Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07212/11
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:03/31/2011
Relator:FONSECA DA PAZ
Descritores:SITUAÇÃO DE PRÉREFORMA.
EXERCÍCIO DE OUTRA ACTIVIDADE.
SUBSÍDIO DE DESEMPREGO.
Sumário:I -Da conjugação do nº 2 com o nº 4 do art. 8º do D.L. nº 261/91, de 25/7, resulta que, quando a préreforma se traduza na suspensão da prestação de trabalho, o trabalhador perde, nessa qualidade, o direito ao subsídio de desemprego, sem prejuízo da aquisição deste direito quando se verifique a entrada de contribuições pelo exercício de outra actividade.

II - O referido art. 8º, nº 4, não confere, por si só, o direito aos subsídios aí mencionados, limitando-se a permitir a sua aquisição, desde que se mostrem preenchidos os requisitos previstos na lei que confere cada um deles.

III -O art. 47º, nº 1, al. c), do D.L. nº 119/99, de 14/4, impede a acumulação do subsídio de desemprego com prestações de préreforma.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª. SECÇÃO, 2º. JUÍZO, DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1. O Instituto ………/Centro ………., inconformado com a sentença do TAF de Almada que julgou procedente a acção administrativa especial contra ele intentada por Antero ……….., dela recorreu para este Tribunal, formulando, na respectiva alegação, as seguintes conclusões:
“1ª.) Quando requereu a atribuição do subsídio de desemprego, em 19/7/2006, o A. fê-lo ao abrigo do D.L. nº. 119/99, de 14/4, por ser o diploma que à data regulava a protecção no desemprego;
2ª.) Referindo expressamente o art. 47º., nº 1, al. c), daquele diploma, que as prestações de desemprego não eram acumuláveis com prestações de pré-reforma, por motivo de cessação do contrato de trabalho;
3ª.) À data em que requereu as referidas prestações, o A. encontrava-se numa situação de préreforma, ao abrigo do D.L. 261/91, cuja figura não faz extinguir o contrato ou a relação de trabalho, antes consiste numa suspensão ou redução da prestação de trabalho em que o trabalhador mantém o direito a receber da entidade patronal uma prestação pecuniária mensal, conforme art. 3º. do D.L. nº 261/91 e art. 356º. da Lei nº. 99/2003, de 27/8 (aprovou o Código do Trabalho), que entretanto revogou aquele DecretoLei;
4ª.) Nos termos do nº 3 do art. 359º. da Lei 99/2003, um trabalhador na situação de préreforma está, para efeitos de retribuição, equiparado a um trabalhador no activo;
5ª.) Assim sendo, não parece, na nossa opinião, que a situação de pré-reforma em que se encontrava o A. à data em que requereu as prestações de desemprego, possa ser caracterizada ao abrigo do nº 1 do art. 6º do D.L. 119/99;
6ª.) Sem embargo do contrato de trabalho entre o A. e a M……. ter cessado em 21/4/2004, a verdade é que o A. não se encontrava, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 6º., 7º. e 12º do D.L. 119/99, numa situação de desemprego involuntário;
7ª.) Apesar do disposto no art. 8º. do D.L. 261/91 (repristinado por força do D.L. nº. 87/2004, de 17/4), a verdade é que o A. não integra a previsão dos arts. 6º. e 7º. do D.L. 119/99 para efeitos de atribuição das prestações de desemprego;
8ª.) Assim sendo, e admitindo por mera hipótese de interpretação que o disposto no nº 4 do art. 8º. do D.L. 261/91 (repristinado) se imporia ao princípio de não acumulação, e na nossa opinião não se impõe, ainda assim o A. não teria direito à atribuição das prestações de desemprego por não preencher a previsão e os pressupostos exigidos nos arts. 6º. e 7º. do D.L. 119/99;
9ª.) Por todo o exposto, a douta sentença ora impugnada viola o disposto nos arts. 6º., 7º., 12º. e 47º., nº 1, al. c), todos do D.L. nº. 119/99, de 14/4, pelo que deverá ser anulada e substituída por outra que confirme o acto praticado pelo R., ou seja, a deliberação do Conselho Directivo de 27/7/2007 que confirmou a não atribuição das prestações de desemprego ao A.”.
O recorrido contraalegou, tendo concluído pela improcedência do recurso.
O digno Magistrado do M.P. emitiu parecer, onde concluíu que o recurso não merecia provimento.
Sem vistos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.
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2.1. A matéria de facto pertinente é a que foi considerada provada na sentença recorrida, a qual se dá aqui por reproduzida, nos termos do nº 6 do art. 713º. do C.P. Civil.
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2.2. Na acção administrativa especial que intentou no TAF, o ora recorrido impugnou a deliberação, de 27/7/2007, do Conselho Directivo do Instituto de Segurança Social, que negara provimento ao recurso hierárquico que interpusera do despacho que lhe negara a concessão de subsídio de desemprego.
A sentença recorrida, após julgar improcedente o vício de forma por falta de fundamentação, entendeu que a deliberação impugnada enfermava de vício de violação de lei por infracção do art. 8º., nº 4, do D.L. nº. 261/91, de 25/7, que estatuía que os trabalhadores em situação de préreforma que tivessem efectuado contribuições para a segurança social pelo exercício de outra actividade mantinham o direito a receber as prestações do sistema de segurança social, tendo, em consequência, anulado essa deliberação.
No presente recurso jurisdicional, o recorrente contesta a verificação do aludido vício, invocando que o art. 47º., nº 1, al. c), do D.L. nº. 119/99, de 14/4, impede expressamente a acumulação das prestações de desemprego com as prestações de préreforma e que, de qualquer modo, ao recorrido nunca poderia ser atribuído o subsídio de desemprego por ele não se encontrar numa situação de desemprego involuntário para efeitos do disposto nos arts. 6º., 7º. e 12º. do mesmo diploma.
Vejamos se lhe assiste razão.
O D.L. nº. 261/91, de 25/7 que aprovou o regime jurídico aplicável às situações de préreforma (cfr. art. 1º) , foi revogado pela Lei nº. 99/2003, de 27/8, que aprovou o Código do Trabalho, tendo posteriormente, por força do D.L. nº. 87/2004, de 17/4, sido repristinadas, com efeitos a 1/12/2003, algumas das suas disposições, entre as quais a do art. 8º. que estabelecia o seguinte:
“1. Na situação de préreforma, o trabalhador mantém o direito às prestações do sistema de segurança Social, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.
2. Quando a préreforma se traduza em suspensão da prestação de trabalho, o trabalhador perde, nessa qualidade, o direito aos subsídios de doença, maternidade ou paternidade e desemprego.
3. Quando a préreforma se traduza em redução da prestação de trabalho, o trabalhador mantém o direito referido no número anterior, com base na remuneração auferida referente ao trabalho prestado.
4. O disposto nos nos. 2 e 3 não prejudica a aquisição do mesmo direito quando se verifique a entrada de contribuições pelo exercício de outra actividade.”
O D.L. nº. 119/99, de 14/4, regulamentou a protecção da eventualidade do desemprego dos beneficiários do regime geral de segurança social dos trabalhadores, através da atribuição de subsídio de desemprego nas situações em que o desemprego se deva considerar involuntário, impedindo expressamente a acumulação dessa prestação com prestações de pré reforma (cfr. art. 47º., nº 1, al. c).
Na préreforma subsiste, embora de forma mitigada, o contrato de trabalho celebrado entre o trabalhador e a sua entidade patronal, cujo conteúdo foi modificado através da formalização de um acordo, nos termos do qual o trabalhador aceita a redução ou a suspensão da sua prestação de trabalho, mediante o pagamento pela entidade patronal de uma prestação mensal, substitutiva da remuneração, até à situação de reforma (cfr. arts. 3º., 4º. e 6º., do D.L. nº. 261/91).
Da conjugação do nº 2 com o nº 4 do art. 8º. do D.L. nº. 261/91 resulta que quando a préreforma se traduza em suspensão da prestação de trabalho, o trabalhador perde, nessa qualidade, o direito aos subsídios de doença, maternidade ou paternidade, e desemprego, sem prejuízo de aquisição desse direito quando se verifique a entrada de contribuições pelo exercício de outra actividade.
A expressão “não prejudica”, constante do aludido nº 4, é sinónimo de não obsta ou não impede, pelo que se deve entender que a perda do direito aos subsídios a que se refere o nº 2 do art. 8º. não impede a aquisição do mesmo direito quando se verifique a entrada de contribuições pelo exercício de outra actividade. Quer dizer: quando ocorra tal entrada, o trabalhador em préreforma pode adquirir o direito aos mencionados subsídios, embora não o adquira automaticamente.
Assim, a norma do referido nº 4, ao afastar a aplicação do nº 2 do art. 8º. aos casos nela previstos, não confere, por si só e automaticamente, o direito em questão, limitando-se a permitir a sua aquisição, desde que se verifiquem os respectivos pressupostos legais.
Portanto, quando se verifique a entrada de contribuições pelo exercício de outra actividade, o trabalhador em préreforma adquire o direito aos subsídios de doença, maternidade ou paternidade e desemprego se preencher os requisitos previstos na lei que os confere.
Ora, mesmo admitindo que a cessação do exercício da “outra actividade” ocorrera com base em motivo susceptível de configurar uma situação de desemprego involuntário que constitui pressuposto da protecção da eventualidade do desemprego , entendemos que, no caso em apreço, não era possível ao ora recorrido adquirir o direito ao subsídio de desemprego, por a tal se opor o art. 47º., nº 1, al. c), do D.L. nº. 119/99, quando impede a acumulação deste com as prestações de préreforma.
Nestes termos, improcede o vício de violação de lei que a sentença julgou procedente.
Quanto à alegada violação dos princípios da prossecução do interesse público, da justiça e da boa-fé, para além de não terem sido alegados os factos integradores dessa infracção o que obstava desde logo à sua procedência , deve-se notar que se trata de princípios cuja violação só releva no domínio da actividade discricionária da Administração, uma vez que no campo vinculado o que importa averiguar é se a legalidade foi respeitada (cfr. Ac. do STA de 9/12/97 Proc. nº.38538).
Ora, porque a Administração não tem o poder de optar pela concessão ou não concessão do subsídio de desemprego consoante o que tenha por mais ajustado ao interesse público, estando, pelo contrário, vinculada a concedê-lo se se verificarem os pressupostos previstos na lei, não há dúvidas que a deliberação impugnada foi praticada no exercício de um poder vinculado, motivo por que não poderia padecer do vício em questão.
Nestes termos, procede o presente recurso jurisdicional, devendo revogar-se a sentença recorrida.
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3. Pelo exposto, acordam em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e julgando a acção totalmente improcedente.
Custas em ambas as instâncias pelo ora recorrido, fixando-se a taxa de justiça, já com as reduções legais, em 2 UCS. na 1ª. instância e em 3 UCS. nesta instância.
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Lisboa, 31 de Março de 2011
as. ) José Francisco Fonseca da Paz (Relator)
Rui Fernando Belfo Pereira
António de Almeida Coelho da Cunha