Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:633/13.5BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:05/22/2019
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:O INSTITUTO DA REVERSÃO É EXCLUSIVO DA EXECUÇÃO FISCAL.
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO É O MEIO PROCESSUAL ADEQUADO PARA O EXECUTADO, POR REVERSÃO, DISCUTIR EM JUÍZO O DESPACHO DETERMINATIVO DESSA REVERSÃO.
REGIME NORMATIVO APLICÁVEL À DECISÃO DE REVERSÃO.
PRESSUPOSTOS. ARTºS.23, Nº.2, DA L.G.T., E 153, Nº.2, DO C.P.P.T.
REVERSÃO BASEADA NA FUNDADA INSUFICIÊNCIA PATRIMONIAL DO DEVEDOR ORIGINÁRIO.
ÓNUS DA PROVA.
PRINCÍPIO DA INVESTIGAÇÃO.
DÉFICE INSTRUTÓRIO (CFR.ARTº.662, Nº.2, AL.C), DO C.P.CIVIL, NA REDACÇÃO DA LEI 41/2013, DE 26/6).
Sumário:1. O instituto da reversão é exclusivo da execução fiscal, sendo desconhecido na execução comum, e traduz-se numa modificação subjectiva da instância, pelo chamamento, a fim de ocupar a posição passiva na acção, de alguém que não é o devedor que figura no título.

2. De acordo com a jurisprudência do S.T.A. e a doutrina que subscreve-mos, é a oposição à execução o meio processual adequado para o executado, por reversão, discutir em juízo o despacho determinativo dessa reversão, nomeadamente, imputando-lhe vícios de forma por ausência de fundamentação e preterição de formalidades legais, mais devendo enquadrar-se este fundamento da oposição no artº.204, nº.1, al.i), do C. P. P. Tributário.

3. Para o efeito da definição de qual o regime normativo aplicável à decisão de reversão do processo de execução fiscal, no que respeita aos requisitos adjectivos para a respectiva efectivação, importa o momento em que a citada reversão é decretada.

4. Nos termos dos artºs.23, nº.2, da L.G.T., e 153, nº.2, do C.P.P.T., a reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário depende de verificação da inexistência de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores/responsáveis solidários ou da fundada insuficiência, para pagamento da dívida exequenda e acrescido, dos bens penhoráveis, integrantes do património destes, sendo que esta última circunstância se pode ter como preenchida com base em elementos constantes de auto de penhora e outros elementos disponíveis para na execução fiscal.

5. Todavia, realizada a alteração subjectiva da instância executiva com base na aludida fundada insuficiência patrimonial, a execução não pode avançar para a fase da penhora de bens do revertido, enquanto o devedor originário tiver património penhorável. Neste caso a lei separa, claramente, dois momentos distintos na responsabilidade subsidiária.

6. O primeiro é o momento em que a A. Fiscal pode efectuar a reversão, ou seja, constituir o responsável subsidiário como devedor. Esse momento ocorre logo que a Fazenda Pública determine a insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal e eventuais responsáveis solidários. Tal pode ocorrer logo depois da instauração do processo de execução fiscal, dependendo apenas de uma avaliação do valor dos activos do responsável originário ou solidário e da sua comparação com o valor em dívida. Assim que se apure essa insuficiência, a A. Fiscal pode chamar à execução os responsáveis subsidiários e, após o exercício do direito de audição, constituí-los como devedores mediante a citação.

7. O segundo momento é aquele em que a Fazenda Pública pode iniciar os actos de coerção sobre o património do devedor subsidiário. A lei exige, como pressuposto essencial para que a A. Fiscal possa executar esse património, que antes tenha sido excutido o património do devedor principal, a fim de se determinar com precisão o âmbito de responsabilidade financeira do revertido. O chamado benefício da excussão prévia inibe a Fazenda Pública de executar o património do revertido antes de se apurar com rigor o valor exacto da sua responsabilidade, o que ocorrerá mediante a excussão de todo o património do devedor principal.

8. Nesta sede, à A. Fiscal incumbe o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento, previsto na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes. Só no caso de a Fazenda Pública fazer a prova do preenchimento desses pressupostos, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão.

9. Recaindo embora sobre as partes o ónus da prova dos factos constitutivos, modificativos e/ou extintivos de direitos, a actividade instrutória pertinente para apurar a veracidade de tais factos compete também ao Tribunal, o qual, atento o disposto nos artºs.13, do C.P.P.Tributário, e 99, da L.G.Tributária, deve realizar ou ordenar todas as diligências que considerar úteis ao apuramento da verdade, assim se afirmando, sem margem para dúvidas, o princípio da investigação do Tribunal Tributário no domínio do processo judicial tributário.

10. No caso dos autos, no que respeita ao exame dos pressupostos da reversão, verifica-se uma situação de défice instrutório que demanda o exercício de poderes cassatórios por parte deste Tribunal nos termos do artº.662, nº.2, al.c), do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, devendo ordenar-se a baixa dos autos, com vista a que seja estruturada a instrução do processo pelo Tribunal de 1ª. Instância.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.100 a 102 do presente processo que julgou procedente a oposição intentada pelo recorrido, Francisco ..............., visando a execução fiscal nº................ e apensos, a qual corre seus termos no …º. Serviço de Finanças de Amadora, contra o opoente revertida e instaurada para a cobrança de dívidas de I.M.I. dos anos de 2007, 2008 e 2009, no montante total de € 3.793,33.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.110 a 115 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões:
1-Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos presentes autos que julga procedente a oposição deduzida pelo oponente FRANCISCO ............... do processo de execução fiscal n.º ............... e apensos instaurado por reversão da execução em que é devedora originária a sociedade L............... LDA por dívidas de IMI e com a quantia exequenda no montante de € 3.793,33;
2-Discorda a Fazenda Pública, salvo o devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, porquanto procede a uma errónea apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão, com consequente inadequado enquadramento jurídico;
3-Conforme consta da alínea d) do probatório, no âmbito do processo de insolvência da sociedade devedora originária “(…) à Fazenda Pública foi admitida a reclamação de créditos de IMI no valor total de € 5.007,03, tendo os mesmos sido graduados em primeiro lugar por gozarem de privilégio imobiliário especial sobre os três bens imóveis sujeitos àquele imposto conforme sentença de 27.06.2014, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido (cfr. fls. 74 a 81 dos autos);”., e por isso entendeu o Tribunal a quo que “(…) existindo ainda pelo menos três imóveis cuja venda poderá previsivelmente satisfazer os créditos exequendos (atendendo ao valor em dívida), não estão preenchidos os pressupostos de reversão previstos no nº 2 do artº 153º do CPPT.”;
4-No entanto, não consta do probatório facto que aluda ao efectivo trânsito em julgado da sentença que se constitui como fundamentadora da douta decisão, bem como não consta do probatório a identificação dos imóveis em questão, bem como não consta qualquer alusão ao valor patrimonial tributário dos mesmos, ou à efectivação ou não da venda dos mesmos em sede de execução fiscal, ou mesmo ao valor do acrescido a considerar para efeitos de satisfação da dívida em apreço nos autos de execução fiscal;
5-Se o Tribunal a quo abraça o entendimento de que o pressuposto referente à insuficiência dos bens penhoráveis da devedora subsidiária não se mostra preenchido à data da reversão por em momento subsequente ser proferida sentença ao abrigo da qual são os créditos reclamados pela Fazenda Pública são graduados em primeiro lugar, teria de cuidar de fixar os precisos factos que asseguram, de acordo com tal entendimento, que o crédito exequendo será satisfeito, o que não aconteceu;
6-Limita-se o Tribunal a quo a decidir com base numa presunção de que o crédito exequendo poderá ser previsivelmente satisfeito, tendo por referência o facto assente na alínea d) do probatório, claramente insuficiente para suportar tal juízo, incorrendo dessa forma em erro de julgamento de facto;
7-Não obstante, e independentemente do deficiente julgamento de facto apontado, discorda a Fazenda Pública respeitosamente da interpretação jurídica atribuída pelo Tribunal a quo às normas em apreço, bem como da apreciação que faz do momento em que a legalidade do despacho de reversão, e seus fundamentos, deverá ser aferida;
8-Vejamos que decorre expressamente do disposto no n.º 2 do artigo 23.º da LGT que “A reversão contra o responsável subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis subsidiários, sem prejuízo do benefício da excussão.”, não dependendo a reversão da efectiva excussão do património da devedora originária, e bastando-se a sua legalidade com o juízo fundado de insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal à data da reversão, conforme reiterado no n.º 2 do artigo 153.º do CPPT a que faz apelo a douta sentença;
9-Nesses termos, impõe-se a apreciação da legalidade no momento em que tal despacho é proferido, e não em momento subsequente e com base em factos que apontam no sentido de uma mera probabilidade de satisfação do crédito exequendo e acrescido, previsibilidade essa que em nada interfere com a legalidade do despacho de reversão;
10-E quando o Tribunal a quo entende que o facto de existirem três bens imóveis cuja venda poderá previsivelmente satisfazer os créditos exequendos permite concluir que não estão preenchidos os pressupostos de reversão previstos no n.º 2 do artigo 153.º do CPPT, não está a proceder à devida interpretação do preceito legal, em conjugação com o n.º 2 do artigo 23.º da LGT, na medida em que a reversão não está dependente da prévia excussão dos bens do devedor principal, mas só e apenas de uma fundada insuficiência do património do devedor principal para a satisfação da dívida exequenda e acrescido, a qual deverá ser aferida necessariamente à data em que se efectiva a reversão;
11-Deste modo, a legalidade do despacho de reversão não pode ser posta em causa, porquanto a insuficiência dos bens da devedora principal se revelou fundada à data da reversão, tendo em consideração a informação constante dos autos de execução fiscal, pois a devedora originária foi declarada insolvente por sentença proferida em 2011-11-21, transitada em julgado, daí resultando a conclusão inequívoca de o activo da devedora originária se mostrar insuficiente para solver as dívidas para com os seus credores, incluindo-se nesta previsão as dívidas fiscais;
12-Mais, na sequência de diligências levadas a cabo pelo Serviço de Finanças com vista à penhora de bens da devedora originária, concluiu-se pela impossibilidade de o património da mesma fazer face às dívidas fiscais constituídas e vencidas, pelo que, tais diligências infrutíferas, o facto de não serem conhecidos da AT bens capazes de satisfazer o crédito e a subsequente declaração de insolvência da empresa, se configuram objectivamente como factos susceptíveis de fundamentar a reversão contra o gerente da sociedade, oponente, não obstante o património da sociedade de devedora originária se encontrar em fase de liquidação;
13-Pois, se devidamente analisados, configuram impreterivelmente a “insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal” plasmada, enquanto fundamento da reversão contra o responsável subsidiário, nos normativos contidos no n.º 2 do artigo 23.º da Lei Geral Tributária (LGT) e no n.º 2 do artigo 153.º do CPPT;
14-Acresce que, per si, a declaração de insolvência proferida em processo judicial de insolvência, considerando ademais o carácter pleno da declaração de insolvência aqui em apreço, referente à devedora principal L............... Lda., surge como um elemento de que emerge a fundada insuficiência dos bens do devedor, mais se devendo referir que com a Lei n.º 64-B/2001, de 30 de Dezembro, que procedeu à alteração do n.º 7 do artigo 23.º da LGT, passou a contemplar-se a possibilidade de reversão nos processos de insolvência em que seja solicitada a avocação dos processos de execução fiscal nos termos do n.º 2 do artigo 181.º do CPPT;
15-Nos termos expostos, a douta sentença ao julgar procedente a presente oposição fê-lo incorrendo em erro de julgamento de facto, atenta a errónea apreciação dos factos pertinentes para a decisão, por não permitirem os factos levados ao probatório presumir uma previsibilidade da satisfação do crédito exequendo e não se mostrar a mesma de molde a fundamentar a ilegalidade do despacho proferido, mais incorrendo em erro de julgamento de direito por violação do disposto no nos n.ºs 2, 3 e 7 do artigo 23.º da LGT, e do n.º 2 do artigo 153.º do CPPT;
16-Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença ser revogada, com o julgamento improcedente da oposição, com as legais consequências. Sendo que V. Exas. decidindo farão a Costumada Justiça.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.123 e 124 do processo físico).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A decisão recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.100 e 101 do processo físico):
A-Em data não apurada, no …º. Serviço de Finanças de Amadora, foram instaurados contra a sociedade “L..............., Lda.” o processo de execução fiscal nº................ e apensos (nº ..............., nº ............... e nº ...............), por dívidas de IMI dos anos de 2007, 2008 e 2009, a que corresponde a quantia exequenda total de € 3.793,33 (cfr.informação exarada a fls.19 a 22 do processo físico; PEF apenso);
B-Em 29.01.2013 foi proferido despacho de reversão do processo referido na alínea anterior contra o aqui oponente, Francisco ..............., na qualidade de responsável subsidiário (cfr.informação exarada a fls.19 a 22 do processo físico);
C-Por sentença de 21.11.2011, proferida pelo Juízo do Comércio de Sintra, no procº nº 20661/11.4T2SNT foi declarada a insolvência da sociedade “L..............., Lda.” (cfr.informação exarada a fls.19 a 22 do processo físico);
D-O referido processo de insolvência em 30.06.2014 encontrava-se a aguardar liquidação, e nele à Fazenda Pública foi admitida a reclamação de créditos de IMI no valor total de € 5.007,03, tendo os mesmos sido graduados em primeiro lugar por gozarem de privilégio imobiliário especial sobre os três bens imóveis sujeitos àquele imposto conforme sentença de 27.06.2014, cujo teor aqui se dá por inteiramente reproduzido (cfr.documento junto a fls.74 a 81 do processo físico);
E-Em 13.02.2013 foi citado o oponente por reversão no âmbito da execução fiscal identificada na al.A supra (cfr.documentos juntos no PEF apenso).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não há factos relevantes para a discussão da causa que, em face das possíveis soluções de direito, importe registar como não provados…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos ao processo e acima expressamente referidos em cada um dos pontos do probatório…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou procedente a oposição que originou o presente processo, com a consequente extinção da execução contra o opoente, tudo em virtude da falta de prova do pressuposto da reversão relativo à fundada insuficiência de bens da sociedade executada originária.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante aduz, em primeiro lugar e em síntese, que tendo por base a factualidade constante da al.D) do probatório a decisão recorrida não podia ter concluído pela falta de verificação dos pressupostos de reversão previstos no artº.153, nº.2, do C.P.P.T. Que não consta da factualidade provada o efectivo trânsito em julgado da sentença de graduação de créditos lavrada no processo de insolvência. Que não consta do probatório a identificação dos imóveis em questão, bem como não consta qualquer alusão ao valor patrimonial tributário dos mesmos, ou à efectivação, ou não, da venda dos mesmos em sede de execução fiscal, ou mesmo ao valor do acrescido a considerar para efeitos de satisfação da dívida em apreço nos autos de execução fiscal. Que o Tribunal “a quo” teria de cuidar em fixar a factualidade que assegura, de acordo com o seu entendimento, que o crédito exequendo seria satisfeito, o que não aconteceu (cfr.conclusões 3 a 5 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar, supomos, erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Antes do exame do alegado erro de julgamento de facto, o qual se reconduz a um défice instrutório, no caso concreto, recorde-se que o instituto da reversão é exclusivo da execução fiscal, sendo desconhecido na execução comum, e traduz-se numa modificação subjectiva da instância, pelo chamamento, a fim de ocupar a posição passiva na acção, de alguém que não é o devedor que figura no título. O legislador só consagrou o instituto da reversão na execução fiscal, como alteração subjectiva da instância executiva, para possibilitar que, por essa via, se cobrem, no mesmo processo executivo, as dívidas de impostos, mesmo de quem não ocupa, inicialmente, a posição passiva na execução, por não figurar no título executivo. O que se justifica em atenção à natureza da dívida e aos interesses colectivos em jogo (o legislador concebeu a execução fiscal como um meio mais expedito e célere do que a execução comum, visando a cobrança coerciva das dívidas fiscais), e à certeza e liquidez destas dívidas, atributos que não adornam, necessariamente, as dívidas não tributárias (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/2/2002, rec.25037; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/6/2011, proc.4505/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc.5370/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2014, proc.7634/14; Carlos Paiva, O Processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.179 e 180).
De acordo com a jurisprudência do S.T.A. e a doutrina que subscreve-mos, é a oposição à execução o meio processual adequado para o executado, por reversão, discutir em juízo o despacho determinativo dessa reversão, nomeadamente, imputando-lhe vícios de forma por ausência de fundamentação e preterição de formalidades legais, assim devendo enquadrar-se este fundamento da oposição no artº.204, nº.1, al.i), do C.P.P.Tributário (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/3/2006, rec.1249/05; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/4/2007, rec.172/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/6/2011, proc. 4505/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc.5370/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2014, proc.7634/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.67; António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária anotada, Rei dos Livros, 2000, pág.134).
Para o efeito da definição de qual o regime normativo aplicável à decisão de reversão do processo de execução fiscal, no que respeita aos requisitos adjectivos para a respectiva efectivação, importa o momento em que a citada reversão é decretada (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/04/2005, rec.100/05; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 27/04/2005, rec. 101/05; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc.5370/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2014, proc.7634/14).
No caso “sub judice”, a reversão da execução fiscal nº................ e apensos, contra o responsável subsidiário e ora recorrido foi ordenada em 29/01/2013 (cfr.al.B) da matéria de facto provada), pelo que, o regime normativo aplicável é o constante dos artºs.23, da L.G.Tributária, e 153, do C.P.P.Tributário.
Nos termos dos citados artºs.23, nº.2, da L.G.T., e 153, nº.2, do C.P.P.T., a reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário depende de verificação da inexistência de bens penhoráveis do devedor originário e seus sucessores/responsáveis solidários ou da fundada insuficiência, para pagamento da dívida exequenda e acrescido, dos bens penhoráveis, integrantes do património destes, sendo que esta última circunstância se pode ter como preenchida com base em elementos constantes de auto de penhora e outros elementos disponíveis na execução fiscal. Ao invés do regime anterior, plasmado no artº.239, nº.2, C.P.T., não é, na actualidade, necessária a prévia excussão do património do devedor originário para ser praticável a reversão, bastando a fundada insuficiência, atestada pela forma referenciada. Por outras palavras, nos casos em que os bens penhorados ao devedor originário têm um valor pré-determinado e esse valor é inferior ao da dívida exequenda revertida é possível concluir no sentido da fundada insuficiência dos mesmos bens, em momento anterior ao da venda, visando o pagamento da dívida exequenda e acrescido (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/07/2017, proc. 1305/14.9BELRA).
Todavia, realizada a alteração subjectiva da instância executiva com base na aludida fundada insuficiência patrimonial, a execução não pode avançar para a fase da penhora de bens do revertido, enquanto o devedor originário tiver património penhorável.
Neste caso a lei separa, claramente, dois momentos distintos na responsabilidade subsidiária. O primeiro é o momento em que a A. Fiscal pode efectuar a reversão, ou seja, constituir o responsável subsidiário como devedor. Esse momento ocorre logo que a Fazenda Pública determine a insuficiência de bens penhoráveis do devedor principal e eventuais responsáveis solidários. Tal pode ocorrer logo depois da instauração do processo de execução fiscal, dependendo apenas de uma avaliação do valor dos activos do responsável originário ou solidário e da sua comparação com o valor em dívida. Assim que se apure essa insuficiência, a A. Fiscal pode chamar à execução os responsáveis subsidiários e, após o exercício do direito de audição, constituí-los como devedores mediante a citação (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/07/2017, proc. 1305/14.9BELRA).
O segundo momento é aquele em que a Fazenda Pública pode iniciar os actos de coerção sobre o património do devedor subsidiário. A lei exige, como pressuposto essencial para que a A. Fiscal possa executar esse património, que antes tenha sido excutido o património do devedor principal, a fim de se determinar com precisão o âmbito de responsabilidade financeira do revertido. O chamado benefício da excussão prévia inibe a Fazenda Pública de executar o património do revertido antes de se apurar com rigor o valor exacto da sua responsabilidade, o que ocorrerá mediante a excussão de todo o património do devedor principal (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/07/2017, proc. 1305/14.9BELRA; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.200; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.65 e seg.).
Nesta sede, à A. Fiscal incumbe o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento, previsto na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes. Só no caso de a Fazenda Pública fazer a prova do preenchimento desses pressupostos, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/4/2005, rec.100/05; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/6/2011, rec.167/11; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/5/2012, rec.123/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2015, proc.8792/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/4/2017, proc.456/13.1BELLE; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/07/2017, proc.1305/14.9BELRA; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.65 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.223 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, do exame do probatório, tal como da prova produzida e constante do processo e apenso, desde logo, não consta a produção de prova incidente sobre os seguintes elementos factuais:
1-Os fundamentos da reversão da execução fiscal nº................ e apensos contra o opoente e ora recorrido, dado que não existe nos autos cópia do despacho de reversão e eventual informação, devidamente documentada, em que se baseou;
2-Supondo que a reversão se fundamentou na alegada insuficiência de bens da sociedade executada originária, haverá que averiguar da concreta identificação e valor patrimonial dos três bens imóveis que fundamentaram a reclamação de créditos admitida no âmbito do processo de insolvência, atento o valor base dos imóveis para venda ditada pelo artº.250, nº.1, do C.P.P.T., visto que pressuposto do exame do dito fundamento de reversão;
3-Concreto valor da dívida exequenda a considerar para efeitos de pagamento nos autos de execução fiscal nº................ e apensos;
4-O efectivo trânsito em julgado da sentença de graduação de créditos lavrada no processo de insolvência, tal como os eventuais desenvolvimentos posteriores de tal processo, nomeadamente, relativos à satisfação dos créditos reconhecidos e graduados.
Nestes termos, recaindo embora sobre as partes o ónus da prova dos factos constitutivos, modificativos e/ou extintivos de direitos, a actividade instrutória pertinente para apurar a veracidade de tais factos compete também ao Tribunal, o qual, atento o disposto nos artºs.13, do C.P.P.Tributário, e 99, da L.G.Tributária, deve realizar ou ordenar todas as diligências que considerar úteis ao apuramento da verdade, assim se afirmando, sem margem para dúvidas, o princípio da investigação do Tribunal Tributário no domínio do processo judicial tributário (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.859; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.173 e seg.).
Arrematando, verifica-se uma situação de défice instrutório, no que respeita ao exame dos pressupostos da reversão, a qual demanda o exercício de poderes cassatórios por parte deste Tribunal nos termos do artº.662, nº.2, al.c), do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, devendo ordenar-se a baixa dos autos, com vista a que seja estruturada a instrução do processo pelo Tribunal de 1ª. Instância de acordo com os trâmites mencionados supra (prejudicado ficando o exame do outro esteio do recurso), ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em ANULAR A SENTENÇA RECORRIDA E ORDENAR A BAIXA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE 1ª. INSTÂNCIA, cumprindo-se em conformidade com as diligências de instrução que se reputem úteis e necessárias à discussão da matéria de facto para os fins acima precisados, após o que se deverá proferir nova sentença que leve em consideração a factualidade entretanto apurada.
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Sem custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 22 de Maio de 2019



(Joaquim Condesso - Relator)


(Vital Lopes - 1º. Adjunto)



(Patrícia Manuel Pires - 2º. Adjunto)