Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:01639/07
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:06/26/2007
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL-REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO
–PRESSUPOSTOS DA SUA APLICAÇÃO E SUA CONSTITUCIONALIDADE
Sumário:I)- Por injunção do art. 53º do CIRC, introduzido pela Lei nº 30-G/2000, de 29.12, são automaticamente abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos cujo volume total de proveitos, no exercício anterior, seja inferior a 149.639,37€, a menos que expressamente optem por regime geral.

II) - Uma vez que quando se inicia actividade não há exercício anterior que possa ser tomado por referência, terá de ser considerado nesse exercício inicial o montante anual de proveitos estimado indicado na declaração de início de actividade; porém, se face ao volume de proveitos posteriormente declarado relativamente a esse exercício, ocorrerem os requisitos para a inclusão no regime simplificado, será este o regime aplicável.

III - Os sujeitos passivos que ficam sujeitos ao regime simplificado podem optar pelo regime geral, devendo, para o efeito, fazê-lo na declaração de início de actividade ou em declaração de alterações a apresentar até ao fim do 3º mês do período de tributação do início de aplicação do regime.

IV- Efectuada a opção pelo regime geral, a mesma é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se for renovada nos termos e prazos referidos nos nºs 8 e 9 do art. 53º do CIRC.

V- A inclusão automática no regime geral não se encontra sujeita a essa regra de validade, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.

VI - O regime simplificado de tributação de IRC, previsto no art. 53.º do CIRC, sendo de carácter facultativo, não contende com o princípio constitucional da tributação das empresas fundamentalmente pelo rendimento real.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam nesta Secção do Contencioso do Tribunal Central Administrativo Sul:

I-RELATÓRIO
1. J...& C..., LDª., recorre da sentença proferida pelo M° Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou improcedente a acção administrativa especial que apresentara contra o despacho proferido em 29 de Agosto de 2005 pela Senhora Directora de Serviços de IRC, no uso de subdelegação de competências, do indeferimento do recurso hierárquico referente ao pedido de enquadramento no regime geral de determinação do lucro tributável no ano de 2003.
Formulou as seguintes conclusões:
A) - A douta sentença recorrida fez errado julgamento da matéria de facto, mais concretamente o facto descrito sobre o n° 2 da matéria provada que deverá ter a seguinte redacção:
B) - 2. O contribuinte assinalou no quadro 19 da declaração de início de actividade a sua opção pelo regime geral de contabilidade.
C) - Facto este cuja prova resulta da cópia da declaração do inicio de actividade que se encontra reproduzida no processo administrativo apenso.
D) - Tendo o recorrente optado na declaração de início de actividade, pela aplicação do regime geral, tal regime aplica-se nos dois anos seguintes, ou seja, 2003 e 2004.
E) - A douta sentença recorrida violou o n° 2 do artigo 659° do CPC e a alínea a) do n° 7 do artigo 53° do CIRC".
Não houve contra – alegações.
O EPGA emitiu a fls. 53 e ss o seguinte douto parecer:
“3 - Ora, de facto, conforme consta da cópia da declaração de início de actividade junta a fls. 18 a 20 do processo administrativo apenso, a recorrente assinalou no quadro 19 que optava pelo regime geral de determinação do lucro tributável, em sede de IRC.
Assim sendo, houve errado julgamento da matéria de facto, devendo o facto descrito sob o n° 2 ser corrigido no sentido apontado pela recorrente.
A questão essencial é a de saber se isso é por si só suficiente para alterar o sentido da decisão.
Salvo o devido respeito, é.
O cerne da questão está em saber se, uma vez apresentada pelo contribuinte a declaração de opção pelo regime de tributação por contabilidade organizada, ela vale para os exercícios subsequentes ao dessa apresentação, sem necessidade de renovação anual, como entende a recorrente, ou, não havendo essa renovação, passa automaticamente ao regime simplificado, como entendem os serviços da AT. R.
Nos termos do n° 1 do artigo 53° do CIRC, ficam abrangidos pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável os sujeitos passivos que, não tendo optado pelo regime de contabilidade organizada, não tenham atingido, no exercício anterior ao da aplicação do regime, um volume total anual de proveitos não superior a € 149 639,37.
E, segundo as alíneas a) e b) do n° 7, essa opção pelo regime de contabilidade organizada deve ser formalizada pelos sujeitos passivos na declaração de início de actividade (alínea a)) ou na declaração de alterações a que se referem os artigos 110° e 111°, até ao fim do 3° mês do período de tributação do início de aplicação do regime (alínea b)).
O recorrente optou, na declaração de início de actividade que apresentara em 2002, pelo regime geral de determinação do lucro tributável e estimou um volume de negócios anual de € 300 000,00.
Porém, nesse mesmo ano, o volume de proveitos efectivos obtidos foi apenas de €27568,21.
Assim sendo, a integração no regime geral de tributação do lucro tributável no primeiro exercício de actividade, 2002, ficou a dever-se a dois motivos:
- O primeiro, ao facto de ter manifestado essa vontade, formalizada na declaração de início de actividade;
- O segundo, à circunstância de o valor total anual de proveitos estimados ser superior ao limite legal de € 149 639,37.
Ao contrário do que defende a sentença recorrida, o contribuinte não ficou, ab initio, enquadrado no regime simplificado apenas porque tenha estimado um volume total de proveitos superior ao valor mínimo de € 149 639,37, mas sim porque optou, nos termos da alínea a) do n° 7 do artigo 53° do CIRC, pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável.
E essa opção é válida por um período de três exercícios, de acordo com o disposto no n° 8, independentemente da apresentação da declaração de alteração a que se refere a alínea b) do n° 7.
Como refere o Prof. Saldanha Sanches (Fiscalidade, Julho/Outubro de 2001), "o regime simplificado tem sempre como pressuposto uma opção do contribuinte que renuncia ao seu direito subjectivo de ser tributado com base na contabilidade. E que, procedendo a uma estimativa de custos que vai suportar e declarar, opta pela dedução estandardizada".
"Temos desde modo uma daquelas situações em que a lei atribui relevância à vontade do contribuinte e em que este pode optar pelo regime que considera mais favorável".
No caso, existindo a opção por parte do contribuinte em ser tributado com base na contabilidade, não podia a AT deixar de respeitar essa opção, ficando por isso impedida de determinar, para o ano de 2003, a tributação de acordo com o regime simplificado.
3 - Em conclusão, emito parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso, revogando-se a decisão impugnada.”
Os autos vêm à conferência depois de recolhidos os vistos legais.
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2.- FUNDAMENTAÇÃO
2.1.- Dos Factos:
Na sentença recorrida, deu-se como provado:
1. O Autor apresentou declaração de início de actividade com início em 1/9/2002, estimando um volume de vendas anual de € 300.000,00 (tudo nos termos que constam de fls. 18 e segs. cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido).
2.O contribuinte não assinalou no quadro respectivo a opção pelo regime geral de tributação.
3.Em 25 de Maio de 2004 o contribuinte reclamou da - posterior - inclusão no Regime Simplificado (fls. 17 do apenso cujo conteúdo se dá por integralmen­te reproduzido).
4.Por despacho do Exmo. Chefe do Serviço de Finanças foi indeferida recla­mação nos termos que constam de lis. 9 do apenso cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
5.Deste indeferimento recorreu hierarquicamente o contribuinte nos termos que constam de fls. 3 e segs. do apenso cujo conteúdo se dá por integralmen­te reproduzido.
6.Por despacho de 29/8/2005 foi indeferido a pretensão do A. com os funda­mentos constantes da informação junta a fls. 28 e segs. do apenso cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido.
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FACTOS NÃO PROVADOS.
Com interesse para a decisão, não houve.
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MOTIVAÇÃO
A convicção do tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, referidos nos «factos provados», com remissão para as folhas do processo onde se encontram.
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Acolhendo as razões constantes do recurso e do parecer do EPGA, há que alterar a matéria levada ao probatório sob o nº 2 já que, tendo em conta o conteúdo do capo 19 da declaração de início de actividade, se apura que:

2)- A recorrente assinalou no quadro 19 que optava pelo regime geral de determinação do lucro tributável, em sede de IRC conforme consta da cópia da declaração de início de actividade junta a fls. 18 a 20 do processo administrativo apenso.
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2.2. Do Direito:
O Mº Juiz julgou a impugnação improcedente com a seguinte fundamentação:
“A questão pode resumir-se no seguinte:
O A. declarou o início de actividade em Setembro de 2002. Podia ter optado pelo regime simplificado de determinação do lucro tributável, ou pelo regime geral. Mas não fez qualquer opção, limitando-se a estimar um volume de negócios anual de € 300.000,00.
E para os meses do ano em que iniciou a actividade - 2002 - estimou € 100.000,00.
Todavia, no exercício de 2002 o A. apresentou um volume de negócios de € 25.210,08.
Em conformidade, a Administração Fiscal aceitou a determinação do lucro tribu­tável pelo regime geral no exercício de 2002, mas para os exercícios de 2003 e segs. enquadrou-o no regime geral.
Vejamos agora a questão de direito.
Embora tenha declarado um VN de € 300.000,00, no exercício de 2002 o A. não atingiu sequer o valor de € 149.639,37.
Como tal, por força do disposto no n.º l do Art.° 53 CIRC, deveria ter ficado abrangido pelo regime simplificado de tributação (assim vulgarmente designado).
Mas não ficou, pela simples razão de que estimou um VN superior ao que determina o enquadramento no regime simplificado.
Dito de outra maneira, o A. só não ficou «ab initio» enquadrado no regime sim­plificado porque estimou um VN superior a € 149 639,37, e não por ter efectuado qual­quer opção nesse sentido.
Embora não tenha feito a opção pelo regime geral na declaração de início de actividade, podia tê-la feito no momento referido na alínea b) do n.° 7 do CIRC.
Mas tão pouco o fez nesta altura.
O A. não optou em nenhum dos momentos em que poderia ter optado pelo regi­me geral de determinação do lucro tributável (alíneas a) e b) do n.° 7 do Art.° 53 CIRC).
Não o fez no início de actividade, nem o fez na respectiva declaração de altera­ções.
Assim, tendo em conta essa omissão e considerando que o VN de 2002 foi apenas de € 25.210,08, no exercício de 2003 teria de ser obrigatoriamente enquadrado no regime simplificado, porque assim determina o n.° l do Art.° 53 CIRC.
O A. defende que tendo ficado enquadrado no regime de contabilidade organizada no ano de 2002, tal enquadramento subsiste por mais dois anos, independentemen­te da opção a que se refere o n.° 7 do Art.° 53 C1RC (artigo 17 da douta petição inicial).
O A. refere-se à norma constante do n.° 8 do Art.° 53 CIRC.
Simplesmente o enquadramento que foi feito para o exercício de 2002 baseou-se no VN estimado, unicamente, e apenas para aquele exercício.
É o próprio n.° 2 do Art.° 53 do CIRC que limita ao início da actividade o enquadramento apenas baseado no VN estimado. Com efeito, diz este preceito que No exercício do início de actividade , o enquadramento no regime simplificado faz-se veri­ficados os demais pressupostos, em conformidade com o valor total anua! de proveitos estimado, constante da declaração de início de actividade, caso não seja exercida a opção a que se refere o número anterior.
No exercício do início de actividade, apenas.
Nos exercícios seguintes atende-se à opção, se a houver; se não, atende-se ao respectivo VN.
E foi o que a Administração Fiscal fez.
O apelo às regras constitucionais da tributação pelo rendimento real (Art.° 104/2 da Constituição) não acolhe a interpretação que o A. pretende.
A «opção» feita pelo regime simplificado (por omissão, entenda-se) é-lhe intei­ramente imputável pelo que a tributação com base naquele regime não padece de ne­nhuma inconstitucionalidade.
Tudo ponderado conclui-se que a Administração Fiscal andou bem; o A. não tem razão.”
Sobre as questões colocadas nos autos já se pronunciou o Acórdão do TCAN de 13-01-2005, tirado no Recurso nº 01570/04 em termos que merecem a nossa inteira concordância pelo que, com a devida vénia, passamos a adaptar ao caso concreto a fundamentação daquele aresto.
Assim:
A questão colocada nos presentes autos prende-se com o enquadramento da Autora no regime de determinação do lucro tributável, sabido que ela fora inicialmente, aquando da apresentação da declaração de início de actividade, em 2002, enquadrada no regime geral e que posteriormente, durante 2003, a Administração Tributária procedeu à alteração desse enquadramento para o regime simplificado, o que a Autora contesta, visando com a presente acção a reintegração no regime geral.
Na tese da Autora, dado que na declaração de início de actividade optou pelo regime geral de determinação do lucro tributável indicando a quantia de 300.000 € como estimado volume anual de vendas, tinha de ser enquadrada no regime geral, já que por força do art. 53º nº 2 do CIRC os sujeitos passivos que nessa declaração declararem proveitos estimados superiores a 149.639,37 € ficam automaticamente enquadrados no regime geral, sem necessidade de fazerem qualquer opção. E porque tal enquadramento é válido por um período de três exercícios, de harmonia com o disposto nos nºs 8 e 9 do mesmo art. 53º, não podia a AT ter alterado, como alterou, esse enquadramento no exercício de 2003.
Segundo o entendimento vertido na sentença recorrida (e que acolhe a tese da AT sobre a questão), apesar de a Autora ter estimado, na declaração de início de actividade, um volume anual de vendas de 300.000 € para o exercício de 2002, o certo é que o volume total de proveitos que efectivamente veio a ser declarado em 2002 (e que substitui a quantia estimada) era inferior aquele valor, o que nos termos do artigo 53º nº 2 do CIRC obrigou ao seu enquadramento no regime simplificado, pois que ela expressamente não optou - nem inicialmente, na declaração de início de actividade, nem posteriormente, na declaração de alteração prevista nos arts. 110º e 111º do CIRC - pelo regime geral.
Assim, face ao volume de proveitos declarados e dada a falta de expressa opção pelo regime geral, julgou-se legal a actuação da AT de alterar para o regime simplificado a determinação do lucro tributável da autora, regime esse que lhe é automaticamente aplicável por um período de três exercícios, assim improcedendo a pretensão da Autora de ficar reintegrada no regime geral relativamente ao exercício de 2003.
O EPGA sustenta que o recurso merece provimento porquanto, provando-se que o recorrente optou, na declaração de início de actividade que apresentara em 2002, pelo regime geral de determinação do lucro tributável e estimou um volume de negócios anual de € 300 000,00, apesar de nesse mesmo ano, o volume de proveitos efectivos obtidos foi apenas de €27568,21, a sua integração no regime geral de tributação do lucro tributável no primeiro exercício de actividade, 2002, fica a dever-se a dois motivos:
- O primeiro, ao facto de ter manifestado essa vontade, formalizada na declaração de início de actividade;
- O segundo, à circunstância de o valor total anual de proveitos estimados ser superior ao limite legal de € 149 639,37.
Assim, ao contrário do que defende a sentença recorrida, o contribuinte não ficou, ab initio, enquadrado no regime simplificado apenas porque tenha estimado um volume total de proveitos superior ao valor mínimo de € 149 639,37, mas sim porque optou, nos termos da alínea a) do n° 7 do artigo 53° do CIRC, pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável.
E essa opção é válida por um período de três exercícios, de acordo com o disposto no n° 8, independentemente da apresentação da declaração de alteração a que se refere a alínea b) do n° 7.
Quid juris?
Como se expendeu no douto aresto cuja fundamentação vimos seguindo, o artigo 53º do CIRC, introduzido pela Lei nº 30-G/2000, de 29.12, instituiu o regime simplificado de apuramento do lucro tributável, quer para rendimentos empresariais ou equiparados de pessoas singulares, quer para os rendimentos das pessoas colectivas. Para os sujeitos passivos de IRC, o enquadramento nesse regime simplificado verifica-se quando se encontrem reunidas cumulativamente as seguintes condições:
a)- exerçam, a título principal, actividade comercial, industrial ou agrícola;
b)- não estejam isentos de IRC;
c)- não se encontrem sujeitos à revisão legal de contas;
d)- apresentem, no exercício anterior, um volume total de proveitos inferior a 149.639,37 €;
e)- não optem pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável.
Da leitura do referido preceito resulta que são automaticamente abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos cujo volume total de proveitos, no exercício anterior, seja inferior a 149.639,37€, a menos que expressamente optem por regime diferente, caso em que aquele deixa de ter aplicação automática. Mas porque quando se inicia actividade não há exercício anterior que possa ser tomado por referência, há que considerar nesse exercício inicial o montante anual de proveitos estimado constante da declaração de início de actividade.
Todavia, os sujeitos passivos que à luz dos aludidos critérios fiquem sujeitos ao regime simplificado podem optar pelo regime geral, devendo, para o efeito, fazê-lo na declaração de início de actividade, ou em declaração de alterações a apresentar até ao fim do 3º mês do período de tributação do início de aplicação do regime. Uma vez efectuada essa opção, a mesma é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se for renovada nos termos e prazos referidos nos nºs 8 e 9 do art. 53º do CIRC.
Donde decorre que só quando há uma expressa opção pelo regime geral este se mantém válido por um período de três exercícios, susceptível de renovação, e que a inclusão automática no regime geral não se encontra sujeita àquela regra de validade por três exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.

No caso vertente, a recorrente indicou na sua declaração de início de actividade, apresentada em 2002, um volume anual de vendas estimado em 300.000 €, optando pelo regime geral de determinação do lucro tributável, pelo que ficou enquadrada no regime geral relativamente a esse exercício.
Porém, em 2003 a AT apurou que nesse exercício de 2002 a recorrente declarara proveitos no montante total de 27.568,21 €, valor este muito aquém do mínimo da previsão legal para não ser englobada no regime simplificado.
Trata-se então de saber se isso determina o seu automático enquadramento nesse regime simplificado dado que expressou a sua opção pelo regime geral.
Ora, acolhendo a posição da AT e que foi sufragada pela sentença, dir-se-á que a integração no regime geral de tributação do lucro tributável no primeiro exercício de actividade, se ficou a dever, não ao facto de ter manifestado essa vontade, mas tendo em conta ao dados constantes da sua declaração de início de actividade, designada e mormente, o valor total anual de proveitos estimados ter sido superior ao limite legal. Dito de outro modo: não se tendo verificado os pressupostos estabelecidos no nº 1 do artº 53º do CIRC, o enquadramento para o exercício de 2002 era obrigatoriamente o regime geral de determinação do lucro tributável, por imposição legal, nos termos do nº 2 daquele inciso legal, não produzindo efeito qualquer opção inscrita ou manifestada pelo sujeito passivo pois a lei não confere essa faculdade.
Donde que a opção só seria válida se o sujeito passivo reunisse todas as condições para o enquadramento no regime simplificado, designadamente a estimativa de um valor total anual de proveitos igual ou superior a 149.639 €.
Daí que não mereça qualquer censura a actuação da AT, porquanto, no estrito cumprimento da lei a que se encontra vinculada, procedeu em 2003 ao enquadramento da recorrente no regime simplificado de tributação.
Face ao volume de proveitos declarado relativamente a 2002, e que a fazia abranger obrigatoriamente pelo regime simplificado, a recorrente, se não pretendia ficar sujeita a tal regime, devia ter apresentado declaração de alteração para exercer a opção pelo regime geral, de harmonia com o disposto no nº 7 do art. 53º do CIRC.
Com efeito, no art. 53º do CIRC, concretamente nos seus números 1, 2 e 3, prevê-se a possibilidade de os contribuintes formalizarem a sua opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável na declaração de início de actividade (modelo nº 1698), opção que logo aí deve ser expressada (no quadro 19) se já nessa altura se encontrarem preenchidos os pressupostos de inclusão no regime simplificado.
No caso da recorrente, como do teor da sua declaração de início de actividade resultava a sua inclusão no regime geral (face ao volume estimado de vendas) não se tornava necessário que fizesse logo a opção pelo regime geral, opção que aí só se mostra configurada para os casos em que já nessa altura se mostram reunidos todos os pressupostos para a inclusão no regime simplificado.
Nestas situações, a opção deve ser exercida logo que ocorram os pressupostos para a inclusão no regime simplificado, o que no caso da recorrente ocorreu em 2003 quando declarou um volume de proveitos inferior a 149.639,37€, pelo que tinha a obrigação de apresentar a declaração de alteração (para opção pelo regime geral) até ao fim do 3º mês do período de tributação do início de aplicação do regime simplificado.
Não o tendo feito, e verificando-se os requisitos de enquadramento no regime simplificado, foi o mesmo aplicado por um período de três exercícios, regime que só pode cessar após o decurso desse período mínimo de permanência e caso a recorrente impeça a sua renovação pela apresentação de opção pelo regime geral (assim como cessa se for ultrapassado o limite de volume total de proveitos em dois exercícios consecutivos, ou num só exercício em montante superior a 25% desse limite, ou ainda se deixarem de ocorrer os demais requisitos de que depende a aplicação do regime).
Do exposto resulta que a recorrente não foi impedida de formalizar a sua opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável, nem ocorre qualquer motivo legal que permita a aplicabilidade desse regime ao exercício de 2003.
Se é verdade que a forma como se encontra elaborada e redigida a declaração de início de actividade (modelo nº 1698) só parece permitir fazer logo aí a opção pelo regime geral no caso de estarem reunidos os pressupostos para a aplicação do regime simplificado - o que é perfeitamente compreensível e legal, pois que só nesse caso se impõe saber se o sujeito passivo prefere outro regime - nada impediu a recorrente de apresentar declaração de alteração de regime quando ocorreram os pressupostos para a inclusão automática no regime simplificado, aí assinalando a sua opção pelo regime geral, pelo que não procede a sua argumentação sobre a impossibilidade de formalização dessa opção e sobre a violação do princípio da legalidade e da igualdade.
Na senda do Acórdão deste TCAS de 09/05/2006, tirado no Recurso n º 1096/06Veja-se, sobre idêntica matéria, o Ac. do STA de 15-02-2007, Recurso nº 0959/06;
, por nós relatado, à guisa de reforço argumentativo, ainda se dirá que,
O nosso ordenamento jurídico consagra, como regime regra da tributação, o método declarativo em que coloca na esfera de actuação dos particulares contribuintes a iniciativa no procedimento de apuramento, fixação e pagamento dos impostos.
Tal sistema pressupõe uma cooperação estreita entre a AT e o contribuinte, em ordem a alcançar a tributação dos rendimentos reais, cooperação essa que impõe, desde logo, que o último faculte à primeira, todos os elementos que viabilizem o correcto apuramento daqueles.
Para hipótese de tal cooperação se gorar o ordenamento faculta à AT o recurso a meios alternativos, sob pena de se colocar nas mãos dos contribuintes, o livre arbítrio de pagarem, ou não, os impostos que forem devidos.
Esses meios alternativos são não só o recurso às correcções técnicas ou aos métodos indiciários, como o próprio regime de tributação simplificado ora em questão.
"A atribuição de crescentes deveres de cooperação aos particulares não vem afastar , como já deixámos referido , o princípio de que a aplicação da lei fiscal é uma tarefa da Administração. Que responde pelos resultados gerais desta e desempenha uma função permanentemente supletiva quanto ao cumprimento dos deveres dos particulares.
(...)
Esta articulação entre o princípio da investigação e os deveres de cooperação ganha novas formas pelas consequências que de tal resultam sempre que se verifica a violação, por parte do sujeito passivo, de um dos específicos deveres de cooperação que lhe são atribuídos pelo ordenamento jurídico.
(...)
....independentemente da dimensão formal dos deveres de cooperação que faz com que possa haver um comportamento ilícito sem que este tenha atingido os fins pretendidos pelo agente, o juízo sobre a gravidade da violação é basicamente determinado pela intensidade do resultado.
É esta intensidade que vem determinar a extensão do exercício pleno dos poderes de investigação atribuídos à Administração, (...)
É o resultado da violação que determina a extensão da actividade da Administração que vai exercer a tarefa de reconstituição de uma situação fáctica que não devidamente descrita pelo sujeito passivo, na medida do necessário. E apenas nesta medida."Cfr. JLSaldanha Sanches , in "A Quantificação da Obrigação Tributária", 2ª ed., pp. 291 ,294 e 295.
.
Como também refere o Prof. Saldanha Sanches, in Fiscalidade de Julho/Outubro de 2001, citado na sentneça recorrida, «o regime simplificado tem sempre como pressuposto uma opção do contribuinte que renuncia ao seu direito subjectivo de ser tributado com base na contabilidade. E que, procedendo a uma estimativa de custos que vai suportar e declarar, opta pela dedução estandardizada.»
(...)
«Temos desde modo uma daquelas situações em que a lei atribui relevância à vontade do contribuinte e em que este pode optar pelo regime que considera mais favorável».
Conceptualmente, em termos gerais e como decorre hoje do disposto no nº 2 do artº 87º da LGT, procede-se à avaliação indirecta nas situações em que não existem elementos fiáveis e suficientes para demonstrar exactamente o valor dos rendimentos ou bens ou serviços sujeitos a tributação e, por essa razão, a sua tributação é feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a AT disponha, inclusivamente aqueles que poderiam ser utilizados na avaliação directa.
A avaliação indirecta é, de resto, excepcional, a ela apenas se procedendo quando não seja viável a determinação da matéria tributável por meio da avaliação directa, seja por falta de elementos para se operar com esta, seja por existirem razões para suspeitar que o valor a que conduz a aplicação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real – cfr. artºs 87º, nº 1, al. c), e 89º da LGT).- Nesse sentido, o Ac. deste TCAS de 05/08/04, no Recurso nº 163/04
E, definindo o âmbito da avaliação directa, dispõe o Artigo 81.° da LGT que: 1. A matéria tributável é avaliada ou calculada directamente segundo os critérios próprios de cada tributo, só podendo a administração tributária proceder a avaliação indirecta nos casos e condições expressamente previs­tos na lei.
No preceito faz-se a referência cumulativa a avaliação e cálculo da matéria colectável dir-se-á, na senda de Diogo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, LGT Comentada e Anotada, 3ª ed., pág. 418 e ss, que a designação de avaliação estará reservada para os casos em que a determinação da matéria tributável é feita através de métodos que, mesmo com uti­lização de critérios objectivos (como exige o n.° l do art. 84.° da L.G.T.), não podem dei­xar de envolver uma margem de subjectividade, como sucede nos casos de determinação do valor de bens (entre outros casos, para efeitos de sisa, imposto sobre sucessões e doa­ções, contribuição autárquica, em certos casos, direitos alfandegários e imposto automó­vel) e naqueles em que a determinação é feita utilizando métodos indirectos.
Destarte as referências a avaliação circunscrevem-se aos casos em que houver aplicação de elementos de carácter subjectivo.
Conforme preceitua o Artigo 83.° da LGT a avaliação directa, visa a determinação do valor real dos rendi­mentos ou bens sujeitos a tributação ( nº 1) e a avaliação indirecta ( que o contribuinte disse ter sido utilizada) visa a determinação do valor dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha (nº 2).
Resulta do inciso legal transcrito que quer a avaliação directa como a indirecta têm por fim determinar o valor dos ren­dimentos ou bens sujeitos a tributação, nos seguintes termos:
a)- no primeiro caso, a avaliação é feita com base em elementos de prova do valor real dos bens ou rendimentos tributáveis e, por isso, visa-se determinar com exactidão este valor;
b)- Os casos em que se procede a avaliação indirecta, indicados no art. 87.° da L.G.T., são situações em que não existem elementos fiáveis suficientes para demonstrar exacta­mente o valor daqueles bens ou rendimentos, metodologia que o contribuinte diz ter sido seguida pela IT, o que não corresponde à verdade pois a avaliação do bem sujeitos a tributação não foi feita com base em indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária dis­puser, inclusivamente alguns que poderiam ser utilizados na avaliação directa.
De resto, dado o seu carácter excepcional, apenas se procede a avaliação indirecta em casos em que não seja viável determi­nar a matéria tributável através de avaliação directa, quer por falta de elementos para esta ser levada a cabo, quer por haver razões para suspeitar que o valor a que conduz a apli­cação dos métodos de avaliação directa não é a matéria tributável real [arts. 87.°, n.° l, alínea c), e 89.° da L.G.T.].
É forçoso concluir, pois, que, em princípio, o regime simplificado de tributação pressupõe a avaliação directa seguindo critérios objectivos em acatamento do comando legal contido no Artigo 84.° que impõe a utilização de critérios técnicos ao determinar que a avaliação dos rendimentos ou valores sujeitos a tributação baseia--se em critérios objectivos (nº 1), devendo a fundamentação da avaliação conter obrigatoriamente a indica­ção dos critérios utilizados e a ponderação dos factores que influenciaram a determinação do seu resultado (nº 2).
Assim, e de acordo com a lei, a avaliação efectuada baseou-se em critérios objectivos, com a possível base técnico - científica, pois da análise, atrás feita, das razões que levaram à atribuição do valor tributável e não de outro, o percurso lógico que foi seguido na avaliação para chegar ao resultado alcançado, foi em perfeito silogismo, demonstrado integralmente de forma objectiva, quer quanto aos ele­mentos utilizados quer quanto ao método de cálculo que tenha sido utilizado.
E isso porque «i casu» a objectividade ter sido concretizada totalmente, pois para realizar a avaliação foram ponderados factores claramente objectivos.
Não obstante, segundo Leite de Campos, Benjamim da Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, a exigência de objectivi­dade nos critérios de avaliação terá de ser meramente tendencial, a objectividade possí­vel no caso concreto, que se traduzirá, nos casos em que têm de ser valorados factores subjectivos, na utilização de uma fundamentação que ultrapasse a estrita subjectividade e permita controlar a correcção dos juízos formulados.
Daí que como requisito maior da fundamentação do acto de avaliação, figure a exigência de que ela contenha a indicação dos critérios utilizados e a ponderação dos fac­tores que influenciaram a determinação do seu resultado, devendo esta indicação e ponderação dar a conhecer, na sua totalidade, o itinerário seguido na avaliação para se alcançar o valor da matéria tributável, permitindo conhecer integralmente as razões por que foi atingido esse valor e não qualquer outro.
Podemos, pois, afirmar, que no caso do regime simplificado estamos perante uma tributação normal (por opção), em que a matéria tributável é determinada com base em elementos exclusivamente objectivos, como acontece nos casos de regime simplificado de tributação (al. a) do art. 87.° da LGT).
Os regimes simplificados de tributação, previstos nos arts. 28.° e 31.º do CIRS e 53.° do CIRC, podemos dizer que se trata de regimes aplicáveis a pequenos contribuintes ou a pequenas empresas, concretizando, a contribuintes ou empresas cujo volume de vendas não seja superior a 30.000.000$ (E 149.639.37} ou cujo valor ilíquido dos restantes rendimentos da categoria B não seja superior a 20.000.000$ (E 99.759.58) no IRS.
Em tais regimes a tributação não assenta no rendimento real, mas no rendimento normal a apurar com base em "indicadores objectivos de base técnico - científica". Ou, enquanto tais indicadores não forem aprovados, assenta em sede do IRS, no rendimento colectável igual a 0,20% do valor das vendas de mer­cadorias e de produtos e do valor dos serviços prestados no âmbito das actividades de hotelaria, restauração e bebidas, ou no rendimento colectável igual a 0.65% dos restantes rendimentos.
Esse rendimento colectável tem por montante mínimo, na versão resultante da LOE/2003, E 3.125 no IRS, o que vale por dizer, a aplicação de colectas mínimas indirectas já que determinadas através de matérias tributáveis mínimas (minimum taxable income).
Assim, o que verdadeiramente temos aqui são três regimes sim­plificados ou, noutra versão, três graus de simplificação da tributação, a saber: l) o regime ordinário, que tem por suporte indicadores objectivos de base técnico-científica definidos para cada um dos diferentes sectores da actividade económica, a implementar no futuro, quando estes indicadores estiverem definidos {regime dos indica­dores): 2) um regime transitório, que tem por base coeficientes definidos na própria lei, a aplicar até que aquele primeiro regime seja implementado (regime dos coeficientes)', e 3) um imposto mínimo (minimum tax), fixado através do estabelecimento de um rendimento tributável mínimo (minimum taxable income) igual a 6 3.125 em IRS e a E 6.250 em IRC quando o rendimento colectável decorrente da aplicação daqueles coeficientes for inferior a tais montantes (regime do imposto mínimo). Cfr. José Casalta Nabais, Direito Fiscal, 2ª ed., pág. 306 a 308.
(…) o regime de tributação simplificado foi instituído pela Reforma Fiscal de 2001, visando facultar aos profissionais independentes e os empresários, com rendimentos abaixo de certo nível, a opção fiscal de serem tributados com as suas despesas determinadas de acordo com as regras contabilísticas ou, em alternativa, serem dispensados de registos contabilísticos e terem o seu rendimento objectivo determinado segundo uma dedução estandardizada.
Com efeito, o regime simplificado de determinação dos rendimentos das actividades empresariais e profissionais é um método que se aplica supletivamente aos sujeitos passivos que cumpram determinados requisitos e que não optem pela tributação com base em contabilidade organizada.
Assim, o(s) recorrente(s), porque estava(m) integrado(s) no regime simplificado, não estavam obrigados, por imposição legal, a possuir contabilidade organizada, no período de tributação imediatamente anterior e não atingiram na sua actividade, valor superior a qualquer dos seguintes limites (n.° 2 do Art. 28.° do CIRS): - volume de vendas: C 149 639,37; valor ilíquido das prestações de serviço e restantes rendimentos integrados nesta categoria: C 99 759.58.
Ao(s) recorrente(s) era garantida a opção pelo regime de contabilidade organizada, sendo os seus rendimentos tributados por avaliação directa, nos termos do n.° 2 do Art.° 81° da LGT como se analisou, opção que devia ter sido exercida na declaração de início de actividade ou na declaração de alterações a apresentar até ao fim do mês de Março do ano para o qual se pretende a determinação do rendimento líquido com base na contabilidade, a qual deverá ser organizada de acordo com o disposto no Art.° 115.° do CIRC.
E o(s) recorrentes, como é pacífico, não exerceram a opção pela contabilidade organizada, podendo-o fazer até ao fim do mês de Junho de 2001 (excepcionalmente, no ano de 2001, a opção foi exercida até ao fim de Junho - Circular n. ° 3/2001) através da apresentação de uma declaração de alterações, afastando, assim, de livre vontade, a hipótese dos seus rendimentos serem tributados segundo o rendimento real - n.° 4 do Art.° 28° do CIRS.
Porque não foi exercida até ao final de Junho de 2001 a opção pela aplicação do regime geral, e dada a verificação dos requisitos de enquadramento no regime simplificado, o mesmo era aplicável automaticamente por um período de cinco exercícios, sendo prorrogado por iguais períodos.
Apesar disso, poderia o sujeito passivo transitar para o regime geral para o que deveria comunicar a necessária opção mediante declaração de alterações, a apresentar até ao fim do 3° mês do período de tributação de início de aplicação deste regime, o que os recorrentes não fizeram.
Donde que, de todo em todo, lhes era aplicável o regime simplificado de tributação, resultando o rendimento da aplicação de indicadores de base técnico - científica determinados para os diferentes sectores da actividade económica, nos termos do n° l do Art.° 31° do CIRS os quais devem ser anualmente definidos pelo Ministro das Finanças após audição das associações empresariais e profissionais, nos termos referidos no Art.° 89.° da LGT.
Como tais indicadores não tinham sido aprovados, o rendimento colectável a englobar na declaração anual de rendimentos dos sujeitos passivos abrangidos por este regime, será o resultante da aplicação dos já referidos coeficientes estabelecidos no n.° 2 do Art° 31 do CIRS.
Estando em causa nos autos o rendimento do ano de 2001 e porque o regime simplificado iniciou a sua vigência em l de Janeiro desse ano, era por demais previsível que em tal exercício fossem os coeficientes estabelecidos no n.° 2 do Art° 31 do CIRS os aplicáveis para a determinação do rendimento colectável, não se podendo afirmar que se goraram as expectativas dos contribuintes com a não aprovação da citada portaria prevista no n.° 4 do Art.° 31° do CIRS.
Ademais, o facto da não aprovação da falada Portaria não era impeditivo de exercício do direito de opção pelo regime de contabilidade organizada que a lei facultava aos recorrentes para evitarem a avaliação indirecta com as inerentes consequências em termos de quantificação próprias do regime simplificado de tributação, e, o certo é que, pura e simplesmente não o exerceram.
Sendo assim, compo é, nºao poderá ser assacada ao acto tributário impugnado qualquer tipo de ilegalidade (o art.° 81.°, n.° 2 da Lei Geral Tributária estatui que «Em caso de regime simplificado de tributação, o sujeito passivo pode optar pela avaliação directa, nas condições que a lei definir.») ou inconstitucionalidade pois a própria Constituição da República Portuguesa legitima a aplicabilidade do regime simplificado de tributação ao não obrigar a exclusividade da tributação segundo o rendimento real (Art.° 104.° n.° 2 da CRP): «a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real.»
A recorrente entregou a declaração de rendimentos de IRC do exercício de 2002, e, encontrando-se abrangidos pelo regime simplificado de tributação, estava sujeita às regras próprias da aplicação desse regime.
Neste conspecto, a lei atribui relevância à vontade do contribuinte, podendo este sempre optar pelo regime que mais lhe convém; ora, tendo a recorrente de ser tributada segundo o regime simplificado de determinação do lucro tributável, a AT agiu de acordo e em estrita obediência ao princípio da legalidade a que está vinculada, não podendo ser assacada à liquidação impugnada qualquer ilegalidade, mormente a violação dos princípios a que alude na conclusão 8ª.
Nem o acto tributário impugnado afrontou o princípio constitucionalmente consagrado de que «a tributação deve incidir sobre o rendimento real.»
E o certo é que o princípio constitucional consagrado no n.° 2 do Art. 104.° da CRP é o regime regra mas admite excepções, quais sejam, o regime simplificado de tributação e o recurso a métodos indirectos.
E, como se viu, o recurso a qualquer deles não depende de um critério discricionário da AT, correspondendo, antes, cada um deles, um seu poder vinculado, na estrita medida do necessário ao evitar da evasão fiscal por parte dos contribuintes faltosos, com o duplo objectivo, no mínimo, de evitar, por um lado o "emagrecimento" ilegítimo dos recursos do Estado e, por outro, de repartir equitativamente, como constitucionalmente imposto, a carga fiscal.
Assim, a AT encontra-se vinculada ao recurso aos métodos indirectos, quando, demonstrada a violação dos deveres de cooperação do contribuinte tal apuramento se vier a revelar inviável, então não pode deixar de lançar mão dos métodos presuntivos.
Ou seja, o recurso à metodologia indiciária surge, por opção do legislador, como uma medida de último recurso, e na impossibilidade de se proceder ao apuramento por qualquer das outras vias legalmente admitidas, ou dito de outra a forma , a metodologia em causa, uma vez que "marcada por uma inultrapassável incerteza e exigindo uma cuidadosa fundamentação , tem de se conservar com uma última ratio flsci,..." o recurso ao método presuntivo Cfr. autor e obra citados, 302/303.
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Por consequência, e sendo certo que nos termos das regras do ónus da prova em sede de direito administrativo tributário - onde , à luz dos vigentes princípios de descoberta da verdade material e , da consequente , oficiosidade de investigação e indagação das provas , não na uma particular incumbência de provar , por parte de quem quer que seja, sem embargo de, vela, impossibilidade de manutenção de um "non liquet", a ausência de prova de factos relevantes não possa deixar de desfavorecer quem com ela estava onerado-, é à AT que cabe a obrigação "... da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação , designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) ..." cabendo , em contrapartida "...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto , quando se mostrem verificados esses pressupostos ..."Cfr. Ac. deste Tribunal, de 02.06.04, tirado no Rec. 3.279/00.
é àquela que se impõe demonstrar , casuísticamente , a verificação do requisitos que a lei impõe para que possa e deva , em concreto , lançar mão da metodologia indiciaria Cfr. entre outros e além do Ac. já referido o Ac. deste Tribunal de 02.11.03 , Rec. n°. 6.382/02.
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Ou seja e ao que aqui releva, importa à AT demonstrar que a contabilidade do recorrente, com referência aos exercícios em questão, padecia de inexactidões , irregularidades e/ou omissões , escamoteadoras ou enganadoras dos reais valores o tributar e impossibilitantes do seu apuramento directo, sem que , a isso, possa ser oposto, que a fiscalização considerou quanto, à regularidade da escrita, que foi dado cumprimento às formalidades extrínsecas a que se encontram sujeitos os livros de escrituração, já que "... a regularidade formal da escrita apenas constitui presunção da sua veracidade e (...) esta presunção de veracidade das declarações dos contribuintes só é estendida aos seus elementos de apoio (...) se estes estiverem organizados de acordo com a lei comercial e fiscal e com as regras da normalização contabilística e se aqueles mesmos elementos de apoio permitirem o apuramento e controlo da matéria tributável efectivamente obtida reflectindo correctamente o lucro liquido do exercício e as operações realizadas” Cfr. Ac. deste Tribunal tirado no Rec. nº. 3.673/00.
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E, no que tange à tributação pelo regime simplificado, ele é aplicável quando os contribuintes, verificados os pressupostos já escalpelizados supra, não optem pelo regime normal de tributação nas condições também analisadas, caso em que serão tributados com base num lucro normal que corresponde à resultante da aplicação de indicadores de base técnico-científica definidos para os diferentes sectores da actividade económica.
O raciocínio é o mesmo na metodologia indiciária e na aplicação dos ditos coeficientes: se da aplicação dos referidos coeficientes resultasse prejuízo para os ora recorrentes, poderiam sempre ter optado pela contabilidade organizada, onde poderiam deduzir os custos da actividade que comprovadamente tivessem sido indispensáveis para a obtenção dos proveitos ou ganhos, segundo as regras previstas no CIRC.
Com efeito, é possível o recurso a índices ou indicadores de actividade para justificar a utilização de métodos indiciários ou o recurso aos próprios métodos indiciários como forma de determinação da matéria colectável, bem como para operar com os regimes simplificados de tributação.
Como se dá nota no Acórdão do STA de 30-04-2002, tirado no Recurso nº 98/02,224 No sentido de que o recurso a métodos indiciários para determinação da matéria colectável do IVA não colide com a autorização concedida pelo art.º 22º da Lei n.º 42/83, de 31 de Dezembro, quando falte ou seja indexada a declaração do contribuinte e de que os artº 82º, 83º e 84º, do CIVA não enfermam de inconstitucionalidade, veja-se, tb., o Acórdão do STA de 28-10-98, Recurso nº 015978.
4 cuja fundamentação se vai seguir de perto, o Tribunal Constitucional já se firmou jurisprudência no sentido da não inconstitucionalidade das indicadas normas, pontificando o Ac. TC 348/97, DR II ª S, nº 170, de 25-7-97, p. 8959, em que se expendeu que a Constituição, no artigo 107º, relativo aos impostos, dispõe no n.º 2 que «a tributação das empresas incidirá fundamentalmente sobre o seu rendimento real» tendo-se adoptado, entre as soluções típicas possíveis, a tributação dos lucros reais, isto é, em princípio, dos lucros efectivamente verificados em cada ano, se bem que, exigindo tal opção um sistema fiável de conhecimento dos resultados das empresas e porque isso não se mostra possível em muitos sectores, admite-se que aquela tributação possa incidir pelo menos sobre os lucros presumivelmente realizados e/ou pela tributação com base num lucro normal resultante da aplicação de indicadores de base técnico – científica definidos para os diferentes sectores de actividade económica.
É que conforme escreveu Teixeira Ribeiro, citado no mesmo acórdão, é do rendimento real, e não do rendimento normal, que depende a capacidade tributária contudo por vezes não há mais remédio do que tributar o rendimento normal quando se torna impossível conhecer com suficiente aproximação o rendimento real.
E ainda citando o Prof. Sousa Franco a forma de determinação da matéria colectável, relativamente aos impostos directos, pode efectuar-se com recurso aos rendimentos presumidos pois que se entende que não é possível, por ser fácil a fraude ou o arbítrio, qualquer tentativa de fixação real e directa da matéria colectável escolhendo-se então indicadores, com base nos quais se determina o valor que vai ser tributado, admitindo-se, por exemplo, que existe uma correlação entre o número de empregados, o volume de vendas ou o capital social. Nesta perspectiva o lucro que a empresa deve ter obtido resultará dos indicadores que servem de base à fixação do imposto por presunção da Administração, aplicando critérios legais.
Ainda segundo o mesmo autor a tributação real, sobretudo por razões de justiça e eficiência económica, é preferível – representa um sistema mais justo, que permite a personalização do imposto e mais uma correcta distribuição da carga fiscal –, sendo certo que tal forma de tributação tem recebido entre nós uma concretização efectiva limitada, desde logo porque pressupõe a existência de uma economia desenvolvida: um elevado grau de precisão e desenvolvimento da máquina administrativa, uma estrutura económica com empresas de razoável dimensão, dispondo de processos de contabilidade normalizados e rigorosos, com sujeitos económicos racionais e uma economia altamente monetarizada e baseada na troca.
Citando, ainda, Manuel Pires, «A Constituição de 1976 e a fiscalidade», Estudos sobre a Constituição, 2º vol., Lisboa, 1978, pp. 417 e seguintes, referiu que: «Sobre a tributação das empresas, adoptou o legislador constitucional a tributação do rendimento real, embora cuidadosamente tenha inserto o advérbio ‘fundamentalmente’ e não poderia deixar de ser de outro modo. Num país em que existe um número imenso de empresários que não dispõe de contabilidade ou se dela dispõe, ela não oferece as condições de confiança para o apuramento do verdadeiro rendimento, será utópico considerar a tributação sempre segundo o rendimento real. Numa grande parte dos casos, esse apuramento terá de ser feito a forfait ou presumidamente, embora tal implique um elemento não homogéneo para efeito do imposto pessoal (soma de rendimentos reais com rendimentos não reais), no caso de empresários individuais ou mesmo de certo tipo de sociedades em relação às quais se possa decidir uma não tributação autónoma (os lucros seriam repartidos finalmente entre os sócios de acordo com determinados critérios).»
Entendeu, por isso, o Tribunal Constitucional que não sofre de inconstitucionalidade a norma segundo a qual os contribuintes são tributados com base no lucro presumido pois que da Constituição e nomeadamente do seu artigo 107.º, n.º 2, não pode retirar-se a conclusão de ser vedada entre nós a tributação de rendimentos presumidos ou a utilização de «presunções» na determinação da base tributável.
Porque assim e visto o artº 107º nº 2 da CRP, as razões que justificam a tributação pelo método indirecto quanto ao rendimento pontificam igualmente, por identidade de razões, quanto à tributação por regimes simplificados.
É sabido que no domínio do Direito Fiscal interessa a substância das operações económicas a tributar e que este interesse se manifesta na disposição constitucional que visa a tributação do rendimento real das empresas (art.104ºnº2 CRP/RC 97) .
Por isso revela acerto a afirmação do Mº Juiz «a quo» de que não sofrem de qualquer inconstitucionalidade, mormente por violação do disposto no artº 107° da Constituição da República, pois a aplicação do regime de tributação simplificado tem exactamente por finalidade determinar o rendimento real auferido quando não há elementos contabilísticos fiáveis para tal porque o contribuinte não optou por um regime normal de tributação baseado na sua contabilidade legitimando assim o recurso a índices ou indicadores de actividade.
É que quando mo preceito constitucional se afirma que a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real, o termo fundamentalmente significa que nem sempre tal pode acontecer, ou seja, de a tributação incidir sobre o rendimento real das empresas.
Ora, como se disse, tal sucede quer no regime simplificado, quer, de um modo geral, nos casos em que a contabilidade não se encontre devidamente organizada em que é necessário o recurso ao método indirecto.
Os recorrentes podiam ter optado pelo regime de contabilidade organizada (e que estivesse devidamente organizada) para que a tributação não fosse calculada com recurso ao método indirecto nos termos do preceituado no artigo 31.° do CIRS e, não o tendo feito, terão de suportar as consequências que a lei atribui a essa opção.
Destarte, a tributação actuada pelo Fisco não é «in casu» inconstitucional.”
Chama-se, igualmente, à colação o Acórdão do STA de 15-02-2007, Recurso nº 0959/06:
“(…)
3 – A única questão que é objecto do presente recurso jurisdicional é a da constitucionalidade do regime simplificado de determinação do lucro tributável, previsto no art. 53.º do CIRC, à face do art. 104.º, n.º 2, da CRP, que estabelece que «a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real».
O próprio texto do referido art. 104.º, n.º 2, da CRP evidencia que o princípio da tributação das empresas pelos lucros reais não foi enunciado em termos absolutos, impondo-se apenas que a tributação incida «fundamentalmente» sobre o rendimento real.
O CIRC adopta a regra da tributação pelos rendimentos reais dos sujeitos passivos, estabelecendo o regime da sua determinação (arts. 1.º, 3.º e 15.º e seguintes).
Paralelamente, prevê-se, no art. 53.º, o «regime simplificado de determinação do lucro tributável» que se traduz em o rendimento que serve de base à tributação ser determinado através da aplicação de indicadores de base técnico-científica definidos para os diferentes sectores da actividade económica ou, na sua falta, através da aplicação de determinados coeficientes ao valor das vendas de mercadorias e de produtos e restantes proveitos, com um determinado montante mínimo. ( ( ) A aplicação destes coeficientes às receitas obtidas não serve para determinar o imposto a cobrar, mas sim para determinar a matéria tributável, sobre a qual vai incidir a taxa do IRC aplicável.
Assim, não se compreende a alegação da Recorrente de que este regime só atende às receitas para o cálculo do IRC, pois, se se considera como matéria tributável 20% ou 45% das receitas (ou a percentagem derivada de indicadores de base técnico-científica), é óbvio que são implicitamente consideradas como despesas 80% ou 55% das receitas.)
A tributação segundo este regime simplificado é facultativa, sendo colocada na disponibilidade do sujeito passivo a opção pela tributação pelo rendimento real, como resulta da parte final do n.º 1 do referido art. 53.º.
Nestas condições, impõe-se a conclusão de que o sistema de tributação de acordo com o regime simplificado não é incompatível com a regra do art. 104.º, n.º 2, da CRP, pois, por um lado, o facto de não se tratar de uma imposição absoluta abre ao legislador ordinário a possibilidade de estabelecer excepções e, por outro lado, sendo garantida a todos os sujeitos passivos de IRC a possibilidade de serem tributados pelo rendimento real se o pretenderem, é manifesto que a excepção prevista não desvirtua aquele regime regra de tributação das empresas pelo rendimento real.
Por isso, não ocorre a inconstitucionalidade invocada.”
Termos em que improcede o recurso, sendo de manter a sentença recorrida.
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Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
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Lisboa, 26/06/2007
(Gomes Correia)
(Eugénio Sequeira)
(Ascensão Lopes)