Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02515/08
Secção:CT- 2ºJUÍZO
Data do Acordão:12/18/2008
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IRC.
RELAÇÕES ESPECIAIS ENTRE EMPRESAS E MENOS VALIAS.
Sumário:1. De acordo com o disposto no artº 57º do CIRC , a DGCI poderá efectuar correcções que sejam necessárias para a determinação do lucro tributável sempre que, em virtude das relações especiais entre o contribuinte e outra pessoa, sujeita ou não a IRC, tenham sido estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes, conduzindo a que o lucro apurado com base na contabilidade seja diverso do que se apuraria na ausência dessas relações.

2. Embora o citado normativo não defina o que deve entender-se por "relações especiais", a doutrina fiscal vem considerando que tais relações existem quando haja situações de dependência, nomeadamente no caso de relações entre a Sociedade e os sócios, entre empresas associadas ou entre sociedades com sócios comuns ou ainda entre empresas mães e filiadas.

3. - Compete à Fazenda Pública o ónus da prova da existência dessas relações especiais, bem como os termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias, devendo o acto ser anulado se tal prova não for feita.

4. - A correcção a que se refere o art. 57º do CIRC não pode, pois, assentar em indícios ou presunções, impondo-se à AF que prove os supra mencionados pressupostos legais para que possa corrigir a matéria colectável do contribuinte ao abrigo do art. 57º do CIRC.

5.- A determinação da situação de condições especiais, diferentes das que seriam normalmente acordadas entre empresas independentes, poderá ser feita pela AF com uma certa margem de discricionariedade técnica desde que adopte um método legítimo e devidamente fundamentado, e que tal situação se enquadre no conceito de relações especiais previsto no art. 9º, nº 1, al. b) do Modelo de Convenção da OCDE de 1977, complementado por novo Relatório de 84, e no art. 57º-C, nº 2, do CIRC.
Nº Convencional:.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo:

I – RELATÓRIO

E…… -E……………………………, SGPS, com os sinais identificadores dos autos, interpõe recurso jurisdicional da decisão do Mmº. Juiz do TAF de Lisboa, que julgou improcedente a presente impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação de IRC do ano de 2000, concluindo assim as suas alegações:
1ª) A Administração Fiscal não aceitou como custo fiscal uma menos-valia gerada na esfera jurídica da M….., resultante da alienação de "acções H….";
2ª) Essa não aceitação como custo foi fundamentada pela Administração Fiscal na invocação do art° 23° do CIRC, e nas seguintes afirmações: teria havido transmissões das referidas acções entre sociedades que "integram o mesmo grupo económico", isto é, "entidades directa ou indirectamente relacionadas entre si";
3ª) Acontece, porém, que a Administração Fiscal não faz qualquer prova da referida existência de relações especiais, isto é, de que as várias entidades integravam o mesmo grupo económico, ou que estavam directa ou indirectamente entre si relacionadas;
4ª) É Jurisprudência firmada (cf. entre muitos, Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul de 24/1/2006 e 26/6/2006, Processos n°s 01217/03 e 365/03), que compete à Administração Fiscal o ónus de demonstrar a legitimidade da sua actuação, isto é, a legitimidade da desconsideração dos custos;
5ª) Ao considerar como correcta a correcção efectuada pela Administração Fiscal sem que esta fizesse a prova do alegado, a sentença recorrida violou o art° 23° do CIRC;
6ª) A Administração Fiscal aduziu, ainda, como fundamento para a correcção do referido custo, ao abrigo do art° 23°, o argumento segundo o qual as referidas menos-valias não são, comprovadamente, resultantes de uma fruição, utilização ou afectação dos elementos que as geraram no âmbito da actividade da sociedade;
7ª) Tal fundamentação é obscura e insuficiente, já que, por um lado, não se entende o exacto sentido de tal afirmação e, por outro, por si só, ela é insuficiente para justificar a aplicação do art° 23° do CIRC;
8ª) A douta sentença recorrida ao aceitar tal fundamento, violou, por um lado, o princípio de que a fundamentação não pode ser insuficiente e obscura e por outro, aceitou um fundamento que não está previsto no art° 23° do CIRC;
9ª) A Administração Fiscal ao aduzir como fundamento para a correcção efectuada a existência de relações especiais, cometeu um erro sobre os pressupostos de direito, na medida em que a existência de relações especiais é fundamento para correcções nos termos do art° 57° do CIRC, na redacção à época em vigor;
10ª) Ao contrário do que é defendido na douta sentença recorrida, os fundamentos aduzidos pela Administração Fiscal constam do art° 57° do CIRC, ao considerar que o valor de venda das "acções H....." por parte da M...... não era aceitável face à existência de relações especiais, que é, precisamente, o fundamento e a correcção prevista no art° 57° do CIRC;
11ª) Em qualquer caso, a recorrente fez prova de que entre a data de aquisição das "acções H......." e a data da sua alienação, houve uma efectiva desvalorização dos activos da referida sociedade H......, na medida em que o Supremo Tribunal Administrativo veio julgar improcedente o recurso contencioso apresentado contra o Despacho do Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território que tinha decretado a inviabilidade construtiva nos terrenos da propriedade da H.....;
12ª) A douta sentença recorrida ao não considerar esse facto como provado e ao não analizá-lo, cometeu uma ilegalidade;
13ª) A Administração Fiscal corrigiu também, invocando o art° 23° do CIRC, a menos-valia obtida pela M....... na alienação das "acções I......";
14ª) A Administração Fiscal para corrigir a referida menos-valia voltou a invocar a existência de relações especiais, pelo que tais menos-valias "foram apuradas sem que os bens que a geraram tivessem saído do património desse grupo económico, não havendo para tais factos reais perdas por depreciação de valores patrimoniais";
15ª) A douta sentença recorrida interpretou erroneamente o art° 23° do CIRC, já que, a existência de relações especiais não é fundamento para a não aceitação como custo fiscal;
16ª) Expressamente, o art° 23° do CIRC considera as menos-valias como custo fiscal, entendendo-se, até, que é desnecessário a prova da indispensabilidade do custo quando ele seja subsumível a uma das hipóteses exemplificativas do referido artigo 23° (cf. Prof. Teixeira Ribeiro, Revista de Legislação e Jurisprudência, n° 3743, p. 39 a 43, a propósito do art° 26° do Código da Contribuição Industrial, de redacção similar à do art° 23° do CIRC -- tal citação consta do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 20/6/2006, Processo n° 365/2003);
17ª) Até 2003, a existência de relações especiais apenas permitia a Administração Fiscal a correcção de eventuais menos-valias com a aplicação do art° 57° do CIRC, fazendo a prova de que as condições estabelecidas entre tais entidades são diferentes das que seriam convencionadas entre entidades independentes;
18ª) Só após 2003, com as alterações introduzidas ao art° 23° do CIRC, é que deixaram de ser aceites as menos-valias geradas em negócios entre entidades com relações especiais;
19ª) Em qualquer caso, o conjunto de negócios relacionados com a venda das "acções I.......", explicam, de forma cabal, a total racionalidade económica da referida menos-valia;
20ª) Na verdade, tendo a M........ adquirido, a entidades independentes, terrenos com vocação urbanística, por imposição da autoridade municipal (Câmara Municipal de O......), a aprovação de loteamento estava dependente da entrega, gratuita, à referida Câmara de um terreno que era propriedade da Sociedade I........;
21ª) Para a viabilização do negócio e, portanto, para a obtenção de proveitos, era necessário incorrer num custo consistente na aquisição da totalidade do capital social da I.........;
22ª) Provado está no processo, de que se a M....... teve uma menos-valia na venda das "acções I........" teve uma mais-valia na venda dos terrenos inseridos no processo de loteamento, pelo que a referida menos-valia foi, claramente, um custo necessário para a obtenção dos proveitos;
23ª) A sentença recorrida, ao considerar que a existência de relações especiais é fundamento de correcção do custo, nos termos do art° 23° do CIRC, interpretou erroneamente tal disposição como interpretou, também, erradamente tal disposição ao não considerar que a menos-valia gerada na alienação das "acções I........." foram um custo indispensável à obtenção de proveitos;
24ª) A Administração Fiscal corrigiu uma menos-valia obtida pela Sociedade S....... gerada na alienação de "acções E.......", invocando o art° 23° do CIRC;
25ª) Fundamentou tal correcção na circunstância de se estar perante transacções entre entidades não independentes, pelo que "os activos podem ser transaccionados sem que saiam do património desse grupo económico pelo que (...) não se produzirá nunca uma realidade económica que se traduza em reais perdas por depreciação de valores patrimoniais";
26ª) A sentença recorrida, ao aceitar esse fundamento como correcção da menos-valia em causa, interpretou erroneamente o art° 23° do CIRC;
27ª) Na verdade, também aqui, e mais uma vez, não se tomou em consideração que a existência de negócios entre entidades não independentes não é pressuposto legalmente estabelecido no art° 23° do CIRC;
28ª) A existência de relações especiais é pressuposto, sim, de aplicação do mecanismo do art° 57° do CIRC;
29ª) Sendo certo, recorde-se, a opinião do Prof. Teixeira Ribeiro e do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 20/6/2006, Processo n° 365/2003, de que um custo subsumível a uma das hipóteses previstas no art° 23° do CIRC, como é o caso das menos-valias, implica a sua imediata aceitação;
30ª) Em qualquer caso, a correcção efectuada à menos-valia com base no valor contabilístico representa, por parte da sentença recorrida, uma interpretação errónea do art° 23° do CIRC já que este não estabelece tal critério como base de correcção;
31ª) A Administração Fiscal corrigiu, também, a menos-valia obtida pela S...... na alienação das "acções P.........", invocando, mais uma vez, o art° 23° do CIRC e a existência de relações especiais;
32ª) A sentença recorrida interpretou erradamente o referido art° 23° do CIRC, já que a existência de relações especiais não é fundamento para a aplicação do referido normativo;
33ª) Sendo certo, que a própria Administração Fiscal admite, em face da situação liqudida da Sociedade P............., nomeadamente, os seus prejuízos e a cobertura deles feita pela sócia (a S.......), que o preço de venda de tais acções é adequado;
34ª) No entanto corrige essa menos-valia, com base no preço pelo qual a adquirente das acções à S....... veio a transaccioná-las;
35ª) O que demonstra, de forma clara, que o que estaria em causa era a correcção do art° 57° do CIRC, que impunha correcção simétrica, pelo que a sua aceitação pela sentença recorrida consubstancia uma errada interpretação do art° 23° do CIRC.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se, nos termos e com os fundamentos acima indicados, a sentença recorrida, considerando procedente a impugnação deduzida contra a liquidação de IRC do ano de 2000, como é de Justiça.
Não foram produzidas contra -alegações.
A DPGA emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
Os autos vêm à conferência depois de recolhidos os vistos dos EXMºS Adjuntos.
*
II. - FUNDAMENTAÇÃO:
2.1. - DOS FACTOS:
Na sentença recorrida foi fixado o seguinte probatório:
1) Em resultado de acções de inspecção efectuadas às contas das sociedades componentes do grupo de consolidação de contas sob o domínio da sociedade E...... E.............., SGPS, SA, foram efectuadas correcções de natureza meramente aritmética com efeitos na determinação dos valores do lucro tributável e por consequência da matéria colectável de IRC que foram declarados, pela ora impugnante em nome do referido grupo referido grupo de sociedades - relatório de fls. 45 dos autos.
2) Das correcções efectuadas ao lucro tributável consolidado, a impugnante vem opor-se às que respeitam às menos valias fiscais que foram desconsideradas pela AF, no montante de €40.111.397,89 - alínea g) do n° 1.2.1 do relatório, a folhas 45 dos autos).
3) O montante das correcções referidas no número anterior, resulta da adição das correcções efectuadas aos resultados para efeitos fiscais das sociedades dominadas, conforme se indica:

Denominação das sociedades e Correcção
designação das operações
M........ -- Sociedade de Compra,
Venda e Administração de Propriedades, SA,
por alienação de participações sociais na
H........ - Investimentos Turísticos, SA
29.499.755, 28
M...... -- Sociedade de Compra, Venda e
Administração de Propriedades, SA, por alienação
de participações sociais na I........ - Capital e
Imóveis, Lda
5.164.493,32
S...... - Sociedade de Mediação Imobiliária e
Turística E........., SA, por alienação de
participações sociais na E....- E.........
Imobiliário, SA
4.268.712,40
S...... - Sociedade de Mediação Imobiliária e
Turística E............., SA, por alienação de
participações sociais na P........... Sociedade
de Desenvolvimento Agro-Turístico, SA
1.178.436,8 9
Total de correcções impugnadas 40.111.397, 89 doc. fls. 45 dos autos.
4) Para a correcção efectuada com referência à sociedade participada M........ - Sociedade de Compra, Venda e Administração de Propriedades, SÁ, pela alienação de participações sociais na H...... -- Investimentos Turísticos, SÁ, a AF sustentou-se nos fundamentos de facto seguintes (folhas 51 a 54 dos autos):
a) Serem as menos valiam apuradas em consequência da acentuada diminuição do preço de venda das acções da H....... Investimentos Turísticos, SA, perante o respectivo preço de aquisição suportado no mesmo dia em que o então alienante as havia adquirido por um custo significativamente mais reduzido;
b) Ter a consequente valorização das acções aferida no próprio dia em que as mesmas foram transmitidas à M........, afectado os resultados de sociedade do mesmo grupo económico, mas sediada em território sujeito a regime fiscal privilegiado (Gibraltar);
c) Por serem todas as empresas intervenientes pertencentes ao mesmo grupo económico, ficou claramente demonstrado que as menos valias foram apuradas sem que os bens que as geraram tivessem saído do património do mesmo grupo económico e que as mesmas são consequência directa e sequencial de mais valias escrituradas na esfera de sociedade sujeita a regime fiscal privilegiado, vulgo paraíso fiscal;
d) Assim, quer tenha sido por a M........ não ter agido como a interveniente na aquisição quando a transmissão se efectuou pelo mais baixo dos dois preços negociados no mesmo dia (21/12/1995), procurando a forma mais económica de aquisição, quer tenha sido por a venda que a mesma realizou ter tido como preço um valor bem abaixo do que aquele que proporcionalmente resultaria das próprias avaliações que são invocadas, não foram as perdas por menos valias assim declaradas reconhecidas como comprovadamente resultantes de uma fruição, utilização ou afectação dos elementos que as geraram no âmbito da actividade da sociedade onde são relevadas, condição esta que o disposto no corpo do número l do artigo 23° do Código do IRC exige que seja verificada;
5) Para a correcção efectuada com referência à sociedade participada M......... Sociedade de Compra, Venda e Administração de Propriedades, SÁ, por alienação de participações sociais na I....... - Capital e Imóveis, Lda, a AF sustentou-se nos fundamentos de facto seguintes (vide folhas 54 a 56 dos autos):
a) Serem as menos valias apuradas em consequência da acentuada diminuição do preço de venda das acções da I........ - Capital e Imóveis, Lda, perante o respectivo preço de aquisição suportado numa data em que os valores dos activos da sociedade alienada eram reconhecidamente inferiores ;
b)Porque se, como está referido, a aquisição foi acordada por Esc:1.020.000.000$00 e o balanço de situação evidenciava capitais próprios negativos de Esc:73.128.830$00, sendo que o objecto da transacção era a entrada na posse de um terreno que constituía um bem estratégico para viabilização de outros activos da M........., haverá que concluir que para o adquirente (M.......), o referido terreno representava um valor alvo de 1.093.128.830$00;
c) Sendo que os dois activos (terrenos) entretanto adquiridos pela M....... foram vendidos em 09/10/2000 à I........ pelo montante global de Esc:3.175.000.000$00, haverá que concluir que a I...... passou a dispor, naquela data, de activos (terrenos agora já investidos de requisitos de viabilização urbanística) com um valor alvo de Esc:4.268.128.830$00;
d) Não foi objecto de cabal esclarecimento a razão que determinou que no mesmo dia 09/10/2000 o preço por que a M....... vendeu à E...... E............... Participações Financeiras, SA, as acções representativas da totalidade do capital social da I......, tivesse sido de 5.012.050$00 (851,6 vezes inferior ao dos respectivos activos), ficando claro que não foram usados os mesmos critérios de valorização dos activos para a determinação dos preços das participações sociais, considerados na aquisição e na alienação;
e) Também na situação em apreço todas as empresas intervenientes pertencem ao mesmo grupo económico, pelo que também as menos valias foram apuradas sem que os bens que as geraram tivessem saído do património desse grupo económico, não havendo por tais factos reais perdas por depreciação de valores patrimoniais;
J) Assim, não foram as perdas por menos valias assim declaradas reconhecidas como comprovadamente resultantes de uma fruição, utilização ou afectação dos elementos que as geraram no âmbito da actividade da sociedade onde são relevadas, condição esta que o disposto no corpo do número l do artigo 23° do Código do IRC exige que seja verificada;
6) Para a correcção efectuada com referência à sociedade participada S..... -- Sociedade de Mediação Imobiliária e Turística E............, SA, por alienação de participações sociais na E..... – E........ Imobiliário, SA, a AF sustentou-se nos fundamentos de facto seguintes (vide folhas 56 e 57 os autos):
a) Serem as menos valias apuradas em consequência da acentuada diminuição da importância do preço de venda das acções da E..... – E.......... Imobiliária, SÁ, perante o valor da respectiva representação no património líquido da sociedade participada;
b) A participação da S..... (7.780.000 acções) no capital da E......alcançou a proporção de 99,74% do respectivo capital social (7.800.000 acções de Esc:1.000$00 por acção), pertencendo o restante (20.000 acções) à anterior única detentora, a sociedade E...... – E.......... Participações Financeiras, SGPS, SA;
c) A realização, em Maio de 1993, da participação social da S...... na E..... decorreu do aumento do capital desta última e consistiu na entrega pela subscritora de 51 lotes de terreno (bens a que corresponde a classificação económica e contabilística de existências) valorizados emEsc:7.780.000.000$00;
d) A venda, em Novembro de 2000, da participação social (activos a que corresponde a classificação económica e contabilística de imobilizações financeiras) foi realizada para a E........., exactamente pelo mesmo valor de Esc;7.780.000.000$00, sem ser dada relevância ao facto de o património líquido da E..... estar valorizado por Esc:10.677.340.000$00 e de à proporção das acções detidas pela alienante, referida na anterior alínea b), corresponder o valor de Esc:10.649.962.205$00;
e) A um resultado operacional nulo ditado pela equivalência a preços nominais dos valores de aquisição e de venda da participação social em apreço, correspondeu uma menos valia fiscal declarada pela S...... em consequência da actualização do preço de aquisição pelo coeficiente de correcção monetária;
f) Ou seja a um resultado aparentemente neutro, se lido a preços correntes (7.780.000.000$00 7.780.000.000$00- O, correspondeu um resultado acentuadamente negativo se lido a preços constantes, (7.780.000.000$00 1,11 x 7.780.000.000$00 855.800.000$00 e, ainda mais negativo se comparado com o valor contabilístico do activo alienado (7.780.000.000$00 10.649.962.205$00 2.869.962.205$00), tendo, no confronto de interesses entre a alienante e a adquirente, prevalecido os da adquirente, por sinal directamente minoritária no capital da E....., perante os da alienante, por sinal largamente maioritária;
g) Mais uma vez a situação em apreço tem como indicador o facto de todas as empresas intervenientes pertencem ao mesmo grupo económico, o que possibilita que os activos possam transaccionados sem que saiam do património desse grupo económico, pelo que quaisquer que sejam os preços declarados não se produzirá nunca uma realidade económica que se traduza por reais perdas por depreciação de valores patrimoniais;
h) Assim, não foram as perdas por menos valias assim declaradas reconhecidas como comprovadamente resultantes de uma fruição, utilização ou afectação dos elementos que as geraram no âmbito da actividade da sociedade onde são relevadas, condição esta que o disposto no corpo do número l do artigo 23° do Código do IRC exige que seja verificada;
7) Para a correcção efectuada com referência à sociedade participada S...... -- Sociedade de Mediação Imobiliária e Turística E..............., SA, por alienação de participações sociais na P........ Sociedade de Desenvolvimento Agro-Turístico, SA, a AF sustentou-se nos fundamentos de facto seguintes (vide folha 58 dos autos):
a) Serem as menos valias apuradas em consequência da diminuição da importância do preço de venda das acções da P............ - Sociedade de desenvolvimento Agro-Turístico, SA, SA, perante o valor dispendido com a respectiva aquisição e o valor considerado numa transmissão imediatamente subsequente;
b) A evolução dos preços considerados não revelam valores que se possam aferir por quaisquer razões de linearidade, porquanto:
b. 1) Em 29/12/1995, a S..... adquiriu 802.822 acções da participação social agora em apreço, por Esc:935.376.000$00, a que corresponde um custo unitário de Esc: l. 165$11;
b.2) Em 30/06/2000, nos procedimentos de aumento de capital da P........, a sites subscreveu mais 475.458 acções por Esc:476.603.853$00, a que corresponde um custo unitário de Esc:1.002$41;
b.3) Em Dezembro de 2000, a S..... transfere um seu crédito na P......., no montante de Esc:78.384.171$00, para cobertura de prejuízos nesta sua participada, contabilizando este mesmo valor a débito de Imobilizado Financeiro, elevando assim o custo deste activo para Esc:1.490.364.024$00, valor este por que fica relevado o custo das 1.278.280 acções detidas, a que corresponde um custo unitário de Esc:1.165$91;
b A) Em 19/12/2000, a S....... vendeu estes seus activos à M........, pelo valor global de Esc: 1.357.000.000$00, a que correspondeu um valor de Esc:1.061$58 por cada uma das 1.278.280 acções;
b. 5) Em 22/12/2000, estas mesmas acções foram transaccionadas entre a M....... e o F........ Fundo de Gestão de Património Imobiliário, por Esc:4.233.447.585$00, sendo assim reconhecido a cada uma das acções uma valor de Esc:3.311$83 (cerca de 3,12 vezes o preço de 3 dias antes);
b.6) Se a regressão dos preços unitários referidos nas alíneas b.l) e b.2) e a necessidade de cobertura de prejuízos referida na alínea b.3) possa constituir um indicador seguro de alguma erosão do património líquido da P........, já o reconhecimento do valor respeitante ao preço referido na alínea b.5) por uma entidade gerida por sociedade do mesmo grupo económico vem contrariar aquela suposta propensão;
c) Mais uma vez a situação em apreço tem como indicador o facto de todas as empresas intervenientes pertencem ao mesmo grupo económico, o que possibilita que os activos possam transaccionados sem que saiam do património desse grupo económico, e, mesmo que na situação em apreço se possa contraditar com a mais valia realizada pela M........ [vide anterior alínea b.5)]9 o resultado seria sempre absorvido pelas menos valias que esta declarou [vide anteriores alíneas 4) e 5)], menos valias estas que o grupo de consolidação não aproveitaria no imediato, dadas as limitações ditadas pelas regras de determinação da matéria colectável sob o regime de consolidação (artigo 59°-A do Código do IRC, com a redacção vigente à data dos factos - vide n° 3.2 do relatório e folha 216 do anexo 9 ao relatório, a respectivamente folhas 59 e 495 dos autos);
8) A impugnante deduziu a presente impugnação em 5 de Abril de 2005 - doc. fls. 3 dos autos.
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A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, em especial os referidos em cada um dos pontos do probatório.
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Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.
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2.2. – DA APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS

Atenta esta factualidade e aquelas conclusões que delimitam o objecto do recurso vejamos agora a sorte deste em que a questão decidenda se desdobra nas seguintes vertentes, cuja apreciação e decisão prejudica todas as demais que de forma directa ou meramente argumentativa sejam suscitadas, saber se a não aceitação da dedutibilidade fiscal da menos valia realizada redunda numa clara violação do princípio da tributação pelo lucro real, por implicar uma recusa de um encargo cuja relevância fiscal decorre directamente da lei (Artigo 23°, número 1, alínea i).
Como resulta do probatório, em resultado de acções de inspecção efectuadas às contas das sociedades componentes do grupo de consolidação de contas sob o domínio da sociedade E.......... E............ Participações Financeiras, SGPS, SA, foram efectuadas correcções de natureza meramente aritmética com efeitos na determinação dos valores do lucro tributável e por consequência da matéria colectável de IRC que foram declarados, pela ora impugnante em nome do referido grupo referido grupo de sociedades.
Das correcções efectuadas ao lucro tributável consolidado, a impugnante vem opor-se às que respeitam às menos valias fiscais que foram desconsideradas pela AF, no montante de €40.111.397,89.
Todas essas correcções foram justificadas, no fundamental, por as situações em apreço terem como indicador o facto de todas as empresas intervenientes pertencerem ao mesmo grupo económico, o que possibilitou que os activos pudessem ser transaccionados sem que saíssem do património desse grupo económico, pelo que quaisquer que fossem os preços declarados não se produziria nunca uma realidade económica que se traduzisse por reais perdas por depreciação de valores patrimoniais.
Daí que não foram as perdas por menos valias assim declaradas reconhecidas como comprovadamente resultantes de uma fruição, utilização ou afectação dos elementos que as geraram no âmbito da actividade da sociedade onde são relevadas, condição esta que o disposto no corpo do número l do artigo 23° do Código do IRC exige que seja verificada.
Na sentença recorrida entendeu-se assistir razão à AT no concernente à consideração de que os negócios geradores das menos valias postas em crise não foram determinados segundo o livre funcionamento das regras de mercado, pois estamos perante negócios feitos dentro do próprio grupo, com o único objectivo de realizar contabilisticamente menos valias, sem qualquer correspondência com a realidade ou com os valores de mercado ou com os valores reais, obtendo-se assim uma poupança fiscal que nada tem a ver com a realidade concreta de cada uma das empresas individualmente consideradas e com cada um dos negócios em causa e, que não pode ser aceite à luz do art° 23 do CIRC.
Aduz ainda o Mº Juiz «a quo» que, no que respeita às alegações centradas na aplicabilidade do disposto no artigo 57° do Código do IRC como norma habilitante para fundamentar as correcções, constata-se que a AF não procedeu a modificações quantitativas dos valores negociados por referência a quaisquer outros que considerasse normal serem estabelecidos, (situação em que teria de socorrer-se da norma invocada e proceder às correcções em sentido reflexo), mas antes à desconsideração como reais perdas as menos valias, por mas mesmas terem sido declaradas como componentes negativas do rendimento, sem que tivesse ficado comprovado que foram incorridas como consequência de actos de gestão realizados na prossecução da obtenção de proveitos, manutenção da fonte produtora, fruição ou protecção dos valores dos activos, requisitos estes previstos no corpo do n° l do artigo 23° do Código do IRC.
A recorrente insurge-se contra esse entendimento sustentando que ao aduzir como fundamento para a correcção efectuada a existência de relações especiais, a Administração Fiscal cometeu um erro sobre os pressupostos de direito, na medida em que a existência de relações especiais é fundamento para correcções nos termos do art° 57° do CIRC, na redacção à época em vigor. E, ao contrário do que é defendido na douta sentença recorrida, os fundamentos aduzidos pela Administração Fiscal constam do art° 57° do CIRC, ao considerar que o valor de venda das "acções H......." por parte da M........ não era aceitável face à existência de relações especiais, que é, precisamente, o fundamento e a correcção prevista no art° 57° do CIRC.
Nesse sentido, é justa a asserção da recorrente de que, atenta a fundamentação usada para justificar as correcções e o teor da citada norma e os factos constantes dos autos, estavam reunidos todos os pressupostos para a aplicação daquele regime normativo regulador das relações especiais.
Isso tem implicado que o procedimento pela impugnante adoptado era correcto não obstante a AT haver invocado a existência de relações especiais. Na verdade, a admitir-se a existência de relações especiais, então deveria proceder-se à aplicação do regime de preços de transferência previsto no actual artigo 58° CIRC (à data dos factos tributários estava em vigor o correspondente artigo 57° do CIRC), à luz do qual deveria ter procedido à correcção, não aplicando o regime geral do artigo 23° do CIRC para fundar a sua correcção.
Tal como refere a recorrente, estando comprovada a indispensabilidade e relevância das referidas operações, na lógica do Fisco, a problemática associada ao preço de aquisição não deverá ser aferida à luz do artigo 23° do CIRC mas sim ao nível da problemática dos preços de transferência entre entidades relacionadas, como poderia ser o caso das relações entre a Recorrente e as outras sociedades.
Ora, a AT, depois de analisar a existência de "relações especiais" entre a Recorrente e essas entidades, veio, a final, proceder a correcções ao abrigo do artigo 23° do CIRC e não ao abrigo do artigo 57° do CIRC, assim afastando o ónus probatório que sobre ela impendia por força do artigo 77° da LGT.
Dispõe o artº 57º, nº 1 do CIRC, na redacção vigente à data em que ocorreram os factos, que “A Direcção - Geral das Contribuições e Impostos poderá efectuar as correcções que sejam necessárias para a determinação do lucro tributável sempre que, em virtude de relações especiais entre o contribuinte e outra empresa, sujeita ou não a IRC, tenham sido estabelecidas condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes, conduzindo a que o lucro apurado com base na contabilidade seja diverso do que se apuraria na ausência dessas relações”.
Decorre do inciso legal transcrito que a AF pode introduzir correcções ao lucro tributável declarado desde que existam relações especiais entre o contribuinte e outra empresa que levou ao estabelecimento de condições diferentes das que se fixariam entre pessoas independentes.
Assim, são os seguintes os pressupostos legais para que a DGCI possa corrigir a matéria colectável ao abrigo do art. 57º do CIRC, por forma a que seja respeitado o princípio de plena concorrência consagrado no art. 9º da Convenção Modelo OCDE de que Portugal é membro:
I. a existência de relações especiais entre o contribuinte e outra pessoa;
II. que entre ambos se estabeleceram condições diferentes das normalmente acordadas entre pessoas independentes;
III. que tais relações especiais são causa adequada das ditas condições;
IV. que aquelas conduziram a um lucro apurado diverso do que se apuraria na sua ausência (cfr. sobre esta mesma temática, os acs. do STA, de 6/11/96, Rec. 20.188 e de 9/12/98, Rec. 19.858).
Como se expendeu no acórdão deste T.C.A. proferido no recurso contencioso nº 1572/98 (confirmado no S.T.A. por acórdão de 23.05.01/Rec.nº 25915), «o citado art. 57º do CIRC, embora considerado, pela doutrina, uma norma de carácter genérico, já que a lei não define o que entende por relações especiais (pois só a partir do DL nº 5/96, de 29/01, que aditou o art. 57º-C do CIRC, a lei passou a referir quando considera existirem relações especiais, embora só para situações de subcapitalização, pelo que se têm levantado dúvidas sobre a sua aplicação noutras situações), nem indica a metodologia a adoptar para determinação do preço de plena concorrência, conferindo, desse modo, à AF uma certa flexibilidade, não contém, todavia, um “cheque em branco” para a AF usar como bem entenda, nem qualquer inversão do ónus da prova, pelo que, tratando-se de uma norma de incidência, cabe à AF a prova dos pressupostos ali previstos, interpretando-a de acordo com as orientações da OCDE na matéria.
Não se trata, também, de uma avaliação indirecta do lucro tributável, que só pode ter lugar nos casos expressamente previstos na lei (cf. art. 51º a 56º do CIRC), até porque, nas situações enquadráveis no art. 57º do CIRC, a contabilidade das empresas, em regra, retrata a realidade das operações, não carecendo de credibilidade que justifique o uso de presunções.
Estamos, pois, aqui no âmbito da avaliação directa.
Assim, face à presunção de veracidade da contabilidade e das declarações do contribuinte (art. 78º do CPT), cabe à AF o ónus de prova dos pressupostos que justificam a correcção bem como do valor do preço de plena concorrência.».
Flui do exposto que a correcção a que se refere o art. 57º do CIRC não pode assentar em indícios ou presunções, impondo-se à AF que prove os supra mencionados pressupostos legais para que possa corrigir a matéria colectável do contribuinte ao abrigo do art. 57º do CIRC.(1)
No caso vertente, entendemos que a AF demonstrou o primeiro requisito (a existência de relações especiais entre a recorrente e as empresas do mesmo grupo).
Embora o citado normativo não defina o que deve entender-se por "relações especiais", a doutrina fiscal vem considerando que tais relações existem quando haja situações de dependência, nomeadamente no caso de relações entre a Sociedade e os sócios, entre empresas associadas ou entre sociedades com sócios comuns ou ainda entre empresas mães e filiadas.
Tal situação, enquadra-se perfeitamente no conceito de relações especiais previsto no art. 9º, nº 1, al. b) do Modelo de Convenção da OCDE de 1977 e no art. 57º-C, nº 2, do CIRC.
É que, como se disse, inexistindo na lei, à data dos factos, uma definição do conceito de "relações especiais", embora o art. 57° -C do CIRC já indicasse, em casos de subcapitalização, alguns critérios para apuramento da existência dessas mesmas relações especiais, podia entender-se, de acordo com o art. 9° n° 1 do Modelo da Convenção da OCDE de 77, que existiam tais relações "quando uma empresa de um Estado contratante participar directa ou indirectamente na direcção, no controle ou no capital de uma empresa de outro Estado contratante, ou, as mesmas pessoas participarem directa ou indirectamente na direcção, no controle ou no capital de uma empresa de um Estado contratante e de uma empresa de outro Estado contratante".
E é a tal propósito pertinente a citação de J.J. Amaral Tomás em "Preços de Transferência", artigo publicado na revista Fisco, n° 29, pág. 23: " Realça-se que a existência de relação especial ou vínculo de dependência tanto pode decorrer de uma dependência jurídica (v.g. participação no capital; designação dos órgãos sociais) como de origem contratual; ou ainda de um sistema ou dependência de facto.”
Mas será que isso legitima a conclusão de que entre a recorrente e as demais empresas com quem tinha essas relações especiais se estabeleceram, efectivamente, condições diferentes das normalmente acordadas entre pessoas independentes?
Se é que pode admitir-se que a recorrente praticou preços artificiais nas vendas uma vez que as efectuou exclusivamente a empresas do mesmo grupo económico e a sua contabilidade parece revelar alguns sinais que podem indiciar práticas enquadráveis numa “lógica de grupo” de desviar os lucros para onde a tributação seja menos pesada, o certo é que a correcção aqui em questão não pode assentar em meros indícios ou presunções, tendo a AF de provar que se verificavam os pressupostos legais que permitem a correcção do lucro efectuada e o valor do preço de plena concorrência.
Na verdade, o procedimento questionado pela AF pode ser visto na lógica de gestão do grupo de empresas em que a mesma está inserida.
Mas isso levanta a controvérsia gerada pelo confronto entre a lógica empresarial, que tem que ver com o sucesso económico de diversas empresas cujos sócios são comuns e a lógica jurídico – fiscal que impõe a autonomização de instituições que, sob esse ponto de vista, nada tinham em comum.
Claro que nem sempre estas lógicas colidem, antes se moldando reciprocamente, embora a realidade empresarial tenha obrigatoriamente de se enquadrar na realidade jurídica em que está inserida, enquanto esta se mantiver inalterada. Por outro lado, também não é verdade que esta limite sempre aquela, pois, em muitas situações como a dos autos, em que diversas empresas tem em comum os mesmos sócios, esta divisão empresarial pretende justamente usufruir das vantagens jurídicas e fiscais dessa divisão. Logo, nem sempre são realidades antagónicas. Isto para dizer que a lógica formal nem sempre é contra a empresarial, mas esta sempre tem de obedecer àquela, enquanto a mesma não for modificada.
Ora, no caso dos autos, o que a recorrente pretende é justamente sobrepor a sua lógica de gestão (inclusive enquanto grupo) à realidade jurídica em que aquela não pode deixar de estar inserida. A recorrente sustenta a verificação do invocado vício de violação de lei, por errada interpretação e aplicação da lei já que sendo várias as Empresas e existindo relações especiais entre elas, a correcção do lucro tributável de uma delas, impõe que se observe o disposto no corpo do art° 77° da L.G.T., sendo que a tal exigência, designadamente à al. c) do nº 3 deste artigo, satisfaz a indicação dos montantes efectivos, além da descrição, conforme exige a alínea a) do art. 77º da L.G.T. dos “termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias”.
Vale isto por dizer que tem a AF de justificar a razão por que o fez, não bastando a mera descrição das relações especiais entre a recorrente e as empresas do mesmo grupo, se nada referir quanto aos termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes em idênticas circunstâncias.
Cumpria, pois, determinar, se as relações especiais permitiam, efectivamente, o estabelecimento de condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre empresas independentes.
A AT conclui, que esse desiderato só se tornou viável porque entre a recorrente e as empresas identificadas nos autos, existem relações especiais, comunicabilidade de interesses ou interesses submetidos a uma vontade única, ou, como refere Vítor Faveiro " Noções Fundamentais de Direito Fiscal Português", fls. 654, porque existiam relações de dependência ou subordinação que podem justificar que uma empresa imponha a outra ou com ela acorde, condições diferentes das que decorreriam nas relações de mercado livre.
E que condições foram essas?
Nesse sentido, a determinação da situação de condições especiais, diferentes das que seriam normalmente acordadas entre empresas independentes, poderá ser feita pela AF com uma certa margem de discricionariedade técnica desde que adopte um método legítimo e devidamente fundamentado.
Quanto a tal método, evoca a entidade recorrida o relatório da OCDE, complementado por novo Relatório de 84, segundo o qual existem três métodos como preferenciais, a saber: a) o método de comparação com os preços de mercado de plena concorrência; b) o método do preço de revenda e o do preço de custo acrescido de uma margem de lucro; e c)- face às inúmeras dificuldades, teóricas e práticas, resultantes da complexidade das situações que se deparam às diversas Administrações Fiscais, a aplicação de outros métodos residuais ou mesmo a combinação dos métodos indicados, posto que a AF descreva e fundamente em que é que consistiu a manipulação dos preços.(2)
Ora, nada disso foi feito pela AF o fez no caso em apreço.
A essa luz, também o acto não está fundamentado, como pretende a recorrente.
Fundamentar o acto tributário consiste na indicação dos factos e das normas jurídicas que o justificam, na exposição das razões de facto e /ou de direito que determinam a AF a proferir uma decisão, enfim, em deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos por que se resolve de certa maneira, e não de outra.
Assim, o acto tributário tem de ser sustentado por um mínimo suficiente da fundamentação expressa, ainda que operada por forma massiva e sendo produto de um poder legalmente vinculado, aspectos estes que só poderão ser valorados dentro do grau de exigibilidade da declaração de fundamentação, quer porque a massividade intui maior possibilidade de entendimento dos destinatários, quer porque a vinculação dispensa a enunciação da motivação do agente que decorrerá imediatamente da mera descrição dos factos - pressupostos do acto.
Os actos tributários carecem de fundamentação, a qual consiste numa declaração formal, externa ou explícita, i. é, numa manifestação exterior consubstanciada num discurso expresso num texto, não bastando que resulte implicitamente da actuação administrativa.
E tal discurso tem de ser contextual, expresso e externado pelo autor do acto por forma a dar a conhecer ao seu destinatário, pressuposto este como um destinatário normal ou razoável colocado perante as circunstâncias concretas, a motivação funcional do acto, os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro, permitindo àquele optar conscientemente entre a aceitação da legalidade do acto ou a sua impugnação.
Destarte, a AF não fundamentou de forma clara e congruente até que ponto e em que termos as relações especiais entre a recorrente e as demais empresas, levaram o estabelecimento de condições diferentes das que seriam normalmente acordadas entre pessoas independentes, conduzindo a que o lucro apurado na contabilidade fosse diverso do que se apuraria na ausência dessas relações.
É que, se por um lado se pode aceitar, num juízo de normalidade, que aquelas referidas circunstâncias determinaram necessariamente o estabelecimento de condições diferentes das que decorreriam normalmente entre pessoas independentes, também, por outro lado, se prova que a AF não logrou demonstrar os termos em que, normalmente, operações da mesma natureza decorreriam se fossem efectuadas entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias, fundamentação que legalmente e de forma reforçada lhe era exigida.
Por outro lado, como resulta do disposto no art° 23° n°l do CIRC, consideram-se custos ou perdas as que comprovadamente forem indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
É pressuposto desta norma a consideração individualizada de cada empresa ou instituição pelo que não podem interferir aqui raciocínios do tipo daqueles que fazem apelo a critérios de gestão do "grupo" ou mesmo dos financiamentos - ainda que gratuitos- dos seus sócios ou mesmo a vontade destes que nessa matéria é irrelevante, visto que se trata de um critério legal, sendo unicamente relevante a pessoa colectiva cujos custos estão em apreciação.
Já vimos que não estamos aqui perante uma avaliação indirecta do lucro tributável, que só pode ter lugar nos casos expressamente previstos na lei (cf. art. 51º a 56º do CIRC), mas, antes, no campo da avaliação directa pois, nas situações enquadráveis no art. 57º do CIRC, a contabilidade das empresas, em regra, retrata a realidade das operações, não carecendo de credibilidade que justifique o uso de presunções.
Assim, face à presunção de veracidade da contabilidade e das declarações do contribuinte, cabe à AF o ónus de prova dos pressupostos que justificam a correcção bem como do valor do preço de plena concorrência.».
Flui do exposto que a correcção a que se refere o art. 57º do CIRC não pode assentar em indícios ou presunções, impondo-se à AF que prove os supra mencionados pressupostos legais para que possa corrigir a matéria colectável do contribuinte ao abrigo do art. 57º do CIRC.
É que, tendo a AT procedido a correcções meramente quantitativas para determinar o lucro tributável do contribuinte, competia-lhe demonstrar a verificação dos pressupostos legais que permitem o uso da avaliação directa consentida pelos artºs. 57º do CIRC e 77º da LGT e, feita essa prova, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que houve erro ou manifesto excesso na quantificação.
Como ficou demonstrado, para a aplicação do regime do artº 57º do CIRC podem ser utilizados os meios que se deixaram analisados, e, como não foram cumpridos, não cessou a presunção de veracidade dos elementos e colocados à disposição da AF e directamente recolhidos da actividade do contribuinte.
Destarte, a não aceitação da dedutibilidade fiscal da menos valia realizada traduz-se numa afronta ao princípio da tributação pelo lucro real, na medida em que se recusa um encargo cuja relevância fiscal decorre directamente da lei (Artigo 23°, número 1, alínea i).
Na verdade, sendo o lucro tributável em IRC legalmente definido no artigo 17° do CIRC, como a variação do activo líquido de acordo com a teoria do balanço, consubstanciada na soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, nele claramente se enquadra as perdas resultantes das alienações em causa, à luz do disposto no artigo 23°, nº 1, alínea i) do CIRC.
Prescrevendo o artigo 20º do CIRC que se consideram proveitos ou ganhos os derivados de operações de qualquer natureza designadamente os ganhos obtidos das mais valias realizadas cfr. al. f) do artigo20 do CIRC e prescrevendo o artigo 23 do CIRC que se devem haver como custos ou perdas os suportados para a realização de proveitos e manutenção da fonte produtora designadamente as menos valias realizadas cfr. al. i) do artigo 23 do CIRC temos de convir que face à data das operações donde derivaram e as menos valias essas operações estavam abrangidas por tais disposições do CIRC então em vigor.
Como assim, porque nela está reflectida a assinalada ilegalidade, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento sobre a matéria de direito o que importa a revogação da sentença e a procedência da impugnação na parte recorrida.
Perante o exposto, procedem «in totum» as conclusões do recurso da impugnante.
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4. Termos em que, acordam os Juízes deste Tribunal em, concedendo provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação procedente anulando o acto impugnado na recorrida.
Sem custas.
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Lisboa, 18/12/2008
(Gomes Correia)
(Eugénio Sequeira)
(Manuel Malheiros) ( Vencido.Entendendo que a Fª.P.ª demonstrou as razões pelas quais as menos valias não deviam ser aceites como custos fiscais e, por isso, confirmaria nos seus precisos termos a douta sentença recorrida).

(1)Esta possibilidade de correcção da determinação do lucro tributável a que se refere o art. 57º do CIRC, configura-se, na opinião do Dr. Nuno Sá Gomes (As Garantias dos Contribuintes, CTF 371, 127 e sgts.), como um poder quase discricionário da AF, pelo que esta deve descrever os termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas independentes e em idênticas circunstâncias.
(2) Também Nuno Sá Gomes em '' As garantias dos contribuintes", CTF, n° 371, pág. 127 e segs., sustenta tal possibilidade de correcção do lucro tributável, afirmando a existência de “um poder quase discricionário da AF", que lhe permite, nomeadamente, a escolha das metodologias mais correctas à determinação do preço de concorrência, pelo que esta deve descrever os termos em que normalmente decorrem operações da mesma natureza entre pessoas idênticas e em idênticas circunstâncias.