Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1858/12.6 BELRS |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 06/22/2023 |
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Relator: | CATARINA ALMEIDA E SOUSA |
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Descritores: | OPOSIÇÃO FUNDAMENTAÇÃO DO DESPACHO DE REVERSÃO |
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Sumário: | I - A responsabilidade subsidiária efetiva-se por reversão do processo de execução fiscal (n.º 1 do art. 23.º da LGT); o despacho de reversão, sendo um ato administrativo tributário, está sujeito a fundamentação.
II - No caso concreto, o projeto de reversão (para o qual remete, em toda a linha, o despacho de reversão) não esclarece minimamente (pelo contrário, mostra-se até contraditório e confuso) ao abrigo de que preceito legal operou a reversão. III - Será de fazer equivaler à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam a concreta motivação do ato. |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I - RELATÓRIO P ………………, dizendo-se inconformado com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a oposição por si deduzida contra o processo de execução fiscal nº ……………485 e apensos, instaurado pelo Serviço de Finanças de Mafra, para cobrança de dívidas de IRC do exercício de 2010, de IRS (retenções na fonte) e Imposto do Selo, referente ao mês de Agosto de 2011, e coima fiscal decorrente de falta de entrega de imposto retido na fonte do mês de Abril de 2011, tudo no montante total de €12.981,23, processo que tinha como devedora originária a sociedade P………………, S.A., dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: «a) O presente recurso vem interposto da sentença proferida em 07 de Abril de 2020, a qual decidiu pela total improcedência da Oposição à Reversão deduzida pelo Recorrente. b) Nos termos do n°3 do artigo 268º da Constituição da República Portuguesa "Os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afeiem direitos ou interesses legalmente protegidos." c) Por sua vez o n°1 do artigo 77° da LGT, com a epígrafe "Fundamentação e eficácia" dispõe que "A decisão do procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório de fiscalização tributária." d) O despacho de reversão tem a natureza de acto administrativo (cfr. artigo 120° do Código de Procedimento Administrativo), pelo que são de considerar em relação a ele as exigências legais próprias deste tipo de actos, designadamente, no que concerne à fundamentação (cfr. artigos 268°, n°3, da Constituição da República Portuguesa, e 77° da Lei Geral Tributária). e) E sendo pressupostos da responsabilidade subsidiária (artigos 23°, n°4 e 24°, n°1, da LGT) o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou da respectiva entrega (artigo 24°, n°1 da LGT), bem como a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (artigo 23°, n°2 da LGT; artigo 153°, n°2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário - CPPT), então, o despacho de reversão, enquanto acto administrativo tributário, deve, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (n°1 do artigo 77º da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração daqueles pressupostos e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária (artigo 23°, n° 4 da LGT). f) No que se refere à fundamentação do ato de reversão, prevê o n°4 do artigo 23.° da LGT que a reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação. g) No caso aqui em sindicância, a citação enviada ao Oponente/Recorrente refere que a fundamentação da reversão consta do Projeto de Reversão e do Despacho de Reversão (cfr. supra, ponto l dos factos provados). h) Nem do conteúdo da citação, nem do despacho de reversão, nem sequer do projeto de reversão, resulta os pressupostos que determinaram a reversão contra o ora Oponente/Recorrente. i) No projeto de reversão, apenas consta a menção à insuficiência dos bens da sociedade devedora originária, não sendo feita qualquer referência à gerência, de direito e de facto. j) De igual modo, não é possível perceber os termos em foi efetuada a reversão, se nos termos da alínea a) do n°1 do artigo 24° da LGT ou da alínea b) do mesmo. k) É inclusive referenciado no projeto de reversão que, nos termos da alínea a) do n°1 do artigo 24° da LGT, não dispondo o Serviço de Finanças de elementos que permitam concretizar a prova da culpa, não é possível efetivar a responsabilidade latente, (vide fls. 39 dos autos). l) Do mesmo modo, e apesar da menção à alínea a) do n°1 do art°24° da LGT, é logo em seguida referido que o Oponente/Recorrente é responsável nos termos da alínea b) do n°1 do mesmo artigo, (vide fls. 39 dos autos). m) Conclui-se, assim, que, quer no projeto de reversão, quer no despacho de reversão, não é efetuada qualquer referência à verificação dos pressupostos da reversão no caso em concreto, limitando-se à exposição abstracta e até contraditória das possibilidades legais de reversão. n) Daí não se corroborar a decisão recorrida, salvo melhor opinião, quando refere que "Resultando provado que o despacho de reversão em apreço, refere como fundamentos da reversão, os constantes do Projecto de Reversão que o antecedeu, o qual por sua vez se alicerçou em informação igualmente constante do PEF, resta concluir que o mesmo reúne fundamentação formal bastante e suficiente". o) Do despacho referido e do projeto de reversão apenas se extrai que a reversão operou pelo simples facto de a sociedade não ter bens penhoráveis e o Oponente/Recorrente ser responsável o gerente de direito da devedora originária, o que, per si, é manifestamente insuficiente. p) A gerência de direito, só por si, não permite que daí se extraia a presunção da gerência de facto. q) Ao despacho de reversão falta, pois, fundamentação válida e congruente e, designadamente, matéria que deveria integrar factos da administração do Oponente/Recorrente e da sua culpa na insuficiência patrimonial, sendo a reversão operada nos termos da alínea a) do n°1 do artigo 24° da LGT. r) A falta de fundamentação da decisão de reversão, não permitindo ao Oponente/Recorrente conhecer as concretas circunstâncias, de facto e de direito, que determinaram a sua citação como revertido, no âmbito dos processos de execução fiscal em causa, determina a anulação do despacho proferido. s) Devendo ser revogada a sentença recorrida por erro de julgamento. t) Na sua petição inicial de Oposição, alegou o Oponente/Recorrente que a presente reversão jamais poderia ter operado, porquanto, aquando da reversão, existiam bens suficientes na esfera patrimonial da devedora originária, para a liquidação da quantia exequenda. u) A sentença recorrida deu como provado que "Na declaração periódica de IVA submetida pela devedora originária relativa ao período 2011/12 foi inscrito no campo 96-"excesso a reportar" o montante de €44.466,68. (Vide f acto dado como provado em M)). v) O Tribunal a quo ignorou por completo os doc. números 2 (IES) e 3 (relação de imobilizado) junto aos autos pelo Oponente através do requerimento datado de 15 de Maio de 2015, de onde resulta que à data da declaração da insolvência da executada, devedora originária, esta era titular de imobilizado no valor de mais de 200 mil euros e de outros activos (vide doc. 2 e 3 juntos aos autos com o requerimento de 15 de Maio de 2015) e de um crédito de IVA superior à divida dos autos, que permanecia no acervo patrimonial da devedora originária, (matéria que resulta provada na sentença recorrida). w) Da leitura do despacho de reversão junto aos autos, nem uma palavra quanto às diligências concretas levadas a cabo pela AT no sentido de averiguar da existência ou não de bens na titularidade da devedora originária, tendo a AT limitado a afirmar que "não havendo bens da devedora originária, ora executada, que respondam pelo pagamento da divida, estão pois verificadas as condições previstas nos termos do n°2, do art°153° do CPPT para o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários...". x) Não menciona a AT, em tal despacho, como chegou a tal conclusão, quando é certo, ademais, que a referida conclusão não é verdadeira, (e a AT sabia disso). y) A inexistência/insuficiência de bens do devedor originário constitui pressuposto de obrigação de responsabilidade subsidiária. z) Sendo certo que, a presunção da inexistência/insuficiência de bens em consequência da insolvência é ilidível por prova em contrário. aa) Dispõe o nº2 do art°153° do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), que "o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação de qualquer das seguintes circunstâncias: a) Inexistência de bens penhoráveis do devedor e seus sucessores; b) Fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros de que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido". bb) O conceito "insuficiência" deve ser fixado objectivamente com recurso aos conhecimentos técnicos do direito fiscal, de forma a obter uma avaliação rigorosa e adequada dos bens penhorados e penhoráveis do devedor originário, não podendo o conceito ser preenchido subjectivamente através da avaliação que o funcionário que lavra o auto de penhora faça sobre valor dos bens penhorados. cc) Havendo um crédito de IVA da devedora originária, superior ao valor em divida nos presentes autos, e outros bens que o Tribunal a quo ignorou, indagamos nós a razão pela qual, a AT, aqui recorrida não tomou as devidas diligências com vista a salvaguardar o seu crédito, (designadamente através de uma eventual compensação de créditos) tendo ao invés aguardado a declaração de insolvência da devedora originária para reverter a divida contra o ora Oponente/Recorrente, violando os princípios da boa fé e da proporcionalidade que devem nortear a actuação da administração pública, aqui administração tributária?! dd) É entendimento da jurisprudência que cabe à administração tributária (não ao responsável subsidiário) o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento, previsto na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, o ónus de demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes. ee) Prova essa que competia à administração tributária fazer e que não fez, ao contrário do que entende a sentença recorrida ao afirmar que "...não logrou o Oponente provar a existência de bens na esfera da devedora originária, susceptíveis de responder pela divida exequenda, nem na fase de audição prévia sobre o projecto de reversão, nem na presente oposição". ff) Na esteira da posição da jurisprudência dos tribunais superiores que, só no caso de a administração tributária fazer a prova do preenchimento desses pressupostos, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegitimidade do ato. gg) Uma coisa é a inexistência de bens, em que não há, de todo, bens penhoráveis; outra, bem diferente, é a insuficiência de bens, em que há bens mas são insuficientes. hh) Ao estabelecer-se no artº153°, n°2, do CPPT a verificação alternativa da falta ou insuficiência de bens, o órgão de execução fiscal ao proceder à reversão tem de optar por um deles. ii) Ou pela falta de bens, e neste caso não há que quantificar qualquer valor. jj) Ou pela fundada insuficiência de bens e, neste caso, tem de indicar os bens existentes e quantificá-los, isto é, determinar o valor dos bens penhoráveis para poder comprovar a sua insuficiência por confronto com o valor da dívida. kk) No caso dos autos, a administração tributária não logrou demonstrar, conforme lhe competia, a inexistência de bens ou a fundada insuficiência de bens, ao omitir no projecto de reversão quais as diligências concretas que realizou, se é que realizou, e se foram ou não encontrados bens. ll) E não se venha dizer, como faz a sentença recorrida que a devedora originária foi declarada insolvente "...e portanto, não só numa situação financeira liquida negativa, como com os respectivos e eventuais bens apreendidos pela massa insolvente". mm) Não sendo a declaração de insolvência suficiente para a reversão. nn) A declaração de insolvência não extingue a existência de bens da esfera jurídica da sociedade insolvente, apenas faz com que os seus bens integrem o acervo da massa insolvente. oo) E se a declaração de insolvência é indiciadora da insuficiência de bens, já não o é da inexistência de bens. pp) Embora na situação em apreço, o despacho de reversão aqui em questão pode ter-se como fundamentado (fundamentação formal), o mesmo não sucede na parte em que se refere à inexistência de bens penhoráveis da devedora originária como pressuposto da reversão. qq) Daí que seja crucial fazer a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa. rr) O ónus da prova dos factos constitutivos do direito da administração tributária em operar a reversão da execução fiscal recai sobre esta, dado que foi a AT quem invocou o pressuposto da inexistência de bens - cfr. artigo 74°, n°1 da LGT. ss)No caso em apreço, verifica-se o erro nos pressupostos, que consubstancia vício de violação de lei do acto de reversão, determinante da sua anulação - cfr. artigos 133° e 135°, do Código do Procedimento Administrativo ex vi do artigo 2°, alínea c), da LGT - e constitui fundamento de oposição à execução previsto na alínea i) do nº1 do artigo 204°, do CPPT, pelo que a procedência da oposição com esse fundamento terá como consequência, não só a anulação do acto de reversão, mas também a absolvição do oponente da instância executiva. tt) Em face do supra exposto, deve ser revogada a sentença recorrida, com os sobreditos fundamentos, por erro de julgamento, devendo outrossim ser julgada procedente, por provada a Oposição deduzida pelo Recorrente. TERMOS EM QUE, O PRESENTE RECURSO DEVE SER RECEBIDO, JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO E DAÍ SER REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA POR A MESMA ESTAR FERIDA DE ERRO DE JULGAMENTO, (POR APLICAÇÃO ERRÓNEA DA LEI), E SER JULGADA PROCEDENTE A OPOSIÇÃO DEDUZIDA, QUE TEM COMO CONSEQUÊNCIA A ANULAÇÃO DO DESPACHO DE REVERSÃO, E EM CONSEQUÊNCIA, A ABSOLVIÇÃO DO OPONENTE DA INSTÂNCIA EXECUTIVA. SÓ ASSIM SE FARÁ A COMPETENTE JUSTIÇA.» * Não foram apresentadas contra-alegações. * Neste Tribunal Central Administrativo, o Exmo. Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso. * Colhidos os vistos, nada obsta à decisão. * II - FUNDAMENTAÇÃO De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida: «[D]ão-se como provados, com interesse para a decisão da causa, os seguintes factos: A) Entre 30/09/2011 e 20/10/2011, foram instaurados pelo Serviço de Finanças de Mafra, contra a sociedade P……………….. – M……………….., LDA, pessoa coletiva n°…………….., doravante devedora originária, os processos de execução fiscal (PEF) n°……………485 e aps. (……………..550 e ……………….960), para cobrança de dívidas relativas a IRC do exercício de 2010, Retenções na Fonte de IRS e Imposto do Selo, relativamente ao mês de agosto de 2011 e coima por falta de entrega de imposto retido na fonte no mês de abril de 2011, as quais perfazem o montante total de €12 981,23 - cfr. fls.3 e 42/v do suporte físico dos autos; B) No PEF referido em A) foi lavrado auto de diligências com o seguinte teor: C) No PEF referido em A), em 29/02/2012, foi elaborada a seguinte informação: D) No PEF referido em A), em 29/02/2012 foi elaborado o projeto de reversão, ora a fls. 39 do suporte físico dos autos, e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; E) O Oponente foi notificado para exercer o direito de audição prévia sobre o projeto de reversão referido em D), através do oficio do Serviço de Finanças de Mafra n°1706, datado de 29/02/2012, ora a fls. 40 do suporte físico dos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido -alegado e não contestado; F) No PEF referido em A), em 26/03/2012 foi proferido o seguinte despacho de reversão: «Face às diligencias que antecedem e estando concretizada a audição do(s) responsável(eis) subsidiário(s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra P ………………………… (...) na qualidade de Responsável Subsidiário, pela divida abaixo discriminada. G) Como fundamentos da reversão referida em F) foi indicado o seguinte: «Constantes do Projeto de Reversão que antecede e que deve fazer parte integrante da citação pessoal» - cfr. fls. 41 do suporte físico dos autos; H) O Oponente foi citado no PEF referido em A) através do ofício n°2608, datado de 28/03/2012, a fls. 36 do suporte físico dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, em 05/04/2012 - cfr. cópia do aviso de receção assinado a fls. 7 do documento sob o registo 005857431; I) Do ofício referido em H), destaca-se o seguinte: «Fundamentos da reversão // Constantes do Projeto de Reversão e do Despacho de Reversão (Cópia anexa à presente citação) - cfr. fls. 36 do suporte físico dos autos; J) A sociedade devedora originária, foi declarada insolvente por sentença proferida em 23/01/2012, no processo n°1927/11.0TYLSB - cfr. documento sob o registo 005853716; K) O Opoente foi designado Presidente do Conselho de Administração da sociedade devedora originária desde a sua constituição em 19/08/1999, e para o quadriénio de 2008/2011 - cfr. fls. 10 e 12 do documento sob o registo n° 005613013; L) Por deliberação datada de 02/04/2010, a forma de obrigar da devedora originária, passou a ser pela assinatura do Oponente - cfr. fls. 13 do documento sob o registo n°005613013; M) Na declaração periódica de IVA submetida pela devedora originária relativa ao período 2011/12, foi inscrito no campo 96 - "excesso a reportar", o montante de € 44 466,68 - cfr. fls, 25 do suporte físico dos autos; N) O PEF referido em A) foi remetido ao processo de insolvência referido em J) através do Oficio do Serviço de Finanças de Mafra n°2891, datado de 04/04/2012 - cfr. fls. 9 do documento sob o registo 005857431. * 2.2 Factos não provados: 1) Que à data da reversão, a devedora originária era "detentora de um crédito de IVA sobre a AF e proprietária de um imobilizado avaliado em mais de duzentos mil euros"; 2) Que o Oponente foi declarado insolvente e em que data. * 2.3 FUNDAMENTAÇÃO DO JULGAMENTO A decisão da matéria de facto provada resultou da análise crítica de toda a prova produzida nos autos, nas informações oficiais e documentos constantes dos autos relativos ao processo de execução fiscal, não impugnados, conforme remissão feita a propósito de cada alínea do probatório. Quanto ao imobilizado, ao qual foi feita uma referência genérica na PI, juntou o Oponente, já em sede de diligência de inquirição de testemunhas, uma listagem, meramente interna - na medida em que se encontra desprovida de qualquer autenticação por terceiros, que portanto não permite dar por provado, não só a existência daqueles (ou outros) bens na esfera patrimonial da devedora originária à data da reversão, nem o seu valor penhorável, ou seja, suscetível de vir a responder pela dívida exequenda.» * - De direito
Como resulta evidente daquilo que para trás ficou exposto, o Tribunal Tributário de Lisboa julgou improcedente a oposição deduzida, por P ………………., à execução fiscal nº ………………….485 e apensos, originariamente instaurada contra a sociedade “P………………- M………………..,S.A.” para cobrança de dívidas de IRC do exercício de 2010, de IRS (retenções na fonte) e Imposto do Selo, referente ao mês de Agosto de 2011, e coima fiscal decorrente de falta de entrega de imposto retido na fonte do mês de Abril de 2011, tudo no montante total de €12.981,23. Foram vários os fundamentos em que a presente oposição assentou, todos eles julgados improcedentes. É consabido que são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer. Ora, lidas as conclusões das alegações de recurso, resulta claro que a 1ª questão que se coloca consiste em saber se a sentença incorreu em erro de julgamento de direito ao decidir que o despacho de reversão contém os elementos necessários e suficientes que permitam ao Oponente, ora Recorrente, apreender os motivos de facto e de direito pelos quais foi chamado à execução fiscal, ou seja, se o despacho de reversão se mostra, ou não, fundamentado – conclusões a) a r). Vejamos, antes do mais, o percurso argumentativo seguido na sentença a este propósito. Escreveu-se na sentença o seguinte: «[…]A reversão, por se tratar de um ato materialmente administrativo em matéria tributária, carece de fundamentação, desde logo por força do princípio constitucional consagrado no nº3 do artigo 268º da CRP, mas também por força do disposto no nº 4 do artigo 23º e nº 1 do 77º, ambos da LGT. Por conseguinte, cabe à Administração fiscal fundamentá-lo, provando que se verificam os factos que integram os fundamentos previstos na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários pela dívida exequenda, ainda que por remissão para documentos, desde que os mesmos permitam concluir pela verificação desses pressupostos. No caso concreto, como resulta provado, foi proferido despacho de reversão da divida exequenda em causa no PEF n.º ………………..485 e aps. contra o ora Oponente, após terem sido realizadas diligências no sentido indagar a existência de bens da devedora originária, fazendo constar do PEF o respetivo auto; terem sido identificados os seus administradores de direito, através de certidão da Conservatória do Registo Comercial; e ter sido assegurado o exercício do direito de audição prévia do Oponente, sobre o projeto de reversão. Resultando provado que o despacho de reversão em apreço, refere como fundamentos da reversão, os constantes do Projeto de Reversão que o antecedeu, o qual por sua vez se alicerçou em informação igualmente constante do PEF, resta concluir que o mesmo reúne fundamentação formal bastante e suficiente. Termos em que, não assiste razão ao Oponente quanto ao primeiro fundamento com que deduziu a presente oposição.» Vejamos, pois. A reversão, sendo um ato administrativo tributário, deve conter a sua fundamentação. A exigência legal e constitucional de fundamentação do ato administrativo, decorrente do artigo 268º da CRP, visa, primacialmente, permitir aos interessados o conhecimento das razões que levaram a Administração a agir, por forma a possibilitar-lhes uma opção consciente entre a aceitação da legalidade do ato e a sua impugnação contenciosa. Como tem sido reiteradamente afirmado pela jurisprudência e pela doutrina, a fundamentação dos atos administrativos há-de ser contextual, integrada no próprio ato, expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do ato um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente. Porque assim é, tal equivale a dizer que será de fazer equivaler à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam a concreta motivação do ato. Neste entendimento, pode afirmar-se que o “ato só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto ato administrativo (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do ato, sendo, portanto, essencial que o discurso contextual lhe dê a conhecer todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro” – vide, acórdão do STA, de 14/12/11 (proc. 0747/11). Como vem afirmando a jurisprudência e a doutrina, o ato encontra-se suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática. No que concerne à fundamentação do despacho de reversão da execução fiscal, a lei é expressa a determinar, no nº 4 do artigo 23º da LGT, que: “A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação”. No despacho de reversão, que é o que aqui nos ocupa, o que está em causa é a qualidade do chamado, a competência de quem decide a reversão e os pressupostos que a legitimam e que se prendem com o exercício do cargo, o período desse exercício, a qualificação das dívidas e a existência ou não de culpa do chamado pela insuficiência do património societário relativamente ao período que exerceu o cargo de administrador ou gerente (Ac. do TCAN de 21/12/2008, Processo 00711/04). No caso em análise, a questão que se coloca é a de saber se a Administração Tributária, em sede de reversão, propiciou ao revertido, ora Recorrente, o conhecimento dos motivos que a levaram a agir nos termos em que o fez, ou seja, se foram dadas a conhecer, nos moldes acima indicados, as razões (de facto e de direito) em que se apoiou a reversão da execução fiscal contra o Recorrente. Trata-se de questão que, naturalmente, se situa no âmbito da validade formal do ato - não se trata de saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta atuação administrativa. Sobre a questão da fundamentação do despacho de reversão, a jurisprudência do STA é pacífica, sendo dela revelador o acórdão de 29/10/14, proferido no processo nº0925/13 que, por isso, aqui parcialmente se transcreve: “….não sofre dúvida que a responsabilidade subsidiária se efectiva por reversão do processo de execução fiscal (n.º 1 do art. 23.º da LGT) e que este despacho de reversão, sendo um acto administrativo tributário, está sujeito a fundamentação (art. 268.º n.º 3 da CRP; arts. 23.º n.º 4 e 77.º nº 1, da LGT). E sendo pressupostos da responsabilidade subsidiária (arts. 23.º n.º 4 e 24.º n.º 1, da LGT) a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (art. 23.º n.º 2 da LGT; art. 153.º n.º 2 do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou da respectiva entrega (art. 24.º n.º 1 da LGT), então o despacho de reversão, enquanto acto administrativo tributário, deve, em termos de fundamentação formal, incluir a indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (nº 1 do art. 77.º da LGT), e deve incluir, igualmente, a declaração daqueles pressupostos e referir a extensão temporal da responsabilidade subsidiária (art. 23º nº 4 LGT). Daí que, em consonância com este normativo, se tenha afirmado, no acórdão do Pleno desta Secção do STA, proferido em 16/10/13, 0458/13, que a fundamentação formal do despacho de reversão se basta com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada, «não se impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.» (cfr., igualmente, os acórdãos desta Secção do STA, de 31/10/2012, proc. nº 580/12 e de 23/1/2013, proc. nº 953/12).”. Tenhamos presente que, no caso concreto, o despacho de reversão proferido apresenta o seguinte teor (transcrito na alínea F) do probatório): «Face às diligencias que antecedem e estando concretizada a audição do(s) responsável(eis) subsidiário(s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra P ………………………….. (...) na qualidade de Responsável Subsidiário, pela divida abaixo discriminada. Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do Art°160° do C. P. P. T para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros demora nem custas (n°5 do Art°23° da L.G.T.) » Como «FUNDAMENTOS DA REVERSÃO» consta «CONSTANTES DO PROJECTO DE REVERSÃO QUE ANTECEDE E QUE DEVE FAZER PARTE INTEGRANTE DA CITAÇÃO PESSOAL» No projeto de reversão (cujo teor foi dado por integralmente reproduzido na alínea D) do probatório), pode ler-se o seguinte: “Em face das diligências que antecedem verifica-se a inexistência de bens penhoráveis da executada P ………………… M………………….. S.A., (…) Não havendo bens da devedora originária, ora executada que respondam pelo pagamento da dívida, estão pois verificadas as condições prevista nos termos do nº2 do artº153 do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPTT) para o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários, de acordo com a legislação em vigor no momento do exercício do seu cargo e no momento da constituição de responsabilidade, revertendo assim contra estes a execução. Corre termos no Tribunal do Comércio de Lisboa, o processo de insolvência nº1927/11.0TYLSB- 3º Juízo, no qual foi proferida Declaração de Insolvência em 24-01-2012 e estes Serviços foram citados para reclamar créditos em 13-02-2012. Foram na mesma data avocados os processos executivos. Considerando o nº7 do artigo 23º da Lei Geral Tributária, é de proceder à reversão das dívidas contra os responsáveis subsidiários antes só se procedendo ao envio dos autos a tribunal após despacho do órgão de execução fiscal. Existem dois momentos relevantes para a constituição da responsabilidade subsidiária, a saber o momento da formação do facto tributário, que está na origem da dívida e o momento da obrigação de pagamento, pelo que, considerando o(s) período(s) aqui em causa, temos como enquadramento(s) legal(is): 1.Relativamente ao facto tributário: Verifica-se que o facto tributário ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea a) do nº1 do seu artº24º, os gerentes e administradores serão subsidiariamente responsáveis pelas dívidas da sociedade, mediante prova da culpa a efectivar pela Administração Tributária. Como não dispõe este Serviço de Finanças de elementos que permitam concretizar a referida prova, não é possível efectivar a responsabilidade latente. No caso das coimas é aplicável o artigo 8º, nº1, alínea b) do Regime Geral das Infracções Tributárias, pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão definitiva que as aplicar for notificada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento. 2. Relativamente à obrigação de pagamento: Verifica-se que a obrigação de pagamento ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea b) do nº1 do seu artº24º, os gerentes e administradores que exerçam, ainda que somente de facto, funções de gestão em pessoas colectivas ou equiparadas, serão subsidiariamente responsáveis pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. No caso das coimas é aplicável o artigo 8º, nº1, alínea b) do Regime Geral das Infracções Tributárias. Assim, em face da informação que antecede e considerando os momentos de constituição da responsabilidade subsidiária, ao conjugar estes com a legislação vigente temos que é (são) (solidariamente) responsável (is) pelo pagamento das seguintes importâncias relativas ao (s) seu(s) período (s) de gerência: Gerente/Administrador NIF Período de gerência Valores (€) P……………….. …………. 19-08-1999 até ao presente 12.981,12 T………… ……….. 19-08-2010 a 09-12-2011 12.981,12 » Ora, o que sucede no caso concreto, como bem observa o Recorrente, é que o projeto de reversão (para o qual remete, em toda a linha, o despacho de reversão) não esclarece minimamente (pelo contrário, mostra-se até contraditório e confuso) ao abrigo de que preceito legal operou a reversão. Com efeito, o projeto de despacho de reversão começa por convocar a alínea a) do nº1 do artigo 24º da LGT, enunciando, em abstrato, o seu teor e o respetivo campo de aplicação. Logo afasta a aplicação de tal alínea, referindo que “como não dispõe este Serviço de Finanças de elementos que permitam concretizar a referida prova, não é possível efectivar a responsabilidade latente.” Após, consta do projeto de despacho o teor da alínea b) do nº 1 do artigo 24º da LGT, sem qualquer referência ao caso concreto, não se percebendo, sequer, que dívidas foram revertidas com base em tal preceito (se o foram), já que, como dissemos, ao abrigo da alínea a), o SF asseverou não dispor de elementos de prova suficientes (apesar de deixar antever que, em abstrato, essa poderia ser a base legal fundamentadora da reversão). Constata-se que, para efeitos da alínea b), nada se refere quanto ao período das dívidas, da obrigação de pagamento, sendo que tal referência (aqui omitida) sempre permitiria apreender minimamente o percurso da análise adotado no projeto de decisão e, consequentemente, no despacho de reversão para o qual este remete. Acresce que o despacho de reversão e a citação, na parte reservada aos fundamentos da reversão, também não esclarecem as dúvidas, permanecendo a dúvida sobre os pressupostos e a extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efetivada. De facto, o que se verifica é que a fundamentação (por remissão, o que não é posto em causa pelo Recorrente) apresentada é contraditória ou, no mínimo, ambígua. Ao despacho de reversão falta, pois, no caso, uma fundamentação válida e congruente, o que basta para determinar a sua anulabilidade. Saliente-se ainda que a reversão por coimas, como resulta do artigo 8.º do RGIT exige também a demonstração da culpa ou seja, este preceito não contém qualquer presunção de culpa, competindo à Administração Tributária reunir os elementos donde possa concluir-se pela verificação da culpa do responsável subsidiário pelo não pagamento das coimas por parte da empresa originária devedora que devem constar do despacho de reversão. No mesmo sentido, e já relativamente às mesmas partes aqui envolvidas, vejam-se os acórdãos deste TCAS, de 25/03/2021, Processo nº 1856/12.0BELRS, e de 10/02/22, Processo nº 1860/12.8 BELRS. Não restam quaisquer dúvidas de que os vícios formais do despacho de reversão se podem erigir em fundamento de oposição à execução fiscal, integrando a previsão da alínea i) do n.º 1 do art. 204.º do CPPT, determinando, por isso, em procedência da oposição, a consequente anulação contenciosa do despacho de reversão, bem como a consequente absolvição da instância executiva quanto ao oponente/revertido (cfr. ac. do STA, de 16/12/2015, proc. nº 0361/14). Assim e, perante todo o exposto, impõe-se concluir pela procedência do recurso e, como tal, pela revogação da sentença. A procedência da 1ª questão analisada prejudica o conhecimento das demais questões colocadas nas restantes conclusões. * III – DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida, e determinando, por isso, a procedência da oposição, com a consequente anulação do acto de reversão (por este fundamento) e a absolvição do oponente da presente instância executiva. Custas a cargo da Recorrida. Lisboa, 22/06/23 Catarina Almeida e Sousa Hélia Gameiro Ana Cristina Carvalho |