Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02811/07
Secção:Contencioso Administrativo - 2º Juízo
Data do Acordão:12/13/2007
Relator:António Coelho da Cunha
Descritores:PEDIDO DE INFORMAÇÃO PRÉVIA
DEFERIMENTO TÁCITO
DEFINIÇÃO DAS CONDIÇÕES NECESSÁRIAS À OPERAÇÃO DE LOTEAMENTO
Sumário:I- Tendo ocorrido deferimento tácito do pedido de informação prévia sobre licença de loteamento, que beneficiou de parecer prévio favorável do Ministério da Defesa Nacional e da REFER, não pode uma Câmara Municipal revogar tal deferimento, com o simples argumento de que o local da operação não possui infra-estruturas e condições necessárias, sem indicar ou identificar tais infra-estruturas e condições e sem nada se provar nos autos a tal respeito.
II- A definição das condições necessárias a uma operação de loteamento não compete ao interessado, mas sim à Câmara Municipal da área respectiva, no procedimento de Licenciamento ou autorização.
III- A deliberação revogatória de um deferimento tácito deve ser devidamente fundamentada, após cumprimento do art. 100º do CPA.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:Acordam no 2º Juízo do TCA Sul

1. Relatório.
José ...intentou no TAF de Almada acção administrativa especial contra o Município de Almada, pedindo que seja declarada a “constituição de uma relação jurídica subjectiva favorável na esfera do A. à decisão sobre um eventual pedido de licenciamento ou autorização da operação urbanística previamente solicitada junto da C.M.A., bem como a condenação da Ré “ao reconhecimento de tal posição emergente do decurso do prazo legal e à abstenção de comportamentos que possam lesar o exercício desse direito constituído”
Por Acordão de 30.10.2006, o Tribunal "a quo" julgou a acção improcedente e absolveu o R. do pedido.
Inconformado, o A. interpôs recurso jurisdicional para este TCA-Sul, em cujas alegações formulou as conclusões seguintes (em síntese útil):
O douto aresto em crise começa por considerar que se formou na ordem jurídica um acto tácito de deferimento da pretensão do recorrente;
Todavia, interpretando o disposto na alínea b) do art. 6º do Regulamento do P.D.M. de Almada, o aresto em crise decidiu pela invalidade deste acto tácito de indeferimento, interpretando erroneamente a citada disposição regulamentar e violando, entre outras, as disposições do art. 14 nº 1 e 2 e art. 17º nos. 1 e 3 do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação;
O Tribunal recorrido não dispunha de elementos que lhe permitissem afirmar a inexistência de infraestruturas gerais necessárias ou quaisquer outros problemas que devessem surgir como condições
As condições a que alude a referida disposição do PDM de Almada, podem ser definidas em sede de procedimento de informação prévia, sendo reduzidos para metade os prazos de decisão em procedimento de licenciamento (art. 17º nº 3 do RJUE), o que não foi feito no acto expresso;
Ao contrário do decidido no acórdão em crise, o acto silente de indeferimento é um acto válido e constitutivo de direitos, não sendo possível a sua revogação pelo acto expresso de indeferimento proferido na pendência da causa;
A decisão recorrida violou o disposto nos nº 1, alínea b) e nº 2, alínea b) do Cod. Proc. Administrativo;
O acto expresso revogatório é inválido, e não apenas irregular;
O Acordão recorrido aplicou erradamente o princípio do aproveitamento dos actos administrativos e as normas que protegem o direito de audiência prévia, além de ter violado o disposto no art. 135º do Cod. Proc. Administrativo;
O acto expresso de indeferimento da pretensão do recorrente, proferido pela C.M.A. em 16.10.2004, é manifestamente ilegal.
A recorrida C.M.A. contra-alegou, pugnando pela manutenção do julgado.
O Digno Magistrado do MºPº emitiu douto parecer no sentido de ser concedido provimento ao recurso.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. Matéria de Facto
O Acordão recorrido considerou provada a seguinte factualidade, com relevo para a decisão:
a) O A. é comproprietário do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Almada, com o nº 29241, a fls. 135 v do Livro B-80, inscrito na matriz sob o art. 20º da Secção B, sito na Quinta do Tecelão, na Trafaria, Almada, com a área de 14.120 m2;
b) O prédio indicado em a) encontra-se em área do Plano Director Municipal de Almada, ratificado por Resolução do Conselho de Ministros nº 5/97, de 14 de Janeiro;
c) prédio indicado em a) insere-se, no âmbito do PDM, na Unidade Operativa (UNOP) nº 6, Pêra, encontrando-se dividido em duas zonas, em regime de uso dominante:
1 A Sul é espaço urbanizável de baixa densidade;
2 A Norte é espaço de vocação turística de baixa densidade;
d) Ambos os usos cometidos pelo Plano à parcela são previstos e não programados; e) Dispõe a alínea b) do art. 6º do PDM de Almada: “espaços urbanizáveis são aqueles em que se admite a edificação de novas áreas urbanas, após a realização das respectivas infra-estruturas urbanísticas. Consoante a prioridade conferida pelo Município à urbanização destes espaços, assim estes são subdivididos em programados e não programados. Espaços urbanizáveis programados são aqueles que já se encontram servidos pelas infra-estruturas gerais do concelho, ou para onde a sua construção se encontra programada, e que por isso a sua urbanização é considerada prioritária pelo município. Espaços urbanizáveis não programados são aqueles em que o uso proposto pelo PDMA só é concretizável quando for assegurado pelos interessados na promoção urbanística da área, o cumprimento de um conjunto de condições, cuja realização não está prevista ou programada pelo município durante o prazo de vigência do PDMA. Neste caso, será assim a iniciativa privada a assumir por inteiro a construção das infra-estruturas gerais e locais, a sua ligação e articulação com os sistemas existentes ou programados, bem como a resolução de eventuais problemas urbanísticos existentes que condicionem a concretização do uso do solo proposto no PDMA;
f) O A. requereu à Câmara Municipal de Almada, em 7.04.2004, informação prévia sobre operação de loteamento, nos termos do artigo 14º nº 1 do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, aprovado pelo Dec. Lei nº 555/99, de 16 de Setembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Dec. Lei nº 177/2001, de 4 de Junho;
g) Por ofício nº 4677/04, de 4 de Maio de 2004, no âmbito do processo de viabilidade já identificado, o Réu solicitou ao Autor “cinco colecções completas do projecto (memória descritiva e peças desenhadas, incluindo planta de localização), sendo uma em reprolar, a fim de colherem parecer junto do Governo Militar de Lisboa e REFER;
h) O A. deu satisfação ao solicitado, tendo em 17 de Maio de 2004, por requerimento nº 10931/2004, juntado os “elementos para efeitos de suprimento de deficiências, conforme v/ofício nº 4677/04 5 colecções (1 em reprolar)”;
i) O Município R., através de Ofícios datados de 23.05.2004, e nos termos do nº 1 do art. 19º RJUE, pediu ao Ministério da Defesa Nacional e à REFER E.P., informação sobre o projecto apresentado pelo A;
j) Através de Ofício datado de 2.07.2004, o Ministério da Defesa Nacional veio dizer nada ter a opor ao projecto;
k) Através de Ofício datado de 11/10/2004, a REFER E.P., veio dizer que não tinha a opor qualquer impedimento à pretensão do A.
l) Através de Ofício datado de 11.10.2004, o Réu notificou o A. de que “o pedido de licenciamento (...) mereceu despacho desfavorável em Reunião de Câmara de 6 de Outubro do corrente ano ...” (cfr. fls. 54 dos autos
m) Lê-se na deliberação camarária a que se refere o nº anterior:
VIABILIDADE DE LOTEAMENTO 3/04
Presente o requerimento nº 7496/04, de 7.04.2004, em que José Manuel Bernardes, na qualidade de proprietário, solicita informação prévia nos termos do art. 14º do Dec. Lei nº 555/99, de 16 de Dezembro, com a redacção data pelo Dec. Lei 177/01, de 4 de Junho, sobre a viabilidade de loteamento para a propriedade sita na Quinta do Tecelão, freguesia de Trafaria, conforme localização em planta anexada.
A parcela assinalada localiza-se, de acordo com PDM de Almada, ratificado na Resolução do Conselho de Ministros nº 5/97, publicado no Diário da República I Série B de 14 de Janeiro, na Unidade Operativa 6, Pêra, m Espaço Urbanizável de Baixa Densidade Não Programado (a Sul) e Espaço de Vocação Turística Não Programado (a Norte).
A parcela insere-se em Área de Protecção de Instalações Especiais (Área de Servidão Militar).
Pelo terreno está ainda previsto, a Norte, a passagem de Infra-estruturas Ferroviárias.
Dado esta área se tratar de uma área não programada, propõe-se que a Câmara informe que não é possível realizar qualquer operação de loteamento no local, uma vez que o mesmo não se encontra servido por infra estruturas gerais capazes de suportar a operação de loteamento da parcela.
D.L. Aprovado por unanimidade.
n) Em 21.07.2005, o A. apresentou nos serviços da C.M. de Almada, requerimento de licenciamento da operação de loteamento.
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3. Direito Aplicável
Após ter observado que, nem no projecto apresentado pelo A. no âmbito do pedido de informação prévia, nem por parte do Município, que se remeteu ao silêncio até à deliberação de 6.10.04, foi apresentada qualquer proposta ou solução para a construção de infra estruturas gerais capazes de suportar a operação de loteamento, o acordão recorrido considerou ter-se formado acto tácito de deferimento. No entanto, o mesmo acordão entendeu que tal acto podia ser revogado, por ser inválido, na medida em que não se encontra preenchida a condição legalmente prevista na alínea b) do artigo 6º do Regulamento do PDM, revogação essa que o Município operou, embora implicitamente, através de tal deliberação artigo 141 nº 1 do CPA.
Quanto à circunstância de não ter sido facultado ao A. o exercício do direito de audição prévia, o mesmo acórdão conclui pela inutilidade de tal formalidade, uma vez que a decisão final não poderia ser outra senão o indeferimento. Ou seja, a informação prévia teria de ser sempre desfavorável ao A., uma vez que a viabilização do licenciamento está, por força do artigo 6º, al. b) do Regulamento do PDM condicionada à realização das infra-estruturas gerais e a construção destas nem figura no projecto submetido à apreciação do Município, nem este veio estabelecer tais condições. Assim, apesar de não ter sido facultado o exercício do direito de audição prévia, o acordão recorrido concluiu que tal irregularidade não pode importar a anulação da deliberação impugnada.
Finalmente, o acordão recorrido considerou fundamentada aquela deliberação, uma vez que da mesma constam considerandos sobre a localização do prédio para onde se encontra projectado o loteamento, caracterizando-o face ao PDM e referindo que a Norte está prevista a passagem de infra estruturas ferroviárias, e que é local de servidão militar. Concluiu-se, em suma, que por se tratar de uma área não programada, não se encontra provida das necessárias infra-estruturas gerais capazes de suportar a operação de loteamento. Trata-se de uma fundamentação perceptível que não sofre da contradição intrínseca que lhe é assacada pelo A., ora recorrente.
Foi com base nesta argumentação que o acordão recorrido decidiu não ser possível reconhecer validade ao acto tácito de deferimento e julgou a acção improcedente.
Discordando deste entendimento, o recorrente, desde logo, considera o acordão nulo, nos termos do disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 668º do Cod. Proc. Civil, visto que apesar de ter reconhecido que se formou na ordem jurídica um acto tácito de deferimento da pretensão de informação prévia favorável ao desenvolvimento de operação urbanística de loteamento da parcela dos autos, deduzida pelo recorrente perante o recorrido, acabou por decidir, face ao disposto na alínea b) do artigo 6º do Regulamento do PDM de Almada, que tal acto podia ser revogado, por ser inválido, e que foi efectivamente revogado pela deliberação impugnada. Segundo o recorrente, o acordão recorrido padece de contradição e interpretou erradamente o disposto na alínea b) do artigo 6º do PDM de Almada, não o fazendo conjugar com o disposto nos artigos 14º nº 1 e 2 e 17º nº 1 e 3 do RJUE.
Por outro lado, defende o recorrente que o acto silente de deferimento da sua pretensão é insusceptível de revogação, face aos princípios da confiança e da boa fé plasmados no art. 140º do CPA.
Finalmente, o recorrente alega que a deliberação municipal que expressamente indeferiu a pretensão apresentada em sede de informação prévia violou o disposto no art. 100º do CPA, aplicável por força do disposto no art. 122º do RJUE, tendo o tribunal "a quo" degradado a omissão do direito de audiência prévia em mera irregularidade não invalidante
O Município de Almada, por sua vez, alega que no caso vertente estamos perante um pedido de informação prévia formulado para operação de loteamento, relativamente ao qual o silêncio da Administração nunca poderá importar o deferimento tácito do pedido, mas apenas o direito a interpor processo de intimação judicial para a prática de acto legalmente devido, nos termos do artigo 111º, al. a) do Dec. Lei 555/99.
No entanto, continua o Município de Almada, a admitir-se a formação de acto tácito de deferimento, o mesmo seria nulo, em virtude de a pretensão formulada pelo recorrente violar o Plano Director Municipal de Almada.
E se fosse meramente anulável, sempre teria sido revogado pela deliberação da C.M.A. de 6.10.2004.
No tocante à audiência prévia, o Município acolhe a tese do acordão recorrido no sentido de que a informação prévia teria de ser sempre desfavorável ao recorrente, por força do disposto no artigo 6º, al. b) do Regulamento do PDM.
Quanto ao vício de forma por falta de fundamentação, o Município de Almada considera-o também inexistente, apoiando-se na argumentação constante no Acordão de 1ª instância.
É esta a questão a apreciar.
O prédio de que o A. é comproprietário encontra-se em área abrangida pelo Plano Director Municipal de Almada, situando-se no perímetro urbano.
Mais exactamente, insere-se na Unidade Operativa (UNOP) nº 6, de Pera, sendo o seu solo dividido em duas zonas, em regime de uso dominante:
A Sul é espaço urbanizável de baixa densidade; -
A Norte é espaço de vocação turística de baixa densidade. -
Em 7.04.2004, o ora recorrente requereu à Câmara Municipal de Almada informação prévia sobre operação de loteamento, nos termos do artigo 14º nº 1 do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação, aprovado pelo Dec. Lei nº 555/99, de 16 de Setembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Dec. Lei nº 177/2001, de 4 de Junho.
Por ofício nº 4677/04, de 4 de Maio de 2004, o recorrido solicitou ao recorrente “cinco colecções completas do projecto (memória descritiva e peças desenhadas, incluindo planta de localização), sendo uma em reprolar, a fim de colherem parecer junto do Governo Militar de Lisboa e REFER.
O ora recorrente promoveu a satisfação do solicitado, em 17 de Maio de 2004. -
No entanto, decorrido o prazo legal para a deliberação municipal sobre a pretensão formulada, de harmonia com o disposto nas alíneas b) e c) do nº 1 do art. 16º do RJUE, a CMA nada disse, pelo que a pretensão se deve considerar tácitamente deferida, face ao disposto nos artigos 111º e 113º do RJUE. -
Isto mesmo, ou seja, a formação de acto tácito de deferimento foi reconhecido pelo Acordão recorrido.
Sucede, porém, que tal acórdão considerou esse acto inválido, “na medida em que não se encontra preenchida a condição legalmente prevista na al. b) do artigo 6º do Regulamento do PDM”.
E foi mais longe, ao concluir que tal revogação foi operada pelo Município, ainda que implicitamente, pela deliberação de 6.10.2004.
De modo algum podemos concordar com este entendimento.
Em primeiro lugar, e como refere o Digno Magistrado do Ministério Público, é de salientar que o recorrente foi chamado a colaborar e aceitou entregar à CMA os elementos em falta, como resulta das alíneas g) e h) dos factos provados. E, quanto às informações solicitadas nos termos do nº 1 do art. 19º do RJUE, tanto o Ministério da Defesa Nacional como a REFER nada opuseram à pretensão do recorrente, pelo que é incompreensível o teor da deliberação de 06.10.2004.
Em termos extremamente sucintos, tal deliberação limita-se, práticamente, a dizer, ignorando as posições assumidas pelo Ministério da Defesa Nacional e pela REFER, o seguinte, conforme o último parágrafo:
“Dado esta área se tratar de uma area não programada, propõe-se que a Câmara informe, que não é possível realizar qualquer operação de loteamento no local, uma vez que o mesmo não se encontra servido por infra estruturas gerais capazes de suportar a operação de loteamento da parcela.
A nosso ver, não pode assim destruir-se o deferimento tácito operado. -
É notória a falta de fundamentação, apesar de o acordão agravado ter concluído, com base no disposto na alínea b) do artigo 6º do Regulamento do PDM de Almada, que a deliberação referida constitui um acto de revogação de um deferimento tácito inválido, por não ter sido respeitada a condição legal de se encontrar assegurada a construção das infra-estruturas gerais capazes de suportar a urbanização da parcela.
Efectivamente, aquele normativo define “Espaços urbanísticos não como “aqueles em que o uso do solo proposto pelo PDMA só é concretizável quando for assegurada pelos interessados na promoção urbanística da área, o cumprimento de um conjunto de condições, cuja realização não está prevista ou programada pelo município durante o prazo de vigência do PDMA. Neste caso, será a iniciativa privada a assumir por inteiro a construção das infra-estruturas gerais e locais, a sua articulação com os sistemas existentes ou programados, bem como a resolução de eventuais problemas urbanísticos existentes”.
Embora se possa concluir que o PDM de Almada exige que o uso urbanístico do solo só possa ser concretizado pelos interessados quando estes cumpram um conjunto de condições, no caso concreto não se vislumbra quais seriam essas condições, e nem sequer se mostra provado que o local em referência não esteja servido de infra-estruturas gerais capazes de suportar o loteamento da parcela dos autos.
Ora, a nosso ver não pode ser o interessado a definir ou apresentar as condições necessárias à concretização da operação. Só o Município está apto a estabelecer quais as condições que considera necessárias, ou indispensáveis, para a viabilização do empreendimento, pelo que não se pode dizer que o acto tácito de indeferimento viola o PDM de Almada.
Conclui-se, portanto, que o acordão recorrido cometeu erro de julgamento, por errada interpretação da alínea b) do art. 6º do PDM, além de que violou o regime dos arts. 14 e 17º do RJUE.
E, assim sendo, deveria o acordão recorrido ter anulado o acto de indeferimento expresso decorrente da deliberação de 6.10.2004, uma vez que o disposto no artigo 140º do CPA impede a revogação de actos válidos, expressos ou silentes, que se revelem constitutivos de direitos ou interesses legalmente protegidos.
Como se escreveu no Ac. STA de 12.11.96, P. 039098, “O acto silente formado em relação a pedido de informação prévia quanto a área não abrangida por Plano Municipal de Ordenamento do Território ou Alvará de loteamento é constitutivo de direitos, na medida em que é vinculativo” (cfr. no mesmo sentido, o Ac. STA de 12.11.96, P. nº 1499/02, citado no douto parecer do Ministério Público, no qual se decidiu que, tendo ocorrido deferimento tácito do pedido de informação prévia sobre licença de loteamento, não pode revogar-se tal deferimento com base em ilegalidade por violação de uma norma que se limita a conceder à autoridade requerida poderes discricionários quanto ao correcto ordenamento do território, poderes que o deferimento tácito pressupõe terem sido exercidos favoravelmente).
Vejamos, agora, quais as consequências da omissão de cumprimento do artigo 100º do CPA.
O Município recorrido entendeu não se tornava necessário cumprir aquela norma, uma vez que a deliberação final seria sempre desfavorável ao ora recorrente. Igual orientação seguiu o acordão do TAF de Almada, negando o direito de o interessado participar na formação de uma deliberação que veio a mostrar-se lesiva, com o pretexto de que nada poderia alterar a fundamentação produzida, dado que tal fundamentação resultava, necessariamente, do disposto na alínea b) do art. 6º do PDM de Almada.
Deste modo se afastou o princípio da participação do interessado consagrado no artigo 100º do CPA e no artigo 267º nº 4 da C.R.P.
Participação essa que, a nosso ver, era essencial.
Na verdade, não existem no processo elementos susceptíveis de possibilitar ao Tribunal "a quo" aceder à conclusão segura de que a decisão tomada era a única possível, sendo de recordar que não é necessário que previamente se encontrem definidas as eventuais condições a que se refere a alínea b) do artigo 6º.
Como justamente refere o recorrente, tais condições podem e devem ser definidas no procedimento de licenciamento e, se o recorrente tivesse tido a oportunidade de exercer o seu direito de participação poderia, designadamente, convencer o Município recorrido de que a sede própria para a definição das eventuais condições é o procedimento de licenciamento.
Procede, assim, a alegada violação do disposto no art. 100º do Cód. Proc. Administrativo.
Quanto à alegada nulidade do acordão, a fls. 216 foi proferido despacho de sustentação que a afastou, tornando-se desnecessário, em face do exposto, o seu conhecimento.
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4. Decisão:
Em face do exposto, acordam em:
- Revogar o acordão recorrido;
- Reconhecer a existência de deferimento tácito e a correspondente situação jurídica subjectiva favorável ao ora recorrente em sede de decisão do recorrido sobre pedido de licenciamento de operação urbanística no prédio dos autos;
Condenar o recorrido no reconhecimento da formação de tal acto e de tal posição, e na abstenção de praticar quaisquer actos susceptíveis de lesar o exercício do correspondente direito
Anular o acto expresso de indeferimento da pretensão do ora recorrente, proferido pela C.M. Almada em 16.10.2004
Custas pelo recorrido em ambas as instâncias, fixando a taxa de justiça em 6 UC (artigo 73ºD nº 3 do C.C. Jud.).

Lisboa, 13.12.07

as.) António de Almeida Coelho da Cunha (Relator)
Maria Cristina Gallego dos Santos
Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa