Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2065/11.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:03/21/2019
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:ALVARÁ DE LOTEAMENTO
LICENCIAMENTO
NULIDADE
IMPOSSIBILIDADE DA LIDE
RESPONSABILIDADE PELAS CUSTAS
Sumário:i) Não se esgotando a acção nos pedidos de nulidade dos actos entretanto declarados nulos pela Entidade Demandada, no que ocorre parcialmente a impossibilidade superveniente da lide, haverá esta que prosseguir para conhecimento dos demais pedidos formulados pela Autora.

ii) Sendo posterior à instauração da acção o facto que determinou a impossibilidade superveniente parcial da lide, de acordo com o disposto no art. 536.º, n.ºs 3 e 4 do CPC, é imputável à Entidade Demandada, ora Recorrida, a responsabilidade pelas custas.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

Rosa .................................................................. (Recorrente), Autora nos autos, intentou uma acção administrativa especial contra o Município de Lisboa e contra-interessada T.................................................................., SA., onde peticionou a declaração de nulidade dos actos administrativos, a saber: i) o Despacho proferido pela Exma., Senhora Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa do Pelouro do Urbanismo, Eduarda .........................., no uso de competência que lhe foi delegada, datado de 14 de Agosto de 2003, nos termos do qual se procedeu à retificação do erro material do Alvará de Loteamento n.º …./....,que consagrou o uso terciário para o Lote ..; ii) o Despacho proferido, em 6 de Maio de 2004, pela Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa do Pelouro do Urbanismo, exarado a fls. 311 do Proc. ........../OB/2001, que procede à aprovação do projecto de arquitectura para a edificação a construir no Lote .. do Alvará de Loteamento n.º ..../....; iii) a Deliberação Camarária n.º ........../CM/2008, nos termos da qual, foi deferido o pedido de licenciamento de obra de edificação de uma construção nova de um edifício destinado a escritórios, a levar a efeito na Rua .........................., lote n.º ..., em área designada por Urbanização Norte do ......................................., que constituiu o Processo ........../OB/2001; iv) o alvará de licenciamento de obras de construção n.º 4/C/2008,a que se refere o processo municipal n.º ........../0B/2001, em nome de T........................................................................., S.A., que titula a aprovação das obras que incidem sobre o prédio sito em Rua .........................., lote … da freguesia de ................................................. Bem como ao restabelecimento da situação que existiria se os actos não tivessem sido praticados e à condenação do Município de Lisboa à reparação dos danos resultantes da sua actuação administrativa ilegal.

Por sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 9.06.2015, foi declarada extinta a instância por impossibilidade da lide e absolvida a Entidade Demandada da instância.

Com aquela não se conformando, a Autora, ora Recorrente, recorre para este Tribunal Central, retirando-se da sua alegação as conclusões que infra se reproduzem:

1 - Em 14 de Julho de 2011 - O Senhor Vereador Manuel ................... elaborou, no seu Gabinete, a proposta nº …./ …., no sentido da declaração de nulidade do acto de rectificação ao alvará de loteamento n° …./…. (Urbanização Norte do Benfica), conforme doe. Junto aos autos a fls 1136 a 1144 dos autos.

2 - Em 19 de Julho de 2011 foi instaurada a presente acção em tribunal (conforme fls 2 dos autos) na qual se pede a declaração de nulidade da rectificação ao alvará ..../.... que permitiu a alteração de uso do respectivo lote 11, de habitacional para terciário e subsequentes actos de licenciamento que permitiram a construção de um edifício com fins terciários. Mais se pede na mesma Petição Inicial com fundamento nas nulidades e na violação de diversas normas legais e regulamentares urbanísticas, a demolição parcial desse edifício e a retirada do equipamento da sua cobertura e a condenação no pagamento de indemnização no valor de € 42.800,00.

3 - Em 20 de Julho de 2011 foi Aprovado pelo Plenário da Câmara Municipal de Lisboa da proposta n° ......./.........., apresentada pelo Senhor Vereador, Manuel ..................., conforme fls fls 1089 a 1091 dos autos, que declara a nulidade da rectificação do alvará ..../.... bem como de todos os actos administrativos subsequentes relativos ao lote 11.

4 - Em 21 de Julho de 2011 foi Publicada a aprovação da proposta n° ......./.........., no Boletim Municipal nº 909 conforme doc. Junto a fls 1089 a 1091 dos autos.

5 - Da cronologia supra referida é facilmente constatável que, à data da instauração dos presentes autos, ainda a Ré, não tinha declarado a nulidade dos actos impugnados pelo Autor.

6 - Pelo que não existe qualquer impossibilidade originária, por falta de objecto.

7 - A aprovação da proposta nº ......./.......... é um acto administrativo de uma autarquia que tem eficácia externa que nos termos do disposto no art. 91° da Lei das Autarquias Locais, está sujeito a publicação obrigatória.

8 - Enquanto, o acto administrativo não foi publicitado no respectivo Boletim Municipal no Boletim Municipal n° 909 de 21.07.11, o mesmo não é eficaz, ou seja, não produz os seus efeitos jurídicos.

9 - Mesmo a existir qualquer inutilidade da lide no que respeita à nulidade já declarada, a mesma só poderá ser superveniente e parcial.

10 - O edifício destinado a fins terciários construído no lote 11 do alvará ..../.... ao abrigo da declaração de rectificação e restantes actos de licenciamento declarados nulos, viola também diversas regras legais urbanísticas e regulamentares, pelo que, como supra referido no n° 2 destas conclusões, na petição Inicial a Autora, formula pedidos de demolição parcial, retirada de equipamento e de pedido de indemnização, como se extrai da leitura do petitório.

11 - A eventual inutilidade decorrente da declarada nulidade não terá como consequência a absolvição da instância do Réu, mas sim, o prosseguimento dos autos para discussão dos restantes pedidos formulados pela Autora na Petição Inicial sobre os quais a Douta Sentença recorrida é omissa, o que gera omissão de pronúncia e nulidade da Sentença prevista no artigo 615° nº 1d) do Código de Processo Civil.

12- Acresce que, a A. utilizou a faculdade da modificação objectiva da instância prevista no art. 64º do CPTA e também requereu a ampliação do pedido.

13 - Mas mesmo que a A. não tivesse utilizado a faculdade de modificação objectiva da instância prevista no art. 64º do CPTA, o que não se concede, a não utilização de tal faculdade não teria como consequência a absolvição da instância do R., mas sim, o prosseguimento dos autos para discussão dos restantes pedidos.

14 - Até porque, o edifício construído com base nos actos impugnados que foram declarados nulos pelo Réu continua edificado no lote …. Ou seja, continua a constituir uma construção ilegal, não só porque a rectificação ao alvará de loteamento nº ..../.... era nula, mas também, porque consubstancia uma clara violação de todos os outros preceitos legais devidamente identificados na Petição Inicial pela A.

15 - Por fim, a douta Sentença recorrida condena a A. nas custas do presente processo, nos termos do disposto no art. 450°, n° 3, 1ª parte do CPC.

Salvo o devido respeito, mais uma vez, existe uma clara violação de lei.

16 - A douta Sentença recorrida não atendeu ao disposto no n° 3 e nº 4 do art. 536º do Código de Processo Civil.

Quando a alegada inutilidade superveniente da lide decorra da satisfação voluntária por parte do réu da pretensão do autor, a responsabilidade pelas custas fica a cargo daquele (réu).

17 - Desta forma, mesmo que se considere que existe uma inutilidade superveniente com absolvição da instância do Réu, o que não se concede, as custas deverão ficar a cargo deste e não da Autora.

18 - Por tudo o supra alegado entende-se que a Douta Sentença Recorrida deverá ser declarada nula por violação do disposto nos artigos 89° e 95° do CPTA.

Termos em que e, nos Melhores de Direito e, com o sempre Mui Douto Suprimento de V. Exas. deve o presente Recurso ser considerado procedente por provado e, em consequência ser revogada a Douta Sentença Recorrida, devendo ainda:

a) ordenar-se o prosseguimento dos autos para conhecimento dos pedidos formulados pela Autora; e

b) caso se entenda pela existência de inutilidade da lide na parte referente às nulidades sub Júdice, declarar-se que a inutilidade é superveniente e parcial.

E, assim, se fará JUSTIÇA!”

A contra-interessada nos autos apresentou contra-alegações, concluindo conforme seguidamente se transcreve:

“A – DA FALTA DE OBJECTO DO PRESENTE RECURSO

1ª. Nas suas alegações e conclusões a ora recorrente não impugnou a decisão efectivamente proferida pelo douto Tribunal a quo, que julgou extinta a instância por falta de objecto, em consequência da declaração de nulidade dos actos sub judice, constante da deliberação da CML, de 2011.07.20, e da “nova regulação da situação” introduzida por este acto (v. art. 64º/1 do CPTA), que a recorrente reconhece agora expressamente “não te(r) interesse” em impugnar (v. fls. 24 e 25 das alegações) – cfr. texto n.º s 1 e 2;

2ª. Não tendo sido indicados pela recorrente – como lhe competia (v. art. 635º do NCPC) – os “fundamentos de facto porque se pede a revogação (…) e as concernentes normas jurídicas violadas” (v. Ac. STA de 1992.03.17, BMJ 415/312), no tocante à concreta decisão proferida – extinção da instância –, esta não pode ser modificada (v. art. 635º/5 do NCPC; cfr. art. 684º/4 do anterior CPC) – cfr. texto n.º 2;

3ª. Os restantes pedidos consequentes formulados pela ora recorrente na p.i. e que agora pretende sejam apreciados – demolição parcial e indemnização – foram formulados “com fundamento nas nulidades e na violação de diversas normas legais e regulamentares urbanísticas” invocadas na p.i. (v. conclusão 2ª das alegações da ora recorrente) – cfr. texto n.º s 2 e 3;

4ª. Os referidos pedidos consequentes eram e são teleológica e funcionalmente dependentes dos pedidos de declaração de nulidade e anulação dos actos administrativos impugnados, pelo que não foram, nem podiam ser objecto de apreciação e decisão pelo douto Tribunal a quo (v. arts. 608º, 615º e 627º e segs. do NCPC; cfr. arts. 660º, 668º e 676º e segs. do anterior CPC e art. 334º do C. Civil) –cfr. texto n.º s 2 e 3;

B – DA INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO DE PRONÚNCIA

5ª. No caso em análise não se verifica qualquer omissão de pronúncia (v. art. 615º/1/d) do NCPC), pois, face à declaração de nulidade dos actos sub judice, pela deliberação da CML, de 2011.07.20, e da “nova regulação da situação” introduzida por este acto (v. art. 64º/1 do CPTA), os pedidos de demolição parcial e indemnização formulados na p.i., em consequência ou como “prolongamento lógico” e funcional da declaração judicial de nulidade ou anulação daqueles actos, nunca poderiam manter-se (v. art. 554º do NCPC; cfr. art. 469º do anterior CPC, arts. 46º e 47º do CPTA e Ac. TCA Sul de 2008.01.24, Proc. 2553/07, in www.dgsi.pt), estando prejudicados pela falta de objecto da lide (v. Ac. STA de 2011.12.07, Proc. 0750/11, in www.dgsi.pt) – cfr. texto n.º s 4 e 5;

C – DA EXTINÇÃO DA INSTÂNCIA POR INUTILIDADE DA LIDE

CA – DOS PEDIDOS DE DECLARAÇÃO DE NULIDADE

6ª. Tendo os actos impugnados na presente acção sido declarados nulos pela deliberação da CML, de 2011.07.20, da qual consta uma “nova regulação da situação” (v. art. 64º/1 do CPTA), é manifesto que deverá manter-se a decisão recorrida, de extinção da instância por inutilidade ou impossibilidade, face à respectiva falta de objecto, ex vi do art. 277º/e) do NCPC (v. art. 287º/e) do anterior CPC e arts. 1º e 140º do CPTA), pois aqueles actos não produziram quaisquer efeitos jurídicos ab initio (v. art. 134º do CPA e art. 162º do NCPA; cfr. art. 8º/1 do DL 4/2015, de 7 de Janeiro, art. 611º do NCPC e art. 663º do anterior CPC) – cfr. texto n.º s 6 e 7;

7ª. Confrontada com a declaração de nulidade dos actos sub judice, a ora recorrente não requereu a alteração do objecto do presente processo dentro do prazo de impugnação judicial do novo acto (v. n.º 8 dos FP; cfr. arts. 58º, 59º e 64º do CPTA, art. 5º do NCPC, art. 264º do anterior CPC e arts. 334º e 342º do C. Civil), pelo que nunca poderia pretender que fossem agora apreciados os pedidos consequentes de demolição parcial e indemnização, que ficaram prejudicados pela falta do objecto da presente acção – cfr. texto n.º 8;

8ª. A ora recorrente não pode assim prevalecer-se das suas próprias omissões no cumprimento de ónus processuais (v. art. 5º do NCPC, art. 264º do anterior CPC e arts. 334º e 342º do C. Civil), pois “é ao recorrente que incumbe definir a situação jurídica administrativa que pretende submeter à apreciação do Tribunal, indicando, designadamente, o seu objecto” (v. Acs. STA de 2002.11.07; cfr. Ac. STA de 2009.03.11, Proc. 1074/2009, in www.dgsi.pt), não merecendo qualquer censura a decisão de julgar extinta a instância por impossibilidade da lide (v. art. 277º/e) do NCPC, arts. 287º/e) do anterior CPC e art. 64º do CPTA) – cfr. texto n.º s 8 e 9;

CB – DOS RESTANTES PEDIDOS

9ª. Os pedidos de demolição parcial e indemnização formulados pela ora recorrente, em consequência ou como “prolongamento lógico” do pedido principal, nunca poderiam manter-se (v. art. 554º do NCPC; cfr. art. 469º do anterior CPC e arts. 46º e 47º do CPTA), tanto mais que foram impugnados “com fundamento nas nulidades e na violação de diversas normas legais e regulamentares urbanísticas” (v. conclusão 2ª das alegações da ora recorrente) – cfr. texto n.º s 10 a 12;

10ª. Não subsistindo actualmente, por falta de objecto, o pedido principal que constituía o pressuposto essencial dos restantes pedidos formulados (v. arts. 277º/e) e 611º do NCPC; cfr. arts. 287º/e) e 663º do anterior CPC e art. 64º do CPTA), nunca seria possível ao Tribunal a quo apreciar e decidir a legalidade dos actos impugnados, cuja nulidade foi declarada pela deliberação da CML, de 2011.07.20, pois tal matéria, por razões imputáveis à própria recorrente (v. art. 5º do NCPC; cfr. art. 264º do anterior CPC e arts. 334º e 342º do C. Civil), não integra o objecto do presente processo (v. art. 64º do CPTA e art. 106º do RJUE; cfr. Ac. STA de 2009.03.11, Proc. 1074/2009; Ac. TCA (Norte), de 2009.01.22, Proc. 01581/04.5 BEPRT, in www.dgsi.pt) – cfr. texto n.º s 13 e 14;

D – DA RESPONSABILIDADE DA ORA RECORRENTE POR CUSTAS

11ª. A responsabilidade por custas resulta, em primeira linha, do princípio da causalidade, segundo o qual deve ser condenada em custas a parte que lhes deu causa (v. art. 527º do NCPC; cfr. art. 446º do anterior CPC) – cfr. texto n.º s 15 e 16;

12ª. O disposto no art. 536º/3 do NCPC, correspondente ao art. 450º/3 do anterior CPC – nos “casos de extinção por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu” –, “é aplicável independentemente do facto que determine a impossibilidade ou inutilidade da lide”, de acordo com o Assento do STJ n.º 4/77, de 9 de Novembro (v. Ac. STJ de 1977.11.09, Proc. 066408, in www.dgsi.pt) – cfr. Texto n.º 17;

13ª. A A. e ora recorrente deu causa (a) à acção, (b) à decisão de extinção da instância, por impossibilidade superveniente da lide, pois não requereu – como lhe competia – o respectivo prosseguimento para apreciação da legalidade da deliberação da CML, de 2011.07.20, nos termos do art. 64º do CPTA (v. n.º 8 dos FP), originando a falta de objecto da presente acção, e (c) ao presente recurso, pois não se conformou com a decisão de extinção da instância – cfr. texto n.º 17;

14ª. O douto acórdão recorrido não merece qualquer censura na parte em que decidiu – e bem – condenar a ora recorrente em custas, nos termos do art. 563º/3 do NCPC (cfr. art. 450º/3 do anterior CPC) – cfr. texto n.º s 17 e 18.

NESTES TERMOS,

Deve ser rejeitado ou negado provimento ao presente recurso, mantendo-se o douto acórdão recorrido, de 2015.06.09, com as legais consequências.



Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, notificada nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 146.º do CPTA, pronunciou-se no sentido de ser concedido provimento ao recurso apresentado, entendendo ocorrer a nulidade por omissão de pronúncia suscitada.


Corridos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do

I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em saber:

- Se a decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia;

- Se a decisão recorrida errou ao concluir pela impossibilidade originária da lide;

- Se a decisão recorrida errou ao condenar a A. em custas.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a qual se reproduz ipsis verbis:

1 – Os actos impugnados na presente acção são os seguintes:

- O Despacho proferido pela Exma, Senhora Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa do Pelouro do Urbanismo, Eduarda .........................., no uso de competência que lhe foi delegada, datado de 14 de Agosto de 2003, nos termos do qual se procedeu à rectificacão do erro material do Alvará de Loteamento n.º ..../....,que consagrou o uso terciário para o Lote …;

- O Despacho proferido, em 6 de Maio de 2004, pela Vereadora da Câmara Municipal de Lisboa do Pelouro do Urbanismo, exarado a fls. 311 do Proc. ........../OB/2001, que procede à aprovação do projecto de arquitectura para a edificação a construir no Lote … do Alvará de Loteamento n.º ..../....;

- A Deliberação Camarária n.º …./CM/2008, nos termos da qual, foi deferido o pedido de licenciamento de obra de edificação de uma construção nova de um edifício destinado a escritórios, a levar a efeito na Rua .........................., lote n.º …, em área designada por Urbanização Norte do ......................................., que constituiu o Processo ........../OB/2001; e

- O alvará de licenciamento de obras de construção n.º …/C/2008,a que se refere o processo municipal n.º ........../0B/2001, em nome de T........................................................................., S.A., que titula a aprovação das obras que incidem sobre o prédio sito em Rua .........................., lote … da freguesia de ................................................, cfr. proémio e petitório da p.i.;

2 - Em 2011.07.14, o Senhor Vice-Presidente da CML, Arq. Manuel ..................., apresentou a proposta n.º ......./.........., no sentido da declaração de nulidade dos actos administrativos relativos ao lote … da Urbanização Norte do ........, aí identificados, cujo teor é o seguinte:


"texto integral no original; imagem"

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cfr. fls 1140-1148 dos autos em suporte de papel;

3 - Por deliberação da CML, de 2011.07.20, foi aprovada a referida proposta, tendo sido declarada a "nulidade da rectificação do alvará de loteamento n.º ..../...., de 14 de Agosto de 2003, bem como de todos os actos administrativos subsequentes relativos ao lote 11, nomeadamente do acto de licenciamento constante da Deliberação n.º …/CM/2008, de 30 de Janeiro de 2008;

4 - A referida deliberação da CML, de 2011.07.20, foi notificada pelo R. à C.I., por ofício de 2011.07.29, cfr. fls 1139 dos autos;

5 – A A. só tomou conhecimento da mesma deliberação na pendência dos autos;

6 – A p.i. da presente acção foi apresentada em juízo no dia 19.7.2011, cfr. fls 1 do processo virtual;

7 – A C.I. impugnou judicialmente a deliberação do R. identificada supra em 3., na parte em que lhe é desfavorável, correndo o respectivo processo judicial os seus termos neste tribunal sob o n.º 3087/11.7BELSB, cfr. admite a C.I. no art.º 3.º do requerimento de fls 1279 dos autos e a A. a fls 1226 dos autos, em requerimento apresentado no dia 26.7.2012, cfr. fls 1219 e consulta aos autos através do SITAF realizada na presente data; e

8 – A A. não apresentou, até á data, qualquer requerimento de modificação do objecto da presente instância após ter tido conhecimento da deliberação referida supra em 3., desconhecendo-se se a impugnou em processo autónomo.”

Por se mostrar assente documentalmente, acorda-se em aditar ao probatório que vem fixado o seguinte facto:

8ª – A publicação da aprovação da proposta nº ......./.........., ocorreu no Boletim Municipal nº 909, de 21.07.2011 (cfr. doc. junto a fls. 1089-1091).



II.2. De direito

II.2.1. Do mérito do recurso

A ora Recorrida julgou extinta a instância por impossibilidade da lide, com base na seguinte fundamentação:

“ (…) Tendo em conta que os actos impugnados, objecto dos pedidos de declaração de nulidade formulados na p.i. foram declarados nulos pela deliberação da CML, de 2011.07.20, que aprovou a proposta apresentada pelo Senhor Vereador Manuel ..................., datada de 14.7.2011, cujo teor foi inteiramente reproduzido supra em 2., os presentes autos carecem de objecto, como bem refere a CI nos art.ºs 12.º a 19.º da contestação por si apresentada.

Acresce que a mencionada falta de objeto da presente acção, embora sendo originária, uma vez que, à data da apresentação da p.i. (19.7.2011) já tinha sido proferida a declaração de nulidade pelo R.., foi de conhecimento superveniente da A..

A A. podia ter usado da faculdade de modificação objectiva da instância prevista no art.º 64.º do CPTA, mas ainda não o fez. Veja-se a este propósito, entre outros, Mário Aroso de Almeida, in Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2012, pág. 395.

Face à declaração de nulidade dos actos ora impugnados, a acção carece de objecto, o que acarreta a impossibilidade da lide.

Fica, assim, prejudicado o conhecimento das demais excepções invocadas. (…)”

Porém, o assim decidido não se pode manter.

Quanto à nulidade por omissão de pronúncia esta não ocorre porque nos termos em que a causa foi decidida, os pedidos formulados pela A. e não conhecidos pelo tribunal a quo ficaram prejudicados face ao entendimento de que na sequência da declaração de nulidade dos actos impugnados, a acção passou a carecer de objecto. Ou seja, o tribunal a quo entendeu que os demais pedidos eram funcionalmente dependentes dos pedidos de declaração de nulidade e anulação dos actos administrativos impugnados, pelo que não careciam de ser apreciados.

No caso, a nulidade invocada, prevista no art. 615.º, nº 1, al. d), do CPC, ocorre quando “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”. Esta nulidade decisória por omissão de pronúncia, está directamente relacionada com o comando inserto na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do CPC (correspondente ao artigo 660.º do CPC antigo) de acordo com o qual o tribunal “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada para a solução dada a outras”.

Questão distinta é a do acerto do juízo tirado precisamente sobre esse juízo de prejudicialidade, o que escapa ao âmbito da nulidade suscitada e antes se inscreve no erro de julgamento.

E neste particular temos que a sentença recorrida apenas se pronunciou relativamente aos actos impugnados objecto dos pedidos de declaração de nulidade formulados na p.i. e que foram declarados nulos pela citada deliberação da Câmara Municipal de Lisboa de 20.07.2011.

Ora, tal como vem referido no recurso, os pedidos formulados pela Autora não se esgotam na declaração de nulidade dos actos conhecidos na sentença recorrida, abrangendo, também, pedidos de demolição, retirada de equipamentos e indemnização por responsabilidade civil extracontratual. E esses pedidos apresentam fundamentos autónomos, quer de facto, quer de direito, como se extrai da causa de pedir – complexa – vertida na p.i..

Assim sendo, atalhando caminho, a apreciação efectuada pelo tribunal a quo não atendeu aos concretos contornos da causa de pedir constante da p.i., sustentando uma impossibilidade da lide que é, afinal, apenas parcial.

Relembre-se que foi peticionada a nulidade do despacho da Vereadora Eduarda .........................., de 14.08.2003, que rectificou o alvará de loteamento nº ..../...., que consagrou o uso terciário para o Lote …, bem como dos actos subsequentes identificados na p.i.. Mas foi igualmente peticionado quer o restabelecimento da situação que existiria se os actos não tivessem sido praticados, quer a condenação do Município de Lisboa à reparação dos danos resultantes da sua actuação administrativa ilegal. Com fundamento em ilegalidade do Alvará de licenciamento de obras referente ao prédio sito na Rua .......................... lote … da freguesia de ................................................, foi pedida a demolição parcial do edifício construído nesse lote, nos seguintes termos:

1. Demolição em altura de 7,5 metros.

2. Demolição de pelo menos 23 metros em cada um dos pisos juntos aos prédios da Rua ...........................

3. Caso com a demolição em altura continuem a existir fachadas com compartimentos habitacionais que confrontem com a construção implantada no lote … terão que ser:

3.1. Demolidos 36 metros (e não apenas 23 metros) em todos os pisos juntos aos mesmos prédios prédios da rua ...........................

3.2. Demolidos 39 metros junto aos prédios da Rua ...................................,

4. Retirada de todod o equipamento existente na cobertura do edifício e das torres de exaustão junto aos terraços dos prédios contíguos”.

E

caso assim não se entenda, seja condenada a entidade demandada a pagar à Autora um valor a título de danos patrimoniais e não patrimoniais nunca inferior a EUR 42.800,00 (…).”

A estes pedidos correspondem, por referência a causa de pedir constante da p.i., os artigos 536.º e s. e 564.º e s., respectivamente.

Donde, devem os autos prosseguir para conhecimento dos pedidos cumulados com os pedidos de declaração de nulidade, não havendo lugar à aplicação do disposto no art. 64.º do CPTA (revogação do acto com efeitos retroactivos e continuação da acção contra o novo acto), uma vez que os pedidos já haviam sido formulados anteriormente.

Assim, haverá que julgar o recurso procedente, revogando a sentença recorrida que julgou extinta a instância quanto a todos os pedidos e determinar a baixa dos autos para conhecimento dos demais pedidos formulados e não conhecidos. Com efeito, a impossibilidade da lide apenas ocorre quanto aos actos impugnados objecto dos pedidos de declaração de nulidade formulados na p.i. e que foram declarados nulos pela deliberação camarária.

Por outro lado, considerando a cronologia supra evidenciada no probatório, temos que à data da instauração dos presentes autos, em 19.07.2011 (cfr. o provado em 6.), o acto de declaração de nulidade dos actos impugnados pela A., que é de 20.07.2011, foi publicado em 21.07.2011 como constante do Boletim Municipal nº 909 (cfr. doc. Junto a fls. 1089-1091). Ou seja, em data posterior à instauração da presente acção.

Donde, também se verificar o imputado erro de julgamento quanto à condenação em custas, pois que terá que aplicar-se o disposto no art. 536.º, n.ºs 3 e 4 do CPC, sendo imputável à Demandada, ora Recorrida, a responsabilidade pelas custas.



III. Conclusões

Sumariando:

i) Não se esgotando a acção nos pedidos de nulidade dos actos entretanto declarados nulos pela Entidade Demandada, no que ocorre parcialmente a impossibilidade superveniente da lide, haverá esta que prosseguir para conhecimento dos demais pedidos formulados pela Autora.

ii) Sendo posterior à instauração da acção o facto que determinou a impossibilidade superveniente parcial da lide, de acordo com o disposto no art. 536.º, n.ºs 3 e 4 do CPC, é imputável à Entidade Demandada, ora Recorrida, a responsabilidade pelas custas.



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

- Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida, também quanto a custas; e

- Ordenar a baixa dos autos para apreciação dos demais pedidos formulados.

Custas pela Entidade Demandada a considerar em regra de custas a final na parte em que gerou a impossibilidade parcial da lide; custas pela Contra-interessada nesta instância de recurso.

Lisboa, 21 de Março de 2019



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Pedro Marchão Marques


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Alda Nunes


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Cristina Santos