Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04885/11
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:10/11/2011
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL.
PRAZO.
CITAÇÃO.
FACTO SUPERVENIENTE
Sumário:1.A oposição à execução fiscal pode ser deduzida pelo executado no prazo de 30 dias a contar da citação pessoal, e tendo-a havido, o seu termo inicial não pode contar-se a partir da ocorrência de qualquer um outro evento;

2. Os factos supervenientes que autorizam que a oposição seja deduzida no prazo a contar da sua ocorrência ou conhecimento, apenas se podem reportar àqueles que constituam fundamentos da oposição a integrar em alguma das alíneas do art.º 204.º do CPPT, não abrangendo as ocorrências processuais que tenham tido lugar nos autos de execução fiscal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. O Exmo Representante da Fazenda Pública (RFP), dizendo-se inconformado com a sentença proferida pela M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, que julgou procedente a oposição à execução fiscal deduzida, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


A. A douta sentença ora recorrida enferma de erro de julgamento, porquanto considerou como fundamento legal da oposição, a notificação da penhora/citação pessoal indevidamente remetida à ora oponente no período de suspensão da execução.
B. Aquela notificação foi emitida em 16/09/2007 e recebida pela executada em 1/10/2007.
C. A suspensão da execução foi ordenada por douto despacho de 12/09/2007, proferido nos autos de reclamação judicial n° …………….
D. Embora emitida indevidamente após a suspensão do processo executivo, aquela notificação de penhora/citação pessoal não tem a virtualidade de fazer renascer novo prazo de oposição e, nessa medida não poderá constituir facto superveniente para efeitos do disposto no artigo 203, n° 1 do CPPT.
F. Nem tal notificação constituirá fundamento susceptível de ser integrado em alguma das previsões das várias alíneas do artigo 204°, n° 1 do CPPT.
G. A pretender sindicar aquele acto praticado em período de suspensão da execução, haveria a executada e ora oponente dele reclamar perante o órgão de execução fiscal e não deduzir oposição a qual será sempre intempestiva, pois já havia sido citada para a execução em 14/05/2002.

Assim,
Pelas razões acima expendidas A representação da Fazenda Pública requer seja revogada a sentença recorrida, E substituída por decisão que julgue a oposição improcedente.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito suspensivo.


A Exma Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser concedido provimento ao recurso, por a oposição ter sido deduzida fora do prazo para o efeito previsto e não constituir o meio processual próprio para a defesa dos direitos e interesses em causa.


Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. A única questão a decidir consiste em saber se a presente oposição à execução fiscal foi deduzida fora do prazo que a lei prevê para o efeito, sendo extemporânea.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório a M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
A) Por carta registada com aviso de recepção assinado e 2002.05.14, a Oponente foi citada no processo de execução fiscal nº ………….;
B) Em 2007.06.26, veio deduzir acção para reconhecimento de direito, na qual termina pedindo a admissão do pagamento a prestações da dívida exequenda ou, caso assim não se entenda, a aplicação do mecanismo da compensação de créditos extra-fiscais que detém sobre o Estado com as dívidas fiscais.
C) Por ofício datado de 2007.06.28, foi notificada:
i. Da rectificação das datas de publicação de venda;
ii. Não prevendo o artigo 169° CPPT a atribuição de efeito suspensivo da execução à acção para reconhecimento de direito ou interesse legítimo, a não suspensão do processo de execução fiscal, por não estarem reunidos os pressupostos do artigo 169/1 CPPT;
D) E em 2007.07.11, reclamou deste despacho, acção que correu termos neste Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja sob o nº…………….;
E) Por ofício datado de 2007.07.31, foi comunicada a marcação de venda, com abertura de propostas agendada para o dia 25 de Setembro de 2007, pelas 10.00h;
F) E, por novo ofício de 2007.08.06, foi transmitido o despacho que se transcreve:
i. Processo executivo nº …………….. e apensos;
ii. Despacho
iii. A executada vem no requerimento que antecede requerer a subida imediata dos autos ao processo de execução fiscal com o nº ……………… e apensos, com a consequente suspensão do referido processo e cancelamento da publicação dos anúncios de venda da sede da executada, em 2007.08.03 e 2007.08.10;
iv. Sobre esta pretensão já tinha recaído despacho (delegado) de 2007.07.13, a fls. 1017 destes autos, pelo que corroboro todo o conteúdo do mesmo;
v. Assim, não suspendo o processo executivo em causa, pelo que o processo não subirá ao TAF de Seja e, não haverá cancelamento dos anúncios de venda, pelo menos até que o TAF de Beja decida em contrário;
vi. [local e assinatura];
G) Em 2007.09.05, no processo nº …………, foi proferido despacho do qual se extracta:
i. (...) a presente reclamação [funda-se] em prejuízo irreparável ( . . . ),
ii. Deste modo, e sem prejuízo do que vier a ser decidido a final, determino que os presentes autos tenham tramitação urgente, efeito suspensivo e subida imediata nos próprios autos de execução fiscal ( . . . );
iii. Notifique a pessoa do Chefe de Serviço de Finanças de Beja, através de carta registada com aviso de recepção do despacho que antecede, bem como para, no prazo de 2 (dois) dias, enviar (...) o processo executivo (...);
H) Posteriormente, em 2007.10.01, a Oponente recebeu ofício de notificação da penhora/citação pessoal, datado de 2007.09.16, no qual o Chefe de Finanças informa ter sido penhorado, em 2007.06.26, no âmbito do processo de execução fiscal nº ………………, o prédio urbano inscrito na matriz predial respectiva da freguesia de s. ………………. sob o artigo ………, fracção A e para reclamar, querendo;
I) Em 2007.11.05, no Serviço de Finanças de …….., deu entrada a presente oposição.

b) Motivação
Os factos apurados resultam dos documentos e informações constantes do processo.


4. Para julgar procedente a oposição à execução fiscal deduzida considerou a M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que não obstante o prazo de 30 dias já ter decorrido para deduzir a oposição a contar da citação pessoal, a mesma é de admitir ao abrigo de facto superveniente por a execução fiscal não obstante se encontrar suspensa o órgão da execução fiscal nela ter continuado a praticar actos sendo este o meio processual adequado para fazer valer o direito da oponente à anulação desses actos praticados.

Para a recorrente Fazenda Pública, de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, é contra esta fundamentação que vem esgrimir argumentos tendentes a exercer um juízo de censura sobre a decisão recorrida em ordem à sua revogação ou alteração, continuando a pugnar que tal oposição é intempestiva e que a apreciação da eventual ilegalidade da notificação/citação de penhora, posteriormente efectuada apenas poderia ser efectuada através da reclamação prevista no art.º 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Vejamos então.
Como não se encontra em causa, a ora recorrida foi citada pessoalmente, no âmbito desta execução fiscal, em 14-5-2002 e apenas em 5-11-2007 veio deduzir a presente oposição à execução fiscal – cfr. matéria das alíneas A) e I) do probatório fixado na sentença recorrida – pelo que, manifestamente, foi fora do prazo de 30 dias que tinha para o efeito nos termos do disposto no n.º1, alínea a) do art.º 203.º do CPPT.

Acontece que, em 1-10-2007, a ora recorrente foi de novo “citada” do despacho do órgão da execução fiscal em que lhe comunicava a penhora efectuada – cfr. matéria da alínea H) da mesma sentença – em que se lhe comunicava a penhora efectuada no imóvel abaixo identificado, e que de tal despacho poderia reclamar em 10 dias ou, não tendo ainda sido pessoalmente citada, a mesma também valeria como citação, onde, assim poderia deduzir oposição em 30 dias, como se pode colher do respectivo documento de cobrança cuja cópia consta a fls 12 dos autos.

Ora, como no caso a mesma já havia sido anteriormente citada pessoalmente, como se não encontra em causa, tal comunicação apenas poderia valer como notificação dessa penhora efectuada, nos termos do disposto nos art.ºs 231.º do CPTT e 838.º do CPC, como nela, expressamente, se menciona, pelo que nem se coloca a questão de com base nela, se fundar o termo inicial, de novo prazo, para deduzir a oposição, como 2.ª citação (que sempre seria irrelevante, por apenas valer a primeira).

Mas será que tal notificação pode valer como facto superveniente para nele fazer iniciar o termo inicial para a dedução da mesma oposição, ao abrigo, agora, do disposto na alínea b) do n.º1 do mesmo art.º 203, como se decidiu na sentença recorrida?

A nossa resposta é negativa, desde logo por uma questão de sistematização da ordem por que o executado pode aproveitar os prazos que a lei lhe confere para deduzir a oposição e que o intérprete não pode deixar de ter em conta na interpretação da lei (cfr. art.º 9.º do Código Civil): se o mesmo deixou esgotar o prazo para a deduzir ao abrigo da sua primeira alínea (a contar da data da sua citação pessoal), não pode o mesmo voltar a abrir-se ou a renovar-se, agora ao abrigo de uma posterior alínea, por força do princípio da eventualidade ou da preclusão dos actos processuais, em suma, tendo havido citação pessoal válida, o termo inicial do prazo para deduzir a oposição não pode contar-se a partir de qualquer um outro evento posterior ocorrido nos autos de execução, como aliás, constitui jurisprudência corrente (1).

Por outro lado também, apenas é susceptível de subsumir na alínea b) do n.º1 do art.º 203.º, referido, em factos supervenientes, os fundamentos da oposição aduzidos pelo oponente, que mais tarde tenham ocorrido ou lhe tenham chegado ao seu conhecimento, onde se não integram neste conceito os factos processuais próprios da execução fiscal, como sejam a penhora de bens ou a sua notificação ao executado, e que têm uma forma processual própria para o executado conhecer da sua ilegalidade, que é através da reclamação prevista no art.º 276.º do CPPT, como bem invoca, quer a recorrente, quer a Exma RMP, junto deste Tribunal, no seu parecer.


Procede assim, a matéria das conclusões das alegações do recurso, sendo de lhe conceder provimento e de revogar a sentença recorrida, que em sentido contrário decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em conceder provimento ao recurso e em revogar a decisão recorrida, rejeitando-se a oposição, por extemporânea.


Custas pela recorrente, mas apenas na 1.ª Instância, por não haver contra-alegado.


Lisboa, 11 de Outubro de 2011
Eugénio Sequeira
Aníbal Ferraz
Pedro Vergueiro


(1) Cfr. neste sentido, Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª Edição, revista e aumentada, 2000, Vislis, nota 4, págs.878/879 e o acórdãos do STA de 20-5-1998, de 10-10-2000 e de 24-11-2010, proferidos nos recursos n.ºs 21094, 24932 e 54/10, respectivamente.