequência, a nulidade processual que lhe está associada, uma vez que o MP se pronunciou em sede de recurso sobre a requerida antecipação da causa, com argumentos que densifica no corpo das alegações e nas conclusões 3 a 7, e que serão, naturalmente, tomados em conta nesta sede recursiva.

Dessa forma alcançando, por outra via, o exercício do direito ao contraditório, enquanto finalidade imanente à formalidade de audição prévia das partes prevista no artigo 121.º do CPTA.

Termos em que tem de improceder a alegada nulidade processual.

*
– Segunda questão: o imputado erro na antecipação do juízo sobre a causa principal (artigo 121º do CPTA).

O tribunal a quo, em despacho que antecedeu a sentença recorrida, decidiu antecipar juízo sobre a causa principal, com a seguinte fundamentação:

«(…) Da requerida antecipação da decisão da causa principal:

A fls. 1250, veio o Requerente solicitar a antecipação da decisão sobre a causa principal, uma vez que se encontra já instaurada a ação principal a que foi atribuído o processo n.º 2705/16.6 BELSB, estando reunidos todos os elementos necessários para se interpretar o contrato de associação de 20/08/2015, quer para decidir as demais questões objeto da presente demanda e por haver urgência na resolução definitiva do caso, porquanto está eminente a conclusão do ano escolar.

Pronunciando-se sobre o pedido de antecipação da decisão da causa principal, vem dizer que o mesmo deve ser indeferido na medida em que o que pretende o Requerido, na prática, é o decretamento provisório cautelar, o que já foi judicialmente indeferido, para além do que não se verificam os pressupostos processuais contidos no artigo 121.º do CPTA.

O n.º 1, do artigo 121.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro, estabelece: “Quando, existindo processo principal já intentado, se verifique que foram trazidos ao processo cautelar todos os elementos necessários para o efeito e a simplicidade do caso ou a urgência na sua resolução definitiva o justifique, o tribunal pode, ouvidas as partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal, proferindo decisão que constituirá a decisão final desse processo.”.

O presente processo cautelar depende da ação administrativa que corre termos neste Tribunal sob o n.º 2705/16.5 BELSB, no âmbito da qual se coloca a questão de saber se o contrato celebrado entre a Requerente e o Estado português em 20/08/2015, confere o direito de iniciar novos ciclos de ensino nos anos letivos 2016/2017, e 2017/2018, como defende a Requerente, ou apenas o direito de completar os ciclos de ensino iniciados no ano letivo de 2015/2016, como defendem os Requeridos, bem assim, a reconhecer o direito de o requerente ver validade segunda turma do 5.º ano de escolaridade, turma B).

Considerando que a adoção das providências requeridas criará uma situação de facto consumado para os interesses defendidos pelas entidades públicas requeridas se a ação principal vier a ser julgada improcedente, da mesma forma que a recusa das providências requeridas criará uma situação de facto consumado para os interesses defendidos pela Requerente se a ação principal vier a ser julgada procedente, mormente por efeito de haverem já decorridos dois anos letivos previstos no contrato de associação celebrado em 20/08/2015, afigura-se que a situação não se compadece com uma decisão provisória, tanto mais que existe o risco sério de a ação principal vir a ser definitivamente decidida depois do decurso dos anos de vigência do contrato, entendemos que se verifica a urgência que justifica a antecipação da decisão da causa principal, sendo que a ação principal foi intentada, constam do processo os elementos necessários para conhecer do mérito da causa principal e foi assegurado o exercício do direito ao contraditório sobre a antecipação da decisão da causa principal.

Assim, nos termos e ao abrigo do n.º 1, do artigo 121.º, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, decido antecipar a decisão sobre o mérito da causa principal”.

Os Recorrentes opõem-se a esta decisão, sustentando que não se verificam os pressupostos ou parâmetros especiais ínsitos no referido normativo, em sintonia com a natureza excepcional do instituto de antecipação da decisão da causa principal: em síntese, a simplicidade das questões sub judice; a estabilização da prova útil ou existência nos autos cautelares de todos os elementos necessários à decisão urgente final, porquanto as partes arrolaram testemunhas quer em sede cautelar quer em sede dos autos principais, dela não tendo prescindido; a falta de especial ou qualificada urgência na antecipação em causa, sublinhando, a este propósito, que o juiz a quo indeferiu, por despacho de 09.01.17, o pedido de decretamento provisório das providências cautelares, com o fundamento principal de não se verificar uma situação de especial urgência comprovada por factos concretos – cfr. conclusões 21 a 31 do recurso do ME, 3 a 7 do recurso do Estado.

Apreciemos.

O artigo 121.º, n.º 1, do CPTA – revisto pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de Outubro – estabelece o seguinte:

Quando, existindo processo principal já intentado, se verifique que foram trazidos ao processo cautelar todos os elementos necessários para o efeito e a simplicidade do caso ou a urgência na sua resolução definitiva o justifique, o tribunal pode, ouvidas as partes pelo prazo de 10 dias, antecipar o juízo sobre a causa principal, proferindo decisão que constituirá a decisão final desse processo.”.

Previu, assim, o legislador a convolação do processo cautelar em processo principal urgente, através da antecipação no processo cautelar da decisão definitiva do juízo da causa principal, exigindo, para o efeito, a verificação (alternativa) da simplicidade do caso ou da urgência da sua resolução definitiva e, conjuntamente, o cumprimento de três requisitos: (i) a prévia instauração do processo principal; (ii) a aquisição processual dos elementos probatórios necessários à decisão; e (iii) a prévia audição das partes.
Tais pressupostos devem interpretar-se de forma exigente, cabendo ao tribunal “uma grande prudência” na adopção do mecanismo de antecipação, “só excepcionalmente” devendo “decidir-se pela substituição do juízo cautelar por um juízo de mérito, nos casos de grande simplicidade ou quando os interesses envolvidos sejam de grande relevo e esteja perfeitamente seguro de possuir todos os elementos de facto relevantes para a decisão (…)” aferindo a urgência na resolução definitiva da causa pela “ineficiência ou insuficiência da medida cautelar provisória– cfr. Vieira de Andrade in A Justiça Administrativa, Lições, 2016, p. 335.
O que bem se compreende, porquanto os meios cautelares são os meios idóneos a salvaguardar os fins ou interesses a atingir com a acção principal e não a sede própria para decidir de forma definitiva tais interesses.

No caso vertente, o juiz a quo assentou a convolação da tutela cautelar em tutela principal urgente no critério de urgência, pelo que se impõe apreciar se esse critério justificava operar o mecanismo da convolação.
Note-se que, não obstante tenha deixado de exigir-se, com a revisão do CPTA de 2015, uma “manifesta urgência na resolução definitiva do caso”, a urgência que justifica tal resolução há-de ser especial ou qualificada, em sintonia com o facto de os processos cautelares serem meros serventuários dos fins a atingir na acção principal” surgindo a “convolação permitida pelo artigo 121º do CPTA (…) como uma solução atípica, imposta pela necessidade de tutela jurisdicional efectiva” – cfr. Ac. do TCAN, de 18-03-2011, proc. nº 01924/10.2BEPRT.
Ou seja, o juízo sobre a urgência na resolução definitiva do caso exige interpretação e aplicação exigentes, e exige especial cuidado e grande prudência por parte do julgador, o qual só excepcionalmente se deve decidir pela antecipação da decisão final de mérito, encontrando justificação em situações de uma urgência qualificada, nas quais se revele insuficiente o decretamento de uma providência cautelar, designadamente por os limites resultantes da sua natureza provisória obstarem à concessão de uma providência apta a evitar uma situação irreversível (cfr., p. ex. Acs. do STA, Pleno, de 26-02-2015, proc. nº 01164/14, e de 13-05-2015, proc. n.º 037/14).” – vide, Acórdão do TCAN de 10/03/2017, Pº 00357/16.1BECBR.

Ora, presente que a urgência exigida para antecipação do conhecimento da causa principal deve ser qualificada e aferida, sobretudo, pelos interesses que a requerente cautelar visa proteger com essa antecipação, não cabe ficcionar, como o fez o juiz a quo, os eventuais efeitos de facto consumado advenientes da probabilidade de recusa da providência cautelar, mormente por haverem já decorrido dois anos lectivos previstos no contrato de associação celebrado em 20/08/2015 e ser provável que a acção principal venha a ser definitivamente decidida depois do decurso dos anos de vigência do contrato em causa.

É que, e desde logo, o juízo a efectuar nesta sede não se deve reportar à probabilidade de recusa da tutela cautelar, mas sim à aptidão desta tutela para acautelar, em tempo útil, os interesses que o requerente defende no processo principal.

Depois, se parte dos eventuais prejuízos relativos aos anos lectivos decorridos já não podem ser evitados, no plano dos factos, mediante a tutela cautelar, também o não podem ser pela antecipação da decisão da causa principal, sendo que os demais prejuízos alegados, nomeadamente a constituição de turmas (de início de novos ciclos de ensino – na versão da Recorrida) no ano lectivo de 2017/2018 e os prejuízos decorrentes da diminuição do apoio financeiro reclamado para suporte da constituição de turmas de início de ciclos de ensino e de continuidade até à conclusão dos ciclos de ensino iniciados, não revelam uma urgência acrescida em relação àquela que a interposição do processo cautelar pressupõe.

Destarte, as providências cautelares requeridas, de regulação provisória da situação jurídica da Recorrida através da imposição à Administração do pagamento por conta de prestações devidas, de intimação à prática de acto administrativo, de abstenção de conduta e de suspensão de eficácia de actos administrativos, tudo como melhor consta do requerimento cautelar, se concedidas, tutelam de forma efectiva, ainda que provisória, interesses que o requerente cautelar pretende assegurar com a decisão favorável da acção principal.

Aliás, os prejuízos económicos alegados pela requerente cautelar, ora Recorrida, como de difícil reparação – por falta de financiamento de turmas a cuja constituição considera ter direito, face ao contrato de associação celebrado em 20/08/2015 – e o alegado facto consumado da não abertura de turmas, por não financiadas, a que reclama ter direito a abrir e a manter, preenchem um dos requisitos da adopção da tutela cautelar requerida.

No demais, as questões objecto da causa principal não se mostram de evidente simplicidade. Basta atentar, para o efeito, e entre o demais, à diversidade de posições jurídicas assumidas pelas partes, bem como ao parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria da República e pareceres de distintos professores universitários juntos aos autos.

Termos em que não se encontrando reunidos todos os pressupostos previstos no artigo 121.º, n.º 1, do CPTA, procedem os fundamentos dos Recorrentes de impugnação da decisão de antecipação do juízo da causa principal.

Procedendo o recurso da decisão prévia de antecipar o julgamento da acção principal, “o tribunal ad quem deverá revogar tal decisão e ordenar que o tribunal a quo aprecie a providência cautelar requerida, ficando sem efeito o julgamento efectuado sobre o fundo da causa – ver, a respeito, Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, páginas 619 a 625” – cfr. Ac. do TCAN, de 26-07-2007, proc. nº 03160/06.3BEPRT.

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Recursos da decisão sobre a causa principal interpostos pelos ME e MP:

Recurso subordinado da decisão da causa principal interposto pela Recorrida:

O conhecimento das questões neles colocadas fica naturalmente prejudicado.

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IV – DECISÃO
Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em conceder provimento aos recursos jurisdicionais interpostos pelos Recorrentes ME e MP, revogando a decisão de antecipação de julgamento da causa principal, ficando sem efeito esse julgamento, e ordenando a remessa dos autos ao tribunal a quo para conhecimento da providência cautelar requerida.

Custas a cargo da Recorrida, devidas pela apresentação de contra-alegações.

Notifique. DN.

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Porto, 4 de Outubro de 2017

Ass.: Alexandra Alendouro

Ass.: Fernanda Brandão – em substituição

Ass.:Hélder Vieira