Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04668/11
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:04/07/2011
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:OPOSIÇÃO A ARRESTO EM BENS DO RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO.
NATUREZA DO ARRESTO E FINALIDADE DA OPOSIÇÃO AO MESMO.
Sumário:I)- Pode ser decretado arresto sobre os bens desde que exista receio fundado da diminuição da garantia de cobrança dos créditos e o imposto esteja liquidado – cfr. artº 136º do CPPT.

II) -Mas são diferentes os pressupostos da responsabilização subsidiária cuja efectivação apenas pode acontecer em sede de execução fiscal dos requisitos definidos para o decreto do arresto preventivo sobre bens do responsável subsidiário impostas pelo artigo 214º do CPPT.

III) -Para que possa ser decretado arresto sobre bens do responsável subsidiário importa apenas verificar se ocorrem os requisitos referidos em II) e no artigo 214 do CPPT e ainda se se encontram preenchidos os pressupostos exigidos por lei para poder ordenar-se contra o responsável subsidiário a reversão da execução.

IV) -O processo cautelar depende da causa que tem por objecto a decisão sobre o mérito, podendo ser intentado como preliminar ou como incidente no próprio processo (cfr. n.º1 do art.º 383º do CPC).

V) -Nem o julgamento da matéria de facto, nem a decisão final proferida no procedimento cautelar, têm qualquer influência no julgamento da acção principal, princípio ínsito no disposto no n.º 4 do art.º 383º do CPC e que, embora não fosse reflectido no CPPT não pode deixar de valer também em processo judicial tributário, por ser inerente à própria condição do processo cautelar.

VI) -A essa luz, o processo cautelar é um processo que tem uma finalidade própria: visa assegurar a utilidade da lide, isto é, de um processo que normalmente é mais longo, porque implica uma cognição plena.

VII) -É em virtude dessa função própria de prevenção contra a demora, que as providências cautelares têm características típicas: a instrumentalidade – isto é, a dependência, na função e não apenas na estrutura de uma acção principal cuja utilidade visa assegurar; a provisoriedade - pois que não está em causa a resolução definitiva de um litígio; e a sumariedade – que se manifesta numa cognição sumária de facto e de direito própria de um processo urgente.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDA-SE, EM CONFERÊNCIA, NESTA 2ª SECÇÃO DO TCAS:

1. – A...veio interpor recurso da decisão da Mmª Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a oposição por si deduzida contra o arresto que viu ser decretado sobre um (1) prédio urbano que lhe pertence.
Após alegações, o recorrente enunciou as seguintes conclusões:
a) O responsável subsidiário tem o direito a impugnar a liquidação da dívida como o fez
b) O recorrente tinha todo o direito a impugnar e opor-se com o fez
c) Deverá em face da prova apresentada e da diminuição do valor em débito ser o valor do pedido reduzido para 16918.41,
4) Se assim não for estão em causa ofensa ao princípio da legalidade e das normas jurídicas aplicáveis
e) O IVA que o douto tribunal afirma que o recorrente liquidou foi por este liquidado em dinheiro.
f) Forma de pagamento a época permitido e demonstrado.
g) O que leva caso seja condenado a pagar a existência de tributação proibida e que o estado português já foi condenado tribunal europeu
h) Existe uma violação clara do art°136 do CPTT, por existir falta de pronúncia do DGCI
i) Existiu falta de fundamentação por parte da DGCI para proceder ao arresto do bem do responsável revertido como fez
j) O princípio da igualdade neste caso desvanece isto porque a DGCl considera-se superior a qualquer cidadão nas mesmas circunstâncias.
k) Deve ser corrigido o imposto a pagar pelo exequente.
Termos em que, nos melhores de direito e com o suprimento de V. Exas deve ser provido o recurso ora interposto e consequentemente revogada a sentença a quo, vindo a ser retomada a tramitação adequada.
Assim se fará a serena e a costumada JUSTIÇA.
Não houve contra – alegações.
A EPGA pronunciando-se no sentido do improvimento do recurso.
Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.
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2 – Com base na documentação dos autos a sentença recorrida considerou assente que:
a) A sociedade A...& A..., Lda., é uma sociedade por quotas, cujo objecto social consiste na construção de edifícios residenciais e não residenciais, a que corresponde o CAE 41200, encontrando-se enquadrada como sujeito passivo de IVA no regime normal de periodicidade trimestral e abrangida pelo regime geral de tributação para efeitos de IRC (cfr. fls. 15 e 61 a 67 dos autos);
b) A gerência da referida sociedade cabia exclusivamente ao sócio B...A..., ora requerido, obrigando-se a sociedade com a assinatura de um gerente (cfr. certidão de fls. 61 a 67 dos autos);
c) A A...& A..., Lda. cessou a sua actividade desde 24.03.2009 (cfr. print da base de dados da DGCI a fls. 15 dos autos);
d) Em cumprimento da ordem de serviço n°0I200903645, datada de 20.05.2009, a A...& A..., Lda. foi objecto de inspecção tributária para o exercício de 2007, no âmbito do IVA e IRC;
e) No relatório de inspecção concluiu-se que a sociedade em causa havia contabilizado custos e deduzido IVA com base em facturas proveniente do fornecedor C..., Lda., relativamente às quais existiam fortes indícios de não corresponderem a serviços efectivamente prestados, tendo sido propostas as seguintes correcções: IRC- €4.828,76; IVA - €7.127,40 (cfr. fls. 17 dos autos);
f) Durante os anos a que respeitam os impostos em falta, a gerência efectiva da sociedade pertencia ao requerido (cfr. fls. 22 dos autos);
g) Da consulta efectuada no sistema informático da DGC, verificou-se que a sociedade A...& A..., Lda. não possui qualquer bem imóvel ou móvel em seu nome;
h) Encontram-se instaurados contra a sociedade A...& A..., Lda, vários processos de execução fiscal - designadamente, por dívidas de IVA do ano de 2004 e IRC e IVA do ano de 2006, num valor total de €57.467,42 -tendo já sido iniciado o processo de reversão contra o requerido no âmbito de pelo menos um desses processos (cfr. fls. 68 a 71 e 10 dos autos);
i) A favor de A...encontra-se registado o seguinte imóvel:
- Fracção autónoma designada pela letra "L" do prédio em regime de propriedade horizontal, sito na Rua da ..., Parque Luso, Alto do Moinho, freguesia de Corroios, concelho do Seixal, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 13 380 e descrito na Conservatória do Registo Predial do Seixal, sob o n°6446, com ónus de hipoteca (cfr. fls.73 a 85).
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Aí se consignou que quanto aos factos indiciariamente provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos pelo Representante de Fazenda Pública e não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão da causa, em face das possíveis soluções de direito.
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3. - Atentas aquelas conclusões e a factualidade fixada e que se reputa a relevante, vejamos qual a sorte do recurso em que a questão decidenda é a da saber, se se mostram preenchidos os requisitos que determinam o decretamento e manutenção do arresto, o que vale por dizer, se procedem os fundamentos da oposição à sentença que o decretou
Na sentença que decretou o aresto, fundamentou-se assim o seu decretamento:
“A providência cautelar do arresto preventivo, encontra-se especificamente prevista nos arts. 136° a 139° do CPPT, sendo-lhe subsidiariamente aplicável o disposto no CPC (art. 139° do CPPT).
O decretamento de tal providência cautelar, nos termos do disposto no n°1 do art. 136° do CPPT, depende da concorrência dos seguintes requisitos:
a) Haver fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis;
b) O tributo estar liquidado ou em fase de liquidação.
Quanto à análise da verificação, no caso dos autos, do primeiro dos requisitos enunciados, socorramo-nos da doutrina expendida no Acórdão do TCA de 20.01.98, Rec. 1067/98, nos termos do qual: " (...) 3. Para preencher o conteúdo do requisito do arresto de "haver fundado receio de diminuição de garantia de cobrança de créditos fiscais" deve o juiz orientar-se pelas regras da comum experiência, no sentido de probabilidade ou provável frustração da cobrança desses créditos;(...)"
Nos termos do n°5 do art. 136° do CPPT, a Fazenda Pública usufrui, no caso em apreço, de uma presunção legal de diminuição da garantia patrimonial concernente às dívidas provenientes de IVA.
Acresce a esta presunção um comportamento fiscal do sujeito passivo caracterizado pelo incumprimento da obrigação tributária principal: o pagamento do imposto em falta.
Face à factualidade apurada e acima transcrita e na esteira do arresto citado, temos de concluir pela verificação, no caso em apreço, do primeiro dos requisitos previstos no art. 136° n°1 do CPPT.
Os factos alegados, suportados nos documentos informativos juntos com a P.I. são reveladores de uma conduta deliberada de fuga ao cumprimento de obrigações fiscais por parte do requerido e indiciam, de acordo com as regras da experiência comum, a forte probabilidade do mesmo poder vir a dissipar, ocultar ou reduzir substancialmente os seus bens, por forma a diminuir as garantias de cobrança dos impostos que vierem a ser liquidados.
Quanto ao segundo dos requisitos acima referidos - estar o tributo liquidado ou em fase de liquidação - face à mesma factualidade apurada e ao disposto no art. 136°.n°3 do CPPT, concluímos, igualmente, pela sua verificação.
No caso em análise, o arresto dos bens pretendido dirige-se a bens imóveis do gerente da sociedade devedora originária.
Impõe-se uma breve consideração quanto à responsabilidade subsidiara dos gerentes de uma sociedade para partirmos de um pressuposto seguro quanto aos requeridos e à sua qualidade. Com efeito, atento o disposto na primeira parte do nº1 do artigo 136º e, bem assim, o âmbito de aplicação do artigo 214°, impõe-se, desde logo, saber se o requerido tem ou não essa qualidade face à devedora originária para sabermos, ab initio, se o mesmo pode ser requeridos nesta providência.
O artigo 24° da LGT, estabelece que os gerentes, ainda que somente de facto, que exerçam funções de administração ou gestão em pessoas colectivas são subsidiariamente responsáveis em relação a estas pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Ora, como decorre do probatório, o requerido A...foi gerente de direito e de facto da A...& A..., Lda. no período relativo aos impostos em causa.
Por outro lado, e tomando em consideração o artigo 23°, n°2 da LGT, não restam dúvidas de que é patente a insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal.
Do que fica dito pode concluir-se igualmente pela verificação do requisito lega de que depende a reversão através da qual opera a responsabilidade subsidiária e, como tal, viabilizar o requerimento do arresto contra o requerido B...A....
Em resumo e para concluir, estão demonstrados os pressupostos de que depende o decretamento do arresto, tal como é pretendido pelo AT.”
Contra o assim fundamentado e decidido, efectuado o arresto, o requerido deduziu oposição à providência, alegando, no fundamental, não estarem demonstrados os pressupostos legais de que depende o seu decretamento, nomeadamente e, por um lado, por não haver, no caso concreto, impostos retidos ou repercutidos a terceiros e, nessa medida, inexistir qualquer presunção legal de que beneficie a Fazenda Pública, pelo que lhe competia fazer prova dos factos integrativos da sua pretensão, o que não faz; e, por outro, que até à reversão - que ainda se não concretizara à data da sentença - inexiste responsabilidade subsidiária e responsável subsidiário para efeitos do disposto no n°1 do art°136°, do CPPT.
A oposição foi julgada procedente com base na seguinte fundamentação que da decisão recorrida se transcreve:
“O requerido não produz qualquer prova destinada a infirmar a factualidade indiciária em que assentou o decretamento da providência.
Alega, por um lado, que não há responsabilidade subsidiária antes de concretizada a reversão em processo executivo e, nessa medida, falece um dos pressupostos do decretamento da providência.
Todavia, a sua posição, já sustentada doutrinariamente, não encontra qualquer amparo nem na lei, nem na jurisprudência dos tribunais superiores.
Com efeito, escreveu-se no recente acórdão do TCAS, de 12/01/2010, processo n°03687/09, o seguinte: «Não é, em nenhuma medida, questionável, por tão explícita e objectiva letra da lei - cfr. art. 136° n.°1 CPPT, a possibilidade do arresto poder incidir sobre bens propriedade de um responsável subsidiário, por dívidas fiscais de outrem. Mais, é permitido e, por isso, legal, o arresto de bens do responsável subsidiário antes da instauração de um qualquer processo de execução fiscal ou sem que este haja sido chamado ao mesmo por via de reversão, ou seja, "é desnecessário demonstrar a efectivação da responsabilidade subsidiária do requerido"».
Trata-se de entendimento há muito defendido pelos tribunais superiores, não se antevendo qualquer razão para nos afastarmos de tal orientação jurisprudencial.
Com interesse, destacamos ainda o acórdão do TCAN, de 05/05/2005, processo n°01045/04.7BEBRG, que se transcreve na parte mais impressiva: «Verificados que sejam os requisitos previstos no artigo 136° do CPPT, o arresto pode ser decretado contra pessoa que seja nos termos da lei responsável subsidiária, sem necessidade de prévia reversão da execução contra esse responsável subsidiário. Isto porque, enquanto o artigo 214° do mesmo diploma prevê o arresto na fase executiva, o arresto previsto no artigo 136° citado pode ser decretado antes de atingida aquela fase, podendo mesmo ter lugar antes de o tributo estar a pagamento, tal como decorre da expressão "estar o tributo liquidado ou em fase de liquidação "».
Outrossim, alega o oponente que não estão em causa quaisquer impostos que o devedor ou responsável esteja obrigado a repercutir a terceiros e não haja entregue nos prazos legais. E nessa medida, não goza a Fazenda Pública de presunção legal em relação à prova do periculum in mora.
Também aqui não lhe assiste razão. E por duas vias.
Por um lado, a sentença não deu por verificado o requisito do "periculum in mora" unicamente sustentada na presunção legal prevista no n°5 do art°136°, do CPPT.
Pois nela se refere o reiterado incumprimento, pelo sujeito passivo, das obrigações tributárias, nomeadamente, de pagamento, como elemento constitutivo do periculum in mora.
E, por outro lado, como se assinalou no acórdão do TCAS, de 13/05/2008, processo n°02396/08, «No caso de IVA, quer seja proveniente dos outputs quer seja dos inpunts, é-lhe aplicável a norma do art. ° 136. ° n. °5 do CPPT (redacção da Lei n. ° 15/2001, de J de Junho), por força da qual se presume (presunção legal) haver fundado receio da diminuição de garantia de cobrança desses créditos tributáveis.
Em Portugal, o IVA começou a vigorar em 1.1.1986, tendo o respectivo Código sido aprovado pelo Dec-Lei n.°394-B/84, de Dezembro.
Do seu preâmbulo, designadamente do seu ponto 4, quanto à incidência do imposto, o mesmo visa tributar todo o consumo em bens materiais e serviços, abrangendo todas as fases do circuito económico, desde a produção ao retalho, sendo, porém, a base tributável limitada ao valor acrescentado em cada fase. A dívida tributária de cada operador económico é calculada pelo método do crédito de imposto, traduzindo-se na seguinte operação: aplicada a taxa ao valor global das transacções da empresa, em determinado período, deduz-se ao montante assim obtido o imposto por ela suportado nas compras desse mesmo período revelado nas respectivas facturas de aquisição. O resultado corresponde ao montante a entregar ao Estado.
Porém, salvo o devido respeito, afigura-se-nos artificiosa esta posição do recorrente ao cindir o imposto (IVA) provindo dos inputs e o dos outputs, desde logo por a citada norma do art°136º° n°5 do CPPT, apenas se referir a «impostos que o devedor esteja obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e não haja entregue nos prazos legais”, sem distinguir a sua proveniência, e inexistirem dois impostos mas apenas um, neste caso o IVA, cujo método de apuramento e logo a prestação devida ao Estado, depender tanto dos montantes cobrados aos seus clientes nas vendas ou prestações de serviços efectuadas (imposto retido) como dos montantes pagos aos seus fornecedores nas aquisições de bens e serviços (imposto repercutido), cuja operação final concretiza o débito de imposto devido, tudo nos termos do disposto nos art °s 19. ° e segs do CIVA.
Ou seja, em regra, o montante do imposto exigível a apurar pelo sujeito passivo na sua declaração periódica, tanto depende do imposto suportado como do imposto recebido, não havendo lugar a dois impostos mas a um só, correspondente à diferença entre o imposto recebido e o imposto suportado pelo sujeito passivo, tudo reportado a um determinado período de tempo (...)».
Inconformado, o arrestado, ora recorrente, vem agora sustentar que como responsável subsidiário tem todo o direito a impugnar e opor-se como fez e, em face da prova apresentada e da diminuição do valor em débito ser o valor do pedido reduzido para €16918.41,sob pena de se ofender o princípio da legalidade e das normas jurídicas aplicáveis. Acrescenta que o IVA que o douto tribunal afirma que o recorrente liquidou foi por este liquidado em dinheiro, forma de pagamento a época permitido e demonstrado, o que leva caso seja condenado a pagar a existência de tributação proibida e que o estado português já foi condenado tribunal europeu, existe uma violação clara do art°136 do CPTT, por existir falta de pronúncia do DGCI, bem como falta de fundamentação por parte da DGCI para proceder ao arresto do bem do responsável revertido como fez e o princípio da igualdade neste caso desvanece isto porque a DGCl considera-se superior a qualquer cidadão nas mesmas circunstâncias. Termina a defender que deve ser corrigido o imposto a pagar pelo exequente.
Quid juris?
Preliminarmente, diga-se que o arresto constitui um meio conservatório da garantia patrimonial para aquelas situações em que o comportamento doloso ou negligente do devedor a faça perigar, não podendo a Fazenda Pública requerer o arresto só porque está convencida de que o património do devedor é insuficiente para solver os seus créditos, tomando-se necessário que alegue e demonstre, além do mais, que o devedor teve um comportamento susceptível de provocar fundado receio de diminuição das garantias de cobrança desses créditos(1).
Na verdade, segundo o artº 54º da Lei Geral Tributária, no âmbito do procedimento tributário é compreendida toda a sucessão de actos dirigida à declaração de direitos tributários como seja: acções preparatórias ou complementares de informação e fiscalização tributária, o RCPIT, aprovado pelo Dec. - Lei nº 413/98, de 31/12 veio incluir as medidas cautelares nos actos de inspecção, actos materiais de recolha de prova, como garantias do exercício da função inspectiva. E é fundamento bastante para a sua propositura a descrição dos factos demonstrativos do tributo ou da sua provável existência; a fundamentação do fundado receio de diminuição das garantias de cobrança e a relação dos bens suficientes para garantia da cobrança da dívida.
Tendo em conta que a AT pode, como se prevê no artº 51º, nº 1 da LGT, tomar providências cautelares para garantia dos créditos tributários em caso de fundado receio de frustração da sua cobrança ou de destruição ou extravio de documentos ou outros elementos necessários ao apuramento da situação tributária dos sujeitos passivos e demais obrigados tributários, e admitindo-se que a verificação de tais pressupostos foi ponderada no deferimento do arresto por se verificar o fundamento para tal previsto na al. a) do nº 1 do artº 136º do CPPT, ou seja, o fundado receio na diminuição de garantia patrimonial da cobrança de tributos, indiciariamente devidos pelo requerido, há que atentar que nos termos do artº 139º do CPPT "ao regime do arresto aplica-se o disposto no Código de Processo Civil em tudo o que não for especialmente regulado nesta secção".
E nessa secção nada se diz sobre a forma de notificar ou citar o arrestado, bem como os termos da efectivação do arresto e em que o arrestado pode opor-se, pelo que, nesse âmbito, haverá que recorrer às normas subsidiárias do CPC.
Assim, de acordo com o disposto no artigo 408°, n° 1, do Código de Processo Civil (CPC), o arresto é decretado sem audiência da parte contrária, só se abrindo para o arrestado a via contraditória depois de ser notificado da decisão, podendo em alternativa este optar por uma das duas vias contenciosas possíveis: o recurso da decisão que decretou o arresto "quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida" ou a oposição à mesma decisão, "quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução", nos termos do disposto nos artigos 388° e 392°, n° 1, do CPC.
Donde que o objecto da oposição versa a alegação de factos ou produção de meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução.
A essa luz, o recorrente parece confundir a efectivação da responsabilização subsidiária que apenas ocorre em sede de execução fiscal e após o preenchimento ou reunião cumulativa dos seus pressupostos legalmente definidos com os pressupostos ou requisitos de que a lei faz depender o arresto.
Em todo o caso, o que há que ponderar prioritariamente é que o arresto visa evitar «a diminuição das garantias de cobrança dos créditos tributários» sendo certo que decorre da lei ser o recorrente responsável subsidiário pelo pagamento dos mesmos.
Questão diferente é a de saber se essa responsabilização se efectivará ou não, mas isso já se liga à acção executiva e não pode nem deve ser confundida com a decisão sobre os fundamentos do arresto como medida cautelar preventiva daquela boa execução.
O arresto constitui uma das providências cautelares explicitante do princípio constitucional de garantia do acesso aos Tribunais consagrada no artigo 20 da CRP e artigo 2/2 da mesma Lei Fundamental e traduz-se na tutela judicial da garantia patrimonial para aquelas situações em que o comportamento doloso ou negligente do devedor a faça perigar por motivo da demora inevitável decorrente da tramitação processual, o chamado « periculum in mora».
Por definição, o arresto é, na verdade, um meio de conservação da garantia patrimonial dos credores. A sua finalidade é evitar que determinado direito de crédito fique insatisfeito por não se encontrarem, no património do devedor, bens suficientes para o pagamento.
O RFP que tenha justo receio de diminuição da garantia patrimonial de cobrança de créditos fiscais quando o imposto estiver liquidado ou em fase de liquidação, pode requerer o arresto dos bens do devedor - assim o dispõe o artº 136º do CPPT ( nº 1/a).
O requerente do arresto fundado no receio de diminuição da garantia patrimonial deduzirá os factos que tornam provável a existência do crédito e justificam o receio invocado (nº 4).
Como decorre do normativo acabado de citar, o requerente do arresto terá de provar factos que permitam concluir pela verificação dos dois requisitos da providência, a saber:-
a)- a provável existência do crédito; e
b)- o perigo de insatisfação do direito.
Efectivamente, o arresto é uma antecipação da penhora pois consiste numa apreensão judicial de bens à qual são aplicáveis as disposições relativas à penhora (artº 402º do CPC) e daí que só possam ser arrestados os bens que possam ser penhorados (Cfr. J. Rodrigues Bastos, «Notas...», Vol. II, 1966, pág. 278) o que está, de resto, em consonância com a finalidade do arresto acima referida.
Trata-se do meio processual destinado a fazer valer o direito concedido pelo Código Civil no seu artº 619º.
Em suma: - o RFP teria de alegar, cumulativamente, além dos factos demonstrativos do imposto ou da sua provável existência, os factos integradores do fundado receio da diminuição de garantias de cobrança do correspondente crédito.
E, como salientam A.J. Sousa e Silva Paixão, CPPT Anotado na 19ª nota ao artº 136º, na fase da declaração do arresto impende sobre o requerente o ónus da prova dos factos integrantes dos respectivos requisitos, não bastando, em consequência, o simples e vago rumor de uma ameaça do requerido de se desfazer dos seus bens, para que se dê como provado que ele se prepara para o concretizar.
E isso porque o receio de diminuição de garantias tem de ser fundado, o que vale dizer, apreciado objectivamente e não apenas na óptica pessoal do requerente.
Pelo que se torna necessário que a FP alegue e demonstre, além do mais, que o devedor teve um comportamento susceptível de provocar fundado receio de diminuição das garantias de cobrança desses créditos. Neste sentido o Ac do TCA de 2000/05/02 in rec 3580/00.
E tudo nos autos aponta para que tal sucedeu, nos exactos termos da sentença recorrida supra transcrita pelo que, em plena adesão aos fundamentos da sentença, dir-se-á que, contrariamente ao que o recorrente sustenta, a lei prevê no artigo 136 do CPPT o arresto dos bens do responsável subsidiário desde que à semelhança do devedor originário haja fundado receio da diminuição da garantia de cobrança de créditos tributáveis e tais tributos estejam liquidados.
O recorrente como sócio -gerente da sociedade devedora originária também se pode considerar devedor para efeitos do art. 136º do CPPT –artº 24º da LGT- está em condições de vir a ser responsabilizado pelo pagamento de tais créditos, o que virá a concretizar-se com o acto administrativo derivante da responsabilidade - a reversão – e, nessa medida, o seu património constitui, também, uma garantia de cobrança dos créditos tributários.
E isso só ocorrerá se houver a certeza de que o recorrente será chamado, por via da reversão, ao pagamento dessas dívidas, o que depende da demonstração dos seguintes requisitos:
a) -Ter sido gerente de direito e de facto da sociedade no período em que as dívidas nasceram ou foram postas à cobrança;
b) -Ocorrer inexistência ou insuficiência do património da sociedade para a satisfação da dívida exequenda e acrescido -art.153º nº2 do CPPT, correspondente ao artº 153º nº 2 do CPT.
«In casu» estamos perante um arresto preventivo o qual, no ensinamento do Prof. Alberto dos Reis in CPC Anotado vol. II pp 6 tem por fim evitar que determinado direito de crédito fique insatisfeito por não se encontrarem no património do devedor bens suficientes para o pagamento
Sobre os fundamentos do arresto, dispõe o artigo 214 do CPPT:
«Havendo justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens pode o representante da FP junto do tribunal Tributário requerer arresto em bens suficientes para garantirem a divida exequenda e o acrescido com aplicação do disposto no presente Código para o arresto no processo judicial tributário.»
Os requisitos do arresto surgem elencados no artigo 136º do CPPT que estabelece que o Representante da Fazenda Pública pode requerer o arresto de bens do devedor de tributos ou do responsável solidário ou subsidiário, quando ocorram, simultaneamente, as circunstâncias seguintes:
a) Haver fundado receio da diminuição de garantia de cobrança dos créditos tributáveis;
b) O tributo estar liquidado ou em fase de liquidação.
Decorre do exposto que o arresto em causa se funda na certeza da existência da divida que está manifestamente demonstrada já que os créditos estão em fase de cobrança e na verificação do justo receio de insolvência do devedor e da diminuição da garantia do património do devedor demonstrada pelo facto de não ter sido infirmado o que se verteu na decisão de arresto: No caso em apreço estão em causa dívidas de IVA, IRC de 2007. A sociedade como sujeito passivo de IVA faz repercutir sobre os seus clientes, relativamente às vendas e prestações de serviços efectuados, uma prestação tributária (art° 36° do CIVA), a qual é obrigado a entregar nos cofres do Estado, nos termos do art° 26° do CIVA. Portanto, relativamente a este tributo, funciona a presunção do n° 2 do art° 214°. No que concerne às restantes dívidas tem de haver factualidade justificadora do justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens.
Depois, não foi feita qualquer prova de que o oponente não era gerente de facto da sociedade no período a que respeitam as dívidas em causa nos autos.
No ponto, diga-se que, quanto ao facto de o devedor não ser o devedor originário mas antes o responsável subsidiário, há que ter em conta que a lei no artigo 136 permite o arresto dos bens desse responsável e que, tratando-se de arresto preventivo, não se exige a demonstração da efectivação da responsabilização subsidiária do arrestado já que ela só pode ser efectivada em sede de execução após despacho de reversão.
E visto que estamos no âmbito de uma providência cautelar o que releva, na senda do Acórdão do STA de 13/ 01/1999 tirado no recurso nº 23073, é saber se aquando do requerimento deste meio cautelar o arrestando já se encontrava em fase de poder vir ser responsabilizado ou melhor ainda se já se verificavam ou se encontravam preenchidos os requisitos de reversão.
Ora, a reversão contra o recorrente como gerente só ocorrerá se face às dívidas em causa, atento o seu montante e período de tempo a que se reportam, se se verificar ter sido o requerido gerente de direito e ter exercido efectivamente a gerência da sociedade executada no período em que as dividas nasceram ou foram postas em cobrança a inexistência ou a insuficiência do património societário para a satisfação da divida em causa (cfr. artigo 24º da LGT e 153 do CPPT).
E tal situação encontra-se provada nos autos, não merecendo censura a sentença recorrida já que a Fazenda Pública alegou a qualidade de gerente do requerido e mediante a junção de documentos provou que da sociedade em causa é sócio gerente o recorrente aí se referindo que por si só obriga a sociedade.
Por outro lado como se vê, da prova produzida, tem de concluir-se, como o fez o Mº Juiz «a quo» que ele assume a gerência efectiva da sociedade executada.
Acresce que está demonstrada a insuficiência do património societário para a satisfação da dívida exequenda e a Fazenda Publica demonstra a inexistência de mais bens penhoráveis no património da sociedade executada.
Está assim demonstrada a insuficiência do património e consequentemente também o preenchimento cumulativo dos pressupostos de reversão já que compete ao revertido neste caso face às dividas em cobrança e ao momento temporal em que nasceram e foram postas à cobrança provar que não foi por culpa sua que o património societário se tornou insuficiente para o seu pagamento.
Destarte, o Tribunal «a quo» não fez errada valoração dos factos dados como provados que por outro lado reputamos suficientes para dirimir a questão.
Daí que este Tribunal analisando todos os factos e documentos juntos aos autos dê igualmente como provados os factos constantes do probatório da sentença recorrida que considera decorrentes da matéria alegada e posteriormente comprovada.
Do que vem dito se conclui que o arrestado e ora opoente não produziu qualquer prova no sentido de afastar os pressupostos de facto em que assentou a decisão que decretou o arresto ou demonstrar o excesso da mesma, mais se verificando os requisitos de decretamento do arresto incidente sobre bens de sua propriedade, enquanto responsável subsidiário e conforme mencionado supra.
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Ademais, como se demonstrou, o arresto de que se trata é uma providência cautelar que pode visar os bens quer do devedor, quer do responsável solidário ou subsidiário (cfr. nº 1 do artº 136º do CPPT), desde que exista receio fundado da diminuição da garantia de cobrança dos créditos e o imposto esteja liquidado.
Saliente-se, no entanto, que são diferentes os pressupostos da responsabilização subsidiária cuja efectivação apenas pode acontecer em sede de execução fiscal dos requisitos definidos para o decretamento do arresto preventivo sobre bens do responsável subsidiário impostas pelo artigo 214 do CPPT.
Na verdade, para que possa ser decretado arresto sobre bens do responsável subsidiário importa apenas verificar se ocorrem os requisitos referidos e ainda se se encontram preenchidos os pressupostos exigidos por lei para poder ordenar-se contra o responsável subsidiário a reversão da execução.
E isso é compatível com a natureza do arresto como providência cautelar, o qual depende da causa que tem por objecto a decisão sobre o mérito, podendo ser intentado como preliminar ou como incidente no próprio processo e, no caso do artº 136º do CPPT, estamos perante arresto enquanto procedimento cautelar e preliminar da execução fiscal.
Apesar do preceito não explicitar em que se traduz a relação de dependência do processo cautelar em relação ao processo principal, essa relação resulta do n.º 1 do artº 383º do CPC quando refere: “ O procedimento cautelar é sempre dependência da causa que tenha por fundamento o direito acautelado e pode ser instaurado como preliminar ou como incidente da acção.
A fortalecer o que fica dito leia-se o disposto no n.º 4 do art.º 383º do CPC, nos termos do qual “ Nem o julgamento da matéria de facto, nem a decisão final proferida no procedimento cautelar, têm qualquer influência no julgamento da acção principal “.
Assim, porque o processo cautelar visa assegurar que as decisões prolatadas na acção principal, não percam a sua utilidade, é um instrumento desta acção.
De facto, toda a doutrina tem assinalado, a par da provisoriedade e da sumariedade, como sinal característico da providência cautelar a sua instrumentalidade em relação à acção principal.
Veja-se a este respeito, entre outros, o Prof. José Carlos Vieira de Andrade, in “ Justiça Administrativa”, 6ª ed. Almedina, pág. 321 e ss.
“O processo cautelar é um processo que tem uma finalidade própria: visa assegurar a utilidade da lide, isto é, de um processo que normalmente é mais longo, porque implica uma cognição plena.
Pode dizer-se que os processos cautelares visam especificamente garantir o tempo necessário para fazer justiça. Mesmo quando não há atraso, há um tempo necessário para julgar bem. E é precisamente para esses casos como aqueles processos em que o tempo tem de cumprir-se para que se possa julgar bem, que é necessário assegurar a utilidade da sentença que, a final, venha a ser proferida.
Em virtude dessa função própria de prevenção contra a demora, as providências cautelares têm características típicas: a instrumentalidade – isto é, a dependência, na função e não apenas na estrutura de uma acção principal cuja utilidade visa assegurar; a provisoriedade - pois que não está em causa a resolução definitiva de um litígio; e a sumariedade – que se manifesta numa cognição sumária de facto e de direito própria de um processo urgente”.
Por conseguinte, e à luz do que fica dito, a sentença sob recurso deve manter-se na ordem jurídica pelo que improcede totalmente a presente oposição ao arresto, mantendo-se o mesmo.
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4. - Face a todo o anteriormente expendido e porque concordamos também com a fundamentação da sentença recorrida que corroboramos, acordam os juízes do TCAS em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo arrestado.
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Lisboa, 07/04/2011
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Joaquim Condesso)



1- Cfr. os Acórdãos do TT 2ª Instância, de 29/10/96, no Recurso nº 63 892 e deste TCA , de 29/06/99, Recurso nº 483/98 e de de 02/05/2000, tirado no Recurso nº 3580/00.