Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:667/19.6BELRA
Secção:CA
Data do Acordão:02/18/2021
Relator:LINA COSTA
Descritores:ATRASO NA JUSTIÇA
HONORÁRIOS DE ADVOGADO
CUSTAS DE PARTE.
Sumário:I – Por não terem sido alegados factos concretos demonstrativos da existência de honorários de advogado, por não estar em causa factos notórios, mas sim essenciais, que têm de ser alegados pela parte, decidiu bem o juiz a quo ao considerar que ficou por demonstrar não só o quantum, mas a própria existência do invocado dano em referência;

II – Mas mesmo que os AA./recorrente tivessem alegado e comprovado as despesas com honorários do mandatário constituído na presente acção “Na indemnização devida à parte vencedora a título de responsabilidade civil por atraso na administração da justiça não é de incluir a importância decorrente das despesas com os honorários do seu advogado que, estando sujeitas a um regime específico, só podem ser compensadas através das custas de parte nos termos previstos no Código de Processo Civil e Regulamento das Custas Processuais”.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

J..... e mulher T....., autores nos autos de acção administrativa especial instaurada contra o Estado português, inconformados vieram interpor recurso jurisdicional da sentença, de 26.10.2020, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, que julgou parcialmente procedente a acção e, em consequência, condenou o Demandado no pagamento a cada um dos AA. da quantia de €2 750,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos em virtude da duração excessiva do Proc. n.º 308/10.7TBENT, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efectivo e integral pagamento, bem como no pagamento de todas as quantias devidas a título de imposto sobre os montantes indemnizatórios ora atribuídos, absolvendo o Demandado do demais peticionado.

Na acção foi peticionado que «(…) deve a presente ação ser julgada procedente, por provada e, em consequência, deve:
1.Declarar-se que o Estado Português violou o artigo 6º, nº 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o artigo 20º, nº s 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa no seu segmento “direito a uma decisão em prazo razoável” e do artigo 2º, nº 1, do CPC;
2. Condenar-se o Estado Português a pagar aos Autores:
a) Uma indemnização por danos não patrimoniais ou morais nunca inferior a €8.000,00 para cada autor, pela duração do processo nº 308/10.7TBENT, e respectivos apensos, devendo esta quantia ser actualizada em mais € 1.000,00 por cada ano que decorra sem que esse processo termine;
b) Uma indemnização de mil e quinhentos euros por cada ano de duração do presente processo sobre a morosidade, agora instaurado, após o decurso de dois anos, até ao seu termo, também a título de danos morais.
c) Juros de mora à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento sobre as verbas em a) e b);
3.Condenar-se o Estado Português a pagar os honorários a advogado neste processo nos Tribunais Administrativos em quantia a fixar equitativamente conforme consta desta petição inicial (artigo 23º) ou a liquidar, oportunamente, fixados de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados, incluindo os honorários da liquidação de honorários ou outras.
4.E a todas as verbas atrás referidas devem acrescer quaisquer quantias que, eventualmente, sejam devidas a título de imposto que incida sobre as quantias recebidas do Estado.
5.Deve condenar-se o Estado a pagar uma sanção pecuniária compulsória de quinhentos euros por dia, por cada despacho, decisão do tribunal ou acto dos funcionários que ultrapasse os prazos legais, ou caso o processo dure mais de dois anos, incluindo liquidação de honorários.»

Nas respectivas alegações, os Recorrentes formularam as conclusões que seguidamente se reproduzem: «
1 – Nos processos contra o Estado em que esteja em causa a violação de direitos fundamentais, deve o mesmo ser condenado, além do mais, pelas despesas processuais em que o Autor incorra, na vertente que contemple o pagamento de honorários de Advogado.
2 – Tal demonstração e aferição apenas pode ser realizada após a finalização da acção judicial, porquanto a respectiva nota de liquidação só é emitida nessa fase.
3 – A existência de despesas e honorários com a constituição de mandatário judicial não carece de prova, a não ser para efeitos da sua contabilização em sede de liquidação de sentença, uma vez que a actividade advocatícia tem escopo lucrativo, sendo obrigatória a constituição de mandatário judicial, pelo que consiste num facto notório.
4 – Além de que, a liquidação das custas de parte nos termos da legislação específica não permite a cobertura de todos os prejuízos com despesas de honorários, mas apenas um valor calculado em virtude da taxa de justiça devida pelo processo e outros montantes.
5 – Quando os honorários do mandatário devem ser fixados segundo o Estatuto da Ordem dos Advogados, Lei 145/2015, de 09/09, artigo 105º.
6 – De modo que, é em sede de liquidação de sentença que deve ser fixado o montante indemnizatório a pagar a esse título, constituindo um obstáculo excessivamente oneroso a demonstração da existência dessas despesas aquando da propositura da acção, quando as mesmas apenas são determináveis após a conclusão do processo, e constituem um facto notório a partir do momento em que existe uma procuração forense!
7– A aplicação do regime das custas de parte limita arrasadoramente com a possibilidade ressarcimento das despesas com constituição de mandato forense, que no caso concreto era obrigatória.
8 - Sendo esse o valor tabelar, que serve como uma mera compensação pelos gastos com os honorários, quando numa acção cuja causa foi a violação de um direito fundamental, apurado em termos de responsabilidade civil do Estado, impõe-se o justo ressarcimentos dos danos causados, sob pena do facto dos lesados terem de suportar os honorários dos seus mandatários desmotivar e desincentivar a prossecução dos seus legítimos interesses.
9 - Se os honorários não fossem pagos dessa forma, não havia interesse em recorrer aos tribunais para contestar a morosidade dos tribunais, pois se pagava em honorários mais do que se recebia de indemnização.
10 - Esvaziando-se o conteúdo do direito constitucional e convencional do direito à justiça em prazo razoável, demovendo as vítimas de recorrer aos tribunais.
11 - Todos têm o direito constitucional de escolherem o Advogado que entendam por bem, sem prejuízo dos limites ditados pela equidade e proporcionalidade, que deverão ser atendidos aquando da fixação do valor compensatório no decurso da liquidação de sentença.
12 – A sentença sub judice, no segmento em recurso, configura também uma forma de decisão surpresa, em violação do disposto no artigo 4º, nº 3 do CPC, sendo que por todos os motivos invocados deve ser substituída por outra que defira a pretensão dos Recorrentes.
13 – Mostrando-se violados os artigos 20º CRP, 6º CEDH, 496º do Código Civil e 4º, nº 3 e 615º, 1, c) do CPC».

O Ministério Público, em representação do Estado português, apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões:
«1ª – Advogam, os recorrentes, que só após o termo da ação, em sede de liquidação da sentença, é possível determinar os honorários que são devidos ao seu advogado constituído, cujo valor deverá ser fixado segundo o art. 105º do Estatuto da Ordem dos Advogados e não com base no regime legal inerente às custas de parte, revelando-se, a sentença, como uma decisão surpresa, em violação do disposto no “art. 4º/3 do CPC”.
2ª- Tendo os AA/recorrentes pedido a condenação do Estado no pagamento de honorários a advogado em quantia não inferior a € 5.500,00 ou a fixar equitativamente, ou, subsidiariamente, a liquidar oportunamente, de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados, a Mmª Juiz, face ao disposto no art. 608º/2 do CPC, não podia deixar de emitir pronúncia, como fez, de acordo com a causa de pedir e pedido peticionados.
3ª- Se não existia qualquer dano determinado ou determinável à data da instauração da presente ação não deviam, os recorrentes, ter pedido a condenação do Estado, naqueles termos.
4ª - Não estamos, pois, perante uma decisão surpresa, porquanto a mesma comporta uma solução jurídica que os AA colocaram à apreciação e decisão do Tribunal e que tinham obrigação de prever, mau grado, porventura, ter merecido um sentido diferente do esperado por eles.
5ª – Efetivamente, não tendo sido alegado nem demonstrado a existência de qualquer dano, levou a que, por falta desse indispensável pressuposto ao direito à indemnização por responsabilidade extracontratual, o pedido principal fosse julgado improcedente e, daí, prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário, por não haver dano suscetível de liquidação.
6ª- Além de incumbir aos AA/recorrentes a iniciativa de afirmarem os factos essenciais ao direito, mormente em relação ao dano, recai sobre eles, igualmente, por força do disposto no art. 342º do Cod. Civil, o ónus de fazerem a prova desses factos constitutivos do direito, não existindo qualquer presunção legal ou natural nesse particular, e não constituindo óbice, para tanto, o facto de não serem conhecidos os danos na sua plenitude. É assim que dita a lei nacional.
7ª- Por outro lado, segundo a sentença recorrida, uma tal indemnização, a título de honorários, só seria de arbitrar, caso o respetivo montante fosse superior às despesas ressarcidas através da aplicação da legislação de custas, condição, essa, que ficou por demonstrar.
8ª – Entendeu, assim, a Mmª Juiz, que estando essas despesas sujeitas a um regime específico, só podem ser compensadas através das custas de parte nos termos previstos no CPC e no RCP.
9ª – Nesse particular, limitou-se a apadrinhar o entendimento da jurisprudência firmado após o Ac. do STA de 5/3/2020 (Pº 0284/17.5BELSB), com julgamento ampliado, in www.dgsi.pt, no sentido de que:
Na indemnização devida à parte vencedora a título de responsabilidade civil por atraso na administração da justiça não é de incluir a importância decorrente das despesas com os honorários do seu advogado que, estando sujeitas a um regime específico, só podem ser compensadas através das custas de parte nos ter-mos previstos no Código de Processo Civil e Regulamento das Custas Processuais”.
10ª- Ademais, tendo os AA. decaído na Ação, na percentagem de 65%, como é bem de ver, contribuíram para a produção de despesas desnecessárias violadoras do ónus do lesado de não contribuir para a produção ou agravamento dos danos (art. 570º/1 do Cod. Civil) o que determina uma redução ou, inclusivamente, uma exclusão da indemnização.
11ª-Donde, nenhuma censura merece, a nosso ver, a sentença recorrida, cujo teor, por isso, deverá ser mantido na íntegra.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer.

Sem vistos dos Exmos. Juízes-Adjuntos (mas com envio prévio a estes do projecto de acórdão), o processo vem à Conferência para julgamento.

As questões suscitadas pelos Recorrentes, delimitadas pelas alegações dos recursos e respectivas conclusões, nos termos do disposto no nº 4 do artigo 635º e nos nºs 1 a 3 do artigo 639º, do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA, consistem, no essencial, em saber se a sentença recorrida errou ao não condenar no pagamento de honorários de Advogado, constituindo uma decisão surpresa, violadora do disposto nos artigos 20º CRP, 6º CEDH, 496º do Código Civil e 4º, nº 3 e 615º, 1, c) do CPC.

A matéria de facto pertinente, que não foi impugnada pelos Recorrentes, é a constante da sentença recorrida e que se dá aqui por reproduzida, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 6 do artigo 663º do CPC ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA.

Na sentença recorrida a decisão de absolver o Estado do pedido de condenação no pagamento de honorários de advogado foi suportada na seguinte fundamentação de direito:
«Peticionam ainda os Autores a condenação do Estado Português a pagar “os honorários a advogado neste processo (…) em quantia a fixar equitativamente conforme consta desta petição inicial (artigo 23.º) ou a liquidar, oportunamente, fixados de acordo com o Estatuto da Ordem dos Advogados, incluindo os honorários da liquidação de honorários ou outras” (cf. ponto 3 do pedido).
Por sua vez, no artigo 176.º da petição inicial os Autores invocam o seguinte:
Segundo a jurisprudência do TEDH, o Estado Português deve ainda pagar os honorários correntes e condignos que, conforme o trabalho, não devem ser inferiores a 5.500,00€ (cinco mil e quinhentos euros) se o processo acabar na 1ª instância e daí para cima se houver recursos, mas que neste momento não se podem liquidar por não se saber o desfecho do processo (…)”.
Na realidade, como referem os Autores, abundante jurisprudência tem versado o tema do ressarcimento destas despesas e afirmado como dano indemnizável as despesas judiciais e os honorários de advogado (e isto não obstante a existência de regime legal expressamente vocacionado para o ressarcimento destas despesas, como é o das custas de parte).
É exemplo claro desta jurisprudência o acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 15.09.2017 (Proc. 00260/05.0BEPRT-A, disponível em www.dgsi.pt), em que se sumariou:
I-Desde que adequadas e necessárias para eliminar da ordem jurídica a actuação ilícita da Administração, geradora do dever de indemnizar, as despesas judiciais e os honorários do advogado são danos indemnizáveis, podendo o seu quantum ser relegado para execução de sentença. (…)
III-As custas compreendem a taxa de justiça e os encargos em que se inclui o reembolso à parte vencedora, a título de custas de parte e procuradoria;
III.1-a função tradicional desta é de indemnização à parte vencedora pelas despesas com o patrocínio judicial;
III.2-todavia, sem se deixar de reconhecer que a procuradoria também cumpre a indicada função, não é forçoso tirar daí a conclusão de que o vencedor da acção não possa peticionar o montante despendido com o patrocínio judicial quando este é superior, desde que tenha de recorrer a tribunal para obter o que lhe é devido ou erradicar os efeitos lesivos da sua esfera jurídica provocados por acção ou omissão do vencido;
O entendimento jurisprudencial dominante é, pois, o de que as despesas em que a parte incorra para ver satisfeita pretensão associada ou decorrente de actuação ilegal da administração constituem dano indemnizável.
Todavia, assente que a ressarcibilidade de um determinado dano supõe a demonstração da sua ocorrência, no caso em apreço não se apurou nos autos a existência de quaisquer despesas, o que significa que não fica apenas por demonstrar o respectivo quantum, mas a própria existência dos danos alegados.
Com efeito, os Autores peticionam o pagamento dos honorários devidos a advogado, entendido como despesa em que incorreram por causa da presente lide. Todavia, não evidenciam (nem sequer alegam discriminadamente, limitando-se a alegar que deverão ser ressarcidos dos custos com honorários de advogado) que tenham despendido com advogado quaisquer quantias, não especificando quaisquer despesas, sequer aquelas que ocorreram já por virtude da instauração da presente acção.
Ora, é impossível relegar para momento posterior a quantificação de um dano cuja existência não se chegou a demonstrar. É o que tem entendido jurisprudência consolidada, de que é paradigmático o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23.01.2007 (Proc. 06A4001, disponível em www.dgsi.pt):
Mesmo que o autor tenha feito um pedido específico (não genérico), a sua quantificação poderá ser relegada para liquidação em execução de sentença, caso não se tenha apurado o montante na acção, desde que nesta se tenha comprovado a existência de danos” (realce nosso).
O mesmo entendimento tem sido firmado pelo Supremo Tribunal Administrativo, que em acórdão de 20.06.2012 (Proc. 0266/11, disponível em www.dgsi.pt) deixou assente que “a prova que em sede de execução de sentença é permitida, nos termos do artº 661, nº 2 do CPC, não é uma prova sobre a existência do direito, no caso, da existência do requisito dano, na vertente, lucros cessantes, mas sim sobre o seu quantum” - realce nosso.
Na linha desta jurisprudência, constata-se que caberia aos Autores, desde logo, comprovarem a existência de despesas relativas a honorários associados a este processo judicial. O que manifestamente não fizeram, não as tendo sequer alegado concretamente.
Em segunda linha, à vista das possibilidades oferecidas pelo regime legal das custas de parte, e à luz da jurisprudência que vem de se citar, seria ainda relevante evidenciar em que medida o regime legal da procuradoria não oferecera resposta às despesas assumidas com o patrocínio judicial para erradicação dos efeitos lesivos provocados pela actuação administrativa.
Nesta linha, também, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo referida no acórdão do TCA Norte, já citado, proferido no âmbito do proc. n.º 00064/10.9BELSB, em 12.10.2012, se refere à necessidade de comprovação da superioridade das despesas concernentes a honorários de advogado relativamente às despesas ressarcidas através da aplicação da legislação de custas.
Nada se dizendo ou evidenciando nos autos a este respeito, conclui-se que a pretensão dos Autores se revela, por conseguinte, insubsistente, devendo improceder a sua pretensão também nesta parte.» [sublinhados nossos].

Da última das conclusões do recurso resulta que a sentença recorrida, na parte em que absolveu o Demandado/recorrido do pedido de condenação no pagamento de honorários de advogado, viola, designadamente, o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC.
Estatui a referida norma que é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
A enunciada contradição entre os fundamentos e a decisão é de natureza lógica «(…) como referia J. Lebre de Freitas, que entre “os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja juridicamente correta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial” [in: “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 2.º, pág. 670] (v. acórdão do STA, de 28.4.2016, proc. 0978/15, in www.dgsi.pt).
A obscuridade resulta de a sentença conter algum passo cujo sentido seja ininteligível, por não se perceber o que o juiz quis dizer (v. o mesmo acórdão).
A ambiguidade ocorre quando alguma passagem da sentença se preste a interpretações diferentes e mesmo opostas, em que não se sabe ao certo qual o pensamento do juiz (idem).
De qualquer modo só ocorre nulidade da sentença recorrida se resultar prejudicada a compreensão da decisão nela contida.

Para além da referência indicada nas conclusões, das alegações de recurso apenas consta [sem especificar se com o propósito de arguir uma nulidade da sentença ou um erro de julgamento] que, tendo o juiz a quo considerado que “O entendimento jurisprudencial dominante é, pois, o de que as despesas em que a parte incorra para ver satisfeita pretensão associada ou decorrente de atuação ilegal da administração constituem dano indemnizável”, contrariamente a esse entendimento, contudo, determinou queno caso em apreço não se apurou nos autos a existência de quaisquer despesas, o que significa que não fica apenas por demonstrar o respectivo quantum, mas a própria existência dos danos alegados.”.
Para logo de seguida alegarem que Com o devido respeito, os Recorrentes não concordam com tal aceção, porquanto o quantum indemnizatório referente aos honorários advocatórios apenas se pode determinar no final da acção.”.
A saber, inexiste qualquer contradição lógica, nos termos indicados, entre a afirmação genérica sobre o entendimento da jurisprudência dominante na matéria, com a que resulta da apreciação pelo juiz a quo do caso concreto, concluindo não haver evidência da existência de qualquer despesa que, de acordo com aquele entendimento jurisprudencial, pudesse ser considerada como dano indemnizável.
A argumentação expendida na sentença recorrida, podendo eventualmente consubstanciar um erro de julgamento, permitiu aos Recorrentes apreender o respectivo sentido e dela interpor recurso, invocando as razões em que suportam a sua discordância da mesma.
Em face do que, se era intenção dos Recorrentes imputar uma nulidade à sentença, a mesma não se verifica.

Alegam os Recorrentes que, para além da contradição com o que resulta da jurisprudência dominante invocada, a decisão proferida configura uma decisão surpresa, violando o disposto no nº 3 do artigo 3º do CPC (e não do “artigo 4º”, como certamente por lapso, vem referido no recurso), porquanto no momento da instauração da acção não dispunham dos elementos necessários a indicar um quantum referente aos honorários do advogado, podendo a respectiva nota de liquidação ocorrer apenas após a conclusão do processo, essas despesas constituem, no entanto, um dado lógico e notório que não carece de prova especial, bastando a sua invocação, por referente a uma profissão remunerada, para que o tribunal, tendo em conta a jurisprudência do TEDH e julgando procedente, mesmo que parcialmente, a acção, condene o réu no pagamento desses gastos a liquidar em execução de sentença, mas se o juiz a quo considerou que havia uma notória falta de fundamentação, ao abrigo do dever de gestão processual, devia ter convidado a parte a pronunciar-se sobre esta pretensão. E que a liquidação das custas de parte nos termos da legislação específica não permite a cobertura de todos os prejuízos com despesas de honorários, mas apenas um valor calculado em virtude da taxa de justiça devida pelo processo e outros montantes, o que limita arrasadoramente a possibilidade ressarcimento das despesas com constituição de mandato forense, que no caso concreto é obrigatória, que todos têm o direito constitucional a escolher o advogado que entendam por bem, sem prejuízo dos limites ditados pela equidade e proporcionalidade, que deverão ser atendidos aquando da fixação do valor compensatório no decurso da liquidação de sentença.

A presente acção é de responsabilidade civil extracontratual do Estado por facto ilícito, consistente no atraso na prolação de decisão judicial em prazo razoável, regulada pelo correspondente regime legal, aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, que no nº 1 do artigo 7º estatui: O Estado e as demais pessoas colectivas de direito público são exclusivamente responsáveis pelos danos que resultem de acções ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício.[sublinhados nossos].
Assim, a decisão recorrida de absolver o Estado Português do pedido de condenação a pagar aos AA./recorrentes indemnização pelo dano de honorários de advogado, por não provado, assenta no pressuposto de que constitui ónus da parte que se arroga do direito a ser indemnizada por causa de actuação ilícita da Administração, a alegação e prova dos factos essenciais da causa de pedir e pedidos, mormente, da existência dos alegados danos de honorários de advogado, com vista a dar por preenchidos os correspondentes requisitos legais, não podendo aquela limitar-se a pedir uma indemnização pelos mesmos [v. também a alínea f) do nº 2 do artigo 78º do CPTA, o nº 1 do artigo 5º do CPC e o nº 1 do artigo 342º do CC].
E, lida a petição inicial (p.i.), constata-se que, efectivamente, os AA./recorrentes apenas alegaram que segundo a Jurisprudência do TEDH o Estado deve pagar-lhes os honorários correntes e condignos, em valor não inferior a €5 500,00, se o processo acabar em 1ª instância, e daí para cima se houver recursos, que neste momento não se podem liquidar por não se saber o desfecho do processo, constando dos exemplos dos acórdãos do TEDH que reproduzem que “As despesas nos tribunais nacionais são reembolsáveis se corresponderem a uma necessidade de corrigir, reparar, reformar ou prevenir o problema que o TEDH julgou constituir uma violação da Convenção e desde que se mostrem razoáveis ou efectivamente gastas”.
O mesmo é dizer que apesar de invocarem jurisprudência do TEDH que condiciona o direito ao ressarcimento do dano patrimonial, designadamente, ao efectivo pagamento de valores a título de honorários de advogado, desde que correntes, condignos e razoáveis, os AA./recorrentes não alegaram quaisquer factos referentes a despesas que tenham pago a esse título ao mandatário que constituíram para a presente acção.
Em sede de recurso os Recorrentes acrescentam que só com a nota de honorários, a emitir após o termo do processo [confirmando tratar-se do desta acção e não do daquela em que ocorreu o atraso na justiça], serão quantificadas tais despesas o que tem implícito que só então terão que efectuar o seu pagamento, ou dito de outro modo, só então ocorrerá o invocado dano.
No mesmo sentido que o decidido na sentença recorrida, entendeu o STA, no acórdão prolatado no âmbito de uma acção de responsabilidade civil por atraso na justiça, de 13.3.2019, proc. 0437/12.2BEALM 0693/18, in www.dgsi.pt, e de cuja fundamentação se extrai:
“(…) apenas se limitou a alegar, na sua PI, de forma conclusiva que o atraso em causa, determinou que a A. prolongasse a contratação e a necessidade de serviços jurídicos e de advogado que a patrocinou nos processos judiciais, reclamando ser de fixar equitativamente, atendendo o total de processos e o número de anos, um valor de honorários não inferior a € 20.000,00 (arts. 187º e 188º da PI).
Quanto aos honorários devidos, pela presente AAC, na medida em que, não está finda e, como alegou a A., ainda não procedeu a qualquer pagamento.
Mas, neste caso os honorários não constituem um dano indemnizável, só podendo ser considerados no âmbito das custas de parte, nos termos dos arts. 25º, nº 2, al. d) e 26º, nº 3, al. c) do Regulamento das Custas Processuais (RCP), a elas tendo direito a parte vencedora, na medida do seu vencimento (cfr. arts. 527, nºs 1 e 2 e 533º do CPC), tal como alega o Recorrente Estado. // (…)» [sublinhados nossos].
Também este TCA, no acórdão de 17.12.2020, proc. 244/14.8BERLA, idem, expendeu, em situação idêntica, a seguinte argumentação:
«Do mesmo modo no respeitante ao pagamento dos honorários com o advogado, estando em causa um peticionado dano patrimonial não concretizado.
Não se põe em causa que honorários do advogado constituem um dano indemnizável, tal como decidido pela jurisprudência – entre outros, o Acórdão do TCAN de 12/10/2012, Proc. n.º 64/10.9BELSB e a jurisprudência do STA nele indicada, como o Acórdão do STA, de 04/03/2009, Proc. n.º 0754/08.
No entanto, há a distinguir se está em causa o ressarcimento de uma despesa imputável à delonga processual ou uma despesa com o processo de responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso da justiça.
No primeiro caso, os honorários de advogado apenas são suscetíveis de consubstanciar um dano indemnizável quando o seu valor aumente devido à delonga do processo judicial e na medida desse prolongamento excessivo, que carece de ser alegado e provado.
No segundo caso, os honorários não constituem um dano indemnizável, apenas podendo ser considerados no âmbito das custas de parte, nos termos dos artigos 25.º, n.º 2, al. d) e 26.º, n.º 3, al. c) do Regulamento das Custas Processuais (RCP).
O Autor peticiona o pagamento dos honorários neste segundo caso, como uma despesa com o presente processo de responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso da justiça, mas mais uma vez nada concretiza. // (…).» [idem].
E no acórdão, de 27.2.2020, proc. 1041/16.1BERLA, de que consta:
“(…), a verdade, aliás frequentemente esquecida - apesar (1º) dos artigos 5º, 410º ss e 607º/3/4 do Código de Processo Civil e (2º) de estarmos ante dano patrimonial -, é que a p.i. e a sentença não contêm qualquer factualidade integrável num dano “despesas com mandatário judicial”, factualidade que, sublinhamos, não é notória no sentido jurídico-processual de facto notório.
Como tal, ainda que pudesse ser uma despesa a quantificar em liquidação de sentença, é uma despesa que tinha de ser alegada (artigo 5º do Código de Processo Civil: ónus de alegação dos factos essenciais) e de ficar provada nos autos.
Não foi, porém, o que aqui aconteceu.
Sublinhemos que a presunção de onerosidade do mandato prevista no artigo 1158º do Código Civil não vale contra terceiros a essa relação jurídica de mandato. Obviamente.
Pelo que a sentença, além de não violar o artigo 3º/3 do Código de Processo Civil, decidiu corretamente, de acordo com os artigos 5º e 410º ss do Código de Processo Civil. // (…)» [ibidem].

Em face do que, por não terem sido alegados factos concretos demonstrativos do dano de honorários de advogado, por não estar em causa factos notórios mas sim essenciais, que têm de ser alegados pela parte e a sua falta não configurar mera irregularidade que possa ser objecto de despacho de aperfeiçoamento, entendemos como acertado o vertido na sentença recorrida de que ficou por demonstrar não só o quantum, mas a própria existência do dano em referência, não constituindo a mesma uma decisão surpresa.

Apesar do que entendemos ser de acrescentar algumas notas sobre as alegadas contradição entre a invocação da jurisprudência dominante e a não relegação da indemnização para liquidação da sentença e a insuficiência do sistema de custas de parte para ressarcir o invocado dano.

O juiz a quo começa por referir que a jurisprudência dominante considera que os honorários do advogado constituem dano indemnizável, mas logo depois argumenta que o dano só será indemnizável se ocorrer a demonstração de que [esse dano] existe. O que não sucedeu nos autos. Motivo porque não pode ser relegada para momento posterior a quantificação de um dano cuja existência os AA. não lograram demonstrar.
É certo que ao abrigo da referida jurisprudência dominante foram proferidos acórdãos como, a título de mero exemplo, o deste TCA, de 4.4.2019, no proc. nº 1045/16.4BEALM in www.dgsi.pt, que entendeu que, em acções em que o mandato judicial é obrigatório [como é o caso da presente] a falta de alegação de concretas despesas em que a parte tenha incorrido a título de honorários de advogado não obsta a que se considere provado o dano [porque a aí autora/recorrente incorreu ou vai incorrer em despesas com advogado] e a sua quantificação deva ser relegada para execução de sentença.
Mas a mencionada jurisprudência dos tribunais administrativos ainda que dominante, não é unânime e tem vindo a ser posta em causa designadamente por aquela que, pelo contrário, considera que as despesas com honorários de advogado não consubstanciam danos indemnizáveis ao abrigo do instituto da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito.
Significando que a mera referência à jurisprudência que entende que o dano de honorários de advogado é indemnizável não implica que, na apreciação do caso concreto, tenha de ser proferida decisão condenatória, não ocorrendo, assim, a referida contradição.

Sobre o regime de custas de parte e da sua aptidão ou suficiência para ressarcir das despesas efectuadas com advogado a parte reagiu contenciosamente contra a actuação ilícita da Administração, pronunciou-se também o STA, designadamente, no acórdão de 5.3.2020, proc. 0284/17.5BELSB, prolatado pela 1ª Secção em formação alargada, com o sumário: «Na indemnização devida à parte vencedora a título de responsabilidade civil por atraso na administração da justiça não é de incluir a importância decorrente das despesas com os honorários do seu advogado que, estando sujeitas a um regime específico, só podem ser compensadas através das custas de parte nos termos previstos no Código de Processo Civil e Regulamento das Custas Processuais.»: in www.dgsi.pt, e de cuja fundamentação de direito se extrai o seguinte:
«(…)
A questão que se coloca é, assim, a de saber se na indemnização devida ao A. a título de responsabilidade civil pela prática de facto ilícito se podem incluir as despesas relativas aos honorários do seu mandatário judicial que moveu e acompanhou a acção.
Tem sido jurisprudência uniforme do STJ desde o Assento de 28/3/1930 (in DG, II Série, de 28/3/1930) que, salvo nos casos de litigância de má-fé e de demanda quando a obrigação ainda não era exigível, as despesas realizadas com o processo, incluindo o pagamento de honorários do mandatário judicial da parte vencedora, apenas podem ser compensadas a título de custas de parte, nos termos previstos no actual RCP e CPC (cf. v.g. os Acs. de 15/6/93 in BMJ 428-530, de 3/12/98 – Proc. n.º 1136/98, de 15/3/2007 – Proc. n.º 07B220, de 23/9/2008 – Proc. n.º 08A2109, de 2/7/2009 – Proc. n.º 5262/05.4TVLSB.S1 e de 15/1/2019 – Proc. n.º 5792/15.0TBALM.L1.S2).
(…).
Na presente revista, como vimos, o que importa averiguar é se, em face do que dispõem o CPC/2013 e o RCP, é de entender que o A., na acção para efectivação de responsabilidade extracontratual que venceu parcialmente, tem o direito de ser ressarcido do que despendeu com os honorários do seu mandatário judicial.
Vejamos então.
Resulta do art.º 527.º, nºs. 1 e 2, do CPC, que a regra geral da responsabilidade pelo pagamento das custas assenta no princípio da causalidade, considerando-se que dá causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for.
É, assim, irrelevante para essa responsabilização a questão de saber qual foi a parte culpada da ocorrência do litígio que determinou a intervenção do tribunal.
Abrangendo as custas processuais as custas de parte (art.º 529.º, n.º 1, do CPC e 3.º, n.º 1, do RCP) – as quais, devendo ser objecto de nota discriminativa e justificativa (art.º 533.º, n.º 3, do CPC), apresentada nos termos do art.º 25.º, do RCP, compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária nos termos do RCP (n.º 4 do referido art.º 529.º) –, também estas devem ser suportadas pela parte vencida na proporção do seu decaimento (n.º 1 do citado art.º 533.º).
Nestas custas de parte incluem-se as quantias pagas a título de honorários do mandatário judicial, salvo quando elas sejam superiores ao valor indicado na al. c) do n.º 3 do art.º 26.º do RCP, ou seja, 50% do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora [art.º 533.º, n.º 2, al. d), do CPC e artºs. 25.º, n.º 2, al. d) e 26.º, nºs. 3, al. c) e 5, ambos do RCP].
Atento à limitação estabelecida, não há dúvidas que a intenção do legislador – aliás, já expressa no n.º 2, al. g) da Lei n.º 26/2007, de 23/7 (lei de autorização legislativa) – não foi a de ressarcir a parte vencedora da totalidade dos honorários do seu mandatário judicial, mas a de lhe fixar uma compensação que, em face do valor da acção e das taxas de justiça suportadas pelas partes, considerou ser no montante adequado.
Essa compensação, porém, ao contrário do que sucedia quando integrada na procuradoria, é sempre devida, por a isenção de custas processuais não a abranger (art.º 4.º, n.º 7, do RCP).
Assim, na actual legislação processual civil e sobre custas, o legislador limitou a enorme discrepância que existia entre o montante das despesas efectivamente suportadas com a demanda pela parte vencedora e as quantias que esta tinha direito a receber através da imputação dos custos dela à contraparte, mas não foi ao ponto de consagrar o princípio da justiça gratuita para o vencedor ou uma solução equiparada à prevista em matéria de responsabilidade civil no art.º 562.º, do C.Cv. estabelecendo que a parte com razão tinha o direito de ser ressarcida nos precisos termos dos prejuízos sofridos.
Portanto, de acordo com o nosso sistema de custas judiciais, “a compensação em análise configura-se como indemnização baseada em responsabilidade processual civil tendente a compensar a parte vencedora, na respectiva proporção, das despesas com honorários de advogado” (Salvador da Costa in “Código das Custas Judiciais Anotado e Comentado”, 2.ª edição-2009, pág. 331), não estando o seu montante dependente da transposição de normas e princípios consagrados pelo direito substantivo de forma a que constitua um efectivo ressarcimento das despesas realizadas por essa parte.
Mas, poderão as despesas com os honorários do mandatário judicial da parte vencedora no montante em que excedem as custas de parte a que ela tem direito ser consideradas um prejuízo de natureza substantiva indemnizável a título de responsabilidade civil extracontratual pela prática de facto ilícito, segundo as regras da teoria da diferença consagrada no art.º 566.º, n.º 2, do C.Cv.?
Entendemos que não.
Efectivamente, a compensação do dano resultante do pagamento por uma das parte dos honorários do seu advogado só está legalmente prevista a título de custas de parte e nas situações de litigância de má fé (art.º 543.º, do CPC) e de demanda quando a obrigação ainda não é exigível (art.º 610.º, n.º 3, do CPC). No contexto da tributação processual, essa compensação obedece, como vimos, a um regime específico que não se confunde com o da responsabilidade civil, não lhe sendo, designadamente, aplicável o disposto nos artºs. 564.º, n.º 1 e 566.º, n.º 2, ambos do C.Civ. Fora deste contexto, a previsão legal cinge-se às referidas situações excepcionais de litigância de má fé e de inexigibilidade da obrigação.
Assim, na esteira da atrás referida jurisprudência do STJ, entendemos que do sistema legal vigenteem princípio coerente e obedecendo a um pensamento unitárioresulta que é através da compensação devida a título de custas de parte que são reembolsadas as despesas realizadas pela parte vencedora com o mandato judicial e quando o legislador pretendeu que essas despesas fossem integralmente ressarcidas indicou expressamente as situações em que tal ocorria e a parte sobre que impendia a obrigação.
Nestes termos, prevendo a lei, especificamente, a sua compensação através das custas de parte, não podem os aludidos honorários ser considerados danos causados por acto ilícito e não se verificando nenhuma das referidas situações excepcionais, tal compensação só pode ser obtida ao abrigo do regime das custas de parte.
E admitir que as despesas em questão na parte em que excediam o montante atribuído a título de custas de parte podiam ser ressarcidas na sua totalidade corresponderia a permitir-se uma condenação em custas de parte em violação da lei, não só porque se desrespeitava a aludida limitação, mas também porque, no caso de procedência parcial da acção – como ocorre na situação em apreço – não se tomava em consideração a proporção do decaimento.
Refira-se, finalmente, que as razões que a corrente jurisprudencial maioritária adoptada por este STA retirou do ínfimo valor da procuradoria que era atribuída à parte vencedora para ressarcimento das despesas com o seu advogado e da isenção de custas (e, consequentemente, da procuradoria) das entidades administrativas não têm hoje validade, dado estas terem deixado de beneficiar de tal isenção e, como vimos, aquelas despesas estarem integradas nas custas de parte que não são afectadas pela eventual isenção de que beneficie a parte vencida (cf. art.º 4.º, n.º 7, do RCP).
Portanto, entendendo-se que, na indemnização devida à parte vencedora a título de responsabilidade civil não é de incluir a importância decorrente das despesas com os honorários do seu advogado que, estando sujeitas a um regime específico, só podem ser compensadas através das custas de parte nos termos previstos no Código de Processo Civil e Regulamento das Custas Processuais, terá de proceder a presente revista.» [sublinhados e negritos nossos].

Assim, concordando com a assunção de que, nos termos invocados neste douto acórdão [reiterado nos acórdãos do STA, de 24.9.2020, proc. nº 02504/08.8BEPRT e de 29.10.2020, proc. nº 02584/09.2BELSB, e nos deste TCA, de 26.11.2020, proc. 524/17.8BELSB e de 17.12.2020, proc. 244/14.8BERLA, in www.dgsi.pt], aos quais aderimos, não se mantêm válidas as razões em que a referida jurisprudência administrativa dominante se tem vindo a suportar, também neste aspecto não assiste razão aos Recorrentes.

Donde, não implicando a constituição obrigatória de mandatário que os honorários do advogado configurem, em abstracto, um dano indemnizável, nem tendo os AA./recorrentes alegado e demonstrado a existência de despesas com o mandatário constituído, os pagamentos em que irão incorrer a título de honorários ser-lhe-ão reembolsadas de acordo com as regras das custas de parte, nos termos previstos no RCP, atendendo ao respectivo decaimento na acção, que foi fixado em 1ª instância em 65%.

Não procedendo os fundamentos do recurso, são os Recorrentes responsáveis pelas custas, na vertente de custas de parte [e, consequentemente, pelo pagamento das despesas de honorários do mandatário constituído].

Por tudo quanto vem exposto acordam os Juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida na ordem jurídica.

Custas pelos Recorrentes, sem prejuízo do apoio judiciário.

Registe e Notifique.

Lisboa, 18 de Fevereiro de 2021.

(Lina Costa – relatora que consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Carlos Araújo e Ana Paula Martins).