Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte | |
Processo: | 00020/11.0BEMDL |
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Secção: | 1ª Secção - Contencioso Administrativo |
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Data do Acordão: | 11/06/2015 |
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Tribunal: | TAF de Mirandela |
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Relator: | Luís Migueis Garcia |
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Descritores: | CADUCIDADE DA ACÇÃO. CONDUTA DA ADMINISTRAÇÃO QUE INDUZ O INTERESSADO EM ERRO (ART.º 58º, Nº 4, A), DO CPTA). |
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Sumário: | I) – O prazo de impugnação de acto anulável pode estender-se para além do prazo regra de três meses previsto no art.º 58º, nº 2, b), do CPTA, se acaso a conduta da Administração tiver induzido o interessado em erro (art.º 58º, nº 4, a), do CPTA). II) – Mas só assim se verificará perante um sério investimento de confiança, merecedor da tutela. III) – De todo o modo, a impugnação só é admitida desde que ainda não tenha expirado o prazo de um ano (art.º 58º, nº 4, a), do CPTA).* * Sumário elaborado pelo Relator. |
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Recorrente: | ARM e MFM |
Recorrido 1: | JGMB, na qualidade de Presidente da Câmara de C.... |
Votação: | Unanimidade |
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Meio Processual: | Acção Administrativa Especial para Impugnação de Acto Administrativo (CPTA) - Recurso Jurisdicional |
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Aditamento: | ![]() |
Parecer Ministério Publico: | Emitiu parecer de não provimento ao recurso. |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: ARM e esposa MFM (…) interpõem recurso jurisdicional de decisão do TAF de Mirandela, que julgou procedente excepcionada caducidade de acção administrativa especial por aqueles intentada contra JGMB, na qualidade de Presidente da Câmara de C.... Os recorrentes concluem o seu recurso do seguinte modo: 1. O Tribunal a quo não analisou adequadamente a excepção invocada e contraditada. 2. Os ora recorrentes alegaram razões para não ter atacado a decisão administrativa em momento anterior. 3. Existe fundamento legal que permite, que o destinatário de actos administrativos, venha atacar os mesmos em prazos diferentes dos previstos no CPTA. 4. Tal verificou-se no caso concreto e foi alegado pelos recorrentes. 5. Existia prova arrolada nos autos, pelo que o douto Tribunal a quo teria de produzir prova, a fim de poder decidir a excepção invocada. 6. Ao não ouvir a prova arrolada pelos recorrentes em sede de julgamento, comprometeu irremediavelmente a defesa dos direitos dos recorrentes. 7. Tomou uma decisão, que não está alicerçada em prova alguma, já que não foi produzida. 8. Trata-se de uma decisão superficial, que não encontra fundamento na realidade e que põe termo a urna situação que se verifica há mais de 30 anos. 9. Razão pela qual deve ser anulada a decisão ora recorrida, baixando os autos ao douto Tribunal a quo, a fim de realizar competente julgamento, cumprindo-se os ditames da lei administrativa e constitucional, permitindo aos recorrentes exporem as suas razões, para defenderem o seu património e os seus direitos. O Recorrido contra-alegou, oferecendo em conclusões o seguinte: A. Os AA. ultrapassaram largamente o prazo de que dispunham para a impugnação nos termos do art° 58, n° 2, al. b) do CPTA - 3 meses. B. Esse facto, constitui excepção dilatória de caducidade do direito de acção prevista no art.° 89, n° 1, al. b) que conduz a absolvição da instância conforme bem se decidiu. C. Os AA. nunca invocaram estar em condições de beneficiar do regime excepcional contido no n° 4 do art° 58 do CPTA. D. A produção de prova testemunhal pretendida pelos AA. não pode ser admitida. * O Exmº Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal foi notificado para os efeitos previstos no art.º 146º, nº 1, do CPTA, tendo dado parecer de não provimento ao recurso.* Com dispensa dos vistos, vêm os autos a conferência, cumprindo decidir a questão em litígio, relativa à caducidade do direito de acção.* Os factos, que o tribunal “a quo” deu como assentes:1. Em 26.01.2004, foi proferido o despacho 11/2004, aqui impugnado pelos Autores – cfr. fls. 114 e 115 dos autos em suporte físico; 2. Por ofício datado de 28.01.2004, foram os Autores notificados do ato referido no ponto antecedente – cfr. fls. 113 dos autos em suporte físico; 3. Em dezembro de 2008, em dia que não se pode precisar, o Autor apresentou nos serviços do Réu pedido de aprovação de projeto de arquitetura para “licenciamento de galeria” – cfr. fls. 116 dos autos em suporte físico; 4. A petição inicial que motiva os presentes autos deu entrada neste Tribunal, em 11.01.2011 – cfr. fls. 2 dos autos em suporte físico. * O direitoVieram os autores impugnar o supra referido despacho de 26/01/2004, despacho que ordena a demolição de obra de construção. O tribunal a quo julgou procedente a excepção de caducidade da acção, com o seguinte discurso fundamentador: «(…) Compulsada a matéria de facto assente supra, verifica-se que os Autores foram notificados por ofício datado de 28.01.2004, sendo que, com a mesma se iniciou o prazo de impugnação contenciosa previsto no artigo 58º, n.º 2, alínea b) do C.P.T.A. – 3 meses. Ora, quando a ação deu entrada neste Tribunal, em 11.01.2011, já aquele prazo se havia esgotado há muito, sendo forçoso concluir pela intempestividade da mesma. No que concerne ao argumento dos Autores no sentido da aplicação do artigo 58º, n.º 4, al. a) do C.P.T.A., impõe-se fazer duas ressalvas: por um lado, tal situação só ocorre quando a ação seja intentada após os três meses mas ainda durante o prazo de um ano, após a notificação do ato; por outro, a conduta da Administração no sentido de induzir em erro o interessado não foi alegada nem resulta dos documentos juntos aos autos. Como bem explicam Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2.º edição revista, Almedina, 2007, pp. 390 e 391: “No caso da alínea a) o que está em causa é, não já uma deficiência a nível das formalidades que publicitam o acto administrativo, mas a conduta da autoridade administrativa – consubstanciada na prática de actos jurídicos ou materiais – que tenha gerado a falsa expectativa da desnecessidade ou inconveniência da impugnação do acto, e, assim, induzindo o interessado a prescindir da apresentação em tempo oportuno da petição. Deste modo, a norma tutela os princípios da protecção da confiança e da boa fé e dá concretização prática, no plano processual administrativo, ao disposto nos artigos 6.º e 6.º-A do CPA.”. Nesta parte, se os Autores se pretendem referir à circunstância de não terem obtido resposta quanto ao pedido formulado em 2008, sempre deveriam reagir a tal inércia, nos termos legais, mormente intentando ação de condenação à prática do ato devido. O que não podem, por não haver suporte legal para tal, é impugnar um ato datado de 2004, numa ação intentada em 2011, por alegado silêncio da Administração. Saliente-se, contudo, que a decisão aqui proferida não prejudica a impugnação de eventuais atos que venham a ser praticados ou a condenação à prática dos atos que se considerem devidos, desde que respeitados os prazos do artigo 58º do C.P.T.A.. Em conclusão, procede a exceção dilatória de caducidade do direito de ação, absolvendo-se o Réu da instância. (…)» «Na firmeza do acto e na respectiva inopugnabilibidade encontramos um valor do próprio Estado de Direito, que tem na segurança jurídica um dos seus pilares mais destacáveis» - Luís Filipe Colaço Antunes, in “A teoria do Acto e a Justiça Administrativa – O Novo Contrato Natural”, Almedina, 2006, pág. 121. O prazo-regra de três meses, prazo de impugnação de actos anuláveis (art.º 58º, nº 2, b), do CPTA), é prazo que os recorrentes, ainda que ultrapassado, entendem não prejudicar a demanda. Nada contestando que esse pudesse ser o prazo que em princípio seria de observar, apesar disso, como consta da resposta que deram ao articulado de contestação, os autores expressamente convocaram (ao contrário do que vem dito em contra-alegações) beneplácito do art.º 58º, nº 4, a), do CPTA; certo é também que, pese a actual invocação de que “Existe fundamento legal que permite, que o destinatário de actos administrativos, venha atacar os mesmos em prazos diferentes dos previstos no CPTA” (conclusão 3ª do recurso), não especificam qual ele seja, nem se descortina qual possa ser. Dispõe o art.º 58º, nº 4, a), do CPTA: «Desde que ainda não tenha expirado o prazo de um ano, a impugnação será admitida, para além do prazo de três meses da alínea b) do n.º 2, caso se demonstre, com respeito pelo princípio do contraditório, que, no caso concreto, a tempestiva apresentação da petição não era exigível a um cidadão normalmente diligente, por: a) A conduta da Administração ter induzido o interessado em erro; (…). O que está em causa é «a conduta da autoridade administrativa – consubstanciada na prática de actos jurídicos ou materiais – que tenha gerado a falsa expectativa da desnecessidade ou inconveniência da impugnação do acto e, assim, induzindo o interessado a prescindir da apresentação em tempo oportuno da petição. Deste modo a norma tutela os princípios da protecção da confiança e da boa fé e dá concretização prática, no plano processual administrativo, ao disposto nos arts. 6º e 6.º-A do CPA». (cfr. M. Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª ed. rev., Almedina, 2007, pág. 350). Há-de consistir numa conduta que, mais do que geradora de uma simples expectativa, e vista a tutela da norma, seja uma expectativa com um sério investimento de confiança, merecedor da tutela. Só assim se justifica quebra no valor de segurança jurídica que o prazo de caducidade almeja. Na lição de Manuel Andrade (in Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, p. 464) se a prescrição tem por fundamento a inércia do respectivo titular, circunstância que o torna indigno de protecção, já “o fundamento específico da caducidade é o da necessidade de certeza jurídica. Certos direitos devem ser exercidos durante certo prazo, para que ao fim desse tempo fique inalteravelmente definida a situação jurídica das partes. É de interesse público que tais situações fiquem, assim, definidas duma vez para sempre com o transcurso do respectivo prazo”. No mesmo sentido, diz Vaz Serra (in RLJ, ano 107º, p. 24) que” a caducidade é estabelecida como o fim de dentro de certo prazo, se tornar certa, se consolidar, se esclarecer determinada situação jurídica”. Os recorrentes sustentam erro de julgamento; em síntese, entendem não ter sido feita correcta apreciação quanto à conduta da Administração, que, a seu ver, justificará a propositura da acção para além dos 3 meses previstos no art.º 58º, nº 2, b), do CPTA; isto, na dependência de produção de prova, que têm como necessária. Sobre a conduta da Administração disseram os recorrentes que “desde 1996, altura em que os AA. adquiriram a sua fracção, a postura do Município tem sido o de informar os AA. que a marquise era a única solução urbanística possível, para evitar as constantes inundações” e que “não se absteve o Município de produzir despachos e decisões, sobre a viabilidade ou não de legalização da Marquise dos AA. e dos outros vizinhos” (respectivamente 4. e 5. da resposta à contestação). Mesmo que ultrapassando a vaguidade do alegado, nada que destrone a constatação de que o despacho impugnado, ele próprio, se assume como ordem administrativa de demolição “definitiva e executória”, dando prazo para cumprimento voluntário, sob alternativa de serem os próprios serviços municipais a executar tal demolição e sob pena de desobediência (cfr. despacho). Não deixa dúvida, não induz em erro, nem doutra sorte há diferente sinal que, em subsequente desenvolvimento, para aí aporte; e seria esse ulterior momento que poderia importar (mesmo sem melhor consubstanciação: outra anterior posição que eventualmente pudesse importar diferente expectativa ficou no acto claramente afastada, e daí em diante nada contraria). Por outro lado, acontece que, como dita o preceito legal (art.º 58º, nº 4, a), do CPTA), a impugnação só é admitida desde que ainda não tenha expirado o prazo de um ano; e, no caso, como a decisão recorrida também aí sustentou, já tal prazo se encontrava expirado quando foi intentada a acção. Pelo que a acção é extemporânea, caducidade impeditiva do prosseguimento do processo, com absolvição da instância – art.º 89º, nº 1, h), do CPTA. * Acordam, pelo exposto, em conferência, os juízes que constituem este Tribunal Central Administrativo Norte, em negar provimento ao recurso.Custas: pelos recorrentes. Porto, 6 de Novembro de 2015. |