Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03536/14.2BEPRT
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:03/18/2016
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Frederico Macedo Branco
Descritores:PRÉ-CONTRATUAL; GRELHA CLASSIFICATIVA; REQUISITOS “FOTOGRÁFICOS”;
CONCURSO PÚBLICO
Sumário:1 – As especificações técnicas definidas pelos adquirentes públicos devem permitir a abertura dos contratos públicos à concorrência. Para o efeito deverão possibilitar-se a apresentação de propostas que reflitam a diversidade das soluções técnicas das normas e das especificações técnicas existentes no mercado incluindo as definidas com base em critérios de desempenho ligados ao ciclo de vida e à sustentabilidade do processo de produção das obras, fornecimentos e serviços. As especificações técnicas deverão ser elaboradas de forma a evitar uma redução artificial da concorrência através de requisitos que favoreçam um operador económico ao refletirem as principais características dos fornecimentos.
A adjudicação de um contrato deverá realizar-se com base em critérios objetivos que assegurem o respeito dos princípios da transparência, da não discriminação e da igualdade de tratamento, com vista a assegurar uma comparação objetiva do valor relativo das propostas, a fim de determinar, em condições de concorrência efetiva, a proposta economicamente mais vantajosa.
2 – A comparação de candidaturas pressupõe que se percecione a razão pela qual foi atribuída uma qualquer classificação e não qualquer outra a cada um dos concorrentes, objetivo inconseguido pela utilização de um simulacro de “grelha” classificativa, na qual a cada item é atribuída a cotação máxima ou zero.
3 – Estando vedada legalmente a possibilidade de fixar especificações técnicas que façam referência a um fabricante, tal, necessariamente e por idêntica razão, abrangerá as situações em que as especificações técnicas de um determinado produto são “desdobradas”, em fatores e subfatores a serem apreciados no procedimento, o que se consubstancia numa escolha final meramente “fotográfica”.
4 - A potencial arbitrariedade do júri na avaliação das propostas será tanto menor quanto mais densificada e escalonada esteja a grelha adotada, o que se reveste de acrescida importância, quando, como na presente situação, se está perante a necessidade de avaliar a proposta economicamente mais vantajosa.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:J&J, Lda.
Recorrido 1:AS, SA.
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Impugnação Urgente - Contencioso pré-contratual (arts. 100º e segs. CPTA) - Recurso Jurisdicional
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
I Relatório
A J&J, Lda., no âmbito do identificado Processo de Contencioso Pré-Contratual intentado pela AS, SA. contra a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE, tendente, em síntese, à “anulação do procedimento e da decisão de adjudicação dos Lotes 1 e 2 do Concurso Público nº CP-3318-CPI-M-140117-B destinado à aquisição de Material para Artroplastia do Joelho”, não se conformando com a decisão proferida no TAF do Porto de 4 de Janeiro de 2016, que veio a julgar a ação procedente, nos termos aí estabelecidos, veio em 26 de Janeiro de 2016, recorrer jurisdicionalmente da mesma para este TCAN (Cfr. Fls. 654 a 688 Procº físico).

Formulou a aqui Recorrente/J&J, Lda., nas suas alegações de recurso, as seguintes conclusões (Cfr. fls. 680 a 688 Procº físico):

“A. O processo tem por objeto um concurso público para Aquisição de Material para Artroplastia de Joelho (Concurso Público n.º CP-3318-CPI-M-140117-B), concretamente, os Lotes 1 e 2. O Lote 1 tinha por objeto o fornecimento de Próteses Totais do Joelho Cimentadas, o Lote 2 o fornecimento de Prótese de Joelho de Revisão.

B. Discute-se a legalidade das peças do procedimento, bem como a legalidade do ato de adjudicação que deriva dessas peças. A Autora AS, ora Recorrida, pediu que a Ré ULSAM fosse condenada “a eliminar das peças do procedimento as características técnicas e os fatores e subfactores de avaliação que não constituam aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência”; e a “proceder à abertura de novo procedimento com as características técnicas e fatores e subfactores de avaliação que contenham aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência”. Pediu, ainda, a anulação da decisão de adjudicação por falta de fundamentação do Relatório Final.

C. O Tribunal a quo entendeu que as especificações técnicas ou os fatores de avaliação estavam orientados para favorecer a J&J: por isso declarou procedentes, por provados, os pedidos da AS. O Tribunal decidiu que a decisão de adjudicação não estava fundamentada, e que as peças do procedimento violavam o disposto nos números 1 e 2 do artigo 75.º, nos números 1, 2, 12 e 13 do artigo 49.º, na alínea n) do n.º 1 do artigo 132.º, e no n.º 3 e 4 do artigo 139.º do Código dos Contratos Públicos (“CCP”), bem como os princípios da concorrência, igualdade e imparcialidade, consagrados pelo n.º 4 do artigo 1.º do mesmo Código.

D. Por força desse entendimento, o Tribunal ordenou a anulação do “procedimento de concurso aqui impugnado, bem como a decisão de adjudicação dos Lotes 1 e 2, por o Programa de Concurso (no ponto X) e o Caderno de Encargos (no ponto 2, do capítulo II) serem inválidos”, por incumprirem as normas acima indicadas, e ordenou que a Ré ULSAM fosse condenada a “eliminar daquelas peças processuais as características técnicas e os fatores e subfactores de avaliação, que não constituam aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência”; e a “proceder à abertura de novo procedimento de concurso, com as características técnicas e fatores e subfactores de avaliação que contenham aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência”.
E. A decisão padece de vários erros de julgamento. O Tribunal a quo não foi escrupuloso na identificação e julgamento dos vícios invocados, ignorou factos importantes para a decisão, e decidiu matérias sem suficiente suporte probatório.

F. A Sentença recorrida considerou que as peças do procedimento violavam o artigo 49.º do CCP. Porém, a Sentença errou ao aplicar esse artigo ao caso. O artigo 49.º aplica-se às especificações técnicas do Caderno de Encargos. As normas das peças do procedimento em questão eram fatores de avaliação das propostas, não especificações técnicas. Isso resulta, desde logo, do facto de nenhuma proposta ter sido excluída por força do incumprimento dos aspetos de execução do contrato analisados na Sentença (cfr. facto G) da matéria dada como provada). As peças do procedimento (e o ato de adjudicação) não violam (nem podiam ter violado), por isso, o artigo 49.º do CCP.

G. Na Sentença entendeu-se ainda que as peças do procedimento violavam o n.º 1 e o n.º 2 do artigo 75.º do CCP, “uma vez que os Subfactores de Qualidade não são elementares, ou seja, não são simples, mas antes complexos e muito específicos; assim como os Subfactores dizem respeito a qualidades e características relativas a um concorrente”.

H. O n.º 1 do artigo 75.º exige, apenas, que os critérios de adjudicação sejam objetivos; que incidam sobre caraterísticas das propostas, e não sobre caraterísticas dos concorrentes; a norma tem a função de impedir que a fase de avaliação de propostas se contamine por juízos de qualificação de concorrentes, alheios à qualidade da proposta.

I. Nenhum dos fatores de avaliação em análise incidia sobre características dos concorrentes, todos incidiam sobre características das próteses a concurso, e, por isso, sobre aspetos da execução do contrato (cfr., por exemplo, facto G) da matéria de facto provada). Por conseguinte, o critério de adjudicação cumpre o n.º 1 do artigo 75.º do CCP.

J. O n.º 2 do artigo 75.º, por sua vez, refere que “apenas os fatores e subfactores situados ao nível mais elementar da densificação do critério de adjudicação, denominados fatores ou subfactores elementares, podem ser adotados para avaliação das propostas”.

K. Esta norma dirige-se ao Júri, e ordena que, na avaliação de propostas, a avaliação apenas se possa realizar através dos fatores ou subfactores mais elementares; ou seja, “os elementos mais baixos da escala de avaliação das propostas”.

L. Constata-se, assim, em primeiro lugar, que o artigo 75.º n.º 2 não é um parâmetro de legalidade das peças do procedimento, mas apenas um parâmetro de legalidade da avaliação; e, em segundo lugar, o artigo 75.º apenas impõe que a avaliação das propostas se realize através do fator ou subfactor mais densificado, o que sucedeu. Assim, não só o artigo 75.º, n.º 2 não incide sobre a matéria em discussão, como foi integralmente cumprido no procedimento.

M. As peças do procedimento também não violaram a alínea n) do n.º 1 do artigo 132.º do CCP. Esta norma contém, apenas, exigências formais. Para a cumprir, basta que o modelo de adjudicação abarque todos os elementos nela referidos: basta que possua fatores e subfatores relativos aos aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência; o valor dos respetivos coeficientes de ponderação; e, relativamente aos fatores ou subfactores elementares, a respetiva escala de pontuação, bem como a expressão matemática ou o conjunto ordenado de diferentes atributos suscetíveis de serem propostos que permita a atribuição de pontuações parciais.

N. Ora, o modelo de avaliação em questão possui todos os elementos referidos no ponto anterior, pelo que observa a alínea n) do n.º 1 do artigo 132.º do CCP.

O. A Sentença está incorreta, também, na parte em que entende que o modelo de avaliação de propostas violou os n.ºs 3 e 4 do artigo 139.º do CCP.

P. O n.º 3 do artigo 139.º obriga a que exista uma escala de pontuação ordenada em função de diferentes atributos. O Tribunal a quo identifica aqui uma obrigação de “graduação” que não existe. As peças do procedimento em crise apresentam uma escala de pontuação, uma vez que a cada atributo da proposta corresponde um certo número de pontos. Não há qualquer violação do n.º 3 do artigo 139.º do CCP.

Q. As peças do procedimento cumpriram, também, o n.º 4 do artigo 139.º. Essa norma proíbe, apenas, que o modelo de adjudicação contenha fatores relativos – isto é, fatores que façam depender a pontuação de uma proposta da pontuação de outra proposta. Proíbe, por exemplo, uma escala que atribua 10 pontos ao primeiro classificado e 9 pontos ao segundo, independentemente da qualidade intrínseca da proposta, ou uma escala cujos pontos dependam da média das propostas.

R. O critério de adjudicação em análise não é relativo, nem depende das propostas dos outros concorrentes. Não houve violação do n.º 4 do artigo 139.º.

S. Improcedem, então, todos os vícios identificados por referência a artigos do CCP. O artigo 49.º e o n.º 2 do artigo 75.º não se aplicam ao caso. Os artigos 75.º, n.º 1, 132.º, n.º 1, alínea n), e 139.º, n.º 3 e n.º 4 aplicam-se ao caso, mas foram manifestamente cumpridos no caso presente.

T. A violação dos princípios da concorrência, igualdade e imparcialidade merece mais atenção. O Tribunal entendeu que tais princípios teriam sido violados por só a J&J ser capaz de cumprir todos os fatores de avaliação em análise. Não só esse juízo está errado (outros concorrentes cumprem), como essa não é a premissa relevante para decidir o caso. O facto de determinados fatores só serem cumpridos por determinados concorrentes não os torna desconformes à concorrência.

U. O princípio da concorrência assume, nos fatores de avaliação, uma particular configuração: os fatores serão concorrenciais e conformes à lei desde que exista um nexo relevante entre o atributo valorizado e a qualidade da execução do contrato.

V. Avaliar o custo-benefício do modelo de avaliação é uma tarefa do órgão responsável pela decisão de contratar, e um exercício da margem de livre decisão administrativa. O órgão responsável pela decisão de contratar possui amplos poderes de regulamentação do modelo de avaliação. Tais poderes são tanto mais amplos quanto mais sensível e particular for a natureza dos bens a adquirir.

W. Tratando-se o concurso de um concurso de aquisição de próteses de joelho, a utilizar em cirurgias delicadas, deve reconhecer-se que esses poderes são mais amplos do que no comum concurso para aquisição de bens. Sobretudo porque cada concorrente pode alterar a sua proposta de forma a ir de encontro a certos aspetos: ora, os fatores de qualidade são fundamentais, na medida em que permitem aos concorrentes apetrechar a prótese sem serem penalizados no preço. Só através de tais fatores as Unidades de Saúde podem obter próteses de joelho com um perfil elevado de qualidade e durabilidade.

X. Assim, o modelo de avaliação aprovado pela ULSAM só poderia ser jurisdicionalmente sindicado quando o julgador encontrasse apoio factual para sustentar que negar o nexo entre os fatores de avaliação e a qualidade das próteses a concurso. O Tribunal a quo nunca seguiu este método, que é o imposto pela lei.

Y. Quando não der como provados os factos referidos na conclusão anterior, o julgador deve abster-se de interferir no juízo discricionário da entidade adjudicante. Se não o fizer, estará a decidir – em vez da ULSAM e sem prova nesse sentido – que atributos deve ou não deve ter uma prótese de joelho.

Z. Os factos dado como provados na Sentença não são suficientes para sustentar o juízo do Tribunal quanto à violação do princípio da concorrência. Aliás, o Tribunal a quo cometeu um erro de julgamento, ao contaminar a sua decisão de direito com juízos de facto.

AA. O Tribunal a quo considerou, particularmente, que:

• “Como refere a Autora, se a prótese for fabricada em crómio-cobalto cumpre as funções a que se destina, independentemente da liga em que ambos são produzidos, mas é apenas pontuado o componente tibial em titânio” (p. 16);

• “«Componentes femorais com retenção, sacrifício, ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo tempo componente patelar», segundo refere a Autora, colocam-se no mesmo item conceitos distintos de componente femoral, que não são comercializados por todos os potenciais concorrentes” (p. 16);

• “possibilidade de orientar a rotação externa entre 0.º e 7.º limita, desde logo, a apresentação de outro tipo de propostas que podem desempenhar cabalmente a mesma função, ainda que com outra versatilidade, ainda que ínfima, sem que haja explicação alguma para o critério” (p. 16 e 17);

• “«Possibilidade de orientar o ângulo do valgo do fémur de 0 a 9 graus», apenas se admite esta hipótese de rotação (…). Ora, menciona a impetrante que existem outros tipos de rotação como de 0 a 8 e de 0 a 10 graus, sem que seja clínica e medicamente fundamentada a exigência de 0 a 9 graus” (p. 17);

• “O critério da qualidade afinal não se destina a apurar a qualidade, mas antes a saber se a proposta corresponde a um determinado modelo existente no mercado” (p. 19)

BB. A Petição Inicial da AS não continha qualquer prova que sustentasse as atrás destacadas conclusões do Tribunal, nem essas conclusões derivam de factos provados. Ora, o juízo quanto à inutilidade (e consequente ilegalidade) dos fatores de avaliação tem de assentar num fundamento técnico, e esse fundamento técnico tem de estar apoiado em factos.

CC. O único facto em que o Tribunal se baseou para a decisão foi a circunstância de nem todos os concorrentes cumprirem com os fatores de avaliação. Mas não chega. Para chegar onde chegou, o Tribunal a quo teria de dar como provado que os fatores eram artificiais, que as próteses que os cumpriam e não cumpriam tinham o mesmo desempenho.

DD. Na ausência desta demonstração, impera, como vimos, a discricionariedade da entidade adjudicante. Na ausência desta demonstração, deve presumir-se que a entidade adjudicante prosseguiu o interesse público, e que os fatores de avaliação em questão são importantes para o desempenho do contrato.

EE. Saliente-se, de qualquer modo, que os juízos descritos na conclusão AA estão errados, e esse erro apura-se a partir de factos e elementos constantes do processo. No Relatório Final, o Júri do concurso, constituído por médicos e enfermeiros, desmentiu o alegado pela AS a propósito dos fatores analisados na Sentença. Nesse Relatório, o Júri justifica a importância dos fatores de avaliação, e revela que os fatores de adjudicação atendem a aspetos importantes para a execução do contrato. Esse documento demonstra, enfim, que existe um nexo relevante entre os fatores de avaliação e a qualidade de execução do contrato. Pela importância desses argumentos, remete-se para o transcrito no ponto II.B.iii destas alegações de recurso.

FF. Nota-se que a ULSAM indicou, na Petição Inicial, alguns membros do Júri como testemunhas. O Tribunal a quo podia tê-los ouvido quanto a estes fatores, claramente inacessíveis a qualquer pessoa desprovida de conhecimentos cirúrgicos. As opiniões constantes da Sentença recorrida revelam que a decisão sustentou-se em preconceitos quanto aos resultados, e não em factos.

GG. Por último, o Tribunal a quo não dedicou suficiente atenção aos factos que sustentam a decisão. Tais factos, devidamente ponderados, desmentem muitas das conclusões da Sentença, e robustecem a alegação de que o princípio da concorrência não foi violado.

HH. Pela extensão de tais factos, contradições, e erros interpretativos, remete-se para o ponto II.B.iv. destas alegações. Para concluir, importa sobretudo destacar os aspetos que mais robustecem a tese de que o princípio da concorrência não foi violado:

• Em primeiro lugar, os factos desmentem que só a J&J podia obter pontuação nos fatores observados pelo Tribunal – outros concorrentes também a obtiveram;

• Em segundo lugar, dois concorrentes foram excluídos por apresentarem preço superior ao preço base, o que revela que o preço foi utilizado como forma de pressão sobre a concorrência, e amortizou de algum modo o reduzido coeficiente de ponderação do preço (20%);

• Em terceiro lugar, a proposta da concorrente S... obteve muito melhor pontuação do que a proposta da AS no fator Qualidade, e cumpriu a grande maioria dos fatores contestados nos autos (designadamente, subfactor “componente femoral em crómio-cobalto e componente tibial em titânio”, subfactor “Possibilidade de orientar a rotação externa entre 0 e 7.º”): esta diferença de qualidade entre S... e AS denuncia que o critério tem um pendor objetivo, que não favorece necessariamente a J&J, mas a melhor prótese.

II. A constatação de que determinadas características tornam uma prótese melhor do que outra é uma manifestação do princípio da concorrência, não uma sua violação. Existe indefinição quanto aos fatores que tornam uma prótese melhor, ou pior, e a opinião varia de ortopedista para ortopedista. Essa indefinição não é um motivo para sufocar a discricionariedade das entidades adjudicantes, obrigando-as a lançar procedimentos focados no preço e indiferentes às diferenças de qualidade entre diferentes bens.

JJ. Pelo contrário. Essa orla de indefinição obriga a reconhecer às entidades adjudicantes uma margem de escolha e determinação das características que, para si, são características de uma boa prótese, ou de uma melhor prótese.

KK. O princípio da concorrência (como o princípio da imparcialidade e transparência) não determina apenas que não se distinga o que é igual – impõe também que se distinga o que é diferente. A fixação dos termos e da medida dessa distinção é um poder discricionário. Os Tribunais só podem imiscuir-se nesse poder se munidos de suporte de facto bastante, ou caso identifiquem erro grosseiro ou violação flagrante de princípios. No caso presente, não há factos que suportem a conclusão do Tribunal, não há erro grosseiro, nem violação flagrante – mais, os factos que há contradizem a conclusão do Tribunal.

LL. Não existe, por isso, violação do princípio da concorrência (que no caso consome os princípios da imparcialidade e da igualdade). A Sentença deve ser revogada também quanto a esse aspeto.

MM. Por último, o Tribunal a quo julgou inválido ato de adjudicação, por incumprimento do dever de fundamentação. Apesar de essa parte da Sentença ser de difícil compreensão, percebe-se que o juízo quanto à fundamentação ficou contaminado pelo juízo quanto ao conteúdo dos fatores de adjudicação, o que não podia ter sucedido.

NN. É pacífico na doutrina e jurisprudência que a função do dever de fundamentação é permitir a apreensão do “iter cognoscitivo-valorativo da decisão”: a apreensão das condições que habilitam um destinatário normal a ficar ciente do sentido da decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe, através dessa apreensão, optar conscientemente entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação (cfr., por todos, o Acórdão do STA de 10-03-2004 – Proc. n.º 025739).

OO. Na decisão em apreço, o critério de adjudicação continha uma grelha com descrição bastante dos fatores e subfactores que seriam valorizados, de tal modo que a atribuição de pontuação equivalia ao preenchimento de uma qualidade predefinida e perfeitamente identificável.

Nesses casos, a jurisprudência dos Tribunais Superiores tem-se acertadamente pronunciado no sentido de que “a avaliação das propostas apresentadas num concurso tem-se por fundamentada através da valoração por elas obtida nos vários itens de uma grelha classificativa minimamente densa”

PP. O caso presente enquadra-se manifestamente neste grupo de casos. A grelha classificativa identifica os fatores e subfactores a avaliar de forma explícita e discriminada, permitindo apreender os motivos da decisão do Júri através da mera atribuição da pontuação. Para cúmulo, o Júri abordou todas e cada uma das questões levantadas pela Autora no seu Relatório Final, expondo ao longo de 20 páginas os motivos da escolha daqueles fatores.

QQ. A fundamentação é clara, suficiente, congruente, e acessível a qualquer destinatário normal – neste caso, fornecedores de próteses de joelho, conhecedores do mercado e do significado de toda e cada uma das expressões consignadas na grelha de qualificação. O ato de adjudicação cumpriu o dever de fundamentação, e cumpriu com o artigo 153.º do Código de Procedimento Administrativo.

RR. Conclui-se, então, que o Tribunal a quo aplicou mal, ao caso, os artigos 49.º e 75.º, n.º 2, do CCP. Por sua vez, os artigos 75.º, n.º 1, 132.º, n.º 1, al. n), e 139.º, n.º 3 e 4 foram mal interpretados, tal como mal interpretados foram os princípios da concorrência, imparcialidade e igualdade, e a questão da falta de fundamentação (artigo 153.º do Código de Procedimento Administrativo). Interpretando devidamente tais artigos e princípios, verifica-se que nenhum deles foi violado pelas peças do procedimento ou pelo ato de adjudicação sub iudice.

SS. Assim, não só as peças do procedimento e o ato de adjudicação não enfermam de qualquer vício, como se impõe, por isso, a revogação da Sentença em juízo.

Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., que desde já se requer, deve ser dado integral provimento ao presente recurso e, consequentemente, ser revogada a Sentença proferida pelo Tribunal a quo, absolvendo a Recorrente J&J e a ULSAM de todos os pedidos formulados. Tudo com as demais consequências legais.”

O Recurso Jurisdicional veio a ser admitido por Despacho de 2 de Fevereiro de 2015 (Cfr. Fls. 698 Procº físico).

A Autora/Recorrida/AS, SA veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 18 de Fevereiro de 2016 (Cfr. Fls. 703 a 717 Procº físico), nas quais concluiu:

“A – A sentença recorrida julgou procedente a ação proposta pela Recorrida e julgou a ação procedente condenando a Ré ULSAM anular o procedimento de concurso impugnado, bem como a decisão de adjudicação dos Lotes 1 e 2, por o Programa do Concurso (no ponto X) e o Caderno de Encargos (no ponto 2, do capítulo II), serem inválidos, conforme acima fundamentado; a eliminar daquelas peças processuais as características técnicas e os fatores e subfactores de avaliação, que não constituam aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência e condenar a Ré, a proceder à abertura de novo procedimento de concurso, com as características técnicas e fatores e subfactores de avaliação que contenham aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência.”

B – A decisão recorrida não violou os artigos quaisquer normas definidas no código dos Contratos Públicos, nomeadamente os art.sº 49º, 75º, 132º e 139º do CCP.

C- As peças do procedimento violam o princípio da concorrência porquanto o concurso público tal como foi configurado reduziu artificialmente a concorrência pois as características técnicas definidas no Caderno de Encargos favorecem um potencial concorrente.

D- O Tribunal a quo aplicou corretamente os conceitos vertidos no art.º 49º - especificações técnicas-, e no art.º 75º - fatores e subfactores.

E - A entidade adjudicante definiu características técnicas que continham características relativas às próteses comercializadas pela J&J e converteu-as em fatores e subfactores de avaliação, não definindo aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência e que permitissem efetivamente avaliar as propostas, compará-las e promover a concorrência.

F- Analisadas as peças do procedimento, o único fator de avaliação do critério da proposta economicamente mais vantajosa que permitiria à entidade adjudicante avaliar as propostas, é o preço!

G - Sendo os fatores e subfactores de avaliação constituídos pelas especificações técnicas dos bens a fornecer, e limitando-se a “avaliação” das propostas pelo Júri a verificar se a proposta contém ou não aqueles fatores e subfactores, mediante a atribuição de duas pontuações de “0” ou “5”, não há qualquer avaliação dos atributos da proposta, porque os mesmos não são avaliados, não funcionando, dessa forma, a concorrência.

H - A fls. 9 a 12 do Caderno de Encargos, sob a epigrafe “II – CONDIÇÕES TÉCNICAS – 2. CARACETRÍSTICAS TÉCNICAS PRINCIPAIS”, a Ré ULSAM definiu as especificações técnicas das próteses que pretendia adquirir no âmbito do concurso público sub judice as quais mais não são do que as características/especificações técnicas relativas às próteses comercializadas pela J&J e a fls. 8 do Programa do Concurso, a entidade adjudicante transformou em fatores e subfatores de avaliação as especificações técnicas definidas no Caderno de Encargos.

I - Considerando que a entidade adjudicante ULSAM fixou especificações técnicas de um bem comercializado por um determinado operador de mercado e que as transformou em fatores e subfactores de avaliação, há uma clara violação dos art.ºs 49º e 75º do CCP.

J - Ao fazer-se referência a especificações técnicas relativas a bens fornecidos por um determinado concorrente, no caso a Recorrente J&J, e transformando-se tais especificações técnicas em fatores e subfactores de avaliação não se cumpre o requisito vertido no n.º 1 do art.º 75º do CCP que determina que na criação de fatores e subfatores de avaliação das propostas só podem ser usados aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência.

K – “A adjudicação de um contrato deverá realizar-se com base em critérios objetivos que assegurem o respeito dos princípios da transparência, da não discriminação e da igualdade de tratamento, com vista a assegurar uma comparação objetiva do valor relativo das propostas, a fim de determinar, em condições de concorrência efetiva, a proposta economicamente mais vantajosa. Convém estabelecer expressamente que a proposta economicamente mais vantajosa deverá ser avaliada com base na melhor relação qualidade/preço, que deverá sempre incluir um elemento de preço ou de custo. Deverá igualmente ser especificado que essa avaliação da proposta economicamente mais vantajosa também poderá ser efetuada apenas com base no preço ou na eficácia em termos de custos.” – vide Diretiva 2014/24/UE

L - Sendo o ato de avaliação das propostas o momento em que a entidade adjudicante avalia os atributos da mesma, ou seja, avalia todos os aspetos da proposta submetidos à concorrência e que permitem distinguir as propostas umas das outras, não tendo havido definição de fatores e subfatores de avaliação diferentes do que foram definidos e que eram as características/especificações técnicas integradas no Caderno de Encargos, há uma clara violação do princípio da concorrência, na vertente da comparabilidade das propostas!

M - No modelo de avaliação da proposta economicamente mais vantajosa impõe-se que a entidade adjudicante apenas e só fixe fatores e subfatores de avaliação que digam respeito aos atributos das propostas, e são os atributos das propostas que as distinguem umas das outras e que permitem que as mesmas sejam comparadas entre si!

N- O Tribunal a quo considerou que houve uma transformação das características/especificações técnicas em fatores e subfatores de avaliação, ao dizer que “uma vez que apenas aquelas especificações técnicas são pontuáveis na integra (...)” não confundiu os conceitos que integram o art.º 49º e 75º do CCP.

O - O art.º 75º do CCP é um parâmetro de legalidade das peças do procedimento porquanto as peças do procedimento são o lugar onde são definidos os fatores e subfactores de avaliação das propostas, por isso é que ao abrigo do CCP é vedado ao Júri do procedimento definir quaisquer fatores e subfatores de avaliação das propostas além dos que foram já definidos pela entidade adjudicante.

P - A decisão recorrida aplicou corretamente o art.º 75º do CCP ao considerar que os “Subfactores de qualidade não são elementares, ou seja, não são simples, mas antes complexos e muito específicos; assim como os Subfatores dizem respeito a qualidades e características relativas a um concorrente”, remetendo-se para o Ponto I das presentes contra-alegações quanto aí se alega.

Q - A comparação das propostas passa por se conseguir perceber qual a proposta que melhor serve as pretensões da entidade adjudicante, motivo pelo qual se definem fatores e subfactores de avaliação e se criam grelhas de pontuação para cada um destes subfactores, apurando-se a pontuação que cada um tem na equação final.

R – A alegada grelha de avaliação criada no âmbito do concurso em análise, como bem diz a sentença recorrida a fls. 19, “de grelha tem aparência física, que não a funcionalidade de permitir pontuar a qualidade das propostas (que se faz por intervalos de pontuação e não apenas em pontuação máxima ou nenhuma pontuação), porque a suposta qualidade, já ficou definida aquando da abertura do concurso, no Programa do Concurso e no Caderno de Encargos, com a exigência de especificações técnicas que apenas um produto possui.”

S - “A preocupação que, em qualquer caso, deve nortear a organização de uma escala de pontuação dos fatores e subfatores do critério de adjudicação é exatamente essa, de a apertar tanto quanto possível, de maneira a não deixar grandes “buracos” ou intervalos classificativos entre propostas de valia próxima, em prol dos princípios da concorrência e da proporcionalidade. Consideram-se, assim, ilegais os casos em que as escalas estão organizadas grosseiramente com intervalos visivelmente desproporcionados na sequência das diversas pontuações, como o caso acima referido de se atribuir à melhor proposta em determinado (subfactor uma cotação valiosa e a todas as outras zero.”

T - A entidade adjudicante ao configurar a “grelha” de avaliação nos moldes em que o fez, violou o art.º 132º, n.º 1 alínea n) do CCP, porque não permite avaliar as propostas no sentido de as diferenciar umas das outras porque a única coisa que as vai verdadeiramente diferenciar é o preço, pelo que não há erro de aplicação do art.ºs 132º, n.º 1 alínea n) do CCP na sentença recorrida.

U – Não há erro de interpretação do art.º 139º do CCP, porque de acordo com as características/especificações técnicas definidas no Caderno de Encargos e os fatores e subfactores de avaliação do Programa do Concurso, apenas o preço constitui um atributo das propostas porquanto apenas este é deixado à concorrência, tudo o mais, esta perfeitamente definido no Programa do Concurso.

V - A sentença recorrida aplicou corretamente os art.ºs 49º, n.º 2, 75º, 132º n.º 1 alínea a) e 139º, n.º 4 do CCP.

W – A Recorrente J&J alega que a decisão recorrida interpretou mal o concurso ao considerar que a forma como o mesmo está configurado beneficia, em abstrato, um determinado concorrente.

X – Existindo no mercado cerca de 17 potenciais fornecedores de prótese de joelho (afirmação esta que não foi impugnada quer pela entidade adjudicante, quer pela própria recorrente – vide item 148º da PI e 2º parágrafo da sentença – pág. 18) só 5 concorrentes apresentaram proposta e só 3 concorrentes é que viram as suas propostas avaliadas.

Y - Em face do número de potenciais fornecedores a operar no mercado não se compreende o motivo pelo qual os requisitos técnicos do concurso foram tão especificamente focados em características técnicas iguais, ou com um diferenciação mínima num subcritério, que corresponde a 5%, às do produto comercializado pela Recorrente J&J.

Z – A discricionariedade atribuída à entidade adjudicante ULSAM no modo como define os componentes de avaliação das propostas, obriga a que a sua escolha se reja pelo principio da concorrência, por forma a que obtenha a melhor proposta que satisfaça o interesse público e não os interesses privados.

AA – A definição no Caderno de Encargos das características/especificações técnicas iguais às das próteses comercializadas pela Recorrente J&J viola o princípio da concorrência, uma vez que a definição destas especificações técnicas limitam desproporcionadamente o mercado a participar no procedimento, considerando-se aqui vertido tudo quanto se alegou nessa matéria no presente articulado.

AB - A entidade adjudicante tem uma liberdade ampla de delimitar ou fixar os fatores e subfatores de avaliação, no entanto tal liberdade não é ilimitada, deve sempre ter como norte a concorrência aliada à prossecução do interesse público.

AC - Como ensina Pedro Costa Gonçalves “o princípio da concorrência representa um padrão ou fator de vinculação da atuação da entidade adjudicante, por força de considerações ligadas ao princípio da igualdade. (…) a vinculação ao princípio da concorrência não advém apenas de uma relação instrumental com o princípio da igualdade, uma vez que parece indiscutível que a “mise en concurrence” se revela ainda um instrumento decisivo para a concretização da própria ideia de economicidade da contratação pública.”

AD - A sentença recorrida ao considerar que o modo como o concurso foi configurado, um concorrente foi favorecido, o que limitou claramente a concorrência, aplicou corretamente os princípios da imparcialidade, da igualdade e da concorrência, vertidos o art.º 1º, n.º 4 do CCP.

AE - O Tribunal a quo decidiu com base na matéria de facto e nos documentos juntos aos autos, os quais revelam a ilegalidade das características técnicas definidas e dos fatores de avaliação.

AF - A obrigação de justificar os motivos pelos quais só aquelas próteses e não outras no mercado, com aquelas características é que satisfazem as necessidades da entidade adjudicante, incumbe à entidade adjudicante no momento em que promove a abertura do concurso, tal justificação não pode ser dada em momento posterior, pelo Júri do procedimento, uma vez que a sua tarefa se limita a avaliar as propostas de acordo com as peças do procedimento, que balizam a sua atuação.

AG - O Tribunal a quo ao considerar que as peças do procedimento violam as regras da concorrência, aplicou corretamente o art.º 1º, n.º 4 do CCP.

AH – A decisão proferida pela entidade adjudicante viola a dever de fundamentação das decisões uma vez que, tendo a decisão de adjudicação por base o Relatório Final emitido pelo Júri, constata-se que não justificou os motivos pelos quais atribuiu as pontuações aos concorrentes mantendo, no que respeita à avaliação dos alegados subfactores de avaliação Q1 e Q2, o quadro avaliativo das propostas nos termos constantes do Relatório Preliminar.

AI – Para que se possa considerar que a decisão se encontra devidamente fundamentada é necessário não só que a grelha seja suficientemente densa, mas também que os subfatores que densificam o fator de avaliação sejam legais, isto é, sejam subfactores que, ab initio, são aptos a avaliar as propostas.

AJ - Por serem ilegais, os fatores e subfatores de avaliação das propostas definidos no Programa do Concurso, não podiam ter servido de base à avaliação das propostas.

AK – A sentença recorrida interpretou e aplicou corretamente os art.ºs 268º, n.º 3 da CRP, e art.º 153º do CPA e nos art.ºs 68º, 69º do CCP.

Termos em que, Deve o Recurso interposto pela Recorrente J&J ser julgado IMPROCEDENTE, mantendo-se a sentença recorrida, só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 26 de Fevereiro de 2016 (Cfr. Fls. 734 Procº físico), nada veio dizer, requerer ou promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, onde se suscita, designadamente, o facto da entidade adjudicante não ter violado quaisquer normas do Contrato dos Contratos Públicos, nomeadamente os Artºs 49º, 75º, 132º e 39º.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade:
A) Em 23 de Maio de 2014 foi publicado, na 2.ª série, Parte L, do Diário da República, o Anúncio de procedimento n.º 2780/2014, pela Unidade Local de Saúde do Alto Minho, E.P.E., referente ao concurso público n.º CP-3318-CPI-M-140117-B, destinado à aquisição de Material para Artroplastia do Joelho, no qual não eram admitidas propostas variantes, e apresentava os seguintes requisitos:
«5 – DIVISÃO EM LOTES, SE FOR O CASO
Lote n.º 1
Designação do lote: Prótese Total do Joelho Cimentada
Descrição sucinta do objeto do lote: PTJ Cimentada
Preço base do lote: 206.450,00 EUR
(…)
Lote n.º 2
Designação do lote: Prótese Joelho Revisão
Descrição sucinta do objeto do lote: PTJ Revisão
Preço base do lote: 16.376,06 EUR
(…)
12 – CRITÉRIO DE ADJUDICAÇÃO
Proposta economicamente mais vantajosa
Fatores e eventuais Subfactores acompanhados dos respetivos coeficientes de ponderação:
Qualidade – 80%; Preço – 20%».
B) O Programa do Concurso estabeleceu no ponto X, como critério de adjudicação, o da proposta economicamente mais vantajosa, em que o fator preço tinha uma ponderação de 20% e o fator qualidade tinha uma ponderação de 80%, este avaliado de acordo com os Subfactores de Adequação Técnica e Funcional à Utilização Prevista, sendo a adjudicação efetuada por Lote e a adjudicação do Lote de Revisão (lote 2), condicionada pela adjudicação do Lote 1 (Próteses Primárias), não relevando para efeitos do cálculo do critério de adjudicação, sendo o adjudicatário do Lote 1, o adjudicatário do Lote 2.
C) Os Subfactores de Adequação Técnica e Funcional à Utilização Prevista, correspondiam ao seguinte:

«PRÓTESES TOTAIS DO JOELHO CIMENTADA
Q1 – (PTJ Cimentada)
Subfactores de Adequação Técnica e Funcional à Utilização Prevista
Sim
Não
Prótese conformada semi-constritiva modular, de superfícies condilianas curvo em curvo
5
0
Componente femoral anatómico em Cobalto crómico e tibial em titânio com possibilidade de colocação de hastes
5
0
Componente femoral e tibial compatíveis entre si, com o mesmo tamanho, um tamanho acima ou abaixo
5
0
Componente femoral cimentado com crescimento proporcional em função do seu tamanho e com opção de desenho que permita flexão do joelho até 150 graus
10
0
Componente patelar cimentado, com total congruência com lodosos componentes femorais
5
0
Componentes femorais com retenção, sacrifício ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo componente patelar
5
0
Alternativa intra-operatória de com o mesmo instrumental, optar por: tíbia monobloco cimentada, tíbia cimentada para aplicação de plataforma fixa ou tíbia cimentada para aplicação de plataforma rotativa
5
0
Possibilidade de orientar a rotação externa femoral entre 0 e 7 graus
5
0
Possibilidade de orientar o ângulo de valgo do fémur de 0 a 9 graus
5
0
Intermutabilidade de componentes primários e de revisão
10
0
Opção intra-operatória de 3 posições de offset femoral antero posterior, quando utilizadas hastes
5
0
Componente femoral primário com substituição do LCP, adaptável a: aumentos distais, aumentos posteriores, hastes de 5 e 7 graus não cimentadas e mangas de preenchimento/fixação metafisária
5
0
Instrumental adaptado a todas as vias de abordagem, cirurgia navegada e minimamente invasivo, podendo com a mesma técnica cirúrgica utilizar: tíbia monobloco, plataforma fixa, plataforma móvel
5
0
Caixas de instrumental ergonómicas para os vários tipos de prótese, permitindo modularidade e multifuncionalidade
5
0
Possibilidade de utilização de prato tibial assimétrico
5
0
Possibilidade de Instrumental, com gestão do slope posterior varo/valgo
5
0
Resultados nos registos artroplastia
10
0
Total Subfactores
100
0
Q2 – (AII POLI)
Subfactores de Adequação Técnica e Funcional à Utilização Prevista
Sim
Não
Prótese conformada semi-constritiva modular, de superfícies condilianas curvo em curvo
5
0
Componente femoral anatómico em cobalto crómico e tibial em polietileno
10
0
Componente femoral e tibial compatíveis entre si, com o mesmo tamanho, um tamanho acima ou abaixo
5
0
Componente femoral cimentado com crescimento proporcional em função do seu tamanho e com opção de desenho que permita flexão do joelho até 150 graus
5
0
Componente patelar cimentado, com total congruência com todos os componentes femorais
5
0
Componentes femorais com retenção, sacrifício ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo componente patelar
5
0
Alternativa intra-operatória de com o mesmo instrumental, optar por: tíbia monobloco cimentada, tíbia cimentada para aplicação de plataforma fixa ou tíbia cimentada para aplicação de plataforma rotativa
5
0
Possibilidade de orientar a rotação externa femoral entre 0 e 7 graus
10
0
Possibilidade de orientar o ângulo de valgo do fémur de 0 a 9 graus
10
0
Intermutabilidade de componentes primários e de revisão
10
0
Opção intra-operatória de 3 posições de offset femoral antero posterior, quando utilizadas hastes
5
0
Componente femoral primário com substituição do LCP, adaptável a: aumentos distais, aumentos posteriores, hastes de 5 e 7 graus não cimentadas e mangas de preenchimento/fixação metafisária
5
0
Instrumental adaptado a todas as vias de abordagem, cirurgia navegada e minimamente invasivo, podendo com a mesma técnica cirúrgica utilizar: tíbia monobloco, plataforma fixa, plataforma móvel
5
0
Caixas de instrumental ergonómicas para os vários t ipos de prótese, permitindo modularidade e multifuncionalidade
5
0
Resultados nos registos artroplastia
10
0
Total Subfactores
100
0
D) O Caderno de Encargos estabelecia no ponto 2, do capítulo II, as Características
Técnicas Principais das Próteses Totais do Joelho Cimentadas, da seguinte forma:
(PJT Cimentada)
◊ Prótese conformada semi-constritiva modular, de superfícies condilianas curvo em curvo;
◊ Componente femoral anatómico em cobalto crómico e tibial em titânio com possibilidade de colocação de hastes;
◊ Componente femoral e tibial compatíveis entre si, com o mesmo tamanho, um tamanho acima ou abaixo;
◊ Componente femoral cimentado com crescimento proporcional em função do seu tamanho e com opção de desenho que permita flexão do joelho até 150 graus;
◊ Componente patelar cimentado, com total congruência com todos os componentes femorais;
◊ Componentes femorais com retenção, sacrifício ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo componente patelar;
◊ Alternativa intraoperatória de com o mesmo instrumental, optar por: tíbia monobloco cimentada, tíbia cimentada para aplicação de plataforma fixa ou tíbia cimentada para aplicação de plataforma rotativa;
◊ Possibilidade de orientar a rotação externa femoral entre 0 e 7 graus;
◊ Possibilidade de orientar o ângulo de valgo do fémur de 0 a 9 graus;
◊ Intermutabilidade de componentes primários e de revisão;
◊ Opção intraoperatória de 3 posições de offset femoral antero posterior, quando utilizadas hastes;
◊ Componente femoral primário com substituição do LCP, adaptável a: aumentos distais, aumentos posteriores, hastes de 5 e 7 graus não cimentados e mangas de preenchimento/fixação metafisária;
◊ Instrumental adaptado a todas as vias de abordagem, cirurgia navegada e minimamente invasivo podendo com a mesma técnica cirúrgica utilizar: tíbia monobloco, plataforma fixa, plataforma móvel, plataforma fixa ou móvel de alta flexão;
◊ Caixas de instrumental ergonómicas para os vários tipos de prótese, permitindo modularidade e multifuncionalidade;
◊ Possibilidade de utilização de prato tibial assimétrico;
◊ Possibilidade de Instrumental, com gestão do slope posterior e varo/valgo;
◊ Resultados nos registos artroplastia.
PTJ (AII POLI)
◊ Prótese conformada semi-constritiva modular, de superfícies condilianas curvo em curvo;
◊ Componente femoral anatómico em cobalto crómico e tibial em polietileno;
◊ Componente femoral e tibial compatíveis entre si, com o mesmo tamanho, um tamanho acima ou abaixo;
◊ Componente femoral cimentado com crescimento proporcional em função do seu tamanho e com opção de desenho que permita flexão do joelho até 150 graus;
◊ Componente patelar cimentado, com total congruência com todos os componentes femorais;
◊ Componentes femorais com retenção, sacrifício ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo componente patelar;
◊ Alternativa intra-operatória de com o mesmo instrumental, optar por: tíbia monobloco cimentada, tíbia cimentada para aplicação de plataforma fixa ou tíbia cimentada para aplicação de plataforma rotativa;
◊ Possibilidade de orientar a rotação externa femoral entre 0 e 7 graus;
◊ Possibilidade de orientar o ângulo de valgo do fémur de 0 a 9 graus;
◊ Intermutabilidade de componentes primários e de revisão;
◊ Opção intraoperatória de 3 posições de offset femoral antero posterior, quando utilizadas hastes;
◊ Componente femoral primário com substituição do LCP, adaptável a: aumentos distais, aumentos posteriores, hastes de 5 e 7 graus não cimentados e mangas de preenchimento/fixação metafisária;
◊ Instrumental adaptado a todas as vias de abordagem, cirurgia navegada e minimamente invasivo podendo com a mesma técnica cirúrgica utilizar: tíbia monobloco, plataforma fixa, plataforma móvel, plataforma fixa ou móvel de alta flexão;
◊ Caixas de instrumental ergonómicas para os vários tipos de prótese, permitindo modularidade e multifuncionalidade.
◊ Resultados nos registos artroplastia.
E) Apresentaram proposta para os dois Lotes: «AS, S.A.», «MBA Portugal, S.A.», «S&N, S.A.», «S…Portugal Produtos Médicos, Lda.» e «J&J, Lda.», tendo esta última apresentado propostas de Prótese do Joelho Anatómica Cimentadas, segundo um Sistema de joelho SIGMA (fls. 127/139 PA).
F) Foram admitidas as propostas de «AS, S.A.», da «S…, Lda.» e da «J&J, Lda.», tendo o Júri elaborado Relatório Preliminar, no qual avaliou o Fator Preço (20%) da proposta de «AS, S.A.» em 3,16, da «J&J, Lda.» em 2,64, e da «S..., Lda.», em 0,00; avaliou o Subfactor Q1, de «AS, S.A.», em 49,5, da «J&J, Lda.», em 85,5, e da «S..., Lda.», em 63; avaliou o Subfactor Q2 de «AS, S.A.», em 5,5, da «J&J, Lda.», em 10, e da «S..., Lda.», em 7; e efetuou a avaliação do Fator Qualidade (80%) de «AS, S.A.» em 44,00, com a pontuação de 55, da «J&J, Lda.» em 76,40, com a pontuação de 95,5, e da «S..., Lda.» em 56,00, com a pontuação de 70; atribuindo a classificação final de 1.º lugar à «J&J, Lda.», com a pontuação global de 79,04; do 2.º lugar à «S..., Lda.», com a pontuação global de 56,00 e em 3.º lugar a «AS, S.A.», com a pontuação global de 47,16.
G) O Júri efetuou a seguinte avaliação dos Subfactores de Qualidade – Q1 e Q2:
SUBFACTORES
AS
J&J
S...
Q1 – Subfactores
Pontuação
Pontuação
Pontuação
Prótese conformada semi-constritiva modular, de superfícies condilianas curvo em curvo
5
5
5
Componente femoral anatómico em Cobalto crómico e tibial em titânio com possibilidade de colocação de hastes
0
5
5
Componente femoral e tibial compatíveis entre si, com o mesmo tamanho, um tamanho acima ou abaixo
5
5
5
Componente femoral cimentado com crescimento proporcional em função do seu tamanho e com opção de desenho que permita flexão do joelho até 150 graus
10
10
10
Componente patelar cimentado, com total congruência com lodosos componentes femorais
5
5
5
Componentes femorais com retenção, sacrifício ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo componente patelar
0
5
0
Alternativa intra-operatória de com o mesmo instrumental, optar por: tíbia monobloco cimentada, tíbia cimentada para aplicação de plataforma fixa ou tíbia cimentada para aplicação de plataforma rotativa
0
5
0
Possibilidade de orientar a rotação externa femoral entre 0 e 7 graus
0
5
5
Possibilidade de orientar o ângulo de valgo do fémur de 0 a 9 graus
0
5
0
Intermutabilidade de componentes primários e de revisão
10
10
10
Opção intra-operatória de 3 posições de offset femoral antero posterior, quando utilizadas
0
5
5
Componente femoral primário com substituição do LCP, adaptável a: aumentos distais, aumentos posteriores, hastes de 5 e 7 graus não cimentadas e mangas de preenchimento/fixação metafisária
0
5
0
Instrumental adaptado a todas as vias de abordagem, cirurgia navegada e minimamente invasivo, podendo com a mesma técnica cirúrgica utilizar: tíbia monobloco, plataforma fixa, plataforma móvel
0
5
0
Caixas de instrumental ergonómicas para os vários tipos de prótese, permitindo modularidade e multifuncionalidade
5
5
5
Possibilidade de utilização de prato tibial assimétrico
0
0
0
Possibilidade de Instrumental, com gestão do slope posterior varo/valgo
5
5
5
Resultados nos registos artroplastia
10
10
10
Total Subfactores
55
95
70
Q2 – Subfactores
PontuaçãoPontuaçãoPontuação
Prótese conformada semi-constritiva modular, de superfícies condilianas curvo em curvo 555
Componente femoral anatómico em Cobalto crómico e tibial em titânio com possibilidade de colocação de hastes101010
Componente femoral e tibial compatíveis entre si, com o mesmo tamanho, um tamanho acima ou abaixo555
Componente femoral cimentado com crescimento proporcional em função do seu tamanho e com opção de desenho que permita flexão do joelho até 150 graus555
Componente patelar cimentado, com total congruência com lodosos componentes femorais555
Componentes femorais com retenção, sacrifício ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo componente patelar050
Alternativa intra-operatória de com o mesmo instrumental, optar por: tíbia monobloco cimentada, tíbia cimentada para aplicação de plataforma fixa ou tíbia cimentada para aplicação de plataforma rotativa050
Possibilidade de orientar a rotação externa femoral entre 0 e 7 graus01010
Possibilidade de orientar o ângulo de valgo do fémur de 0 a 9 graus0100
Intermutabilidade de componentes primários e de revisão101010
Opção intra-operatória de 3 posições de offset femoral antero posterior, quando utilizadas hastes 055
Componente femoral primário com substituição do LCP, adaptável a: aumentos distais, aumentos posteriores, hastes de 5 e 7 graus não cimentadas e mangas de preenchimento/fixação metafisária050
Instrumental adaptado a todas as vias de abordagem, cirurgia navegada e minimamente invasivo, podendo com a mesma técnica cirúrgica utilizar: tíbia monobloco, plataforma fixa, plataforma móvel050
Caixas de instrumental ergonómicas para os vários tipos de prótese, permitindo modularidade e multifuncionalidade555
Resultados nos registos artroplastia101010
Total Subfactores 100
5510070
H) A concorrente «AS, S.A.» apresentou pronúncia em sede de audiência prévia, invocando a violação do dever de fundamentação e a violação do princípio da concorrência, por os Subfactores de avaliação serem de tal forma específicos e numerosos que apenas um determinado operador do mercado tem capacidade para concorrer e responder a todos os Subfactores de forma satisfatória.
I) Foi elaborado Relatório Final em 15/10/2014, que propôs a adjudicação à «J&J, Lda.», pelo valor global de € 209.145,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor (e que a adjudicação do lote 2 está condicionada À adjudicação do lote 1), e no qual o Júri respondeu às questões levantadas pela concorrente «AS, S.A.» em sede de audição prévia, referindo que a decisão encontra-se fundamentada mediante pontuação dos Subfactores, referindo que quando o mesmo é cumprido é atribuída a pontuação máxima, e quando não cumpre é-lhe atribuída a pontuação nula; e relativamente à violação do princípio da concorrência, que os fatores e Subfactores de avaliação nunca podem reduzir o número de potenciais concorrentes a concurso, mas apenas o não cumprimento das especificações (aspetos não submetidos à concorrência) ou dos parâmetros base dos aspetos submetidos à concorrência, não tendo sido nenhum dos concorrentes excluído por não cumprir nenhum deles, e que a adjudicação não é efetuada à proposta de maior qualidade, nem à proposta de menor preço, mas sim àquela que seja mais vantajosa, em termos da relação qualidade/preço, do ponto de vista da entidade adjudicante.
J) O Conselho de Administração da Unidade Local de Saúde do Alto Minho, E.P.E. acolheu a proposta do Júri, adjudicando o contrato à proposta da «J&J, Lda.», no dia 27 de Novembro de 2014, decisão que foi notificada aos demais concorrentes a 28 de Novembro de 2014.
K) Em Maio de 2012, foi realizado um estudo sistemático sobre Sistema de artroplastia do joelho SIGMA (vide doc. junto pela Contrainteressada com a sua Contestação e traduzido a fls. 535 a 562 dos autos, págs. 000 do SITAF), o qual referiu que o mesmo oferece um design de elevada confiança, com baixo risco de necessidades de revisão e resultados bons ou excelentes, apresentando eficácia e segurança clínicas de boa qualidade, sendo que na maioria dos estudos ao sistema de joelho SIGMA, nos resultados pós-operatórios KS do joelho e de função são maior do que a média comparada pós-operatória dos resultados KS do joelho e de função para a classe ATJ, assim como foi verificada uma elevada durabilidade em cinco registos clínicos nacionais, demonstrando que o risco de revisões é baixo, quando usado por todas as classes de cirurgiões e em qualquer doente, tratando-se de um sistema fiável e indulgente. Este estudo concluiu, ainda, que: «A sobrevida do sistema de joelho total primário SIGMA é já melhor do que o sistema de Joelho P.F.C. Modular original em cerca de 20%, a 10 anos, e espera-se que este melhoramento relativo se mantenha a longo prazo, caso sejam tidas em consideração as razões para possíveis falhas. Na literatura revista por pares, as revisões associadas ao desgaste e complicações da rótula, as causas mais frequentes de revisão do design P.F.C. original, acontecem com muito menos frequência com o uso do design SIGMA, até 7 anos, que constitui o ponto mais longínquo ao qual esta comparação pode ser feita e é, atualmente, a média mais longa de acompanhamento dos estudos SIGMA».

IV – Do Direito
Enquadrando a questão controvertida, refira-se que foi originariamente invocado pela Autora que:
a) As peças do procedimento padecem de vício de violação de lei, porque os fatores e subfactores de avaliação a aplicar a cada lote, violam o n.º 1 do art.º 75.º do CCP, uma vez que não são aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência, mas antes características que os bens a fornecer têm de ter, sob pena de não lhe ser atribuída qualquer pontuação, sendo que apenas um dos concorrentes possuía no seu universo de bens a fornecer as próteses com as características/subfactores definidos no procedimento, violando o princípio da concorrência, da igualdade e da transparência.
b) Por outro lado o Caderno de Encargos define características técnicas principais de tal forma que apenas só um dos concorrentes é capaz de obter a pontuação máxima definida para cada conjunto de subfactores, o que limita a concorrência, sendo que no fator qualidade foram definidos subfactores de avaliação as características técnicas principais que havia definido no âmbito do Caderno de Encargos, o que viola o disposto nos artigos 49.º, 75.º, 132.º, n.º 1 – n) e 139.º do CCP e na Diretiva Comunitária.
c) O Relatório do Júri não se encontra fundamentado, o que conduz à anulabilidade da decisão.

Em função do que precede peticionou-se em 1ª Instância, que:
1. (Seja) declarada a anulação do procedimento e da decisão de adjudicação dos Lotes 1 e 2 do Concurso Público n.º CP-3318-CPI-M-140117-B destinado à Aquisição de Material para Artroplastia do Joelho, aberto pela Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE por o Caderno de Encargos e o Programa do Concurso conterem características técnicas principais e fatores e subfatores de avaliação que não constituem aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência e que violam o disposto nos art.ºs 49º, 75º e 132º, n.º 1 alínea n) e art.º 139º do Código dos Contratos Públicos;
2. (Seja) a Ré Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE (…) condenada a eliminar das peças do procedimento as características técnicas e os fatores e subfactores de avaliação que não constituam aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência.
3. (Seja) a Ré Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE (…) condenada a proceder a abertura de novo procedimento com as características técnicas e fatores e subfatores de avaliação que contenham aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência.
Sem prescindir e para o caso de se entender que as peças do procedimento não enfermam das ilegalidades supra identificadas,
4. (Seja) anulada a decisão de adjudicação por falta de fundamentação do Relatório Final proferido pelo Júri do Concurso, em violação do disposto no art.º 124.º e 125.º do Código de Procedimento Administrativo,
5. (Seja) a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE (…) condenada a proferir nova decisão fundamentada em cumprimento do disposto no art.º 124.º e 125.º do Código de Procedimento Administrativo.
Sem prescindir e para o caso de se entender que a decisão de adjudicação não enferma de vício de falta de fundamentação,
6. (Seja) a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE (…) condenada a avaliar a proposta da Autora e atribuir-lhe a pontuação máxima em todos os fatores e subfactores de avaliação que não foram pontuados por a proposta da Autora cumprir com todas as especificações técnicas definidas nas peças do procedimento.
7. (Seja) a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE (…) condenada a classificar a Autora em primeiro lugar,
8. (Seja) a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, EPE (…) condenada a proferir decisão de adjudicação a favor da Autora por ser a concorrente com a proposta economicamente mais vantajosa.
9. Deverá ser declarada a anulação do contrato que se venha a celebrar ou que já tenha sido celebrado, nos termos do artigo 283.º, n.º 2 do CCP.

Consequentemente, decidiu o Tribunal a quo julgar a ação procedente, nos seguintes termos:
1. Anula-se o procedimento de concurso aqui impugnado, bem como a decisão de adjudicação dos Lotes 1 e 2, por o Programa do Concurso (no ponto X) e o Caderno de Encargos (no ponto 2, do capítulo II), serem inválidos (…);
2. Condena-se a Ré a eliminar daquelas peças processuais as características técnicas e os fatores e subfactores de avaliação, que não constituam aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência.
3. Condena-se a Ré, a proceder à abertura de novo procedimento de concurso, com as características técnicas e fatores e subfactores de avaliação que contenham aspetos de execução do contrato submetidos à concorrência.

Aqui chegados, importa analisar o recurso interposto para esta instância pela J&J Lda.

Pela sua relevância para a apreciação que se fará, e no que aqui releva, transcreve-se o que de “direito” ficou expendido na decisão de 1ª instância:
“(…) verifica-se que o Júri classificou as propostas conforme a pontuação que deu no Fator Preço e segundo a pontuação parcelar que atribui a cada um dos diversos Subfactores de Qualidade (Q1 e Q2).
Considerando que a avaliação a realizar correspondia ao facto de as propostas preencherem ou não na totalidade os critérios definidos em cada um dos itens dos Subfactores, conclui-se que atribuída a pontuação máxima, a proposta preenche os critérios e nenhuma pontuação sendo atribuída, a proposta não preenche os critérios. No entanto, fica-se sem saber por que motivo é que a proposta preenche uns itens e qual a razão por que não preenche outros itens. Ou seja, quando se atribui a pontuação de zero, devia-se explicar que a proposta não contempla aquela funcionalidade, ainda que o concorrente tenha dito que contemplava.
Assim, a grelha classificativa, acaba por não ser grelha nenhuma, porque de grelha apenas tem o aspeto físico, porquanto a pontuação nem sequer é intervalada, de forma a se poder apreender o motivo de maior ou menor ponderação das propostas.
Significa isto, que a classificação decorre da pontuação dada, mas a pontuação por si só não explica por que motivo a propostas preenche ou não cada um dos itens. Até porque não se trata de uma verdadeira e própria pontuação, na medida em que a “pontuação” dá sempre: ou tudo ou nada. Daí que a grelha em causa não se possa considerar uma grelha de tipo comparativo de propostas, porque não compara a qualidade das propostas, ou os atributos técnicos de cada um dos itens dos Subfactores, mas antes se limita a verificar se a proposta tem ou não os requisitos técnicos específicos descritos em cada um dos itens dos Subfactores. E ao limitar-se a verificar se estão ou não preenchidos os requisitos definidos em cada um dos itens, não realiza pontuação de qualidade dos atributos das propostas. E ao não realizar pontuação de qualidade referente a cada um dos itens dos requisitos técnicos das propostas, não está a fundamentar a decisão. Significa isto, que a pontuação dada, só por si não fundamenta a decisão, porque se limita a dizer se a proposta preenche ou não os requisitos técnicos. Ora, para tal nem era necessária a intervenção do Júri, bastava colocar as características técnicas num qualquer programa de computador e este pontuava exatamente como o Júri fez. Isto porque, tem a pontuação máxima o produto que possua exata e integralmente todas aquelas características definidas no item, e não tem pontuação nenhuma o produto que não satisfaça a integralidade dos requisitos técnicos estabelecidos no item.
Desta forma, tem razão a Autora quando refere não estar a decisão fundamentada, pelo que se julga procedente o vício de falta de fundamentação.

*
Alega, ainda, a Autora que os fatores e subfactores de avaliação são características que os bens a fornecer, que têm de estar totalmente preenchidos, sob pena de não lhe ser atribuída qualquer pontuação, sendo que apenas um dos concorrentes possuía os bens a fornecer com as características/subfactores definidos no procedimento, o que viola o princípio da concorrência, da igualdade e da transparência e o disposto nos artigos 49.º, 75.º, n.º 1, 132.º, n.º 1 – n) e 139.º do CCP e na Diretiva Comunitária.
Cumpre apreciar os invocados vícios.
(…)
Conforme referido no Aviso do Concurso, o mesmo se destinava a aquisição de Material para Artroplastia do Joelho, e a Entidade Adjudicante não refere nos documentos do procedimento, por que razão apenas lhe interessa um tipo de material com as características técnicas tão específicas e tão iguais às de um fornecedor, sendo que todo o tipo de material técnico serve o efeito pretendido pelo concurso, ou seja, desempenha as mesmas funções.
Por sua vez, conforme estabeleceu o Programa do Concurso no ponto X, Subcritérios de Qualidade, e segundo definiu o Caderno de Encargos no ponto 2, do capítulo II (Características Técnicas Principais das Próteses Totais do Joelho Cimentadas); ambas mencionam requisitos de tal forma específicos, minuciosos, com pormenores técnicos meticulosos, que na prática não permitem a apresentação de propostas que reflitam diversidade nas soluções técnicas. Assim, apenas os aparelhos que tenham exatamente as características técnicas especificadas no concurso são pontuados, com a totalidade da pontuação, bastando que não seja cumprida alguma (nem que seja apenas uma), dessas características, a pontuação será de zero valores. Conforme está bom de ver, ao ser atribuído um peso de 80% no Fator Qualidade, a Entidade Adjudicante acaba por fixar especificações técnicas que não permitem a participação dos concorrentes em condições de igualdade, uma vez que à partida (e a final) somente um produto contém a integralidade dos requisitos técnicos; e como tal, obtém, desde logo, a pontuação total nos itens dos Subcritérios de Qualidade. Assim, as especificações técnicas acabam por corresponder ao produto apresentado pela «J&J, Lda.», ou seja, um modelo existente no mercado (SIGMA); o que não é admissível. Desta forma, resulta claro que apenas interessa à Entidade Adjudicante o modelo daquele fornecedor, dessa forma, beneficiando o concorrente que possui esse material, tal como descrito nos Subcritérios do Fator Qualidade. Vejam-se as características descritas no quadro dos Subfactores Q1e Q2 e no Caderno de Encargos.
Assim, na segunda linha do quadro do Subfactores Q1 (que é igual à segunda linha do ponto 2 do capítulo II, do Caderno de Encargos – Condições Técnicas), prevê-se «componente femoral anatómico em cobalto crómio e tibial em titânio …», sendo que, não admite qualquer outro tipo de fabrico, sem que esteja explicado o motivo pelo qual apenas se deseja este tipo de material. Conforme refere a Autora, se a prótese for fabricada em cromo-cobalto cumpre as funções a que se destina, independentemente da liga em que ambos são produzidos, mas é apenas pontuado a componente tibial em titânio. Desta forma, à partida, está-se a desejar apenas um certo tipo de fabrico, ou seja, está-se a beneficiar um fabricante, ou no caso, um concorrente, uma vez que nem sequer é admitida pontuação para qualquer outro tipo de material. Ora, se ambos os materiais desempenham as mesmas funções e são admitidos na prática clínica generalizada, não se antolha por que motivo não existe qualquer tipo de pontuação para um determinado tipo de fabrico. Ou seja, deveria a grelha espelhar uma pontuação intervalada para o fabrico elegido como preferencial mas admitir pontuação para outro tipo de fabrico, ainda que com menor pontuação.
No que concerne às características mencionadas na sexta linha do quadro Q1 (igual à sexta linha do ponto 2, do capítulo II do Caderno de Encargos), «Componentes femorais com retenção, sacrifício ou substituição do LCP, adaptados a meniscos fixos ou móveis e ao mesmo componente patelar», segundo refere a Autora, colocam-se no mesmo item conceitos distintos de componente femoral, que não são comercializados por todos os potenciais concorrentes.
Por seu turno, a linha 8 do quadro do subfactor Q1 (igual oitava linha do ponto 2, do capítulo II do Caderno de Encargos), «Possibilidade de orientar a rotação externa entre 0º e 7º», limita, desde logo, a apresentação de outro tipo de propostas que possam desempenhar cabalmente a mesma função, ainda que com outra versatilidade, ainda que ínfima, sem que haja explicação alguma para o critério.
Relativamente à exigência descrita na nona linha do quadro Q1 (também nona linha do ponto 2, do capítulo II do Caderno de Encargos), «Possibilidade de orientar o ângulo de valgo do fémur de 0 a 9 graus», apenas se admite esta hipótese de rotação, sendo que de 0 a 9 graus apenas existe um fabricante, segundo refere a Autora. Ora, menciona a impetrante que existem outros tipos de rotação como de 0 a 8 e de 0 a 10, sem que seja clinica e medicamente fundamentada a exigência de 0 a 9 graus. Assim, a adjudicante deveria ter admitido um intervalo de pontuação entre os diferentes tipos de rotação, não sendo compreensível a inexistência de qualquer pontuação intervalada, designadamente para diferentes tipos de rotação.
Ora, sendo as características técnicas as mais diversas, a Adjudicante podia muito bem admitir um intervalo entre essas características, pontuando diferentemente o aparelho que estivesse dentro do intervalo e o que não estivesse. Designadamente, pontuando autonomamente cada uma das diversas características técnicas. Mas não, o sistema de joelho tem de ter todas e exatamente todas (ou praticamente todas) as características do modelo da SIGMA. Basta ver que no Subfactor Q2, a Contrainteressada obtém a pontuação total (100), e no Subfactor Q1, obtém a pontuação de 95, em 100; sendo a pontuação final do Fator Qualidade de 95. É que, se ainda de entre aquelas características técnicas pudesse a pontuação variar de 0 a 5 ou de 0 a 10, ainda se compreenderia, porque então corresponderiam a um padrão referência, mas não é isso que sucede. Resulta, então, que a Entidade Demandada ao não permitir, desde logo, uma variação de pontuação que quantifique a qualidade das propostas em cada um dos itens, está precisamente a dizer que a proposta pretendida é a que tem apenas um só requisito e apenas aquele requisito técnico muito específico. E não vale a pena dizer que o modelo que a Contrainteressada submete a concurso é um produto de excecional qualidade ou que apresenta bons resultados a nível internacional, porque no item em que tal poderia ser pontuado, todos os concorrentes obtiveram a pontuação máxima – vide linha 17 do subfactor Q1. Ainda que, a Autora considere este item não referente à qualidade do produto, acaba por não ser prejudicada pela sua previsão. Em todo o caso, sempre acaba a Autora por ter razão, uma vez que se trata de um critério que não se sabe muito bem em que consistem os «resultados nos registos artroplastia», nem quais sejam os registos, seu período temporal, que tipo de resultados. Nada. É um critério vago e impreciso, e efetivamente não corresponde a uma componente da prótese. Daí que tal item não se deva manter, pelo menos conforme a formulação que apresenta.
Resulta, assim, que a grelha dos Subcritérios está feita à medida do produto apresentado pela Contrainteressada, porque as características técnicas são tão detalhadas, precisas e tão concretamente certeiras ao produto apresentado pela Contrainteressada. Ou seja, ainda que haja outro tipo de produtos a desempenhar a mesma função, ainda que com que a diferenciação técnica seja tão ínfima que não contenda com a qualidade, a pontuação de qualquer outro modelo será sempre de zero.
Segundo refere a Autora no artigo 148.º da Petição Inicial operam no mercado nacional cerca de 17 potenciais fornecedores de próteses de joelho (afirmação que não está impugnada), pelo que não se entende o motivo pelo qual os requisitos do concurso foram tão especificamente focados em características técnicas iguais (ou com uma diferenciação mínima apenas num subcritério, que corresponde a 5%) às do produto submetido a concurso pela Contrainteressada.
Por sua vez, o Caderno de Encargos define características técnicas principais que foram transpostas para os Subfactores de Qualidade, pelo que enferma do mesmo vício, uma vez que apenas com a apresentação de um produto conforme integralmente descrito no ponto 2, do capítulo II, um concorrente pode cumprir os requisitos do Caderno de Encargos, e como tal obter a pontuação plena.
Resulta, assim, que o produto a apresentar tem de ter as características iguais ou praticamente iguais ao do modelo SIGMA, pelo que então este modelo passa a ser um dado obrigatório para quem quiser concorrer; uma vez que ou apresenta este modelo, ou fica imediatamente prejudicado na pontuação (ou seja, sem qualquer pontuação no item que não cumpra a integralidade da característica técnica do modelo SIGMA), uma vez que inexiste outro aparelho igual ao mencionado nos Subfactores de Qualidade do Programa do Concurso e no ponto 2 do capítulo II do Caderno de Encargos.
Significa isto que acaba por não haver comparabilidade de propostas, ou da qualidade das propostas, porque o critério da qualidade afinal não se destina a apurar a qualidade, mas antes em saber se a proposta corresponde a um determinado modelo existente no mercado. E, não obstante a apresentação de uma grelha, tal só por si não é elemento de verificação dos requisitos técnicos dos atributos das propostas, mas antes mero elemento de informação cardinal do preenchimento dos requisitos definidos em cada um dos itens dos Subcritérios. Ou seja, de grelha tem a aparência física, que não a funcionalidade de permitir pontuar a qualidade das propostas (que se faz em intervalos de pontuação e não apenas em pontuação máxima ou nenhuma pontuação), porque a suposta qualidade, já ficou definida aquando da abertura do concurso, no Programa do Concurso e no Caderno de Encargos, com a exigência de especificações técnicas que apenas um produto possui. De tal forma, que concorrente «J&J» consegue ver atribuída a pontuação máxima em 31 dos 32 itens dos Subfactores de Qualidade.
Em face do exposto, pode concluir-se que o concurso se encontra estabelecido para que apenas o modelo SIGMA, apresentado pela «J&J» possa ser pontuado, e logo pelo máximo, em todos os itens (exceto um item) relativos às características técnicas (Subfactores de Qualidade), sendo que para todos os demais produtos, se sabe à partida, que não irão obter qualquer pontuação em muitos itens; situação que não é admissível.
Desta forma, não se mostra cumprido o estabelecido no artigo 75.º, n.ºs 1 e 2 do CCP, uma vez que os Subfactores de qualidade não são elementares, ou seja, não são simples, mas antes complexos e muito específicos; assim como os Subfactores dizem respeito a qualidades e características relativas a um concorrente.
Por sua vez, nos termos do n.ºs 1, 2, 3, 12 e 13 do artigo 49.º do CPP, as especificações técnicas devem ser fixadas de forma a permitir aos concorrentes participarem em condições de igualdade. De tal forma, que as mesmas apenas podem ser fixadas por referência a normas, a referencial técnico de normalização, na falta destes a especificações técnicas em matéria de conceção ou de utilização de materiais, e por referência aos termos de desempenho ou exigências funcionais.
São, ainda, proibidas as fixações técnicas que façam referência a uma marca ou modelo, que tenha por efeito favorecer ou eliminar determinadas entidades ou determinados bens; sendo apenas admissível a fixação de especificações técnicas por referência, acompanhada da menção «ou equivalente», quando haja impossibilidade de descrever, de forma suficientemente precisa e inteligível, as especificações técnicas, por referência a normas nacionais ou europeias, a especificações técnicas.
Ora, as especificações técnicas descritas nos itens dos Subfactores Qualidade Q1 e Q2), correspondem às características do modelo que a Contrainteressada submeteu a concurso. Considerando que, com certeza, todos os equipamentos a concurso desempenham as mesmas funções, e que são tecnicamente fiáveis, não se compreende o motivo de tão detalhada referenciação técnica, que por coincidência é praticamente igual ao modelo SIGMA da Contrainteressada.
Veja-se sobre o assunto o Acórdão do TCA Sul de 27/10/2011, proferido no processo n.º 07952/11 (pode ser lido em www.dgsi.pt), cujo sumário é o seguinte:
“I- (…)
II- De acordo com o artigo 49º nº 4 do CCP, é proibida a fixação de especificações técnicas que façam referência a um fabricante, a uma proveniência determinada, ou a marcas, patentes ou modelos que tenham por efeito favorecer ou eliminar determinadas entidades ou determinados bens.
III- No artigo 49º nº 12 do CCP estabelecem-se restrições à inclusão no Caderno de Encargos de especificações técnicas, proibindo as que, pela sua natureza, possam ter efeito discriminatório, prejudicando a concorrência.
A dado passo refere o Acórdão em apreço:
A promoção da concorrência é um objetivo que consta do considerando (29) da Diretiva nº2004/18/CE; segundo o qual, “As especificações técnicas definidas pelos adquirentes públicos devem permitir a abertura dos contratos públicos à concorrência. Para o efeito, deve possibilitar-se a apresentação de propostas que reflitam diversidade nas soluções técnicas. Neste sentido, as especificações técnicas devem poder ser estabelecidas em termos de desempenho e de exigências funcionais e, em caso de referência à norma europeia - ou, na ausência desta, a norma nacional – as propostas baseadas em soluções equivalentes deverão ser consideradas em soluções equivalentes e também ser consideradas pelas entidades adjudicantes“.
Como se escreve na decisão recorrida, a entidade adjudicante deveria ter demonstrado a não existência de uma equivalência (cfr. considerando 29 da Diretiva nº 2004/18/CE e artigo 49º nº 5 do Código dos Contratos Públicos), verificando se as impressoras propostas pela A..., “ impressoras LASER Policromatic ORI C750N e impressoras LASER Monocromática LASER cor HP 1515 n” detinham ou não a mesmas características das impressoras HP.”
Com efeito, no artigo 49º nº 12 do Código dos Contratos Públicos estabelecem-se restrições à inclusão no Caderno de Encargos de especificações técnicas, proibindo as que, pela sua natureza, possam ter efeito discriminatório, prejudicando a concorrência. Ou seja, “os Estados Comunitários não podem incluir no Caderno de Encargos especificações técnicas mais redutoras da concorrência que as resultantes daquele preceito, designadamente com a menção de produtos de determinada origem ou qualquer procedimento de que resulte favorecimento ou afastamento de determinados produtos ou potenciais concorrentes (cfr. Jorge Andrade da Silva, “Código dos Contratos Públicos”, Comentado e Anotado, Almedina, 2009, p.189).
Sucede no caso dos autos, que a referência às especificações técnicas (que acabam por ser uma remissão para um modelo) favorecem um concorrente, uma vez que apenas aquelas especificações técnicas são pontuáveis na íntegra, não obtendo qualquer outro tipo de especificação técnica nenhuma pontuação, em diversos itens dos Subcritérios de Qualidade. Nem sequer é admitida uma pontuação intervalada, pelo que se acaba por não aferir a comparabilidade dos produtos a concurso, mas apenas em conferir os requisitos de um modelo proposto.
Desta forma, não se mostram preenchidos os pressupostos estabelecidos nos n.ºs 1, 2, 12 e 13 do artigo 49.º do Código dos Contratos Públicos.
No seguimento do que acima se referiu, verifica-se que não existe uma verdadeira possibilidade de pontuação das propostas, porque não há escala de pontuação, nem sequer em cada um dos atributos é admissível pontuação parcial (que no caso deveria ser efetuada em cada um dos diversos itens dos subcritérios de qualidade).
Desta forma, a pontuação de “pontuação” tinha a designação, sendo que não avaliava a qualidade das propostas, porque não definia uma verdadeira e própria escala de pontuação, porque a classificação de 0 ou 5, ou de 0 ou 10, não corresponde a uma pontuação. Pontuação seria uma classificação de 0 até 5 ou de 0 até 10. Daí que não haja qualquer possibilidade de efetuar uma avaliação dos atributos das propostas, uma vez que a já estava tudo valorado no momento da abertura do concurso, com o modelo de suposta classificação apresentado.
Desta forma, o Programa do Concurso, bem assim como o Caderno de Encargos, violam o disposto na alínea n) do n.º 1 do artigo 132.º do CCP.
Resulta, ainda, que o artigo 139.º do CCP, obriga a que haja uma escala de pontuação ordenada em função de diferentes atributos suscetíveis de serem propostos para o aspeto da execução do contrato submetido à concorrência respeitante a esse fator ou Subfactor. Ora, escala de pontuação significa graduação.
Quer isto dizer, então que em cada Fator ou Subfator (na situação em apreço seriam os Subfatores de Qualidade) deve ser permitida uma graduação. No caso em apreço, nos Subfatores de Qualidade, não era admitida qualquer graduação, uma vez que ou o produto tinha os requisitos do Programa do Concurso e do Caderno de Encargos e era pontuado na totalidade, ou se não continha esses requisitos pura e simplesmente não era pontuado.
Face ao exposto, foi violado o n.º 3 do artigo 139.º do CCP.
Para além disso, e conforme já acima referenciado, o modelo de avaliação utilizava dados ou continha características técnicas correspondentes a um modelo proposto (SIGMA, da «J&J»); situação que viola o disposto no n.º 4 do artigo 139.º do CCP.
Considerando que o Caderno de Encargos, e em especial o Programa do Concurso, definiram requisitos técnicos iguais aos atributos de uma possível proposta (produto), verifica-se que o concurso está, desde logo, a beneficiar quem possua tal produto, assim como a limitar a concorrência, porque mais ninguém representa tal produto; e como tal a colocar os concorrentes numa situação de desigualdade concorrencial.
Desta forma, mostram-se, ainda, violados os princípios da imparcialidade, da igualdade e da concorrência (artigo 1.º, n.º 4 do CCP).
Em face ao exposto, conclui-se que o procedimento de concurso em apreço tem de ser anulado, uma vez que as suas peças processuais: Programa do Concurso – ponto X - Critérios de Adjudicação – Próteses Totais do Joelho Cimentadas – Subfactores de Adequação Técnica e Funcional à Utilização Prevista – Q1 – (PTJ Cimentada e Q2 (AII POLI) – vide alínea C) da matéria de facto; e no Caderno de Encargos - ponto 2, do capítulo II - Características Técnicas Principais das Próteses Totais do Joelho Cimentadas – vide alínea D) da matéria de facto; enfermam das supra apontadas invalidades, em função dos requisitos estabelecidos.
Nessa sequência, deve ser anulado o concurso, e como tal, o ato de adjudicação dos Lotes 1 e 2.
Considerando que as referidas peças do concurso enfermam dos apontados vícios, não se podem manter, pelo que deve a entidade adjudicante expurgá-las de tais enfermidades e proceder ao lançamento de novo concurso público, onde não estabeleça requisitos técnicos referenciados a um concreto aparelho; ou por outras palavras, onde defina critérios passíveis de serem submetidos à concorrência, em condições de igualdade.
Atendendo a que as peças do concurso são consideradas desconformes as regras aplicáveis, e como tal devendo ser substituídas, e que o concurso vai anulado, não é possível condenar a Ré na apreciação das propostas apresentadas, uma vez que agora devem presidir à avaliação outros critérios ainda a definir.”

Vejamos então o suscitado pela Recorrente.
Da violação dos art.ºs 49º, 75º, 132º, n.º 1 al. n) e 139º do CCP
Entende a Recorrente J&J que o Tribunal a quo confundiu os conceitos constantes do art.º 49º - especificações técnicas-, e no art.º 75º - fatores e subfactores - do CCP, verificando-se erro na determinação da norma aplicável, nos termos do art.º 639º, n.º 2 alínea c) do CPC.

Desde logo, não se vislumbra que assim seja, tanto mais que bastará uma leitura não necessariamente atenta do procedimento concursal, para que desde logo se possa concluir que o controvertido concurso evidência uma manifesta vertente “fotográfica”, pois que, em bom rigor, as características técnicas submetidas a concurso correspondiam às constantes de prótese comercializadas pela J&J, as quais deram lugar a fatores e subfactores de avaliação.

Com efeito, os fatores e subfactores de avaliação corresponderam linearmente às especificações técnicas dos bens a fornecer, em face do que a avaliação a fazer ficou limitada à verificação se as propostas apresentadas continham ou não aqueles fatores, atribuindo-lhes sintomaticamente uma avaliação de “0” ou “5”, ou seja, ou tudo ou nada.

Como resulta do afirmado pelo tribunal a quo, a entidade adjudicatária limitou-se a converter as características e especificações técnicas dos produtos que pretendia adquirir, em fatores de avaliação, não se verificando a imputada confusão por parte do tribunal a quo dos conceitos ínsitos art.ºs 49º e 75º do CCP.

Com efeito, resulta do art.º 49º, n.º 12 do CCP que “é proibida a fixação de especificações técnicas que façam referência a um fabricante ou uma proveniência determinados, a um processo específico de fabrico, a marcas, patentes ou modelos e a uma dada origem ou produção, que tenha por efeito favorecer ou eliminar determinadas entidades ou determinados bens.”

Por outro lado, refere-se no art.º 75º, n.º 1 do CCP que “os fatores e os eventuais subfactores que densificam o critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa devem abranger todos, e apenas, os aspetos da execução do contrato a celebrar submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, não podendo dizer respeito, diretamente ou indiretamente, a situações, qualidades, características ou outros elementos de facto relativos aos concorrentes”.

Efetivamente, verifica-se que a Entidade Adjudicatária se limitou a transpor para as condições técnicas concursadas, as especificações das próteses da J&J, convertendo-as em fatores de avaliação, subvertendo desde logo a concorrência.

Como esclarecedoramente se refere na Diretiva 2014/24/EU, “As especificações técnicas definidas pelos adquirentes públicos devem permitir a abertura dos contratos públicos à concorrência, bem como a consecução dos objetivos de sustentabilidade. Para o efeito deverão possibilitar-se a apresentação de propostas que reflitam a diversidade das soluções técnicas das normas e das especificações técnicas existentes no mercado incluindo as definidas com base em critérios de desempenho ligados ao ciclo de vida e à sustentabilidade do processo de produção das obras, fornecimentos e serviços. Consequentemente as especificações técnicas deverão ser elaboradas de forma a evitar uma redução artificial da concorrência através de requisitos que favoreçam um operador económico ao refletirem as principais características dos fornecimentos, serviços ou obras habitualmente oferecidos pelo mesmo. “
(…)
“A adjudicação de um contrato deverá realizar-se com base em critérios objetivos que assegurem o respeito dos princípios da transparência, da não discriminação e da igualdade de tratamento, com vista a assegurar uma comparação objetiva do valor relativo das propostas, a fim de determinar, em condições de concorrência efetiva, a proposta economicamente mais vantajosa.
Convém estabelecer expressamente que a proposta economicamente mais vantajosa deverá ser avaliada com base na melhor relação qualidade/preço, que deverá sempre incluir um elemento de preço ou de custo. Deverá igualmente ser especificado que essa avaliação da proposta economicamente mais vantajosa também poderá ser efetuada apenas com base no preço ou na eficácia em termos de custos.”

Não se vislumbra pois, como se disse já, que o tribunal a quo tenha violado, ou confundido, designadamente, o art.º 49º, n.º 12 e 75º do CCP ao decidir como decidiu.

Sendo critério de adjudicação o da proposta economicamente mais vantajosa, seria expectável que fossem aplicados os critérios estabelecidos para o efeito, quer no CCP quer nas Diretivas aplicáveis.

Como se explicitou no Acórdãos do Colendo STA, de 15 de Janeiro de 2002, no Procº nº 048343, “os fatores e subfatores estarão presentes sempre que existe enunciação de características objetivas ou sinais para distinguir entre propostas, os quais hajam de ser considerados como um conjunto, unitariamente, ou formando uma unidade separada (autónoma) dos demais fatores ou subfatores. Por outras palavras, são subfatores os elementos de avaliação (apreciação/valoração) das propostas aos quais se atribua autonomia tal que passem a formar uma unidade estanque à qual é atribuída uma valoração separada, por exemplo, fixando-se uma certa percentagem para o subconjunto de um fator.

Alega, no entanto, a Recorrente que o art.º 75º do CCP é um parâmetro de legalidade dos atos administrativos. Se é verdade que assim é, esse facto não impedirá, antes determinará, que as peças do procedimento concursal se devam conformar com esse parâmetro, não sendo pois por acaso que ao Júri do procedimento está vedada a definição de quaisquer fatores de avaliação divergentes dos originariamente definidos.

Como refere Pedro Gonçalves a propósito ao art.º 75º do CCP, citado pela Recorrida, “não se revela possível, entre nós, a designada “densificação a posteriori” dos critérios de adjudicação. A lei seguiu o sentido para que se inclinava a jurisprudência (cf., por exemplo, Acórdão do STA de 17/01/2007, Proc. 01013/06, no sentido de que a observância dos princípios da legalidade da justiça, igualdade, transparência e imparcialidade “obriga a que na apreciação das propostas se não introduzam critérios já depois de conhecidos os concorrentes e as suas propostas”). Ou seja, os fatores e subfactores de densificação do critério de adjudicação têm de estar estabelecidos e fixados em definitivo no início do procedimento.” – Cfr. Direito dos Contratos Públicos, Pedro Costa Gonçalves - Almedina, pág. 316.

No que concerne ao art.º 132º do CCP, e no que respeita à pontuação adotada, invoca a Recorrente que o referido normativo se limita a estabelecer limites formais, não se imiscuindo, por assim dizer, no conteúdo do modelo de adjudicação.

Em qualquer caso, a comparação de candidaturas pressupõe que se percecione a razão pela qual foi atribuída uma qualquer classificação e não qualquer outra a cada um dos concorrentes, objetivo inconseguido pela utilização do simulacro de “grelha” classificativa adotado.

Com referiu o tribunal a quo, a grelha estabelecida, tem de tal a mera aparência física, pois que não permite diversificar, decompor ou ponderar as características das propostas apresentadas, uma vez que em cada um dos itens só se poderá obter a cotação máxima ou zero.

Se para alguns itens tal se poderá excecionalmente admitir e justificar, quando estejam, ou não, presentes determinadas características essenciais submetidas à concorrência, já quando a outros itens, em que sejam de admitir alternativas técnicas intermédias, mal se compreende como poderá um item parcelar de uma proposta ser liminarmente “arrasado” com uma classificação de zero, sem que tal seja justificado. Com efeito, o facto de se estabelecer uma grelha, não isenta a Entidade adjudicante de explicitar a razão pela qual foi atribuída a cada item das propostas, uma cotação e não qualquer outra.

A propósito de questão distinta, mas comparável, refere Margarida Olazabal Cabral in “Concurso Público no Código dos Contratos Públicos” - Estudos da Contratação Pública -I, Coimbra Editora, 2008, pág. 182 que “(…) o CCP exige que o programa de concurso “imagine” todos os atributos que as propostas poderão conter e que defina para cada um desses atributos possíveis uma escala de pontuação (num exemplo reduzido à maxima simplicidade, para o critério “qualidade dos materiais”, determinar-se-ia, “se forem propostos predominantemente, os materiais x ou y, será atribuída uma pontuação de 20, se forem os materiais n ou z, uma pontuação de 15, para a proposta com os materiais g e h, uma pontuação de 10, e para os materiais k ou w, uma pontuação de 5”; em alternativa, e ainda neste exemplo simplificado, estabelecer-se-ia “para uma proposta que apresente materiais com as características a, b ou c, uma pontuação de 20, para uma com materiais com características , d, e, ou f, uma pontuação de 15, e por ai adiante;(…)”

No mesmo sentido apontam Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira (in Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública, Almedina 2011, páginas 969 e seguintes) quando referem que “A preocupação que, em qualquer caso, deve nortear a organização de uma escala de pontuação dos fatores e subfactores do critério de adjudicação é exatamente essa, de a apertar tanto quanto possível, de maneira a não deixar grandes “buracos” ou intervalos classificativos entre propostas de valia próxima, em prol dos princípios da concorrência e da proporcionalidade.
Consideram-se, assim, ilegais os casos em que as escalas estão organizadas grosseiramente com intervalos visivelmente desproporcionados na sequência das diversas pontuações, como o caso acima referido de se atribuir à melhor proposta em determinado (sub)fator uma cotação valiosa e a todas as outras zero.”
Em face do que precedentemente ficou expendido, mostra-se que a “grelha” classificativa adotada não permite avaliar as propostas de modo a que se possa visualizar uma coerente diferenciação entre todas, em face do que se não mostra censurável a decisão aqui recorrida ao ter considerado violado o art.º 132º, n.º 1 alínea n) do CCP.

No que respeita já ao imputado erro de interpretação do art.º 139º do CCP, por parte do tribunal a quo, igualmente se não vislumbra que assim seja.

Com efeito, tendo sido entendido, e aqui se confirmando, que o Programa do Concurso definiu fatores e subfactores de avaliação que em boa medida se limitaram a replicar os atributos de um determinado produto, não se vislumbra pois que a decisão do tribunal a quo possa ter incorretamente invocado a violação, nos termos em que o fez, dos art.ºs 49º, n.º 2, 75º, 132º n.º 1 alínea a) e 139º, n.º 4 do CCP.

Da violação dos princípios da concorrência, igualdade e imparcialidade
Invoca ainda a Recorrente J&J que a decisão recorrida interpretou mal o concurso ao considerar que a forma como o mesmo está configurado beneficia um determinado produto.

Desde logo, se é certo que à entidade adjudicante deverá ser dada alguma discricionariedade no modo como define os componentes de avaliação das propostas, o que é facto é que esse facto não deverá redundar em abusiva arbitrariedade.

Se está vedada legalmente a possibilidade de fixar especificações técnicas que façam referência a um fabricante, tal necessariamente e por idêntica razão, abrangerá as situações em que as especificações técnicas de um determinado produto são “desdobradas”, em fatores e subfatores a serem apreciados no procedimento, o que se consubstancia numa escolha final meramente “fotográfica”.

Neste sentido refere Jorge Andrade Silva, em anotação ao Artº 49º CCP (in Código dos Contratos Públicos Revista e Atualizada, 2013, 4ª Edição, pág. 179) que “(...) estabelece-se restrições à inclusão no caderno de encargos de especificações técnicas, proibindo as que, pela sua natureza, possam ter efeito discriminatório e, portanto, impeditivo do livre acesso aos procedimentos adjudicatórios, prejudicando, consequentemente, a concorrência. Por isso os Estados comunitários não podem incluir nos cadernos de encargos especificações técnicas mais redutoras da concorrência que as resultantes deste preceito, designadamente com a menção de produtos de determinada origem ou qualquer procedimento de que resulte favorecimento ou afastamento de determinados produtos ou potenciais concorrentes.”

A este propósito se referiu igualmente no sumário do Acórdão deste TCAN nº 01257/09.7BEPRT de 25 de Março de 2010, a propósito do princípio da concorrência que “(...) para além das exigências de proporcionalidade, de necessidade e de adequação à luz do ulterior contrato também os deveres de prossecução do normal funcionamento do mercado e da proteção subjetiva dos potenciais concorrentes de forma a assegurar o mais amplo acesso aos procedimentos por parte dos interessados em contratar”.

Mostra-se pois, tal como decidido em 1ª instância, que as características técnicas definidas pela entidade adjudicante no Caderno de Encargos e os subfactores de avaliação qualitativa propostos para avaliação das propostas, violam o princípio da concorrência, por se mostrarem desproporcionalmente restritivos da concorrência.

Igualmente neste sentido se refere no Acórdão deste TCAN nº 322/11BEBRG, de 16.12.2011 que :
“(…) VIII. A concorrência constitui o elemento dinamizador da construção do mercado interno impondo, em matéria de contratação pública, especiais medidas de transparência, de imparcialidade e de publicidade com a abertura dos procedimentos ao maior número de operadores económicos, sejam eles nacionais sejam de Estados-membros da UE.
(…)
X. As entidades adjudicantes não podem, por exemplo, estabelecer requisitos de acesso e/ou de avaliação de propostas em termos tais de que resulte uma limitação desproporcionada e desigualitária quanto ao mercado habilitado a participar no procedimento ou, então, um condicionamento, ainda que potencial, dos resultados do próprio procedimento concursal.”

Em face do que precede, não se vislumbra que o tribunal a quo tenha deixado de aplicar corretamente os princípios da imparcialidade, da igualdade e da concorrência, constantes no art.º 1º, n.º 4 do CCP.

Da falta de fundamentação
Ao contrário do concluído na decisão Recorrida, entende a Recorrente que a decisão controvertida se encontra devidamente fundamentada por remissão para a grelha de avaliação.

Se é certo que a necessária fundamentação pode ser em abstrato plasmada por via de uma grelha classificativa, terá a mesma, no entanto, de explicitar, ainda que por remissão para graduações antecipadamente estabelecidas e objetivadas, a classificação obtida, não podendo, como na situação em apreciação, consistir num mero simulacro de grelha, não gradativa, através da qual cada item das propostas é avaliado com a cotação máxima ou zero, sem qualquer possibilidade de recurso a classificações intermédias.

A potencial arbitrariedade do júri na avaliação das propostas será tanto menor quanto mais densificada e escalonada esteja a grelha adotada, o que se reveste de acrescida importância, quando, como na presente situação, se está perante a necessidade de avaliar a proposta economicamente mais vantajosa.

Desde logo, o referido é essencial, tanto mais que se mostra básico que os candidatos percecionem por que razão num determinado item lhes é atribuída a classificação de zero.

Efetivamente, e como resulta já explicito da decisão recorrida, não se alcança do relatório preliminar e do Relatório Final, que suporta a decisão tomada pela entidade adjudicante, que o júri tenha explicitado de forma adequada e suficiente as razões que determinaram as decisões adotadas.

A este respeito referem lapidarmente Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, (in Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública - Almedina, 2011, pág. 985) que “Carece de fundamentação adequada um relatório em que o júri se limite a referir genericamente quais foram os aspetos ou dados que se tiveram em consideração para efeitos da avaliação de um determinado fator de adjudicação, atribuindo depois uma determinada pontuação em cada proposta, sem explicitar minimamente as razões concretas que conduziram às diversas pontuações, ou seja, sem adiantar nada quanto às qualidades e quantidades de cada uma das propostas, aos respetivos atributos, que permitisse diferenciar umas e outras.”

Em face do que precede, por não estarmos perante uma grelha de classificação suficientemente densa que dispense outra fundamentação complementar, não merece igualmente censura o entendimento adotado pelo tribunal a quo, ao entender que a controvertida decisão concursal se mostrava insuficientemente fundamentada, à luz do estatuído no art.º 268º, n.º 3 da CRP, art.º 153º do CPA e nos art.ºs 68º, 69º do CCP.
* * *
Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão de 1ª instância.
Custas pela aqui Recorrente.

Porto, 18 de Março de 2016
Ass.: Frederico de Frias Macedo Branco
Ass.: Joaquim Cruzeiro
Ass.: Luís Migueis Garcia