Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1122/13.3BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:12/18/2019
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:TAXA URBANÍSTICA;
CADUCIDADE;
AUGI.
Sumário:I-A comissão de administração da AUGI tem poderes representativos da assembleia dos comproprietários das parcelas situadas na respetiva área urbanística, mormente, perante a Autarquia e os serviços de finanças.

II-A notificação da taxa urbanística feita pela Autarquia produz efeitos na esfera jurídica dos representados, no caso, os comproprietários da AUGI, sujeitos passivos do tributo.

III-Não se verifica a caducidade do direito à liquidação se dentro do prazo legal de quatro anos, a taxa urbanística é notificada ao representante legal do contribuinte, sujeito passivo da taxa.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO

I-RELATÓRIO

O MUNICÍPIO DE SESIMBRA veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou procedente a oposição deduzida por M...... ao processo de execução fiscal nº ……./2013, instaurado para cobrança coerciva de dívidas de taxas e compensações urbanísticas do ano de 2006, no montante de €25.596,28.


***

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

1. A Administração Conjunta, entidade equiparada a pessoa coletiva, representa a totalidade dos proprietários da A......, para efeitos do processo de reconversão –art.ºs 8.º, n.ºs 6 e 7 e art.º 15.º da Lei n.º 91/95.

2. Assim, a notificação da liquidação, global, das taxas urbanísticas deve ser feita à Comissão de Administração, órgão da Administração Conjunta, cabendo a esta, em Assembleia de Proprietários, imputar a cada proprietário, a sua quota-parte–art.º 15.º, al.c), da Lei n.º 91/95.

3. As taxas em causa, liquidadas globalmente, não respeitam a cada lote individualmente, mas a toda a área objecto da reconversão urbanística, reportando-se a obras coletivas, comuns a todos os lotes, de infraestruturação de toda a área da A.......

4-Sendo uma taxa única e global só pode, e deve, ser notificada a quem representa a totalidade dos prédios: no caso, e por força de uma Lei de excepção, à Administração Conjunta.

5. Aliás, só após o registo do título de reconversão -no caso o plano de pormenor -e a divisão de coisa comum, são criados os lotes e é a imputada a respetiva titularidade a cada um dos proprietários, e se pode exigir individualmente o pagamento das taxas que a cada um foi imputada, e cujo pagamento haja sido diferido para momento posterior à emissão do título-art.º 29.º, n.º 2, da Lei n.º 91/95.

6.Foi, pois, a liquidação da taxa notificada a quem de direito, e atempadamente, ou seja, à Administração Conjunta, e dado conhecimento, por esta, aos proprietários, em Assembleia de 16/07/2006, não ocorrendo a caducidade da liquidação.

7. A douta sentença não teve em consideração a excepcionalidade da área abrangida pelo plano –área urbana de génese ilegal –e do procedimento excepcional de reconversão aplicável, o previsto na Lei n.º 91/95.

Termos em que, e no mais de direito que V. Ex.ªs doutamente suprirão, deve o presente recurso merecer provimento, revogando-se a douta sentença, como é de JUSTIÇA!”


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O Recorrido apresentou as contra-alegações, nas quais formula as seguintes conclusões:

– Salvo melhor opinião, o presente recurso, uma vez que tem por objeto apenas a apreciação de matéria de direito, deveria ter sido interposto para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (art.º 282º n.º 1, parte final).

– A douta sentença sob recurso deverá ser integralmente mantida e confirmada, pois, a Mª. Juiz que a proferiu, fundamentou a mesma, tanto no que respeita à matéria de facto como de direito, de uma forma irrepreensível e juridicamente inatacável.

Na verdade,

– A matéria de facto, ou seja, a matéria dos factos provados e dos factos não provados, assenta toda ela em documentos, da qual, aliás, o Município de Sesimbra, não interpôs recurso, pelo que se considera definitivamente fixada.

– Analisando o elenco dos factos provados e dos factos não provados, conclui-se que o direito de liquidação das taxas que o Município pretende cobrar do recorrido, havia caducado já antes de ter iniciado o processo de cobrança coerciva, no Ano de 2013.

– O ora recorrido, atendendo ao rigor com que a Mª. Juiz, escalpelizou tanto a matéria de facto dada como provada como a fundamentação do direito aplicável a esses factos, não vai repetir o que tão doutamente se escreveu na douta sentença sob recurso, por aderir à mesma, na sua plenitude. Na verdade,

– A Lei 91/95, de 2 de Setembro (Lei das A......) não tem aplicação aos presentes autos, uma vez que nenhum dos órgãos da administração dos prédios integrados na A...... e identificados no art.º 8º n.º 2 dessa Lei, tem competência para cobrar as taxas que foram criadas pelo Município e que revertem exclusivamente em seu benefício. Designadamente, não se encontra nas competências e/ou atribuições da Comissão de Administração, a cobrança das taxas criadas pelo Município recorrente que só a este beneficiam.

Aliás,

– Na alínea c) do art.º 15º da Lei n. 91/95, estabelece-se que compete à Comissão de Administração elaborar e submeter à assembleia de proprietários ou comproprietários os mapas e os respetivos métodos e fórmulas de cálculo e as datas para a entrega das comparticipações e cobrar as comparticipações, designadamente, para as despesas do seu funcionamento, para execução dos projetos, acompanhamento técnico do processo e execução das obras de urbanização.

Resulta claramente deste preceito, citado pelo recorrente nas suas alegações e, ao contrário do que nas mesmas se refere, que a Comissão de Administração da A...... tem apenas competência para cobrar dos proprietários ou comproprietários as comparticipações que estes terão de pagar para as despesas de funcionamento da A...... e para a execução dos projetos acompanhamento técnico e execução das obras de urbanização.

Ou seja:

- A Comissão de Administração da A...... tem competência para cobrar as comparticipações dos proprietários ou comproprietários, para fazer face às despesas de funcionamento da A...... e para a execução dos projetos.

Contudo, a Comissão de Administração da A...... não tem competência para cobrar dos proprietários ou comproprietários as taxas de urbanização ou outras que o Município criou na sequência do processo de reconversão e urbanização dos espaços integrados na A.......

É ao Município que compete cobrar as taxas que ele próprio criou em seu exclusivo benefício, pelo que terá de ter serviços competentes para, oportunamente, proceder à cobrança de tais taxas, pelo que, neste domínio, não tem aplicação a Lei n.º 91/95.

– Ainda que, por hipótese (que não se concede nem admite) para a cobrança da taxa de urbanização criada pelo Município recorrente, este, por seu interesse e comodidade, tivesse confiado à Administração da A...... a sua cobrança, o certo é que nem o Município de Sesimbra, nem a Administração da A...... notificaram cada um dos proprietários ou comproprietários, mediante carta registada com aviso de receção, conforme previsto nos art.ºs. 36º e 38º do CPPT, para procederem ao pagamento da sua quota-parte.

Assim, quando o Município recorrente iniciou a presente execução (no ano de 2013), já havia deixado caducar o direito de liquidação de tal taxa.

Termos em que deverão V. Exas negar provimento ao recurso interposto pelo Município de Sesimbra e, em consequência, confirmar integralmente a douta sentença sob recurso, por a mesma se encontrar rigorosamente fundamentada tanto de facto como de direito.

Assim se fará justiça.”


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A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) emitiu parecer suscitando a incompetência, em razão da hierarquia, deste Tribunal Central Administrativo Sul para conhecer do objeto do presente recurso por o mesmo se fundar, exclusivamente, em matéria de direito, sendo competente para dele conhecer o Supremo Tribunal Administrativo.

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Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

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II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

A) Em 05/04/2006 foi aprovado pela Câmara Municipal de Sesimbra fixar em € 2.538.862,00 o valor da taxa de urbanização de acordo com o disposto no contrato de urbanização da A...... nº 24 da R…. (cfr. fls. 52 dos autos);

B) A Comissão de Administração da A...... n° 24 da R......, foi notificada da deliberação identificada no ponto anterior por ofício de 08/05/2006 (cfr. fls. 50).

C) Em 16/07/2006 foi exarada ata nº 14 da reunião dos comproprietários da A...... nº 24 da R......, constado da ordem de trabalhos, no seu ponto 3 o seguinte: "Análise, discussão e votação do critério para pagamento das taxas devidas à Câmara Municipal de Sesimbra." Tendo ficado fixado que cada comproprietário teria de pagar o valor de € 5.368,00, devendo esse valor ser pago até 30/09/2006 (cfr. fls. 54/56).

D) Em data que se desconhece concretamente, mas depois de 16/07/2006, foi elaborada uma carta pela Comissão de Administração da A...... nº 24 da R......, dirigida aos comproprietários, da qual consta que estes terão a pagar a quantia de € 5.368,00 referente à emissão do Alvará de Loteamento até ao dia 30/09/2006, constando ainda que após aquela data o pagamento deveria ser efetuado diretamente à Câmara Municipal de Sesimbra (cfr. fls. 70).

E) Em 23/02/2009 foi publicado no Diário da República, II Série, nº 37, a Deliberação n° 556/2009 da Câmara Municipal de Sesimbra, da qual consta o Plano de Urbanização da R...... (cfr. fls. 48/49).

F) Em 01/06/2010 foi elaborada uma Listagem de Taxas de Alvará em débito à Câmara Municipal de Sesimbra, pela administração conjunta da A...... 24 - R...... - da qual consta em falta a taxa do referente ao ora oponente no montante total de € 24.621,23 (cfr. fls. 46/47).

G) Em reunião camarária de 07/07/2010 considerando, entre o mais, a incapacidade da Comissão de Administração da A...... nº 24, em proceder à cobrança das comparticipações e das taxas devidas, foi aprovado aceitar a transferência para a Câmara Municipal de todos os créditos existentes relativos a obras de urbanização e a cedência de 9 lotes, ficando com o encargo de executar as obras de urbanização em falta e recuperar as iniciadas (cfr. fls. 57/58).

H) Em 30/07/2010 foi efetuado um segundo Aditamento ao Contrato de Urbanização da A...... 24 - R...... - sendo que do seu Anexo 3 consta uma discriminação de valores por lote e por proprietário (cfr. fls. 41/45).

I) Por ofício nº 13209 de 15/07/2011 foi remetido ao Oponente uma notificação da qual consta que este, na qualidade de proprietário de 4 lotes na A...... 24 - R...... - é devedor a título de taxas urbanísticas dos lotes da quantia de € 24.120,21, informando ainda que são devidos juros (cfr. fls 2 do processo administrativo junto aos autos).

J) O ofício mencionado na alínea anterior foi remetido por carta registada com aviso de receção tendo este sido assinado em 23/07/2011 (cfr. fls. 2-A do pa apenso).

K) Em 04/10/2013 foi emitida uma certidão de dívida com o nº……., da qual consta a indicação da entidade emissora da execução Câmara Municipal de Sesimbra, e executado M......pela quantia de €5.025,89, acrescida de juros, e no montante global de € 6.399,07, por dívidas do executado proveniente de taxa e compensações urbanísticas relativa ao lote criado no Plano de Pormenor de Reconversão da A...... nº 24 R......, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº……, da freguesia da Quinta do Conde (cfr. fls. 10 do processo em apenso).

L) Em 04/10/2013 foi emitida uma certidão de dívida com o nº……, da qual consta a indicação da entidade emissora da execução Câmara Municipal de Sesimbra, e executado M......pela quantia de € 5.025,89, acrescida de juros, e no montante global de € 6.399,07, por dívidas do executado proveniente de taxa e compensações urbanísticas relativa ao lote criado no Plano de Pormenor de Reconversão da A...... nº 24 R......, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº……, da freguesia da Quinta do Conde (cfr. fls. 8 do processo em apenso).

M) Em 04/10/2013 foi emitida uma certidão de dívida com o nº 137, da qual consta a indicação da entidade emissora da execução Câmara Municipal de Sesimbra, e executado M......pela quantia de € 5.025,89, acrescida de juros, e no montante global de € 6.399,07, por dívidas do executado proveniente de taxa e compensações urbanísticas relativa ao lote criado no Plano de Pormenor de Reconversão da A...... nº 24 R......, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Sesimbra sob o nº……., da freguesia da Quinta do Conde (cfr. fls. 6 do processo em apenso).

N) Das certidões mencionadas nas alíneas anteriores consta que a dívida se reporta a 05/12/2006, data de emissão e entrega à Comissão de Administração da A...... do seu montante e que resulta de deliberação camarária de 05/04/2006 (cfr. teor de fls. 6, 8 e 10 do processo em apenso). O) Com base nas certidões de dívida mencionadas nas alíneas anteriores, em 10/10/2013 foi autuado o processo de execução fiscal nº ……/2013 em nome do ora oponente (cfr. fls. 1 do processo de execução fiscal em apenso).

P) Em 10/10/2013 foi emitido aviso/citação referente ao processo executivo nº……/2013 no qual consta a quantia exequenda de € 25.596,28 acrescida de custas no montante total de € 25.769,46 cfr. fls. 10 do processo de execução fiscal em apenso).


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A decisão recorrida fixou como factualidade não provada o seguinte:

“Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados.”


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A motivação da matéria de facto fundou-se no seguinte: “A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo acima expressamente referidos em cada uma das alíneas do probatório.”

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III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou procedente a oposição deduzida contra o processo de execução fiscal nº ……/2013, instaurado pela Câmara Municipal de Sesimbra por dívidas de taxas e compensações urbanísticas do ano de 2006, no montante global de €25.596,28.

Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.

Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a sentença padece de erro de julgamento por errónea apreciação dos pressupostos de facto e de direito, competindo, para o efeito, analisar se, in casu, ocorre falta de notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade, conforme decidiu o Tribunal a quo. Antes, porém, cumpre aferir da questão prévia suscitada pelo Recorrido nas suas contra-alegações e pela Digna Magistrada do Ministério Público referente à incompetência em razão da hierarquia.

Comecemos, então, pela arguida incompetência em razão da hierarquia, uma vez que a infração das regras da competência em razão da hierarquia determina a incompetência absoluta do tribunal, constituindo uma questão que o tribunal deve conhecer, oficiosamente ou mediante arguição, com prioridade sobre qualquer outra (cfr. artigos 16.º, n.ºs 1 e 2, 18.º, n.º 3, do CPPT e artigo 13.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT).

Apreciando.

De harmonia com o disposto no artigo 280.º, nº 1, do CPPT das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do STA (artigos 26.º, alínea b) e 38.º, alínea a), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF)).

A competência, sendo um pressuposto processual afere-se pelo pedido e pela causa de pedir, ou seja, pela pretensão do autor e pelos factos com relevância jurídica, tal como são expostos pelo autor, sendo certo que não é a interpretação subjetiva desses factos que interessa à determinação da competência do tribunal mas a relevância objetiva desses factos.

Para determinação da competência hierárquica, à face do preceituado nos citados artigos 26.º, alínea b), e 38.º, alínea a) do ETAF e artigo 280º, n.º 1, do CPPT, o que é relevante é que o Recorrente, nas alegações de recurso e respetivas conclusões, suscite qualquer questão de facto ou invoque, como suporte da sua pretensão, factos que não foram dados como provados na decisão recorrida.

Com efeito, o recurso não versa exclusivamente matéria de direito, se nas respetivas conclusões se questionar a matéria de facto, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos, quer, ainda, por o Tribunal, no âmbito dos seus poderes cognição, ter entendido fixar matéria de facto que reputou relevante para a apreciação da lide(1).

In casu, não obstante a Recorrente não ter procedido à impugnação da matéria de facto, conforme aduz o Recorrido nas suas contra-alegações, não se discernindo qualquer aditamento seja por substituição, seja por complementação, a verdade é que atentando nas suas conclusões, aquiesce-se a necessidade de juízo de valor sobre a matéria de facto.

Em bom rigor, sempre que para a apreciação do erro sobre os pressupostos de direito o Tribunal ad quem tenha que emitir uma apreciação ou um juízo de valor sobre a matéria de facto, independentemente da bondade ou da possibilidade de êxito da mesma, a questão envolve, necessariamente, matéria de facto.

No caso vertente, analisadas as conclusões das alegações da Recorrente, coadjuvadas com o teor das mesmas, constata-se que o objeto do recurso não se limita à questão de direito de saber quem deveria ter sido notificado do tributo impugnado em termos de obstar à caducidade da liquidação, concretamente, a Administração Conjunta da A......, ou os proprietários dos lotes. E isto porque, a Recorrente retira ilações, extraídas de factos, nomeadamente, que o valor da taxa impugnada foi fixado globalmente para toda a área abrangida e não para cada um dos proprietários, cabendo à A......, internamente, a distribuição do valor global fixado pela Autarquia.

De convocar, neste particular, o aduzido nas suas alegações, concretamente, no ponto V: “Carece, pois, de sentido, e não corresponde à realidade, afirmar que o valor da taxa do ora Oponente foi fixado em 05/04/2006; nesta data foi, isso sim, fixado o valor global da taxa”.

E por assim ser, sendo as ilações de facto, também elas, factos improcede a exceção de incompetência absoluta deste Tribunal, em razão da hierarquia, suscitada pelo Recorrido e pela DMMP.

Vejamos, então, se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento.

A Recorrente alega que a Administração Conjunta, entidade equiparada a pessoa coletiva, representa a totalidade dos proprietários da A......, para efeitos do processo de reconversão, em conformidade com o consignado nos artigos 8.º, n.ºs 6 e 7 e art.º 15.º da Lei n.º 91/95.

Razão pela qual, a notificação da liquidação, global, das taxas urbanísticas deve ser feita à Comissão de Administração, órgão da Administração Conjunta, cabendo a esta, em Assembleia de Proprietários, imputar a cada proprietário, a sua quota-parte–art.º 15.º, al.c), da Lei n.º 91/95.

Até porque, sublinha, as taxas sub judice, liquidadas globalmente, não respeitam a cada lote individualmente, mas a toda a área objeto da reconversão urbanística, reportando-se a obras coletivas, comuns a todos os lotes, de infraestruturação de toda a área da A.......

Conclui, assim, que a taxa foi notificada a quem de direito, e atempadamente, ou seja, à Administração Conjunta, e dado conhecimento, por esta, aos proprietários, em Assembleia de 16 de julho de 2006, não ocorrendo a caducidade da liquidação.

O Recorrido dissente por entender que não se encontra nas competências e/ou atribuições da Comissão de Administração, a cobrança das taxas criadas pelo Município recorrente que só a este beneficiam.

Densificando, para o efeito, que a Comissão de Administração da A...... tem apenas competência para cobrar dos proprietários ou comproprietários as comparticipações que estes terão de pagar para as despesas de funcionamento da mesma e para a execução dos projetos acompanhamento técnico e execução das obras de urbanização.

Para concluir pela procedência a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo alinhou o seguinte discurso fundamentador:

Do quadro normativo vigente, concretamente, da Lei nº 91/95 de 2 de setembro “[n]ão resulta qualquer competência da administração da A...... para representar os vários proprietários dos imóveis para rececionar qualquer notificação das taxas devidas por cada um deles.

Na verdade as únicas competências de representação dos referidos proprietários conferidas à comissão de administração da A...... encontram-se previstas nas alíneas i) e j) do nº 1 do referido art. 15º e traduzem-se na representação perante os serviços de finanças e conservatórias do registo predial tendo em vista a promoção de determinados atos e na representação em ato notarial.

Concretizando, depois, por reporte ao recorte probatório dos autos que: “[r]esultou que foi emitido o ofício nº 13209 datado de 15/07/2011 dirigido ao ora oponente para pagamento da taxa, tendo sido enviado ao oponente através de carta registada com aviso de receção assinado em 23/07/2011 (cfr. alíneas I) e J) do probatório).

Considerando que as taxas em questão têm natureza de obrigação única o prazo de caducidade de 4 anos conta-se desde a ocorrência do facto tributário que no caso em apreço ocorreu 05/04/2006 (cfr. alínea A) do probatório), pelo que a caducidade do direito à liquidação ocorreu em 06/04/2010.

Para depois concluir que: “atendendo que o ora oponente apenas teve conhecimento do valor da taxa a pagar em 23/07/2011 (cfr. alíneas H) e I) do probatório), verifica-se que efetivamente nessa data já tinha ocorrido a caducidade do direito à liquidação

Vejamos, então, se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento de direito.

Na apreciação que se segue adotaremos – transcrevendo – a análise esclarecedora e detalhada que foi feita no recente acórdão deste TCA Sul, de 17 de outubro de 2019, proferido no processo nº 1119/13.3 BEALM, a qual merece a nossa inteira concordância. Trata-se de aresto prolatado em oposição deduzida por outro executado contra processo executivo instaurado para cobrança coerciva de tributos da mesma natureza e com total idêntica fática com a do caso vertente.

Lê-se em tal acórdão:

“De acordo com o disposto n.º2 do art.º3.º da Lei Geral Tributária, «Os tributos compreendem os impostos, incluindo os aduaneiros e especiais, e outras espécies tributárias criadas por lei, designadamente as taxas e demais contribuições financeiras a favor de entidades públicas».

Diz o seu n.º3 que «O regime geral das taxas e das contribuições financeiras referidas no número anterior consta de lei especial», cumprindo aqui referir a Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro, que aprovou o Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais.

E o n.º2 do art.º4.º da LGT, dispõe que «As taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares».

Estabelece ainda o n.º3 do art.º18.º da LGT que o sujeito passivo da relação tributária «é a pessoa singular ou colectiva, o património ou a organização de facto ou de direito que, nos termos da lei, está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, seja como contribuinte directo, substituto ou responsável».

Por outro lado, de acordo com o disposto no n.º2 do art.º7.º do RGTAL, «O sujeito passivo é a pessoa singular ou colectiva e outras entidades legalmente equiparadas que, nos termos da presente lei e dos regulamentos aprovados pelas autarquias locais, esteja vinculado ao cumprimento da prestação tributária».

Já por aqui se vê que o sujeito passivo da relação jurídica de taxa é a pessoa ou entidade legalmente equiparada requerente da prática do acto ou o interessado na obtenção de permissões administrativas geradoras da obrigação da taxa.

Assim, só pode concluir-se que os sujeitos passivos das taxas urbanísticas exigidas pelo Município de Sesimbra como contrapartida das operações de reconversão são os comproprietários da A...... e não a sua Administração Conjunta, a qual não é detentora de qualquer direito subjectivo ou interesse próprio na regularização das situações jurídicas de génese ilegal constituídas na área urbanística respectiva, nem por qualquer modo, se encontra a Administração Conjunta vinculada ao pagamento da prestação tributária (art.º20.º da LGT).

De resto, a contraprova disso mesmo é que não foi ela a entidade executada pelo montante da taxa em falta, mas cada um dos comproprietários faltosos na medida da comparticipação que lhes foi imputada por deliberação da assembleia de comproprietários (art.º8.º, n.º2 da citada Lei n.º 91/95, de 02 de Setembro).

Aqui chegados e aproximando-nos do cerne da questão controvertida, estabelece o n.º1 do art.º45.º da LGT que «O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro».

No mesmo sentido, pode ver-se o art. º14.º do RGTAL, segundo o qual, «O direito de liquidar as taxas caduca se a liquidação não for validamente notificada ao sujeito passivo no prazo de quatro anos a contar da data em que o facto tributário ocorreu».

A partir daqui divergimos da sentença recorrida, pois sendo certo que o sujeito passivo da taxa, no caso, o oponente, não foi directamente notificado da sua liquidação pelo sujeito activo, a taxa liquidada foi notificada, sem controvérsia, à Administração Conjunta da A...... 24 – R......, que integra a parcela de que o oponente é proprietário.

Ora, nos termos do disposto no art.º 8.º da Lei n.º 91/95, de 02 de Setembro, que contém o regime da Reconversão das Áreas Urbanas de Génese Ilegal, “o prédio ou prédios integrados na mesma A...... ficam sujeitos a administração conjunta, assegurada pelos respectivos proprietários ou comproprietários” sendo órgãos dessa administração conjunta, a assembleia de proprietários ou comproprietários, a comissão de administração e a comissão de fiscalização (n.ºs 1 e 2).

E nos termos do disposto no n.º1 do art.º15.º da mesma lei, “compete à comissão de administração”, entre o mais, “Praticar os actos necessários à tramitação do processo de reconversão em representação dos titulares dos prédios e donos das construções integrados na A......”; “Emitir declarações atestando o pagamento das comparticipações devidas pelos proprietários ou comproprietários para efeito da emissão da licença de construção, ou outros actos para as quais as mesmas se mostrem necessárias, nomeadamente para efeito do disposto no artigo 30.º-A; Representar os titulares dos prédios integrados na A...... perante os serviços de finanças.

Cabendo legalmente à comissão de administração representar, perante a Autarquia a quem compete as operações de reconversão, os membros da assembleia de proprietários ou comproprietários das parcelas integradas na A......, tal significa que estes (entre os quais, o oponente) se encontram representados pela comissão de administração e, nessa medida, está até a Autarquia, no exercício dos poderes tributários decorrentes daquelas operações de reconversão, obrigada a efectuar àquela Comissão, todas as notificações que faria ao contribuinte, sujeito passivo da taxa.

Ora, nos termos gerais de direito, os actos praticados pelo representante em nome do representado, nos limites dos poderes que lhe competem, produzem efeitos na esfera jurídica deste último – art.º258.º do Código Civil e 16.º, n.º1 da Lei Geral Tributária -, pelo que, à pessoa do representante deverão ser dirigidas as notificações relativas a obrigações tributárias dos sujeitos passivos que legalmente representam.”

Ora, transpondo o regime jurídico e os considerandos de direito vertidos anteriormente, à factualidade assente, entende-se que, no sentido propugnado pela Recorrente, a liquidação do tributo em causa foi notificada a quem de direito respeitando o respetivo prazo legal de caducidade.

Senão vejamos.

Do acervo probatório dos autos resulta que:

A 05 de abril de 2006, foi aprovado pela Câmara Municipal de Sesimbra fixar em € 2.538.862,00 o valor da taxa de urbanização de acordo com o disposto no contrato de urbanização da A...... nº 24 da R.......

Tendo, nessa sequência, a Comissão de Administração da A...... n° 24 da R......, sido notificada da referida deliberação por ofício datado de 08 de maio de 2006.

Mais resultando assente que, a 16 de julho de 2006, foi exarada ata nº 14 da reunião dos comproprietários da A...... nº 24 da R......, na qual se estipulou que cada comproprietário teria de pagar o valor de € 5.368,00, até ao dia 30 de setembro de 2006, tendo sido notificados, dessa deliberação, todos os comproprietários.

Mais dimanando que a, 23 de fevereiro de 2009, foi publicado no Diário da República, II Série, nº 37, a Deliberação n° 556/2009 da Câmara Municipal de Sesimbra, da qual consta o Plano de Urbanização da R.......

Tendo, ulteriormente, em reunião camarária de 07 de julho de 2010 -na qual foi assumida, entre o mais, a incapacidade da Comissão de Administração da A...... nº 24, em proceder à cobrança das comparticipações e das taxas devidas- sido aprovada, designadamente, a transferência para a Câmara Municipal de todos os créditos existentes relativos a obras de urbanização e a cedência de 9 lotes.

Sendo que, a 30 de julho de 2010 foi efetuado um segundo Aditamento ao Contrato de Urbanização da A...... 24 - R...... – constando do seu Anexo III, uma discriminação de valores por lote e por proprietário.

E mediante ofício nº 13209, datado de 15 de julho de 2011, endereçado ao Recorrido, expedido através de carta registada com aviso de receção e recebido, em 23 de julho de 2011, sido o mesmo notificado na qualidade de proprietário de quatro lotes na A...... 24 - R...... de que é devedor, a título de taxas urbanísticas, da quantia de € 24.120,21, a que acresce o montante dos juros legalmente devidos.

Dimanando, outrossim, assente que, em 04 de outubro de 2013 foram extraídas pela Câmara Municipal de Sesimbra as competentes certidões de dívidas para cobrança coerciva, tendo o Recorrido, no seguimento de citação, deduzido oposição.

Ora, face à realidade fática supra aludida, resulta que a notificação da taxa urbanística foi efetuada à comissão administrativa, tornando-se, assim, eficaz relativamente aos comproprietários representados, nomeadamente, ao Recorrido.

Pelo que, se conclui, no sentido do Acórdão supra citado e que vimos acompanhando que, datando a aludida notificação de 08 de maio de 2006, ela considera-se efetuada dentro do prazo de caducidade de quatro anos contados do facto tributário (art.º45.º da LGT e 14.º do RGTAL) – consubstanciado na emissão do Plano de Pormenor da A...... – cf. art.º31/4 da Lei 91/95 ) – não sendo oponível pelo Recorrido a falta de notificação dentro do prazo de caducidade, posto que a mesma foi tempestivamente efetuada ao seu representante legal, produzindo efeitos na esfera jurídica do sujeito passivo representado.

In fine, sempre se dirá que se poderá questionar a legalidade de uma taxa autárquica fixada globalmente e cuja repartição pelos titulares das parcelas integradas na A...... foi deixada ao critério da assembleia dos comproprietários, mas a verdade é que essa questão não se compreende no objeto do recurso, circunscrito à falta da notificação da liquidação do tributo no prazo de caducidade. De todo o modo, sempre se dirá que, a mesma não integraria fundamento válido de oposição à execução fiscal.

Face a todo o exposto, não pode este Tribunal acompanhar a sentença recorrida que julgou verificada a caducidade do direito de liquidação por falta de válida e tempestiva notificação ao contribuinte, uma vez que, como visto, o Recorrido foi, dentro do prazo de caducidade, notificado, mas na pessoa do seu representante legal, a Administração Conjunta da A...... 24 – R......, em que se insere a parcela de que é titular.

Deste modo, a sentença que assim o não decidiu tem de ser revogada.


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IV- Decisão

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul, em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA, em consequência, julgar a oposição improcedente, com todas as legais consequências.

Custas pelo Recorrido.

Registe e Notifique.

Lisboa, 18 de dezembro de 2019

(Patrícia Manuel Pires)

(Mário rebelo)

(Anabela Russo)





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(1).Vide, designadamente, Acórdão do STA proferido no processo nº 0161/14, de 09 de abril de 2014 e demais jurisprudência nele citada