Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:787/22.0 BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:03/02/2023
Relator:VITAL LOPES
Descritores:DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA
ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA
DÉFICE INSTRUTÓRIO DO PEDIDO
PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO
Sumário:I - Invocando o executado a manifesta falta de meios económicos por insuficiência de bens penhoráveis susceptíveis de garantir a dívida exequenda e o acrescido, em ordem a obter a dispensa de prestação de garantia (cf. art.º 52.º, n.º 4, da LGT), incumbe-lhe o ónus de alegar e demonstrar os factos susceptíveis de integrarem essa insuficiência, o que deve fazer com o requerimento de pedido, instruindo-o com a documentação pertinente (cf. art.º 342.º do CC, art.º 77.º, n.º 1, da LGT e art.º 170.º, n.º 1, do CPPT).
II - Não o fazendo, não há lugar a convite ao suprimento do deficit instrutório do pedido, sem prejuízo de a AT dever proceder à avaliação da prova na sua posse, de modo a verificar se a mesma lhe permite concluir pela alegada insuficiência de meios económicos da executada.
III - Tendo a AT feito essa avaliação no caso em apreço e concluído não se verificar uma situação de manifesta insuficiência de meios económicos, juízo que não merece censura face aos meios de prova de que dispunha, nenhuma outra diligência ou pedido de esclarecimento à executada se lhe impunha com vista ao esclarecimento da situação económica desta.
Votação:Unanimidade
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA OS JUIZES DESEMBARGADORES DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO

O Exmo. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a reclamação deduzida contra o despacho do Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras – 1, proferido em 05/09/2022 que indeferiu o pedido de dispensa de garantia efectuado por T… Unipessoal, Lda., no âmbito do plano de pagamento em prestações n.º 3654.2022.9366, associado ao processo de execução fiscal n.º 3654.2022.01077937, que contra a reclamante corre naquele serviço.

Termina as alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões:
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I – Com a ressalva da devida vénia, visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou a presente reclamação procedente, determinando, em conformidade, pela anulação do despacho proferido pela Srª Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 1, datado de 2022-09-05, nos termos do qual, foi determinado pelo indeferimento do seu pedido de dispensa de garantia, formulado na sequência do deferimento obtido quanto ao pagamento prestacional das dívidas exequendas, cujo procedimento se mostra identificado por “Plano prestacional n.º 3654.2022.9366.
II – Sobre o mérito do pedido da Reclamante considerou a douta Sentença a quo que: “Em face da situação patrimonial conhecida da Reclamante, não se pode dar como comprovada a manifesta falta de meios económicos necessária para a dispensa de prestação de garantia.”
III – Não obstante, identificou a douta Sentença a quo como fundamento anulatório do despacho reclamado a violação dos princípios do inquisitório, da descoberta da verdade material, da proporcionalidade e do dever de colaboração da Administração Tributária para com os contribuintes, porquanto, tendo a Reclamante instruído o seu pedido com os documentos melhor identificados alínea H) do probatório, justificava-se, in casu, perante a incompletude dos documentos probatórios, que a AT solicitasse os elementos necessários a formar a sua convicção, no sentido de proferir sobre o pedido uma decisão de mérito e não de mera forma, como fez.
IV – E concluiu a douta Sentença do seguinte modo: “Neste desiderato, não tendo o órgão de execução fiscal convidado a Reclamante a apresentar documentação adicional, permitindo-lhe a demonstração cabal da factualidade alegada no pedido de dispensa de prestação de garantia, é de anular o despacho reclamado, face à violação do princípio do inquisitório e do dever de colaboração e de cooperação recíprocas com o contribuinte (…).
V – E ainda justificou a douta Sentença a quo que, contrariamente ao sucedido noutros processos, o presente caracteriza-se precisamente pela junção de documentos probatórios pela Reclamante com o seu requerimento dirigido ao órgão de execução fiscal e por isso, justifica-se concitar a aplicação do princípio do inquisitório nos termos preditos.
VI – Ora, perscrutada a citada alínea H) do probatório, retira-se que os referidos documentos probatórios consistem na declaração “IES 2020 e do Modelo 22 da Executada”; num contrato de arrendamento e dois autos de penhora (segurança social e AT enquanto entidades exequentes), tudo documentos que a Reclamante já havia antecedentemente juntado ao abrigo de outros processos e de que é exemplo o processo nº 788/22.8BESNT.
VII – Sucede que estes mesmos documentos foram objeto de análise por parte do órgão de execução fiscal, como se demonstra no ponto I do probatório e com base nos quais foi indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia, com o fundamento de que a Executada não demonstrou a invocada manifesta falta de meios económicos por inexistência ou insuficiência de bens (cf. artigo 52.º, n.º 4, da LGT) e por possuir bens sobre os quais podiam ser constituídas garantias.
VIII – Com efeito, a Reclamante sempre poderia oferecer como garantia o seu estabelecimento comercial; além de que, os valores evidenciados na declaração anual de IES referentes a 2020, conforme resulta do probatório, não se coadunam com uma situação de manifesta falta de meios económicos.
IX – Ou seja, o OEF não sentiu a necessidade de solicitar elementos adicionais à Reclamante, uma vez que, desde logo, identificou factos evidenciadores de que esta
possuía bens sobre os quais podiam ser constituídas garantias, como aliás reconhece a douta Sentença a quo.
X – Ora, não tendo a AT ficado convencida quanto à insuficiência de bens, seria destituído de sentido solicitar documentos que comprovassem essa mesma insuficiência de bens (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 28/04/2016, proferido no processo n.º 02303/15.0BEPRT).
XI – Em suma, mostra-se destituído de sentido solicitar documentos que comprovassem a alegada insuficiência de bens, como sustentou a douta Sentença a quo, quando a AT já havia identificado a existência de bens suscetíveis de penhora.
XII – Face à total omissão probatória e ao incumprimento do seu ónus de alegação, não tinha a AT a obrigação legal de, em obediência aos princípios do inquisitório e da descoberta da verdade material, da proporcionalidade e do dever de colaboração, instruir o pedido formulado ou convidar a executada a fazê-lo.
XIII – Com efeito, o princípio do inquisitório apenas tem sentido perante a invocação, pelas partes, de factos concretos que se mostrem controvertidos. Deste modo, revelando o requerimento de dispensa de prestação de garantia total omissão de factos integradores do pressuposto cumulativo legalmente previsto para a sua concessão, não se verifica défice instrutório, por impossibilidade de instrução (cfr. Ac. do TCA Norte, de 28.04.2016, proferido no processo n.º 02303/15.0BEPRT).
XIV – Com efeito, revelam os documentos juntos pela Reclamante que esta possui bens suscetíveis de penhora – nomeadamente um estabelecimento comercial -; um volume de negócios considerável e outros bens e rendimentos de valor elevado.
Como tal, não se verifica uma situação de manifesta insuficiência de meios económicos, juízo que não mereceu censura por parte da douta Sentença a quo, pelo que nenhuma outra diligência ou pedido de informação à executada se lhe impunha com vista ao esclarecimento da situação económica desta.
XV – Nestes termos, a Sentença ora recorrida, ao decidir como efetivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de facto e do direito relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto nos artigos 52.º, n.º 4, 59.º e 74.º, n.º 1, da LGT, 342.º do CC, artigo 170.º, nº3 do CPPT e artigo 7.º do CPC, não podendo, como tal, manter-se na ordem jurídica, motivo pelo qual não se pode manter na ordem jurídica.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por Acórdão que declare a Reclamação improcedente.
PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA».

Contra-alegações, não foram apresentadas.

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu mui douto parecer concluindo ser de manter a decisão recorrida na ordem jurídica, negando-se provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais dada a natureza urgente do processo e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, analisadas as conclusões das alegações do recurso, a questão que importa resolver reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento quanto ao fundamento anulatório do despacho reclamado consubstanciado na preterição de princípios informadores do procedimento tributário, como o do inquisitório, da verdade material e da colaboração, na medida em que a Administração tributária deveria previamente à decisão de indeferimento do pedido de dispensa de garantia, ter convidado a reclamante a suprir as deficiências instrutórias do pedido.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
Na sentença recorrida, deixou-se factualmente consignado:
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B. DE DIREITO

A questão a decidir, tal como acima deixamos enunciada, reconduz-se a saber se a AT, em procedimento de dispensa de garantia, deverá procurar suprir, mesmo oficiosamente, as deficiências instrutórias de que padece o requerimento da executada visando essa pretensão.

Como pedagogicamente se deixou consignado no Ac. do STA, de 01/12/2022, tirado no proc.º 01204/21.8BELRA, «A execução fiscal visa a cobrança coerciva das dívidas elencadas no art. 148º do CPPT. É um processo de natureza judicial, como decorre expressamente do art. 103º nº 1 da LGT, sem prejuízo de ser instaurada e se desenvolver perante órgãos da AT, que nela praticam os actos de natureza não jurisdicional que couberem, tudo nos termos dos arts. 10º nº 1, alínea f), 149º, 150º e 151º do CPPT. Entre tais actos incluem-se os concernentes à prestação de garantia, quando a ela houver lugar, e às respectivas vicissitudes: apreciação da suficiência, dispensa, reforço, redução, levantamento. É o que se extrai das disposições dos arts. 169º, 170º, 183º, 195º, 199º nºs 8, 9 e 10 do CPPT. Em síntese, tudo quanto respeite à garantia prestada no âmbito da execução fiscal, quer tenha em vista a sua suspensão, quer o pagamento em prestações da dívida exequenda, é da competência do órgão da execução fiscal.

Nesta matéria, diga-se que art. 52º nº 4 da LGT refere que “A administração tributária pode, a requerimento do executado, isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que não existam fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a atuação dolosa do interessado.”.

Face à alteração do art. 52º nº 4 da LGT, que entrou em vigor em 01-01-2017, o legislador tributário procedeu à inversão do ónus da prova no que concerne ao preenchimento do terceiro pressuposto (cumulativo) passando a constar uma actuação dolosa ao invés da prova do afastamento de uma actuação culposa por parte do executado.

Ora, da interpretação do art. 52º nº 4 da LGT resulta que o deferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia está sujeito à verificação de três requisitos, sendo dois deles de verificação alternativa e um terceiro de verificação cumulativa, a saber: alternativamente, importa provar que (i) a prestação de garantia causa prejuízo irreparável ou (ii) a manifesta falta de meios económicos a qual é revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido; cumulativamente, cumpre demonstrar (iii) a inexistência de fortes indícios de que a insuficiência ou inexistência de bens se deveu a actuação dolosa do interessado.

Tal significa que quer na dispensa de prestação da garantia assente na ocorrência de prejuízo irreparável, quer na manifesta falta de meios económicos do executado, é sobre o Requerente que recai o ónus de alegar e provar os pressupostos para tal dispensa, competindo à AT a demonstração da existência de fortes indícios de que a insuficiência de bens se deveu a actuação dolosa por parte do executado.

A partir daqui, importa ainda salientar que o pedido de dispensa de garantia deve ser apresentado ao órgão da execução fiscal, nos termos do art. 170º nº 1 do CPPT - que regulamenta o pedido de dispensa de prestação de garantia previsto no art. 52º nº 4 da LGT -, pois é a esse órgão que está legalmente atribuída a competência exclusiva para decidir sobre esse pedido. Isto, sem prejuízo de o tribunal tributário competente poder ser chamado, mediante solicitação de qualquer interessado, a sindicar a legalidade da actuação da Administração no âmbito desse pedido (arts. 151.º, n.º 1, e 286.º do CPPT), o que significa que estamos perante um procedimento administrativo tributário enxertado no processo de execução fiscal, sendo a respectiva decisão um verdadeiro acto administrativo, procedimento da iniciativa do executado, sendo que é um procedimento formal, que deve obedecer às regras legais, designadamente, deve seguir a forma escrita (art. 54º nº 3 da LGT), deve indicar o órgão a que se dirige, identificar o requerente, com indicação do nome e domicílio [cf. art. 102.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código do Procedimento Administrativo (CPA)], expor os fundamentos de facto e de direito em que se baseia o pedido e instruir o requerimento com a prova documental pertinente (cf. n.º 3 do art. 170.º do CPPT). Deverá também o requerente mencionar o número de identificação fiscal (cf. n.º 1 do art. 29.º do Decreto-Lei n.º 14/2013, de 28 de Janeiro) e ainda, no caso de o procedimento respeitar a um processo de execução fiscal, indicar o número desse processo» (fim de cit.).

Nesta sequência, constata-se que a AT negou abrigo à pretensão da reclamante, aqui recorrida, porquanto e como se alcança do despacho reclamado a que se refere a alínea J) da matéria assente e cuja fundamentação se transcreve na sua alínea I), «…no caso vertente, aquilo que alega no requerimento apresentado, bem como os documentos que junta, é sobejamente conhecido pela AT e a respectiva análise foi amplamente vertida nas múltiplas decisões anteriormente proferidas por ocasião de outros pedidos de dispensa de garantia e das quais foi notificada.
Porém, a executada insiste, a cada novo pedido de dispensa de garantia que apresenta, em continuar a nada carrear para os autos que demonstre que efectivamente não dispõe de qualquer outro património passível de servir de garantia.
A executada continua a não dar cumprimento àquilo que decorre expressamente art.º 170.º n.º 3 do CPPT, não instruindo o seu pedido com o suporte documental necessário para habilitar a AT a decidir no sentido da sua autorização, cingindo-se a informar aquilo que já havia informado em sede de reclamação de decisões que indeferiram anteriores pedidos de dispensa…».

Ora, este discurso fundamentador não padece contextualmente de erro nos pressupostos, de resto a sentença reconhece expressamente que, “em face da situação patrimonial conhecida da Reclamante, não se pode dar como comprovada a manifesta falta de meios económicos necessária para a dispensa de garantia”, mas na esteira da posição expressada pela reclamante entende que ocorre no despacho reclamado um fundamento anulatório, consubstanciado na violação dos princípios informadores do procedimento tributário, porquanto, a Administração tributária deveria, previamente à decisão de indeferimento do pedido de dispensa de garantia, ter convidado a executada/ reclamante a suprir as deficiências instrutórias do requerimento que contém o pedido

Mas, salvo o devido respeito, não a podemos acompanhar. Tal como se aponta o Ac. do STA de 04/11/2020, tirado no proc.º 0289/20.9BEALM, «…o procedimento de dispensa de prestação de garantia tem regras próprias de alegação e prova dos factos (cf. art. 52.º, n.º 4, da LGT e art. 170.º, n.º 1, do CPPT), não podendo, sem mais, aplicar-se-lhe as regras do procedimento tributário de liquidação, tanto mais que não é possível estabelecer paralelismo entre ambos: enquanto naquele está em causa a pretensão do executado a obter um efeito que se há-de ter como excepcional em sede de execução fiscal - a norma é a prestação da garantia em ordem a obter a suspensão da execução fiscal - e, portanto, o procedimento tem início a pedido do interessado e a decisão fica sujeita ao que foi pedido (cf. art. 56.º da LGT), neste estamos perante um procedimento tributário que pode ser iniciado oficiosamente (cf. art. 57.º, n.ºs 1 e 7, da LGT) e em que a AT não vê a sua decisão limitada senão pela prossecução do interesse público e pelos princípios enunciados no art. 54.º da LGT; enquanto naquele o interessado pretende obter um efeito constitutivo de direitos, neste o efeito será a declaração (concretização) de uma obrigação tributária. …».

Ou seja, invocando a executada a manifesta falta de meios económicos por insuficiência de bens penhoráveis susceptíveis de garantir a dívida exequenda e o acrescido, em ordem a obter a dispensa de prestação de garantia nos termos do art.º 52.º, n.º 4, da LGT, incumbe-lhe o ónus de alegar e demonstrar os factos susceptíveis de integrarem essa insuficiência, o que deve fazer com o requerimento de pedido, instruindo-o com a documentação pertinente, nos termos das disposições combinadas dos artigos 342.º do Cód. Civil e 170.º, n.º 3, do CPPT.

Não quer isto dizer que a AT se deva eximir à avaliação crítica da prova que tenha na sua posse, em ordem a ver se pode (ou não) concluir, com base nela, pela alegada insuficiência de meios económicos.

Mas isso, como se alcança da fundamentação do despacho reclamado, foi feito, tendo a AT concluído não se verificar uma situação de manifesta falta de meios económicos em vista dos valores dos bens e rendimentos da reclamante constantes dos elementos declarativos e de relato financeiro na sua posse.

Se este juízo conclusivo da AT se mostra erróneo, a verdade é que não há, no probatório, factos que o permitam infirmar, sendo contraprova disso mesmo a circunstância de ter sido dada como «não provada» matéria factual alegada que, se demonstrada, permitiria à AT uma diferente leitura da situação económica da reclamante (vd. pontos 1 a 8 dos «factos não provados»).

Em suma e concluindo, invocando a executada a manifesta falta de meios económicos por insuficiência de bens penhoráveis susceptíveis de garantir a dívida exequenda e o acrescido, em ordem a obter a dispensa de prestação de garantia (cf. art.º 52.º, n.º 4, da LGT), incumbe-lhe o ónus de alegar e demonstrar os factos susceptíveis de integrarem essa insuficiência, o que deve fazer com o requerimento de pedido, instruindo-o com a documentação pertinente.

Não o fazendo, não há lugar a convite ao suprimento do deficit instrutório do pedido, sem prejuízo de a AT dever proceder à avaliação da prova na sua posse, de modo a verificar se a mesma lhe permite concluir pela alegada insuficiência de meios económicos da executada.

Tendo a AT feito essa avaliação no caso em apreço e concluído não se verificar uma situação de manifesta insuficiência de meios económicos, juízo que não merece censura face aos meios de prova de que dispunha, como a própria sentença reconhece, nenhuma outra diligência ou pedido de esclarecimento à executada se lhe impunha com vista ao esclarecimento da situação económica desta.

Tendo a sentença recorrida decidido diferentemente, não pode manter-se na ordem jurídica, sendo de conceder provimento ao recurso.
IV. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes de turno deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgar a reclamação improcedente e manter o despacho reclamado na ordem jurídica.

Condena-se a Recorrida em custas, que não são devidas no recurso por não ter contra-alegado.

Lisboa, 02 de Março de 2023


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Vital Lopes



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Luísa Soares



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Tânia Meireles da Cunha