Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:01751/07
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:10/23/2007
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL. VERIFICAÇÃO E GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS PROVENIENTES DE CONTRIBUIÇÃO AUTÁRQUICA PAGA POR SUB-ROGAÇÃO.
Sumário:I)- Resulta do preceito do artº 92º do CPPT que a sub-rogação importa efeitos de índole substantiva – a conservação das garantias e privilégios do crédito exequendo – e de natureza processual – a utilização do processo de execução fiscal para cobrança do crédito sub-rogado.

II)- Assim, o terceiro sub-rogado vê assegurada a subsistência dos privilégios creditórios e garantias reais previstos nos artºs. 705º, 736º, 738º, 743º e 745º do Cód. Civil e em outras normas especiais, adquirindo a medida dos direitos dados pelo credor (cf. dispõe o artigo 593° do C. Civil).

III)- Gozando a contribuição autárquica das garantias especiais previstas no Código Civil para a contribuição predial e visto que os créditos por contribuição predial inscritos para cobrança no ano corrente da data da penhora, e nos dois anos anteriores, têm privilégio sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos àquela contribuição, nos termos do disposto no art. 744°, n° 1 do CCivil, devem os créditos adquiridos por sub-rogação por um reclamante conservar as garantias e privilégios da dívida paga referente a contribuição autárquica, nos termos do disposto no art. 92° do CPPT.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo:
l – Inconformado com a sentença proferida pelo TAF de Sintra, nos presentes autos de reclamação e graduação de créditos, dela interpôs recurso jurisdicional para este T.C.A.S. O MINISTÉRIO PÚBLICO, formulando as seguintes conclusões:
1. A contribuição autárquica goza das garantias especiais previstas no Código Civil para a contribuição predial;
2. Os créditos por contribuição predial inscritos para cobrança no ano corrente da data da penhora, e nos dois anos anteriores, têm privilégio sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos àquela contribuição, nos termos do disposto no art. 744°, n° 1 do CCivil;
3. Os créditos adquiridos por sub-rogação conservam as garantias e privilégios da dívida paga, nos termos do disposto no art. 92° do CPPT;
4. Parte dos créditos de que o reclamante J... obteve sub-rogação dizem respeito à contribuição autárquica incidente sobre o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais, sob o n° 9862, penhorado na execução fiscal que está na origem dos presentes autos de reclamação de créditos;
5. E, concretamente os relativos à Contribuição Autárquica dos anos de 1995 e 1996, situam-se dentro do limite temporal previsto no art. 744°, n° 1 do C. Civil;
6. Considerando a data da penhora e o disposto no art. 92° do CPPT, podiam aqueles créditos ser reclamados no processo de execução fiscal e admitidos ao concurso de credores, nos termos do disposto no art. 240° do CPPT, como créditos que gozam de garantia real (privilégio imobiliário especial) incidente sobre o bem imóvel penhorado na execução fiscal;
7. Tais créditos deviam ter sido reconhecidos e graduados antes dos demais créditos reclamados e do crédito exequendo;
8. Ao assim não proceder violou a douta decisão recorrida, por erro de facto, o disposto no art. 24°, n° 1 do CCA e arts. 733°, 744°, n° 1, ambos do C. Civil.
Nestes termos, julgando-se procedente o presente recurso, deverá ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por outra que gradue os créditos relativos a Contribuição Autárquica dos anos de 1995 e 1996, de que o reclamante J... obteve sub-rogação, antes dos demais créditos reclamados e da quantia exequenda.
V.Exas, decidirão, fazendo a costumada, Justiça.
Os autos vêm à conferência depois de recolhidos os vistos legais.
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2.- Com base nos documentos juntos a sentença deu como assentes os seguintes factos com relevância para a decisão do recurso:
A) Em 23 de Junho de 1992 a Fazenda Pública instaurou contra a execução fiscal n° 1503921065017, a qual corre termos no Serviço de Finanças de Cascais l, tendo por objecto dívidas ao Instituto da Segurança Social, I.P. Centro Distrital de Lisboa, respeitante a contribuições em dívida ao C.R.S.S. de Lisboa, de Outubro de 1990 a Outubro de 1991, acrescidas de juros de mora, no montante de 1.553.031$00, de que os presentes autos constituem apenso (cf. fls. l e certidão de fls. 2 da execução);
B) Em 25 de Março de 1998, no âmbito do processo de execução indicado em A), para pagamento da quantia ali referida, foi penhorado metade (1/2) do prédio urbano, designado lote 14, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais, sob o n° 9862 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o n° 00599/010885, (cf. certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Cascais de fls. 230 dos autos de execução);
C) Em 31 de Março de 1998, a penhora identificada na alínea anterior foi registada a favor da Fazenda Nacional pela apresentação n° 89/310398 (cf. certidão emitida pela Conservatória do Registo Predial de Cascais de fls. 230 dos autos de execução);
D) Em 25 de Maio de 1998, foi vendido metade (1/2), do prédio urbano, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais, sob o n° 9862 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o n° 00599/010885 (cf. auto de abertura de propostas de fls. 269 a 272 dos autos de execução);
E) A executada é devedora ao Instituto da Segurança Social, I.P. Centro Distrital de Lisboa, de crédito no montante de 1.553.031$00, correspondente a contribuições em dívida ao C.R.S.S. de Lisboa, de Outubro de 1990 a Outubro de 1991, acrescidas de juros de mora;
F) A executada é devedora ao Instituto da Segurança Social, I.P. Centro Distrital de Lisboa, de crédito no montante de 59.204$00, correspondente a contribuições em dívida ao C.R.S.S. de Lisboa, de Novembro e Dezembro de 1991 e Setembro e Outubro de 1992, acrescidas de juros de mora, conforme certidão de fls. 45 a 47 destes autos);
G) A executada é devedora a José Alves, da quantia de 31.000.000$00, correspondente a indemnização cível, por emissão de cheque sem provisão, em cujo pagamento a executada foi condenada por sentença transitada em julgado em 15 de Janeiro de 1999, que constituiu a seu favor hipoteca judicial sobre a/2 do imóvel penhorado e vendido nos autos de execução (cf. certidão de fls. 105 a 113 e 131 e sgs);
H) A executada foi devedora a da quantia de 2.769.984$00, quantia por ele paga com direito a sub-rogação nos direitos da Fazenda Pública referente à dívida exequenda nos autos de execução fiscal n° 1053.90-105735.9, que diz respeito a Contribuição Autárquica dos anos de 1990 a 1996 e respectivos juros e IVA relativa aos anos de 1992 a 1994 e juros, Imposto Complementar do ano de 1988 e juros, e a Taxa de Justiça e respectivos juros (cf. certidões que constam no verso de fls. 140 a 143 e 183,183 verso e 184);
I) J..., entretanto faleceu, tendo sido, por sentença proferida em incidente de habilitação de herdeiros apensa a estes autos, declarado habilitado o Estado Português para prosseguir em seu lugar a instância (cf. sentença de fls. 116 a 120 do Processo 11/98-A apenso a estes autos).
Factos não provados
Provaram-se todos os factos objecto de análise com interesse para a decisão da causa, constantes das reclamações de créditos admitidas liminarmente à excepção do seguinte facto:
No processo de execução indicado na alínea H) foi penhorado metade do prédio urbano composto de um lote de terreno destinado a exploração de pedreira, sito nos limites de Birre, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais sob o artigo 9861/ e descrito na Conservatória do Registo Predial de Cascais sob a ficha n° 02310/260387 (cf. requerimento de fls. 125).
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3.- Fixada a factualidade relevante, vejamos agora o direito donde emerge a solução do pleito, sendo certo que as conclusões de quem recorre balizam o âmbito de um recurso concreto ( artºs. 684º e 690º do CPC).
É inquestionável o regime segundo o qual este Tribunal aplica o Direito ao circunstancialismo factual que vem fixado, pelo que a questão que se impõe neste recurso é a de juridicamente fundamentar se, gozando a contribuição autárquica das garantias especiais previstas no Código Civil para a contribuição predial e visto que os créditos por contribuição predial inscritos para cobrança no ano corrente da data da penhora, e nos dois anos anteriores, têm privilégio sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos àquela contribuição, nos termos do disposto no art. 744°, n° 1 do CCivil, devem os créditos adquiridos por sub-rogação por um reclamante conservar as garantias e privilégios da dívida paga referente a contribuição autárquica, nos termos do disposto no art. 92° do CPPT.
Subscrevemos inteiramente o ponto de vista do recorrente MP.
Na verdade e como se diz na própria sentença, os créditos reclamados pelo Estado, que ocupa na acção o lugar do falecido J..., adquiridos por sub-rogação conservam as garantias e privilégios da dívida paga conforme dispõe o artigo 92° do CPPT.
Textua este que:
“1.- A dívida paga pelo sub-rogado conserva as garantias, privilégios e processo de cobrança e vencerá juros pela taxa fixada na lei civil, se o sub-rogado o requerer.
2.- O sub-rogado pode requerer a instauração ou o prosseguimento da execução fiscal para cobrar do executado o que por ele tiver pago, salvo tratando-se de segunda sub-rogação.”
Resulta claro do preceito transcrito que a sub-rogação importa efeitos de índole substantiva – a conservação das garantias e privilégios do crédito exequendo – e de natureza processual – a utilização do processo de execução fiscal para cobrança do crédito sub-rogado.
Assim, o terceiro sub-rogado vê assegurada a subsistência dos privilégios creditórios e garantias reais previstos nos artºs. 705º, 736º, 738º, 743º e 745º do Cód. Civil e em outras normas especiais, adquirindo a medida dos direitos dados pelo credor (cf. dispõe o artigo 593° do C. Civil).
Como se provou, parte dos créditos de que o reclamante J... obteve sub-rogação dizem respeito à contribuição autárquica incidente sobre o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais, sob o n° 9862, penhorado na execução fiscal que está na origem dos presentes autos de reclamação de créditos.
Mais concretamente, os relativos à Contribuição Autárquica dos anos de 1995 e 1996, situam-se dentro do limite temporal previsto no art. 744°, n° 1 do C. Civil;
E, considerando a data da penhora e o disposto no art. 92° do CPPT, podiam aqueles créditos ser reclamados no processo de execução fiscal e admitidos ao concurso de credores, nos termos do disposto no art. 240° do CPPT, como créditos que gozam de garantia real (privilégio imobiliário especial) incidente sobre o bem imóvel penhorado na execução fiscal.
Tais créditos deviam ter sido reconhecidos e graduados antes dos demais créditos reclamados e do crédito exequendo.
Pelo exposto e tendo em conta que quanto aos demais créditos nenhum dissídio se levanta, nos termos das disposições legais atrás citadas, em conjugação com o preceituado no artº 747º do CCivil há que alterar o julgado em 1ª instância, graduando os créditos reconhecidos e o exequendo pelo modo seguinte:
1° - Os créditos reclamados por J... provenientes de contribuição autárquica incidente sobre o prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais, sob o n° 9862 e relativa aos anos de 1995 e 1996 e respectivos juros;
2º - Os créditos reclamados por José Alves, correspondente a crédito por indemnização cível, por emissão de cheque sem provisão pela executada.
3° - Os créditos exequendo e reclamados pelo Instituto da Segurança Social, I.P., correspondentes a contribuições em dívida ao Centro Distrital de Lisboa e respectivos juros.
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4.- Termos em que acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em, concedendo provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida com a consequente admissão e graduação de créditos acima operadas.
Custas pelo recorrido, em ambas as instâncias fixando-se em 3 (três) UCs a taxa de justiça.
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Lisboa, 23/10/2007
(Gomes Correia)
(Eugénio Sequeira)
(Manuel Malheiros)