Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07947/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:10/16/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:EXAME E DECISÃO DE DOIS RECURSOS.
DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. PROVA TESTEMUNHAL.
REGIME DE TRIBUTAÇÃO DAS MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA.
ARTº.89-A, DA L. G. TRIBUTÁRIA, NA REDACÇÃO RESULTANTE DA LEI 94/2009, DE 1/9.
MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA, EM SENTIDO ESTRITO (ARTºS.87, Nº.1, AL.D), E 89-A, DA L.G.T.).
INCREMENTOS PATRIMONIAIS OU DESPESA NÃO JUSTIFICADOS (ARTº.87, Nº.1, AL.F), DA L.G.T.).
ÓNUS DA PROVA.
I.R.S. JUSTIFICAÇÃO PARCIAL DE RENDIMENTOS.
CONTAS BANCÁRIAS COLECTIVAS.
TITULARIDADE DOS VALORES DEPOSITADOS.
PRESUNÇÃO DO ARTº.516, DO C.CIVIL.
Sumário:1. Levando em consideração, segundo um prudente critério, a tutela mais eficaz dos interesses em presença no âmbito do presente processo, deve concluir-se pela necessidade de apreciação, em primeiro lugar, do recurso apresentado pelo recorrente (...), desde logo, por uma questão de prioridade temporal, apesar de entre os dois recursos não se estabelecer qualquer relação de subsidiariedade, visto terem por objecto partes distintas do dispositivo da decisão recorrida (cfr.artº.124, do C.P.P.Tributário).

2. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).

3. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

4. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

5. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.

6. Se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

7. A denominada Lei de Reforma da Tributação do Rendimento (cfr.Lei 30-G/2000, de 29/12) veio, no capítulo relativo às medidas de combate à evasão e fraude fiscais, introduzir uma importante alteração nas regras relativas ao ónus da prova e à possibilidade de recurso a métodos indirectos na determinação da matéria tributável.

8. O referido diploma excluiu da presunção de veracidade das declarações do contribuinte os casos em que os rendimentos declarados para efeitos de I.R.S. se revelem desproporcionados, para menos, sem razão justificativa, dos padrões de rendimento indiciados por determinadas manifestações de fortuna. Com o aditamento à L. G. Tributária da al.d), do nº.2, do artº.75, e do artº.89-A, efectuado pela Lei 30-G/2000, de 29/12, o legislador consagrou uma nova situação em que cessa a presunção de veracidade da declaração do contribuinte: o de existirem manifestações de fortuna em desproporção com os rendimentos declarados, tudo nos termos previstos na lei.

9. Na tributação com base em manifestações de fortuna, em sentido amplo, podem ser discernidas duas tipologias de situações:
a) A correspondente ao artº.87, nº.1, al.d), da L.G.T., que determina a possibilidade de avaliação indirecta quando os rendimentos declarados em sede de I.R.S. se afastarem significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artº.89-A do mesmo diploma (manifestações de fortuna, em sentido estrito);
b) A constante da al.f), do nº.1, do artº.87, da L.G.T., segundo a qual é possível tal avaliação indirecta, quando haja um acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a € 100.000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados (incrementos patrimoniais ou despesa não justificados).

10. De acordo com o artº.87, nº.1, al.f), sendo detectada pela A. Fiscal uma divergência entre os valores declarados pelo sujeito passivo através da sua declaração mod.3 do I.R.S. e um acréscimo patrimonial ou consumo evidenciado de pelo menos um terço, aquela encontra-se legitimada a presumir, através da avaliação indirecta, um rendimento resultante dessa diferença de valores. A aplicação deste regime depende do pressuposto da omissão da declaração de rendimentos ou da apresentação de declaração com rendimentos desproporcionados, para menos, face ao nível de rendimento evidenciado pelas manifestações de fortuna apresentadas. Nestes casos, cabe ao contribuinte a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas. Para o efeito, o contribuinte deve apresentar os respectivos elementos probatórios demonstrativos de que a fonte das manifestações de fortuna apresentadas não é constituída por rendimentos indevidamente não declarados, conforme se retira do disposto no artº.89-A, nº.3, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 94/2009, de 1/9, a aplicável ao caso “sub judice” (cfr.artº.12, do C.Civil). Encontramo-nos perante regime dirigido à descoberta de rendimentos inominados sujeitos a I.R.S. Parte-se do consumo ou de aumentos de património evidenciados pelo sujeito passivo e de que a A. Fiscal tem conhecimento para a presunção de rendimentos que os sustentem.

11. Os ditos acréscimos patrimoniais não justificados consagrados no artº.87, nº.1, al.f), da L.G.T., são passíveis de enquadramento no artº.9, nºs.1, al.d), e 3, do C.I.R.S. (categoria G de rendimentos na cédula de I.R.S.), devendo visualizar-se este último preceito como uma verdadeira norma residual de incidência, dando melhor concretização à teoria do rendimento-acréscimo subjacente ao I.R.S.

12. Admite a doutrina e a jurisprudência mais recentes a possibilidade do afastamento parcial da presunção de rendimento consagrada no examinado artº.89-A, da L.G.T., no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., nas situações em que o sujeito passivo somente faz prova parcial da fonte dos seus sinais exteriores de riqueza (v.g.celebração de empréstimo bancário para adquirir imóvel). Nestes termos, embora só a justificação total do montante que permitiu a verificação da “manifestação de fortuna”, tenha a virtualidade de afastar a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram tais sinais exteriores de riqueza, já assim não é, contudo, no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., onde a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto.

13. As contas bancárias colectivas (aquelas que têm mais do que um titular) podem ser solidárias (quando qualquer dos titulares pode movimentar sozinho a conta) ou conjuntas (quando os movimentos da conta exigem a intervenção simultânea de todos os seus titulares). No que respeita à titularidade dos valores depositados numa conta bancária colectiva, na falta de demonstração em contrário, presume-se (cfr.artº.516, do C.Civil - presunção ilidível) que cada um dos depositantes é proprietário de metade dos fundos nela existentes.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
1-ISABEL ………………….., com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.1024 a 1064 dos autos, através da qual julgou parcialmente procedente o recurso deduzido ao abrigo do artº.146-B, do C.P.P.Tributário, da decisão do Director de Finanças de Lisboa, datada de 20/02/2014, que fixou à recorrente, por métodos indirectos, a matéria colectável de € 471.572,09, relativamente ao ano de 2010 e nos termos do disposto nos artºs.87, nº1, al.f), e 89-A, nºs.3 e 5, da Lei Geral Tributária.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.1073 a 1125 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-O presente recurso tem por objecto a sentença proferida pelo Mm.° Juiz a quo em 3/07/2014 no âmbito do recurso de decisão de avaliação de matéria colectável com recurso a métodos indirectos apresentado pela recorrente, nos termos do disposto no artigo 146.°-B e seguintes do CPPT e no artigo 89.°-A da LGT, da decisão dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa que, ao abrigo do disposto nos artigos 9.°, n.°1, alíneas d) e n° 3 do Código do IRS, 87.°, n.° 1, alíneas d) e f) e 89.°-A, n.°s 3 e 5 da LGT, fixou o rendimento tributável da Recorrente em sede de IRS, por referência ao ano de 2010, em € 471.572,09;
2-Na sentença recorrida o Mm.° Juiz a quo negou provimento (parcial) ao recurso da recorrente por apenas considerar demonstradas quantias no valor de € 142.711,00 referentes a remessas de dinheiro de Angola através de levantamentos, em Portugal, do saldo dos cartões angolanos KUMBU e BNI, com a consequente redução da correcção oficiosa do rendimento tributável da recorrente em sede de IRS por referência ao ano de 2010, de € 471.572,09 para € 287.592,09;
3-Entendeu o Mm.° Juiz a quo, em suma, que do probatório resulta claro existir uma divergência entre os rendimentos declarados e o património/consumo verificado, não justificada pela recorrente a quem competia, no âmbito da acção inspectiva realizada, comprovar que correspondiam à realidade os rendimentos declarados e que o consumo evidenciado provinha de outras fontes de rendimento não sujeitos a imposto, conforme resulta do disposto no n° 3, do artigo 89.°-A da LGT;
4-Contudo, a sentença recorrida labora em erro de julgamento tanto no que concerne aos pressupostos de direito - na medida em que o esforço probatório exigido à recorrente pelo Tribunal a quo não tem apoio legal no artigo 89°.-A, n.° 3 da LGT - como também no que tange à apreciação da matéria de facto - por referência à qual a recorrente produziu abundante prova - pelo que importa analisar porque claudicam os fundamentos em que o Tribunal recorrido assenta a decisão de improcedência (parcial) do recurso judicial apresentado pela ora recorrente;
5-No que respeita ao erro sobre os pressupostos de direito, cumpre referir que da jurisprudência maioritária do Tribunal Central Administrativo (Sul), apoiada pelo Supremo Tribunal Administrativo, resulta que do disposto no n° 3 do artigo 89.°-A da LGT não se pretende que o contribuinte efectue a prova da origem dos meios financeiros que fundamentaram a manifestação de fortuna, bastando a prova da afectação desses rendimentos à ostentação de riqueza evidenciada e da sua não tributação em sede de IRS, na medida em que o objectivo do regime é marcadamente o de tributar os rendimentos omitidos na declaração de rendimentos do ano da constatação da manifestação de fortuna;
6-No entender da recorrente, o Mm.° Juiz a quo não teve em devida conta o referido entendimento jurisprudencial no exame que fez dos documentos e depoimentos produzidos nos autos, na medida em que parece ter exigido da recorrente um esforço probatório que não tem apoio legal, nem no disposto no artigo 89.°-A, n.° 3 da LGT, nem na interpretação que o Tribunal Central Administrativo Sul tem feito do referido preceito legal, maxime na parte em que sufraga o entendimento de que à recorrente cumpria a prova da concreta origem de todo e qualquer depósito bancário efectuado pelo companheiro da recorrente e sua família, quando na verdade bastaria provar que os referidos meios financeiros não advirem de rendimentos tributáveis na esfera da recorrente em 2010;
7-No que respeita ao erro sobre os pressupostos de facto, entende a recorrente que à luz da razão de ciência dos depoimentos prestados por Paulo …………., Maria ……………, Pedro ………….. e Graça ……… - intervenientes e com conhecimento total e direto dos factos sobre os quais prestaram os seus depoimentos de forma totalmente espontânea - deveria ter ficado cabalmente demonstrado nos autos que o acréscimo de património e de despesa verificado na esfera da recorrente resultou apenas e só (i) das remessas de dinheiro que o companheiro da recorrente (Paulo ………………) realizou a partir de Angola, (ii) da liquidação das dívidas que Jorge ………… (sócio e gerente da J. R……………, LDA.) tinha perante o companheiro da recorrente e que pagou através da entrega à recorrente dos cheques emitidos pela sociedade P.......... à sociedade J. R……….., LDA. e, bem assim, (iii) da liquidação de uma dívida no valor de € 30.000,00 que o pai da recorrente tinha perante o seu companheiro, nenhuma das quais susceptível de tributação em sede de IRS na esfera da recorrente;
8-Por facilidade de exposição e de compreensão, as razões da discordância da recorrente com o exame que o Mm.° Juiz a quo fez dos documentos e depoimentos produzidos nos autos poderá ser dividida nos seguintes tópicos:
i. Depósitos de numerário nas contas bancárias da recorrente (€ 459.420,14);
ii. Pagamento de empréstimos bancários (€ 119.714,78);
iii. Aquisição de viaturas automóveis (€ 54.290);
iv. Pagamento do lVA da sociedade J. R…………., LDA. (€ 23.952,32);
v. Depósito de cheques emitidos pela sociedade P.......... e transferências efectuadas pela sociedade E………. (€ 137.250,68 + € 6.000,00); e
vi. Depósito de cheque emitido por Fernando ………………. (€ 30.000,00);
9-No que diz respeito aos depósitos de numerário nas contas bancárias da recorrente, decorre dos depoimentos das testemunhas e dos documentos n.°s 16, 17, 18 e 19 juntos ao recurso, do documento n° 2 do requerimento apresentado em 17/03/2014, dos documentos n.°s 1 e 2 do requerimento apresentado em 11/04/2014 e dos documentos n.°s 1 a 90 do requerimento apresentado no dia 05/05/2014 que os depósitos de numerário nas contas bancárias da recorrente e detectados pela Administração Tributária no decurso da acção inspectiva por referência ao ano de 2010, eram efetuados pelas seguintes vias;
i. Através de levantamentos de remessas de dinheiro enviadas de Angola, pelo companheiro da recorrente e através da WESTERN UNION;
ii. Através de levantamentos de dinheiro efetuados com utilização dos cartões angolanos KUMBU (do BANCO SOL ANGOLA);
iii. Através de levantamentos de dinheiro efetuados com utilização dos cartões angolanos BNI (do BANCO DE NEGÓCIOS INTERNACIONAL DE ANGOLA);
iv. Através de depósitos de dólares americanos que o companheiro da recorrente enviava de Angola e depositava em Portugal quando viajava para Portugal, ou que eram entregues à recorrente e familiares do companheiro da recorrente por pessoas conhecidas do companheiro da recorrente, aquando de viagens destes, de Angola para Portugal;
10-No que diz respeito ao pagamento de empréstimos bancários, resulta do depoimento de Paulo ……………. prestado em audiência de julgamento que os meios financeiros para as várias amortizações parciais efetuadas a partir de 27/09/2010 e cujo valor total ascendeu a € 119.714,78 (sendo € 5.790,86 o valor das prestações habituais), advieram dos depósitos de várias remessas de dinheiro e transferências realizada por Paulo ………….. (em Angola) e a favor da recorrente;
11-No que diz respeito à aquisição de viaturas automóveis, das declarações de parte da recorrente e do depoimento prestado por Paulo …………… resulta que os veículos em questão foram dois presentes de Paulo …………… para a recorrente, tendo os meios financeiros utilizados para a sua aquisição origem nas remessas de dinheiro para o efeito enviadas de Angola, pelo companheiro da recorrente, não sendo, pois, tributáveis na esfera da recorrente;
12-No que diz respeito ao pagamento do IVA da sociedade J. R…….., LDA., ficou esclarecido em sede de inquirição de testemunhas que o companheiro da recorrente e Jorge …………… têm uma relação de amizade de longa data, motivada pelo facto de Jorge …………….e mais de 10 anos, pelo que quando em 1997/1998, Jorge ………… começou a ter dificuldades financeiras (situação que ainda se mantém e que afetou a sociedade J. ………., LDA.), Paulo ………. em investido num espírito de liberalidade emprestou por diversas vezes dinheiro a Jorge ………, tendo ainda, durante o ano de 2010, efetuado pagamentos do IVA devido pela sociedade J. ……….., LDA;
13-A referida operação nenhuma relação tem com qualquer actividade tributável ou outra da recorrente, cuja conta bancária foi, a pedido de Paulo ………, utilizada meramente como uma conta intermediária com vista a viabilizar a transferência de fundos do companheiro da recorrente provenientes de Angola para pagamento do referido IVA, pelo que se considera plenamente justificada a liberalidade que esteve na origem do pagamento do IVA da sociedade J. …………., LDA. efectuado a partir das contas bancárias identificadas nos autos, não sendo consequentemente tributável como manifestação de fortuna na esfera da recorrente, porquanto não configura rendimento da mesma;
14-Também no que diz respeito ao depósito de cheques emitidos pela sociedade P………….. e transferências efectuadas pela sociedade E……, demonstrou a recorrente que os pagamentos por cheques e transferências efectuado respectivamente pelas sociedades P…………… e E………… nenhuma relação têm com qualquer actividade tributável ou outra da recorrente, tendo as suas contas sido utilizadas a pedido do seu companheiro meramente como contas intermediárias de modo a viabilizar a transferência de fundos seus provenientes de Angola ou, de outro modo, para condução de negócios que apenas ao companheiro da recorrente são atribuíveis;
15-Por fim, no que diz respeito ao diz respeito ao depósito de um cheque emitido por Fernando …….. (pai da recorrente) na conta bancária ………, resulta tanto das declarações de parte da recorrente, como do depoimento de Paulo ……… e de Graça …………, que o cheque foi depositado na conta bancária ………. (em que Paulo …………. era 1° titular e na qual recebia parte do ordenado auferido em Angola), como forma de liquidação da dívida de igual valor, que o pai da recorrente tinha perante P................ e que havia sido contraída para aquisição do imóvel em que viveu com a mãe da recorrente, a qual faleceu recentemente;
16-Deste modo, considera a recorrente estar plenamente justificada a origem do cheque depositado numa das contas bancárias identificadas nos autos, no decurso do exercício de 2010, sendo certo que a mesma não pode servir de fundamento à tributação de manifestações de fortuna na esfera da recorrente, porquanto não configura rendimento tributável da recorrente;
17-A sentença recorrida viola, assim, o princípio do ónus da prova a que alude o artigo 89.°-A da LGT e, ainda, o princípio da capacidade contributiva a que se reporta o artigo 104.°, n.°1 da CRP, razão pela qual, deverá a sentença recorrida ser anulada, dando-se provimento ao recurso de decisão de avaliação de matéria colectável com recurso a métodos indirectos apresentado pela recorrente, com as legais consequências.
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A entidade recorrida, a Fazenda Pública, produziu contra-alegações no âmbito da instância deste primeiro recurso deduzido (cfr.fls.1190 a 1198 dos autos) pugnando pela manutenção do julgado, sem, no entanto, formular conclusões.
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2-O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA também deduziu recurso dirigido a este Tribunal visando a sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.1024 a 1064 dos autos, cingindo a apelação à parte da decisão em que considerou demonstradas quantias no valor de € 142.711,00, em virtude do que operou a redução da correcção oficiosa do rendimento tributável da recorrente, em sede de I.R.S. e por referência ao ano de 2010, de € 471.572,09 para € 287.592,09.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.1143 a 1146 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-A douta sentença, ao decidir como decidiu, anulando o valor de € 142.711,00 ao rendimento colectável apurado pela AT, em sede de avaliação indirecta do rendimento, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e erro na aplicação do direito;
Com efeito,
2-Não ficou provado o "percurso" dos depósitos em numerário, alegadamente provenientes dos cartões Kombu;
3-É que, apesar das testemunhas, e, em particular a testemunha M................ ter declarado que procedia aos levantamentos desses cartões e, posteriormente, depositava, parte dos fundos, nas contas da ora recorrida, não ficou demonstrado que assim seja;
4-Tanto os extractos desses cartões, como os talões de depósitos nas contas da recorrida, não são suficientes para sustentar aqueles depoimentos, pois de tais documentos não resulta qualquer aderência à alegada realidade, nem quanto aos valores levantados através desses cartões e, posteriormente depositados nas contas bancárias visadas, nem quanto às datas em que esses movimentos foram efectuados;
5-Não é ainda despiciendo, na apreciação do probatório, o facto da testemunha M................ ter dito que parte dos montantes levantados através desses cartões se destinava a pagamentos diversos, tendo a testemunha P................ dito que apenas depois de pagar as dívidas que possuía é que passou a mandar depositar dinheiro nas aludidas contas bancárias;
6-Não ficou, assim, demonstrado que os depósitos efectuados nas contas bancárias visadas tivessem a sua origem nos levantamentos dos cartões Kombu;
7-O mesmo se diga, pelas mesmas razões, quanto ao decidido pelo tribunal a quo relativamente aos cartões pré-pagos "BNI”;
8-Por último, incorreu ainda a decisão em erro de julgamento quando, relativamente às remessas provenientes da "Wester Union" que foram depositadas numa conta da recorrida em regime de contitularidade, entendeu que a administração tributária, na aferição do rendimento colectável, tinha tido em consideração da totalidade dos fundos depositados - o que não é verdade.
X
A recorrente apresentou contra-alegações no âmbito da instância deste segundo recurso deduzido, nas quais pugna pela confirmação do julgado nesta parte (cfr.fls.1153 a 1182 dos autos), sustentando, nas Conclusões:
1-O presente Recurso vem interposto, por parte da Fazenda Pública, contra a sentença proferida pelo Mm,° Juiz a quo no presente processo, na parte em que julgou parcialmente procedente o recurso judicial de decisão de avaliação de matéria colectável com recurso a métodos indirectos apresentado pela ora recorrida e, em consequência:
- determinou a anulação de urna importância no valor de € 142.711,00 (cento e quarenta e dois mil, setecentos e onze euros) aos montantes apurados considerados não justificados, o que resulta num apuramento do rendimento tributável corrigido no montante de € 287.592,09 (duzentos e oitenta e sete mil, quinhentos e noventa e dois euros e nove cêntimos);
- condenou a Fazenda Pública em 30% das custas, de acordo com o decaimento;
2-A Fazenda Pública vem pugnar pela anulação da sentença recorrida, por considerar que, ao contrário da posição assumida no Tribunal a quo, não resultou provado o "percurso" dos depósitos em numerário, em especial no que concerne às remessas de dinheiro enviadas de Angola, pelo companheiro da recorrida, através da WESTERN UNION, bem como aos levantamentos de dinheiro efectuados com utilização dos cartões angolanos KUMBU e BNI, pelo que incorreu o Mm.° Juiz a quo num erro de julgamento da matéria de facto e erro na aplicado do direito;
3-Antes de mais, cumpre referir que da jurisprudência maioritária do Tribunal Central Administrativo (Sul), apoiada pelo Supremo Tribunal Administrativo, resulta que do disposto no n° 3 do artigo 89.°-A da LGT não se pretende que o contribuinte efectue a prova da origem dos meios financeiros que fundamentaram a manifestação de fortuna, bastando a prova da afectação desses rendimentos à ostentação de riqueza evidenciada e da sua não tributação em sede de IRS, na medida em que o objectivo do regime é marcadamente o de tributar os rendimentos omitidos na declaração de rendimentos do ano da constatação da manifestação de fortuna;
4-Atento os fundamentos do recurso interposto pela Fazenda Pública, importa analisar em maior detalhe a prova produzida no que concerne aos levantamentos de remessas de dinheiro enviadas de Angola, pelo companheiro da recorrida, através da WESTERN UNION, bem como aos levantamentos de dinheiro efectuados com utilização dos cartões angolanos KUMBU e BNI, com vista a aferir da bondade da sentença recorrida na parte em que julgou (parcialmente) procedente o recurso judicial apresentado pela recorrida;
5-No que diz respeito às remessas de dinheiro de Angola através de levantamentos, em Portugal, do saldo dos cartões angolanos KUMBU (do BANCO SOL ANGOLA) e BNI (do BANCO DE NEGÓCIOS INTERNACIONAL), o Mm.° Juiz a quo considerou-as devidamente comprovadas, tendo no dispositivo da sentença decretado a anulação do referido valor aos montantes apurados considerados não justificados em face da ilegitimidade da determinação indirecta do rendimento colectável da recorrida quanto aos mesmos;
6-Com efeito, resulta da prova documental junta aos autos e dos depoimentos prestados em audiência de que os 2 cartões KUMBU e 4 cartões BNI referidos nos autos eram carregados em Angola por P................ até ao limite de $ 15.000 (quinze mil dólares), e utilizados em Portugal pela recorrida, pelos irmãos de P................, pela filha de P................ (Sofia …………..) e pelas filhas da recorrida (Patrícia e Rita …………….), que efectuavam o pagamento de despesas e procediam ao levantamento do saldo aí creditado por P................, posteriormente depositando os valores que P................ lhes tivesse indicado na ou nas contas bancárias referidas nos autos;
7-Não pode, pois, a recorrida aceitar que a Ilustre Representante da Fazenda Pública insista em considerar não provado o "percurso" dos depósitos em numerário proveniente dos cartões KUMBU e BNI, alegando ser de desconsiderar a prova testemunhal produzida por insuficiente ou contraditória, quando é certo que a recorrida arrolou testemunhas que com conhecimento total e directo dos factos sobre os quais prestaram os seus depoimentos descreveram em detalhe de forma totalmente espontânea;
8-Sem prejuízo do referido, a recorrida não pode deixar de responder directamente à alegada contradição identificada pela Ilustre Representante da Fazenda Pública no depoimento de M................ (irmã do companheiro da recorrida) quando confrontado com o depoimento de P................ (companheiro da recorrida), na medida em que a mesma tem por base uma incorrecta apreensão da ordem cronológica dos eventos;
9-Em todo o caso, o importante para a boa resolução da presente contenda é que ficou plenamente provado que o valor total destas remessas de dinheiro de Angola através do saldo dos cartões angolanos KUMBU e BNI teve uma origem claramente determinada, provindo os fundos em questão na totalidade de actividades do companheiro da recorrida em Angola, não sendo consequentemente tributável como manifestação de fortuna na esfera da recorrida;
10-No que diz respeito às remessas de dinheiro de Angola via WESTERN UNION a ilustre Representante da Fazenda Pública defende que o Tribunal a quo "incorreu ainda a decisão recorrida em erro de julgamento quanto às remessas provenientes da Western Union, porquanto, e ao contrário do decidido, a administração tributária, tendo em conta que se tratava de uma conta em regime de contitularidade (a ora recorrida e P................), cujos fundos pertencem em partes iguais aos seus contitulares, apenas imputou à recorrida metade dos depósitos efectuados";
11-Quanto a este ponto a recorrida oferece inteiramente o merecimento dos autos ao juízo superior do Tribunal ad quem, não se considerando em posição de opinar sobre a bondade dos argumentos invocados pela Ilustre Representante da Fazenda Pública, na medida em que da leitura do Relatório de Inspecção Tributária não resulta claro se a contitularidade foi ou não efectivamente tida em conta no apuramento final da rendimento colectável de IRS da recorrida por referência ao ano de 2010;
12-Trata-se, porém, de uma questão que pouco ou nada releva para a matéria dos autos, pois que o que interessa para boa decisão da presente contenda - e que ficou, aliás, atestado pelas testemunhas ouvidas em sede de inquirição de julgamento e, ainda, amplamente demonstrado por meio da prova documental junta aos presentes autos - é que os referidos montantes não tiveram origem em qualquer actividades praticada ou desenvolvida pela recorrida, na medida em que comprovadamente tiveram, antes, origem em actividades do seu companheiro (em Angola).
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do provimento do recurso interposto pela recorrente Isabel ………………., mais devendo improceder o interposto pela Fazenda Pública (cfr.fls.1213 e 1214 dos autos).
X
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº.146-D, nº.1, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.1025 a 1059 dos autos - numeração nossa):
1-No âmbito de um procedimento de inspecção relativa a consulta, recolha e cruzamento de informação, no qual se incluiu a investigação das contas bancárias, destinada ao apuramento da situação tributária da recorrente, do ano de 2010, em sede de IRS, tendo em vista aferir da conformidade da declaração de rendimentos por si apresentada com o aumento do património e da despesa efectuada evidenciado pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação, foi elaborado o relatório de inspecção, que aqui se dá por reproduzido e do qual conta, designadamente, que:
"(...)
AT
Autoridade
tributária e aduaneira
DIRECÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA
INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA - DEPARTAMENTO C - DIVISÃO H - EQUIPA 21

1-CONCLUSÕES DA AÇÃO INSPETIVA

No âmbito da ação de inspeção realizada ao sujeito passivo (s.p.) ISABEL …………….., (doravante designada de Isabel …………) com o NIF ………. e domicílio na Rua ………… nº 23 - 1° C, ………….. ……….., de âmbito parcial, relativa ao exercício de 2010, conforme descrito nos pontos IV e V do presente Relatório Conclusões de Inspecção Tributária efectuaram-se correcções ao rendimento colectável de IRS declarado pelo próprio, que se resumem no quadro infra:

1.1 - Correcções ao rendimento colectável, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS), com recurso a métodos indirectos, no ano de 2010

Foi apurado o rendimento tributável a fixar em sede de IRS, do ano de 2010, com recurso a métodos indirectos, no montante de € 471.572,09, nos termos do disposto no artº9° n°1 alínea d) e n° 3 do Código do Imposto sobre os Rendimentos das Pessoas Singulares (Cl RS), artigo 87° n° 1 alíneas d) e f) e 89°-A n°s 3 e 5, ambos da Lei Geral Tributária (LGT) conforme cálculos que se seguem:

Quadro 1 Unidade €
Ponto
      Descrição
      Valor
N.3.3 1 - Rendimento Global Declarado pelo s. p. 46.123,66
II.3.3 2 - Rendimento Coletável/Líquido Declarado 41.269,66
V 3 - Incrementos Patrimoniais não justificados (*) 512.841,75
V 4 - Rendimento Coletável Corrigido art° 89°A, nº5 al. a) e d) =3-2 471.572,09
5 - Correções ao Rendimento Coletável=4-2 ; 430.302,43

(*) Incrementos patrimoniais apurados, excluindo as transferências entre contas bancárias do s.p., conforme quantificado nos mapas constantes no anexo 5 pags. 48 e 49, anexo 6 pags 56 e 57, anexo 7 pag 11 e anexo 8 pag. 63 e 64.


II. OBJETIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA AÇÃO DE INSPEÇÃO

II. 1 - Credencial e período em que decorreu a ação

Em cumprimento do disposto na Ordem de Serviço n°OI201300675, emitida em 2013/02/08, e com despacho datado de 2013/02/08, nos termos do disposto nos artigos 2.°, nº1 e n,° 2, alínea a), 12.°, nº 1 e 14º n.° 1 alínea b), todos do Regime Complementar do Procedimento da Inspecção Tributária (RCPIT), foi ordenado procedimento inspectivo externo, referente ao exercido de 2010, ao s.p. ISABEL ………………., com o NIF …………, e domicílio fiscal na Rua ………….. n°23 - 1° C, ………. ………….

O presente procedimento de inspeção iniciou-se em 2013-02-22, com assinatura da Ordem de Serviço pelo sujeito passivo, e os atos inspectivos tiveram a sua conclusão em 2013-12-09, mediante assinatura da nota de diligência nos termos do art.º 61º do RCPIT.
O procedimento de inspecção foi alargado, por dois períodos de 3 meses, por despacho do Senhor Director de Finanças de Lisboa, comunicados ao sujeito passivo, mediante os ofícios n° 55618 e 79527, datados, respectivamente, de 2013-08-07 e 2013.11.11.

II.2 - Motivo, âmbito e incidência temporal

A presente ação de inspeção, foi motivada pelas movimentações nas contas bancárias do s,p., nomeadamente os pagamentos de IVA da sociedade J………….., Lda (NIIPC ………….), o pagamento de empréstimos bancários e o recebimento dos cheques da sociedade P…………. Serviços de …….. Lda (NIPC ………….), movimentações essas que não são compatíveis com os rendimentos do trabalho dependente declarados pela mesma.

A ordem de serviço externa n° OI201300675 é de âmbito parcial, para o IRS, e extensível ao exercício de 2010

II.3 - Outras situações
II.3.1 - Caracterização do Sujeito Passivo / Obrigações Declarativas
Trata-se de um s.p. singular, não inscrito para o exercício de qualquer atividade comercial, industrial ou profissional. De acordo com a informação constante no Sistema de Gestão de Registo de Contribuintes, é residente em Território Nacional, com domicílio fiscal na Rua ………….., n° 23, r C, ……….. …………………

O sujeito passivo em análise, é também sócio e representante de cessação da sociedade E………….PROJECTOS …………… LDA (NIPC …………..).

II.3.2 - Agregado familiar
De acordo com a sua declaração de rendimentos, modelo 3, do exercício de 2010, o agregado familiar é composto pelo próprio, e pela sua filha Rita Carvalho de Ia R................, NIF 219371628.

II.3.3 - Obrigações declarativas
Na qualidade de sujeito passivo de IRS, procedeu à entrega da declaração de rendimentos do exercício em análise, nos termos do art.°57° do CIRS, cujos rendimentos declarados, são os seguintes:

Quadro 2 Unidade €
Rendimentos Declarados Modelo 3 de IRS - 2010
Categoria A - T. Dependente Categoria B -T Independente
Isabel …………………………………
45.373,66
Rita …………………………..
750,00
Rendimento Global Declarado 46.123,66
Rendimento Líquido 41,269,66

Os rendimentos do trabalho dependente declarados foram atribuídos pela PT Comunicações S.A., NIPC ……………, os quais foram confirmados através da consulta à declaração modelo 10, submetida pela referida entidade.

Os rendimentos da categoria B - trabalho independente, foram auferidos pelo dependente do s.p,, no âmbito do exercício da actividade de "Outros Prest. De Serviços", com o código da tabela de atividades prevista no art. ° 151° do CIRS- 1519.

II.3.4 - Procedimentos Inspetivos Anteriores

O s.p. não foi objeto de outros procedimentos inspetivos anteriores.

II.3.5 - Dívidas Fiscais

Da consulta ao sistema informático, verificou-se que não existiam processos de execução fiscal em curso.

II. 4 - Diligências efectuadas

II.4.1 - Carta Aviso

O s.p. foi notificado, por carta registada (registo dos CTT nº RC 8397 7166 O PT), para o domicílio fiscal constante do sistema informático, através do ofício n.° 11124, de 2013-02-12, da carta aviso, nos termos da alínea l) do n° 3 do art.° 59º da Lei Geral Tributária (LGT) e art.º 49.° do RCPIT.

II.4.2 - Cruzamento de informação com outras entidades

Em 2013-02-22, aquando do início da ação de inspeção com a assinatura da ordem de serviço pelo s.p., foi o mesmo ouvido em auto de declarações, acerca dos movimentos nas várias contas bancárias de que é titular (anexo 1, pgs. 2 a 4).

Embora o s.p. tenha informado que alguns dos movimentos das contas bancárias foram efetuados pelo seu companheiro Sr. Paulo ……………….. (NIF ……………..), não conseguiu explicar exactamente, os motivos para os pagamentos, por si efetuados, do IVA da sociedade J. ……………. Lda, com o NIPC …………… nem tão pouco, a razão do recebimento dos cheques da sociedade P………… Serviços ……………. Lda com o NIPC ………………………...

Face às dúvidas em causa, o s p. autorizou a Autoridade Tributária (AT) a consultar e solicitar todos os documentos bancários necessários à análise (anexo 1, pg. 5)

Mediante a referida autorização, solicitaram-se os extratos bancários à Caixa ……….. (C..........) e ao Montepio ……………… (M……..) e, posteriormente, cópia de alguns documentos e/ou cheques, registados nos extractos.

Por sua vez, na sequência da informação contida no referido auto de declarações (anexo 1, pgs. 2 a 4) e, posteriormente, a remetida via email (anexo 1, pgs. 6 e 7), o s.p. acrescentou alguma informação relativamente aos movimentos relacionados com as sociedades P………… e J.R……………..

A fim de podermos clarificar as operações com estas duas sociedades, procedeu-se ao cruzamento de informação com as mesmas, solicitando-se alguns elementos, nomeadamente extractos de conta corrente e cópias dos documentos ai registados (anexo 2, pgs. 2 a 20)

Tendo em conta os elementos recebidos das várias entidades, nomeadamente das instituições bancárias (anexos 5, 6, 7 e 8), constatou-se que, nas contas bancárias em que o s.p. é titular, ocorreram inúmeras entradas de dinheiro, através de depósitos, cheques e transferências bancárias, bem como diversos pagamentos que suscitam dúvidas sobre a origem e destino dos mesmos, respetivamente. Assim, em 2013-04-22, notificou-se o sujeito passivo para que, nos termos do art.° 87° nº 1, alínea d) e f) e 89°-A n°s 3 e 5 ambos da LGT, justificasse a origem dos rendimentos em causa e os consumos efectuados no exercício em análise (anexo 1, pgs. 8 a 11).

De acordo com a informação prestada pelo sujeito passivo, em 2013-05-15 - cfr anexo 1, pgs. 12 a 51 - e elementos juntos a mesma, confirma-se que os incrementos patrimoniais / despesa ou consumos efetuada(os), no exercício de 2010, é de valor superior a € 100.000,00, divergindo esses consumos/acréscimos patrimoniais do rendimentos declarados, nos termos da legislação antes citada.

Desta forma, no ponto V do presente relatório, procederemos à descrição detalhada dos valores de incrementos patrimonias/consumos efetuados e, correspondente quantificação do rendimento coletável a corrigir.

III. DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITÉMICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL .

Não aplicável no caso e apreço.

IV. MOTIVO E EXPOSIÇÃO DOS FACTOS QUE IMPLICAM O RECURSO A MÉTODOS INDIRETOS

Dispõe a lei, nomeadamente a Lei Geral Tributária (LGT), duas formas de determinação da matéria tributável das pessoas singulares e coletivas - a directa e a indirecta.

De acordo com o art.° 81° daquele normativo, a determinação da matéria tributável, com recurso a métodos indiretos, só pode ser efetuada, nos casos e condições expressamente previstos na lei.

Quanto aos fins da avaliação indireta, estabelece o artº 83° n° 2 da LGT que aquele visa a determinação "dos rendimentos ou bens tributáveis a partir de indícios, presunções ou outros elementos de que a administração tributária disponha",

O art° 87° da LGT delimita o conjunto de situações as quais se pode aplicar a avaliação indireta.

Entre essas situações está a da alínea f) do n° 1 daquele artigo, segundo a qual pode efetuar-se a avaliação indireta em caso de "Acréscimo de património ou despesa efetuada, incluindo liberalidades, de valor superior a € 100.000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados".

Da análise à informação constante das várias contas bancárias infra identificadas e, respectivos contitulares, nomeadamente ao confrontar a totalidade dos movimentos de depósitos e transferências registados nas mesmas, com a declaração de rendimentos apresentada pelo sujeito passivo relativamente ao exercício de 2010, conclui-se estarmos perante uma situação passível de aplicação de métodos indiretos, face ao acréscimo de património ou despesa efetuada ser de valor superior a € 100.000,00, portanto, com uma divergência não justificada com os rendimento declarados pelo s.p. no mesmo período de tributação, nos termos do disposto na al. f) do º 1 do art°87° da LGT.

A relação total dos depósitos e transferências bancárias, deduzidos dos valores transferidos para outras contas do mesmo sujeito passivo, com vista a não se duplicar o valor de rendimentos, encontra-se evidenciada em mapas resumo (anexo 5 pags. 48 e 49, anexo 6 pags 56 e 57, anexo 7 pag.11 e, anexo 8 pags 63 e 64), e resulta da análise de todos os movimentos constantes nos extratos bancários, dos quais de junta cópia no anexo 5 pags. 3 a 33, anexo 6 pags. 3 a 23, anexo 7 pags.3 a 9 e, anexo 8 pags. 2 a 15, conjuntamente com a informação apresentada pelo sujeito passivo (anexo 1, pgs. 12 a 41).

As contas bancárias em que o sujeito passivo é titular e, nas quais ocorreram os movimentos descritos ao longo do presente relatório, são as infra indicadas:

Quadro 3
Relação de contas bancárias analisadas
1° Titular
Banco
Nº Conta
2° Titular
Autorizado Movimentar
Isabel …………Montepio ………………………………
Paulo ……………..
Paulo ………………….Montepio …………….………………..Isabel ………………………
Isabel ………………..Montepio …………………….Graça ………………
Isabel ……………………..Caixa …………….………………………..
Paulo ……………..
Elisa ………Caixa ……………..……..Isabel ……………….
Conforme se extrai da análise à informação constante no quadro supra, o sujeito passivo em análise, participa como titular nas cinco (5) contas bancárias. Uma das contas é detida em contitularidade com o Sr. Paulo ……………….. (companheiro do s.p.), outra com a Sra. Graça ………………………..o (irmã do s.p.) e outra com a Srª Elisa ……………….. (mãe do s.p.). As duas restantes contas é o sujeito passivo o único titular, com autorização de movimentação pelo seu companheiro Sr. P.................

Apesar da conta n° …………. da C………. ter como titulares o sujeito passivo e sua mãe Srª Elisa …………….., atendendo ao facto de a Srª Elisa ……………, por motivo de doença incapacitante, estar dependente do sujeito passivo em análise, e do auxílio prestado pelos serviços da Sociedade …………………, S.A. (SPSI), constatou-se que apenas a Srª Isabel de …………. movimenta a referida conta.

Esta conclusão foi reforçada pelo facto dos incrementos patrimoniais resultantes da movimentação da referida conta, ocorrerem na esfera patrimonial do sujeito passivo em análise, conforme resulta da análise à conta bancária, conjuntamente com a análise de todos os elementos de que dispomos, nomeadamente, das aquisições de bens móveis, dos consumos e, pagamentos de empréstimos relativos a bens imóveis.

Assim, da análise às contas em que o s.p. é titular, permite-nos concluir o seguinte:

•A conta n° …………., da C……….., já antes referenciada, apesar de detida em contitularidade com sua mãe, Srª Elisa ……………, na realidade é controlada pelo sujeito passivo em análise, o qual dispõe dos valores nela depositados conforme a sua vontade;

• A conta ………………. do M…… …………, detida em contitularidade com sua irmã. os valores nela registados são pouco significativos, e tão pouco nos permite identificar qual dos titulares a controlava. Como tal, os seus valores não foram tidos em consideração em todos os cálculos efectuados.

• Por sua vez, a conta nº 1……. do M.................e, a conta n° …………..da C.........., revelam incrementos patrimoniais exclusivos do sujeito passivo, cujos valores creditados mediante depósitos e transferências bancárias, o mesmo usufruiu, conforme a sua vontade, ao longo do ano;

Por ultimo, quanto à conta nº……………, do M…………. na qual o sujeito passivo é contitular juntamente com o Sr. P................, os montantes aí depositados/creditados pertencem em partes iguais aos dois contitulares, que segundo informação do s.p. são também companheiros. A referida conclusão baseia-se, quer na análise pormenorizada dos movimentos efectuados na conta, quer tomando em consideração o estatuído no art.° 516° do Código Civil:

"Nas relações entre si, presume-se que os devedores ou credores solidários comparticipam em partes iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles existente, não resulte que são diferentes as suas partes, ou que um só deles deve suportar o encargo da dívida ou obter o benefício do crédito".


IV. 1 - ACRÉSCIMO PATRIMONIAL / DESPESA EFETUADA

Analisados os rendimentos declarados pelo s.p. no exercício de 2010 e, nos imediatamente anteriores, conclui-se pela inexistência de meios financeiros para, por essa via, obter fundos para efetuar as aquisições, consumos e/ou pagamentos, ocorridos no exercício de 2010.

O acréscimo de património confirmado e/ou despesa efetuada no exercício de 2010, é consubstanciado nos depósitos efetuados nas contas bancárias do s.p., muitos dos quais em numerário, de origem desconhecida, conforme poderemos confirmar, a título exemplificativo, no anexo 5 pags. 34 a 47, anexo 6 pgs 24 a 55, anexo 7 pg. 10 e, anexo 8 pgs. 20 a 62, bem como em transferências, que representam ativos à ordem do sujeito passivo, que deles pode dispor livremente, de acordo com a sua vontade.

Porque o s.p. passou a dispor livremente dos montantes correspondentes a esses depósitos, pode utilizar os mesmos para diferentes fins, nomeadamente:

IV.1.1 - PAGAMENTO DE EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS

Nos pagamentos dos empréstimos bancários titulados pelo s.p. (anexo 3, pgs. 2 a 5), nomeadamente empréstimos destinados a Lar e Habitação, requeridos junto do Montepio Geral, relativamente aos quais, ao longo do exercício de 2010, além dos regulares pagamentos mensais foram efetuados pagamentos adicionais, e/ou amortizações extraordinárias, que permitiram o seu cancelamento, conforme se resume nos quadros seguintes.

Quadro 4 Unidade €
Data/Período
Empréstimo Lar
Empréstimo n° 16527100153-0
27-09-2010
M Lar – Cancelamento
18.619.24
2010
Prestações habituais Empréstimo Lar
827,94
Total Empréstimo Lar 2010
19.447.18

Data/Período Empréstimos Habitação
Empréstimo n°
16521100321-6 165 21 100322-4
20-10-2010 M HAB - Amortização extra contratual
40.000,00
20-11-2010 Cobrança Empréstimo
20.000,00
20-12-2010 M HAB - Amortização extra contratual
10 000,00
20-12-2010 M HAB - Amortização extra contratual
20.000,00
Total amortizações extracontratuais
70.000,00
20.000,00
2010 Prestações habituais Empréstimos Habitação
5.790,86
4.476,74
Total por Empréstimo Habitação 2010
75,790,86
24.476,74
Total dos Empréstimos Habitação 2010
100.267,60
Total considerado no campo 731, Anexo H, Modelo 3 100.221,19

O sujeito passivo é proprietário único de um imóvel, situado na freguesia ………… (111006), com o artigo matricial n° ………3, fração J, correspondente a um apartamento T3, destinado à habitação, cuja localização é na Rua ….. n° 23, 1° C, ………. …………., que corresponde precisamente ao seu domicilio fiscal.

O referido imóvel constituía garantia dos empréstimos a que o sujeito passivo recorreu, identificados no quadra supra, relativamente aos quais, no decurso do exercício de 2010, foram realizadas amortizações extraordinárias que totalizam o montante de € 90.000,00 (Cfr. anexo 3, pgs. 2 a 5).

Em suma, relativamente aos vários empréstimos (Lar e Habitação), no exercício em análise, o s.p. efetuou pagamentos no montante total de € 119.714,78, conforme quadro infra:

Quadro 6 Unidade: €
Descrição
Valor
Total Empréstimo Lar 2010
19.447,18
Total dos Empréstimos Habitação 2010
100.267,60
Total de Empréstimos 2010
119.714.78

IV.1.2 - AQUISIÇÃO DE VIATURAS AUTOMÓVEIS

Também no exercício de 2010, são conhecidas aquisições de dois veículos pelo sujeito passivo em análise.

- Veículo de marca ……., modelo …… Kompressor, matrícula …………, adquirido em 2010-12-14, pelo valor de € 33.250,00 (cfr. anexo 4, pgs. 2 a 4). O pagamento foi efetuado através do cheque visado n° ……….. descontado na conta nº……….do MG, de que o sujeito passivo é contitular com o Sr. Paulo ……………… (anexo 4, pgs. 3 e 4).

- Veículo de marca …., modelo JAZZ 1.4 l-Shift, matrícula ….., adquirido em 2010-01-18, pelo valor de € 21.040,00 ( cfr. anexo 4, pgs. 5 a 8) , Parte do pagamento foi efetuado por multibanco (anexo 4, pgs 6 e 7) e parte, através do cheque n°…………. (anexo 4, pg. 8), ambos através da referida conta n° …………-9 do MG, de que o sujeito passivo é contitular com o Sr. Paulo ………….., seu companheiro .

IV.1.3 - PAGAMENTO DO IVA LIQUIDADO PELA SOCIEDADE J ……………….. LDA, PELO SUJEITO PASSIVO EM ANÁLISE

Da análise aos elementos contabilísticos da P…….. Serviços ……………. Lda, confirmou-se mediante documentos que se juntam como anexo 2, pags 14 a 20, que o IVA liquidado, nas faturas infra identificadas, que referem tratar-se de serviços prestados pela sociedade J.R………… Lda, à sociedade P.........., Lda. no valor global de € 23.952,32 (€ 721.92 + 10.8/2,30 + 12.350.10) foi pago por transferência bancária, das contas tituladas pela Srª Isabel …………. - Contas n°s ……………. e …….. . Desconhece-se a razão de assumir o pagamento que é da responsabilidade da referida sociedade, em virtude de, nem o sujeito passivo em análise, nem o Sr. Paulo ………….., deter participações na mesma.

IV.2 CHEQUES DA SOCIEDADE P.......... LDA, RECEBIDOS PELO SUJEITO PASSIVO
Pela análise dos elementos recolhidos junto das sociedades P.......... - Serviços ………….. Lda -NIPC: ………….. (anexo 2, pgs. 2 a 16) e J.R................ Lda - NIPC: ……… (anexo 2, pgs. 17 a 23), foi possível confirmar, que apesar de os cheques infra identificados terem sido emitidos pela P.......... Lda, no intuito de pagar serviços prestados pela sociedade J R................ Lda, foi a Srª Isabel …….., o efetivo beneficiário dos mesmos, o qual se confirma, não só através da cópia do verso dos cheques endossados â mesma, mas pela confirmação do depósito dos mesmos em contas Caixa …………., conforme resumo que se segue:

Quadro 7 Unidade €
Dados do Cheque
Dados do Depósito
CH do BES nº
Data
Valor
Anexo 2, Pág.
Conta C..........
Anexo 2, Pág.
……………01-04-2010
30.720,00
3
…………………..
21
……….04-05-2010
31.800,00
5
………….
22
…………28-06-2010
4.472,03
7
……………………
23
……………...….26-07-2010
35.695,00
12
……………………
24
………….…..27-08-2010
34.563,65
10
…………………..
25
Total 137.250,68

A justificação apresentada pelo sujeito passivo (cfr anexo pags 37 a 39 ), para o depósito, nas suas contas pessoais, dos cheques da P.........., Lda emitidos à entidade J. R................ Lda e endossados por representante desta ao sujeito passivo em análise, é que as referidas importâncias, correspondem â amortização da dívida de empréstimos efetuados pelo seu companheiro ( Sr. P................) na década de 90 e meados dos anos de 2000, ao representante da J. R................ ( Jorge R................) - ex-marido do sujeito passivo em análise.

Todavia quando do cruzamento de informação na entidade J. R................ Lda, a contabilidade não refletia os referidos empréstimos.

Importa referir que, a conta n° ……………. da C.........., tem como único titular a Srª I.................... Por sua vez, a conta n° ………. da C.........., tem como titulares o sujeito passivo e sua mãe, Srª Elisa ……………., embora como já se referiu anteriormente, apenas o sujeito passivo em análise movimenta a referida conta.

Desta forma foi possível concluir que, o s. p. foi o efetivo beneficiário do montante global de € 137.250,68, uma vez que, foi nas suas contas bancárias que os cheques foram depositados.

Desta forma, confirmado o acréscimo de património ou despesa efetuada de valor superior a €100.000,00, com divergência não justificada com os rendimentos declarados, estão reunidos os pressupostos para a determinação do rendimento colectável com recurso a métodos indirectos, nos termos do disposto na al. f) n°1 do art.°87° da LGT, com o inerente ónus da prova.

Compete ao sujeito passivo provar que os rendimentos declarados são os reais, e de que é outra a fonte dos incrementos patrimoniais ou consumo evidenciado, nos termos do nº 3 do art° 89°-A da LGT.

Assim, face ao acréscimo patrimonial/despesa efetuada, foi o s p. notificado em 2013-04-22 (anexo 1, pgs 8 a 11) para comprovar a fonte dos meios financeiro aplicados nas aquisições, acréscimos patrimoniais ou despesa efetuada, mediante apresentação de documentos que evidenciem a origem e a mobilização dos recursos financeiros e da respectiva justificação.

Apesar do s. p. ter entregue em 2013-05-15 a sua explicação (anexo 1, pgs 12 a 41) acompanhada de diversa documentação, tais elementos não justificam a totalidade dos depósitos/transferências ocorridos nas suas contas bancárias. O s. p. não conseguiu provar que dispunha de meios financeiros próprios e/ou fontes de rendimento passíveis de elidir a presunção prevista na al. f) do n° 1 do art.° 87° articulada com os n°s 3 e 5 do art.º 89°-A, ambos da LGT.

Em suma, as situações descritas anteriormente, evidenciam que, os rendimentos declarados pelo s. p. em sede de IRS não correspondem aos rendimentos reais e afastam-se significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir os incrementos patrimoniais / consumos evidenciados pelo s.p., pelo que, se justifica o recurso à avaliação indireta do rendimento nos termos da alínea f) do nº 1 do art ° 87°. n° 3, 5 e 11 do art.° 89°-A e al. d) e i) do nº1 do art.° 90°, todos da LGT, conjugados com a al. d) do nº1 e nº3 do artº 9° do CIRS.

Desta forma, nos termos da legislação anteriormente citada e do art.° 22º do CIRS, consideram-se como rendimento a englobar no apuramento do rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, o montante determinado nos termos do nº 5 do art.° 89°-A, conforme quantificação efetuada no ponto subsequente.

V. CRITÉRIOS DE CÁLCULO DOS VALORES CORRIGIDOS COM RECURO A METÓDOS INDIRECTOS

A informação e documentação apresentada pelo sujeito passivo, na sequência de notificação efetuada, para comprovar a fonte dos meios financeiro aplicados nas aquisições, acréscimos patrimoniais ou despesa efetuada, não comprovou de forma clara e inequívoca, nos termos do disposto no n° 3 do art.° 89°-A da LGT, de que os rendimentos declarados correspondem à realidade, embora tenha procurado evidenciar que a fonte do acréscimo de património ou da despesa efetuada são os recebimentos provenientes do seu companheiro, que no exercício em análise, residia e trabalhava em Angola.

Face ao exposto, e atendendo ao estipulado nas alíneas, a) e b) do n° 5 do art.° 89°-A da LGT, considera-se rendimento tributável para efeitos do IRS, a diferença entre o acréscimo de património, no exercício de 2010, e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo, no mesmo exercício .

Uma vez que o s.p. foi notificado (anexo 1. pgs. 8 a 11) nos termos do artº 87º al. f) e artº 89°-A nº3 e n° 5 ambos da LGT, para justificar a divergência verificada e, comprovar que correspondem à realidade os rendimentos declarados em 2010, sendo que, os esclarecimentos e documentos apresentados não comprovam que os rendimentos declarados correspondem à realidade, serão de considerar como acréscimos ao património, os valores que através de depósitos ou de transferências bancárias, foram creditados nas várias contas do sujeito passivo em análise, para os quais, o mesmo, não conseguiu justificar a sua origem, apesar dos argumentos e documentos que apresentou, já que os depósitos são realizados em numerário.

Importa realçar, a propósito da justificação dos movimentos nas suas contas bancárias, o sujeito passivo afirmou no ponto 2, página 5/30 (anexo 1, pag. 16) na sua resposta à notificação efetuada em 2013-04-22:

"O que sucedeu durante o ano de 2010 foi a realização de vários movimentos entre as várias contas da Exponente, para que todas, durante aquele ano, observassem movimentos bancários necessários para que ficassem isentas das despesas de manutenção e apresentassem liquidez”.

De facto, da análise pormenorizada aos movimentos realizados nas várias contas identificadas em quadro subsequente - quadro 8 - verificou-se existir alguns movimentos entre as contas do próprio sujeito passivo.

Mas além desses movimentos entre contas, existem inúmeros movimentos, destacando-se as entradas totais nas várias contas, no exercício de 2010, que perfizeram o montante global de € 1.275.509,24. Deduzidas as movimentações entre contas do sujeito passivo, os valores recebidos pelo mesmo, relativos ao trabalho dependente para a PT Comunicações SA, bem como todos os créditos devidamente justificados quando da resposta à notificação, apurou-se nas contas do sujeito passivo, o montante total de créditos de € 610.683,33, os quais, apesar dos esclarecimentos e documentos apresentados pelo mesmo, não se apresentam justificados.

De referir que, todos os valores depositados na conta do sujeito passivo, que o mesmo indicou como provenientes dos cartões KUMBO/BNI, movimentos através da WESTERN UNION, os mesmos não se consideraram justificados por vários motivos:

- O sujeito passivo apenas apresentou cópia de alguns cartões KUMBO/BNI, nos quais não consta qualquer nome de proprietário/utilizador. A acompanhar as cópias dos cartões e para justificar os movimentos efetuados, apenas foram apresentados mapas, elaborados pelo sujeito passivo;

- No caso concreto dos movimentos com a WESTERN UNION, o sujeito passivo informou, já não dispor de todos os documentos. Por sua vez, os talões fornecidos pelo s. p. apresentam diversos beneficiários, mas nenhum deles é o sujeito passivo em análise, nem tão pouco os valores neles indicados são coincidentes com os montantes dos depósitos identificados nas contas.

A título exemplificativo (anexo 5, pag. 50), o s.p. apresentou como justificativo, um documento datado de 2010-10-19, no montante de € 3.585,79, onde o beneficiário identificado é o Sr. Pedro …………… e o remetente o Sr. Mário ……... Ora, se o mesmo, pretende justificar que os rendimentos de que dispõe, são provenientes de rendimentos do seu companheiro Sr. Paulo …………………, teria de ser ele o remetente daquele montante, e o beneficiário, o sujeito passivo em análise. Acresce que nas contas bancárias não há depósitos coincidentes, nem nas datas indicadas, nem quanto ao valor constante dos mesmos.

Estas incongruências descritas a título exemplificativo para este documento, repetem-se nos diversos talões da Western Union, entregues pelo sujeito passivo, quando da resposta à notificação e, que se integram o anexo 5, pags 51 a 74 ;

Por todo o exposto, verificou-se que, os vários movimentos que o sujeito passivo pretendeu justificar com os cartões KUMBO/BNI e com a WESTERN UNION, não se encontram reflectidos nas suas contas bancárias. Estas reflectem apenas, depósitos em numerário, cuja análise conjunta com a documentação apresentada pelas Instituições bancárias e pelo sujeito passivo, não confirmam as informações prestadas, de que a proveniência são rendimentos do seu companheiro, Sr. Paulo …………, auferidos em Angola.

Assim e para se proceder ao correto apuramento dos montantes não justificados pelo s. p. foram tidos em conta, os valores creditados nas suas contas bancárias, deduzidos dos valores debitados nas mesmas contas, para crédito de outras das suas contas bancárias, de forma a que, nenhum dos valores creditados fosse duplamente tributado.

Os valores em causa foram determinados para as várias contas bancárias, conforme consta nos mapas constantes no anexo 5 pags. 48 e 49, anexo 6 pags. 56 e 57, anexo 7 pag. 11 e anexo 8 pags. 63 e 64, sendo que, o quadro infra, resume os valores não justificados de cada uma das contas bancárias do s.p., e evidencia os valores de cada uma delas sujeito a tributação em sede de IRS nos termos dos já referidos artigos 87° al. f) e 89°-A n° 3 e n° 5, ambos da LGT.

Quadro 8 Unidade €
N° Conta
V. Crédito
V. Não Justificados
% do s.p.
V.p/ Tributação
…………
215. 992,39
53.948,09
100%
53.948,09
……………….
284.399,73
195.683,16
50%
97.841,58
…………….
440.531,31
300.339,58
100%
300.339,58
…………………..
334.585,81
60.712,50
100%
60.712,50
Total
1.275,509,24
610.683,33
512.841,75

VIII. OUTROS ELEMENTOS RELEVANTES

De seguida apresenta-se a listagem pormenorizada dos anexos ao presente relatório anteriormente referenciados, que dele fazem parte integrante, devidamente rubricados e numerados:

Descrição
N° de Folhas
1
Auto de Declarações, notificações e respostas ao s. p.
51
2
Documentação recolhida relativa as sociedades P.......... e J. R................
25
3
Documentação relativa aos pagamentos de empréstimos
5
4
Documentação relativa ás aquisições de viaturas
8
5
Extratos bancários da conta 100037432 do Montepio Geral, correspondentes documentos e mapa resumo
74
6
Extratos bancários da conta 100059279 do Montepio Geral, correspondentes documentos e mapa resumo
57
7
Extratcs bancários da conta 0044 045065 200 da Caixa Geral Depósitos, correspondentes documentos e mapa resumo
11
8
Extratos bancários da conta 0549 059566 100 da Caixa Geral Depósitos, correspondentes documentos e mapa resumo
64
9
Declaração de Rendimentos Mod 3 de IRS. - 2010
7
(...)
pelo que, face à divergência não justificada entre os rendimentos declarados e os aumentos de património e os consumos evidenciados, determinou-se um rendimento tributável pela diferença e a considerar na categoria G, nos termos do disposto no n° 5, do art° 89°-A, da LGT, no montante de € 430.302,43 (cfr.cópia de relatório da I.T. e anexos junta a fls.51 a 271 dos presentes autos);
2-No âmbito do direito de audição fixado no prazo de dez dias, face ao projecto de conclusões do relatório, foi apresentado requerimento contestando as correcções propostas, cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido, do qual consta designadamente, o seguinte:
"(...)

Anexo

DIRECÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA

Inspecção Tributária - Arca A

GESTÃO DOCUMENTAL

DIREÇÃO DE FINANÇAS DE LISBOA

INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA

DEPARTAMENTO C - DIVISÃO II - EQUIPA 21

PROCESSO OI201300675

EXMO. SENHOR DIRETOR DOS SERVIÇOS DE INSPEÇÃO TRIBUTÁRIA

ISABEL …………………., contribuinte fiscal número ……………, tendo sido notificada para, nos termos previstos no artigo 60,° do RCPIT e LGT e artigo 45.° do CPPT, exercer o direito de audição quanto ao projeto de decisão de aplicação de métodos indiretos para a determinação do rendimento do ano de 2010 sujeito a IRS, vem apresentar os seus elementos escritos, nos termos e com os seguintes fundamentos:

A) PROJETO DE DECISÃO DE APLICAÇÃO DE MÉTODOS INDIRETOS:

1. Resulta do projeto de decisão de aplicação de métodos indirectos notificada à Exponente, em suma, o seguinte.

• Que após consulta aos extratos bancários das diferentes contas de que a Exponente é titular, terá sido possível concluir "que os incrementos patrimoniais evidenciados relativamente aos rendimentos declarados à Autoridade Tributária, excedem largamente a capacidade contributiva dos mesmos."

• Que se encontrarão reunidas as condições para se proceder à fixação do rendimento colectável no montante de € 471.572,09, porquanto, "de acordo com a informação prestada peto sujeito passivo em 2013-05-15 (...) confirma-se que os incrementos patrimoniais / despesa ou consumos efectuada (os), no exercício de 2010, é da valor superior a € 100.000,00 (...) portanto com uma divergência não justificada com os rendimentos declarados pelo s.p. no mesmo período de tributação" e cujo valor global declarado pela Exponente ascendeu a quantia de € 46.123,66.

2. A justificação apresentada pela Autoridade Tributária (AT) para a fixação do rendimento colectável no montante de € 471.572,09, serão "depósitos efectuados nas contas bancárias do s.p., muitos dos quais em numerário, do origem desconhecida (...), bem como em transferências, quo representam ativos à ordem do sujeito passivo, que deles pode dispor livremente, de acordo com a sua vontade."

3. Assumindo que a Exponente passou a dispor dos montantes correspondentes a esses depósitos, refere a AT que a Exponente os utilizou para diferentes fins, sendo os enumerados pela AT, os seguintes:

(i) Pagamento de empréstimos bancários no montante total de € 119.714,70;

(ii) Aquisição de 2 viaturas automóveis, uma pelo preço de € 33.250,00 e outra pelo preço de € 21.040,00;

(iii) Pagamento do IVA pela sociedade J R................, LDA. no valor global de € 23.952,32.

4. Alega ainda a AT que a Exponente foi a efetiva beneficiária do montante global de € 137.250,68, correspondente à soma do valor dos cheques que haviam sido emitidos pela sociedade P.........., LDA., a favor da sociedade J R................, LDA., porque "foi nas suas contas bancárias que os cheques foram depositados", sendo certo que a contabilidade da J. R................, LDA., não refletia os empréstimos referidos pela Exponente - e segundo os quais os referidos cheques corresponderam a amortização da dívida de empréstimos efetuados pelo companheiro da Exponente (P................ - emigrado em Angola) na década de 90 e meados de 2000 ao representante da J. R................, LDA., ex-marido da Exponente

5. Fazendo autêntica "tábua-rasa" dos esclarecimentos e documentos apresentados pela Exponente em 15.05.2013, refere a AT que os mesmos "não justificam a totalidade dos depósitos/transferências ocorridos nas suas contas bancárias. O s.p. não conseguiu provar que dispunha de meios financeiros próprios e/ou fontes de rendimento passíveis de elidir a presunção prevista na al. f) do n° 1 do art. 87° articulada com os n°s 3 e 5 do art. 89°-A ambos da LGT."

6. Deste modo, considera a AT, em suma que: "as situações descritas anteriormente, evidenciam que, os rendimentos declarados pelo s.p. em sede do IRS não correspondem aos rendimentos reais e afastam-se significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir os incrementos patrimoniais / consumos evidenciados pelo s.p., pelo que, se justifica o recurso à avaliação indirecta do rendimento nos termos da alínea f) do n° 1 do art. 87°, n° 3, 5 e 11 do art.° 89-A e al. d) e i) do nº 1 do art. 90°, todos da LGT, conjugados com a al d) do n° 1 e n° 3 do art. 9° do CIRS."

7. Mantendo a mesma argumentação, refere a AT o seguinte: "a informação e documentação apresentada pelo sujeito passivo (...) não comprovou de forma clara e inequívoca, (...) que os rendimentos declarados correspondem à realidade, embora tenha procurado evidenciar que a fonte do acréscimo de património ou da despesa efetuada são os recebimentos provenientes do seu companheiro, que no exercício em análise, residia e trabalhava em Angola."

8. Assim, segundo a AT: "serão de considerar como acréscimos de património, os valores que através de depósitos ou de transferências bancárias, foram creditados nas várias contas do sujeito passivo em análise, para os quais, o mesmo, não conseguiu justificar a sua origem, apesar dos argumentos e documentos que apresentou, já que os depósitos são realizados em numerário."

9. Aceitando, nesta sede, os esclarecimentos prestados pela Exponente, segundo os quais efetuou diversas movimentações entre as contas de que é titular, refere a AT o seguinte: "As entradas totais nas várias contas, no exercício de 2010, que perfizeram o montante global de € 1.275.509,24. Deduzidas as movimentações entre contas do sujeito passivo, os valores recebidos pelo mesmo, relativos ao trabalho dependente para a PT Comunicações SA, bem como todos os créditos devidamente justificados quando da resposta à notificação, apurou-se nas contas do sujeito passivo, o montante total de créditos de € 610.683,33, os quais, apesar dos esclarecimentos e documentos apresentados pelo mesmo, não se apresentam justificados."

10. No que respeita especificamente aos valores decorrentes de depósitos efectuados através dos levantamentos do saldo dos cartões KUMBO e BNI e através da WESTERN UNION, a AT não considerou justificados os respectivos depósitos, pelos seguintes motivos:

• A Exponente apenas apresentou cópia de alguns cartões KUMBU e BNI, nos quais não consta o nome do proprietário/utilizador. Por outro lado, a acompanhar cópias dos cartões e para justificar os movimentos efetuados, apenas foram apresentados mapas elaborados pelo sujeito passivo;

• No que respeita aos talões WESTERN UNION, além de a Exponente já não dispor de todos os documentos, "os talões fornecidos pelo s.p. apresentam diversos beneficiários, mas nenhum deles é o sujeito passivo em análise, nem tão pouco os valores neles indicados são coincidentes com os montantes dos depósitos identificados nas contas."

• Assim, considera a AT que as contas bancárias da Exponente apenas reflectem "depósitos em numerário, cuja análise conjunta com a documentação apresentada pelas instituições bancárias o pelo sujeito passivo, não confirmam as informações prestadas, de que a proveniência são rendimentos do seu companheiro, Sr. P................, auferidos em Angola."

11. Consequentemente, considera a AT o seguinte:

• Que na conta nº………………. (titulada pela Exponente), do crédito de € 215.992,39, a quantia de € 53.948,09 não está justificada e, por essa conta ser titulada pela Exponente, esta quantia deverá ser tributada a 100%;

• Que na conta n°…………….(titulada pela Exponente e pelo seu companheiro - emigrado em Angola), do crédito de € 284.399,73, a quantia de € 195.683,16 não está justificada e, por essa conta ser titulada pela Exponente e pelo seu companheiro, esta quantia deverá ser tributada a 50%;

• Que na conta ……………. (titulada pela Exponente), do crédito de € 440.531,31, a quantia de € 300.339,58 não está justificada e, por essa conta ser titulada pela Exponente, esta quantia deverá ser tributada a 100%;

•Que na conta ………………. (titulada pela Exponente e pela sua mãe), do crédito de € 334.585,81, a quantia de € 60.712,50 não está justificada e, porque no entender da AT a Exponente é quem "dispõe dos valores nela depositados conforme a sua vontade", esta quantia deverá ser tributada a 100%.

B) EXERCÍCIO DO DIREITO DE AUDIÇÃO PELA EXPONENTE:

1. O projecto de decisão agora notificado à Exponente menciona valores de créditos nas contas bancárias da Exponente, que não correspondem aos valores mencionados pela AT na notificação a que a Exponente respondeu em 15.05.2013 e datada de 22.04.2013.

De facto, das 4 contas bancárias identificadas pela AT na folha 16 do projecto de decisão, apenas o valor dos créditos efetuados na conta número ……………. coincide com o valor dos créditos referido na notificação enviada à Exponente em abril de 2013.

No que respeita às restantes 3 contas, os valores agora identificados não são coincidentes com os valores referidos na notificação de 22.04.2013. Senão vejamos:

(i) No que respeita à conta número ……….., a notificação de abril de 2013 referia créditos no valor de € 214.776,62, enquanto que o projeto de decisão aumentou esse valor para a quantia de € 215.992,39, daí resultando uma diferença de € 1.215,77, que a AT não explica e/ou fundamenta a que se deve.

(ii) No que respeita à conta número …………….., a notificação de abril de 2013 referia créditos no valor de € 183.906,59, enquanto que o projeto de decisão aumentou esse valor para a quantia de € 284.399,73, daí resultando uma diferença de € 100.493,14, que a AT não explica e/ou fundamenta a que se deve.

(iii) No que respeita à conta número ……………, a notificação de abril de 2013 referia créditos no valor de € 440.725,57, enquanto que o projeto de decisão refere a quantia de € 440.531,31, sem que a AT explique e/ou fundamente a que se deve essa diferença.

Assim, o projecto de decisão aumenta o valor total dos créditos das contas bancárias da Exponente em € 101.514.65 relativamente à decisão de 22.04.2013. Atendendo a que tanto em abril de 2013 como em janeiro de 2014 a AT se baseou em extratos bancários de 2010 (ano que já findou) e uma vez que esses extratos lhe foram entregues pelas entidades bancárias e pela Exponente, deverá a AT explicar a que se devem as referidas diferenças e a que título imputa à Exponente o referido aumento de€ 101.514.65.

2. Sem prejuízo desta divergência de valores, a Exponente congratula-se pelo facto de a AT aceitar a justificação dada pela Exponente em 15.05.2013, segundo a qual os valores totais dos créditos efectuados nas contas bancárias de que é titular não correspondia ao valor total inicialmente referido pela AT na notificação datada de 22.04.2013 (e que era superior a € 1.000.000,00), porquanto se verificaram várias transferências entre as contas bancárias de que a Exponente é titular.

3. A Exponente congratula-se também pelo facto de a AT ter verificado corresponder à verdade que no exercício de 2010 P................ (companheiro da Exponente) estava emigrado em Angola, aí trabalhava e auferia os seus rendimentos.

4. Este reconhecimento resulta não só de vários trechos da notificação, mas também do Anexo 6, que expressamente considera "créditos justificados", as transferências de parte do vencimento do companheiro da Exponente em Angola, efectuadas pela sociedade T……………, por transferência bancária para a conta número ………., bem como da aceitação, como "créditos justificados" de várias ordens de recebimento estrangeiras, identificadas expressamente pela AT como "Ordem recebimento estrangeiro WU Angola", sendo WU a abreviatura de WESTERN UNION.

5. Não obstante congratular-se por estes factos, a Exponente não aceita que a AT não extraia as necessárias consequências do facto de o seu companheiro estar emigrado em Angola, e que, no presente caso, implicará a aceitação, como "créditos justificados", de todos os depósitos de numerário efetuados nas contas bancárias da Exponente e que, conforme anteriormente explicado, eram efetuados através de:

(i) Depósitos em dólares americanos (USD) efetuados no banco M……………ANGOLA e posteriormente transferidos para Portugal através do sistema WESTERN UNION. Conforme referido, as quantias correspondentes a estes depósitos eram levantadas em Portugal, em numerário e em Euros, nas sucursais do banco M………… BCP, por familiares de P................ (companheiro da Exponente emigrado em Angola) e pela Exponente, e depositadas na sua quase totalidade nas diversas contas bancárias da Exponente e do seu companheiro.

(ii) Depósitos em dólares americanos (USD) efetuados por P................ (companheiro da Exponente emigrado em Angola), no banco SOL ……….., nas contas de 2 cartões pré-pagos tipo VISA, de nome comercial KUMBU que, em Portugal, estavam na posse de familiares da Exponente e de familiares do seu companheiro, para utilização. Conforme referido, os saldos destes cartões eram levantados e/ou utilizados para realização de pagamentos em Portugal, através da rede Multibanco (porquanto os referidos cartões tinham uso mundial na rede VISA) e depositados na sua quase totalidade nas diversas contas bancárias da Exponente e do seu companheiro, em Portugal.

(iii) Depósitos efetuados em Luanda, Benguela e Lobito (Angola), em Kwanzas, pelo companheiro da Exponente, nas contas de 4 cartões pré-pagos do banco BNI - BANCO DE NEGÓCIOS INTERNACIONAL DE ANGOLA. Os cartões referentes a estas contas estavam em Portugal, na posse de familiares da Exponente e de familiares do seu companheiro, e eram utilizados para realização de levantamentos e/ou para realização de pagamentos em Portugal, igualmente através da rede Multibanco, sendo que as quantias a eles referentes eram posteriormente depositadas na sua quase totalidade nas diversas contas bancárias da Exponente e do seu companheiro.

(iv) Depósitos das quantias que, em Euros eram correspondentes aos câmbios de dólares americanos (USD) que o companheiro da Exponente trazia de Angola quando viajava para Portugal, ou que enviava para Portugal através de pessoas suas conhecidas (por ocasião das viagens por estas realizadas a Portugal) e que eram entregues à Exponente e aos familiares do companheiro da Exponente, para câmbio e posterior depósito nas contas bancárias da Exponente e do seu companheiro em Portugal.

6. Também os depósitos de cheques emitidos pela sociedade P.......... à ordem da sociedade J. R................, LDA, deverão ser considerados "créditos justificados", atento o facto de corresponderem à liquidação das dividas contraídas pelo ex-marido da Exponente (Jorge R................ - sócio gerente da sociedade J. R................. LDA.) junto de P................ (companheiro da Exponente emigrado em Angola), durante a década de 90 e inícios do ano 2000, Tal como referido pela Exponente, o companheiro da Exponente era amigo do seu ex-marido e, nessa condição de amigo, emprestou-lhe a título pessoal quantias pecuniárias que o ex-marido da Exponente se comprometeu a devolver quando tivesse possibilidades financeiras, o que apenas sucedeu em 2010.

7. Também as transferências efetuadas pela sociedade E…………… deverão ser consideradas "créditos justificados", porquanto não só a Exponente era (contrariamente ao afirmado pela AT), sócia desta sociedade (cfr. Cópia do registo de constituição da sociedade E……. e certidão permanente à data de 2010, que se junta como Doc. 4 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais), como essas transferências corresponderam à liquidação do empréstimo contraído junto do MONTEPIO …….., pelo valor total de € 118.000,00 (cfr. Contrato de Mútuo celebrado com esta instituição bancária e que foi junto aos esclarecimentos de 15.05.2013 como Doc. 12) e à liquidação de adiantamentos feitos pela Exponente para o pagamento de despesas dessa sociedade.

8. Por outro lado, também o depósito do cheque emitido por Fernando ……………, à ordem do companheiro da Exponente, no valor de € 30.000,00, deverá ser considerado "crédito justificado", porquanto Fernando ……………. é pai da Exponente e também este cheque visou a liquidação de um empréstimo que o companheiro da Exponente lhe havia feito em 29 de Setembro de 2010 o que, conforme referido aquando dos esclarecimento prestados em 15.05.2013, foi prática constante entre a Exponente, o seu companheiro e o pai da Exponente.

9. Assim, a Exponente dá por integralmente reproduzido tudo o anteriormente referido à AT quanto à origem dos depósitos de numerário verificados nas contas bancárias de que é titular, bem como aos pagamentos das várias despesas questionadas pela AT, reiterando que o valor dos rendimentos declarados no ano de 2010 (€ 46.123,66) corresponde ao valor do rendimento que a Exponente auferiu durante aquele ano.

10. Não obstante o exposto, cumpre referir que a tese da AT é incoerente em diversos pontos.

11. No que respeita ao argumento utilizado pela AT, segundo o qual por os cartões KUMBU (do Banco SOL) e B……. (do Banco B………- BANCO …………) não terem o nome do titular, os depósitos efectuados com esses cartões não se podem considerar justificados, é manifestamente improcedente pelos seguintes motivos:

• Conforme se pode verificar pela mais elementar consulta à página de internet do Banco SOL (www.bancosol.ao),os cartões KUMBU não são personalizáveis, sendo certo que a adesão a um cartão KUMBU apenas depende da apresentação do Bilhete de Identidade e dos valores a depositar nesse cartão - cfr. Print com as perguntas mais frequentes sobre os cartões KUMBU, que se junta como Doc. 1 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

• Na verdade, a atribuição deste cartão basta-se com a apresentação desses dados e o preenchimento do "Contrato de Adesão" respectivo, de modelo semelhante ao que se junta como Doc. 2 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

«Conforme se pode verificar pela Cláusula II, número 2 destas Condições Gerais: "O Cartão VISA Pro-Pago Não-Personalizado, não tem o nome do titular inscrito" - cfr. Doc. 2.

• Verifica-se, assim, facilmente, que os 2 cartões KUMBU referidos pela Exponente nos esclarecimentos prestados em 15.05.2013. não têm o nome do titular, nem o poderiam ter porquanto são, por definição, cartões não personalizáveis - cfr. Doc. 1 e 2.

• Não obstante serem cartões não personalizáveis, "o titular do cartão, é a pessoa singular que contrata com o Banco a emissão do mesmo, e se responsabiliza pelos débitos e encargos decorrentes da sua utilização"- cfr. Cláusula III do Doc. 2.

• Os 2 cartões KUMBU referidos pela Exponente nos esclarecimentos prestados em 15.05.2013 (cartões KUMBU com o n°……………….. e com o n°……………….) foram solicitados ao Banco SOL pelo companheiro da Exponente, emigrado em Angola. De referir que bastará que a AT, ao abrigo do princípio da colaboração, requeira os extratos destes cartões (como fez com os extratos bancários das contas referidas no projecto de decisão), para comprovar tal facto.

• De referir ainda que os cartões KUMBU apenas são recarregáveis em Angola (cfr. Doc. 1), assim se dissipando todas as dúvidas quanto à origem de grande parte dos depósitos de numerário efetuados nas contas da Exponente.

12. O mesmo se aplica aos 4 cartões B………. referidos pela Exponente nos esclarecimentos prestados em 15.05.2013 (cartões n.°………, ………………, n° ………………. e n.° ……………………).

• De referir que o companheiro da Exponente tinha uma conta ordenado no Banco BNI, aí recebendo parte dos rendimentos que auferia em Angola. Através desta conta, o companheiro da Exponente efectuava levantamentos de numerário da conta ordenado e depositava os valores correspondentes a esses saldos nos vários cartões BNI 24 que havia solicitado (2 em seu nome, 1 em nome da Exponente e 1 em nome da filha do companheiro da Exponente), sempre assinando o respectivo talão de entrega nos balcões do Banco BNI em Angola.

• Não obstante já não dispor do contrato de adesão desta conta ordenado, o companheiro da Exponente ainda tem em seu poder o recibo da Proposta de Adesão de Particulares, que manifestamente comprova que P................, companheiro da Exponente, era titular de uma conta bancária no banco Angola BNI - cfr. Proposta de Adesão e respetivas condições gerais que se juntam como Doc. 3 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

• De salientar que também no que respeita aos cartões BNI, a AT poderá requerer (igualmente ao abrigo do princípio da colaboração) os respetivos extratos bancários para verificação do seguinte:

(i) De que os carregamentos efetuados nestes cartões foram efetuados em Angola, por P................, companheiro da Exponente; e

(ii) De que os débitos efetuados com esses cartões foram efetuados em Portugal, porquanto se encontravam na posse de familiares do companheiro da Exponente ou da Exponente.

13. Também no que respeita aos talões WESTERN UNION, cumpre salientar que apesar de a Exponente não ser a beneficiária direta dos mesmos, todos têm o mesmo denominador comum: ou tinham como beneficiário Pedro ……………………..a (irmão do companheiro da Exponente) ou Maria …………………………. (irmã do companheiro da Exponente), o que, mais uma vez, comprova que estas remessas eram enviadas por P................, emigrado em Angola, através dos seus irmãos.

14. Acresce que os irmãos do companheiro da Exponente não depositaram nas suas contas bancárias os valores de que foram beneficiários através destas remessas, o que a AT poderá confirmar pela verificação dos extratos destas contas.

15. Cumpre nesta sede elucidar a AT quanto ao facto de esta situação se dever aos Emites diários a que cada remetente estava sujeito para enviar dinheiro de Angola em 2010, bem como aos limites mensais a que cada recebedor estava sujeito em Portugal na mesma altura sendo que ambos os limites eram impostos pelo BANCO MILLENNIUM ANGOLA e pela WESTERN UNION. Era devido a estas limitações diárias (no que respeita ao remetente) e limitações mensais (no que respeita ao recebedor) que era impossível que todas as remessas fossem feitas directamente para a Exponente pelo seu companheiro que estava em Angola. É apenas devido a esta razão que o companheiro da Exponente em 2010 se socorreu de remessas de dinheiro para os seus familiares, sendo certo, não obstante, que o destinatário final dessas remessas eram as contas bancárias do companheiro da Exponente e da Exponente em Portugal. De salientar que este método era utilizado por todos os emigrantes para envio de dinheiro para Portugal de Angola em 2010.

Acresce que os recibos WESTERN UNION constantes das páginas 55. 59. 60. 61. 63, 64. 67. 69. 71. 72 e 73 do anexo 5 expressamente referem constituir remessas de dinheiro de Angola.

Não obstante os restantes recibos não fazerem essa menção, sempre poderá a AT (ao abrigo do principio da colaboração), requerer ao Banco MILLENNIUM BCP que, através do número de controlo de transferência monetária (MTCN), identifique o local de origem da remessa de dinheiro. Conforme verificará a AT, todas essas remessas partiram de Angola, local em que o companheiro da Exponente estava emigrado.

No que respeita à divergência de valores entre os constantes dos recibos de remessas WESTERN UNION e os valores depositados nas contas bancárias da Exponente e do seu companheiro, conforme referido aquando dos esclarecimentos prestados em 15.05.2013, após os irmãos do companheiro da Exponente levantarem as remessas de dinheiro através da WESTERN UNION, depositavam a quase totalidade dessas remessas nas contas da Exponente. É por este motivo que os recibos da WESTERN UNION não correspondem aos valores dos depósitos. Não obstante, não existe qualquer motivo para a AT fazer "tábua-rasa" dessa prova documental para, a seu "bel-prazer" considerar não justificados os depósitos bancários efetuados através dessas remessas, por considerar que não está demonstrado terem sido enviadas pelo companheiro da Exponente, emigrado em Angola.

16. No que respeita especificamente aos valores que a AT considera não justificados nas 4 contas bancárias da Exponente, alegando um "desconhecimento da origem", cumpre referir o seguinte:

a. Na conta número ……………… são considerados "créditos não justificados" depósitos em numerário no valor total de € 53.948,09, correspondente à soma de entregas de numerário efectuadas nos dias 10,15,22 e 23 de fevereiro de 2010, 02 e 04 de março de 2010, 05 de maio de 2010, 15, 18, 19 e 20 de outubro de 2010.

É absolutamente falso que a origem destes depósitos seja desconhecida.

De salientar que todos estes depósitos de numerário foram efetuados por M................ ……….. e Manuela ……….. (respectivamente irmã e mãe de P................, companheiro da Exponente emigrado em Angola) e pela Exponente.

Tal como anteriormente explicado, estes depósitos foram efetuados após o companheiro da Exponente, P................, ter feito, em Angola, carregamentos nos cartões KUMBU e BNI de valor próximo aos valores que posteriormente foram levantados nos terminais Multibanco em Portugal e depositados nas contas bancárias da Exponente.

De salientar que o depósito mencionado na página 38 da análise desta conta bancária menciona expressamente tratar-se de um depósito de $ 8.800,00 (oito mil dólares) que, depois de cambiados para euros e paga a respetiva taxa, correspondeu a um depósito no valor líquido de € 6.413,09. O dólar era, em 2010, uma moeda bastante comum para realização de pagamentos em Angola.

De salientar que também os recibos dos depósitos efetuados através da WESTERN UNION juntos pela AT nas páginas 55, 59, 60, 61, 63, 64, 67. 69, 71, 72 e 73 do Anexo 5, referem expressamente que as quantias aí tituladas foram enviadas de Angola, sendo que o valor total destas remessas ascendente à quantia de € 39.140,40.

Verifica-se, assim, facilmente que a justificação apresentada pela Exponente em 15.05.2013 corresponde á verdade, não podendo a AT afirmar que desconhece a origem destas remessas quando os próprios documentos que as titulam são expressos quanto ao país do qual provêm essas remessas e que corresponde ao país em que o companheiro da Exponente estava emigrado: Angola.

Assim, atendendo a que as páginas 38, 55, 59, 60, 61, 63, 64, 67, 69, 71, 72 e 73 do Anexo 5 demonstram, sem qualquer margem para dúvidas, corresponder a remessas de dinheiro efetuadas de Angola, e sendo certo que a AT comprovou e aceitou que o companheiro da Exponente estava emigrado em Angola e aí trabalhava, sempre a AT deverá considerar estes depósitos, no valor total de € 45.553.49 (€ 6.413.09 + € 39.140,40), como “créditos justificados".

Sem prejuízo, no que respeita aos restantes talões WESTERN UNION que não mencionam expressamente serem remessas de Angola, de referir que tal conclusão se retira do facto de todos os beneficiários dessas remessas terem sido Pedro …………………. e Maria ……………………, Irmãos de P................, companheiro da Exponente emigrado em Angola. Acresce que a maioria dos documentos identifica P................ (companheiro da Exponente) como remetente dos valores. No que respeita aos restantes talões de depósitos bancários que não mencionam o depósito de moeda estrangeira, cumpre referir daí não se pode entender - como o faz a AT - que a origem dos valores depositados seja "desconhecida", porquanto estes depósitos foram precedidos de levantamentos através dos cartões pré-pagos KUMBU e BNI, estando estes levantamento expressamente identificados nos extratos destes cartões. Assim, também estes depósitos deverão ser considerados "créditos justificados".

Na conta número ………, do Montepio …….., são considerados "créditos não justificados" depósitos em numerário no valor total de € 195.683,16, sendo que apenas a quantia de € 97.841,58 foi considerada como "crédito não justificado" da Exponente, atenta a contitularidade desta conta com P................, companheiro da Exponente emigrado em Angola.

A quantia de € 97.841,58, corresponde à soma de entregas de numerário efetuadas nos dias 12 de janeiro de 2010, 02, 04 e 05 de março de 2010, 01,10 e 29 de abril de 2010, 10 e 31 de maio de 2010, 01 de junho de 2010, 02 de julho de 2010, 23 de agosto de 2010, 16 e 24 de setembro de 2010, 18, 19, 26 e 27 de outubro de 2010, 04, 05, 08, 15 e 26 de novembro de 2010, 07, 16 e 20 de dezembro de 2010. Estes depósitos de numerário foram efetuados por P................, por M................ ……………., por Manuela ………………. (respetivamente irmã e mãe de P................, companheiro da Exponente emigrado em Angola) e pela Exponente.

De salientar que os depósitos constantes das páginas 24, 26, 27, 29, 30, 34, 35, 36, 37, 51, 52 e 53 do Anexo 6 - no valor total de € 78.452,15 - foram assinados por P................ (companheiro da Exponente emigrado em Angola) aguando das viagens que este fez a Lisboa, o que, aliás, decorre expressamente da cópia do passaporte entregue à AT na sequência dos esclarecimentos escritos prestados em 15.05.2010.

Atendendo a que estes depósitos foram efetuados por P................, companheiro da Exponente emigrado em Angola, conforme a AT comprovou e aceitou, a AT não poderá ignorar a justificação dada pela Exponente e considerar estes depósitos como não justificados.

De salientar também que na análise desta conta bancária, a AT considerou não justificado o depósito do cheque número …………………, no valor de € 30.000,00, emitido por Fernando ………….. (pai da Exponente) a favor de P................ (companheiro da Exponente emigrante em Angola), quando, na análise da conta número …………., aceitou todas as transferências por este efetuadas para essa conta.

Cumpre salientar que este cheque correspondeu à devolução, pelo pai da Exponente, do valor que o seu companheiro da Exponente lhe havia emprestado em 29 de Setembro de 2010 para a aquisição de parte da casa em que atualmente vive com a mãe da Exponente, e que o pai da Exponente obteve através da venda da casa de que eram proprietários, sita na Rua …………, número 42, 3° Dto., em ………...

Conforme se verifica pela consulta do extrato desta conta, o companheiro da Exponente transferiu, no dia 19.12.2010, a quantia de € 30.000,00, para a conta da Exponente com o número …………… e no dia 20.12.2010 foi depositado este cheque, no mesmo valor de € 30.000,00.

Conforme também se verifica pela consulta ao extracto da conta da Exponente com o número …………, a quantia de € 30.000,00 foi debitada no dia 20.12.2010 para amortização do empréstimo habitação. Foi precisamente porque o companheiro da Exponente sabia que o pai desta iria emitir o cheque no valor de € 30.000,00, que o companheiro da Exponente antecipou a transferência de € 30.000,00 para a conta do empréstimo habitação.

Acresce que estes factos determinam a elisão da presunção assumida pela AT e estabelecida com base no disposto do artigo 516° do Código Civil, sendo, assim, manifesto, que do saldo existente nesta conta, a totalidade dos depósitos pertence ao companheiro da Exponente e não à Exponente.

Atendendo a que a quantia total de € 78.452.15, corresponde a depósitos de numerários efetuados por P................ (companheiro da Exponente emigrado em Angola), nas datas em que este viajou a Portugal, sendo certo que a AT aceitou e comprovou que este estava emigrado em Angola, sempre a AT deverá considerar estes depósitos, no valor total de € 78.452.15, como "créditos justificados". A este valor deverá acrescer o valor de € 30.000,00 titulado pelo cheque número 1356324835, emitido por Fernando ……………. (pai da Exponente) a favor de P................, porquanto todas as transferências por este efetuadas para a conta da Exponente com o número …………. foram consideradas pela AT como respeitantes a créditos justificados da Exponente. No que respeita aos restantes depósitos efetuados nesta conta e não aceites pela AT, a Exponente dá nesta sede por reproduzido o anteriormente e acima referido e que também deverá determinar a sua aceitação como "créditos justificados".

b. Na conta número ……………., da Caixa ………….., são considerados "créditos não justificados", 2 depósitos e 1 transferência no valor total de € 60.712,50.

Este valor corresponde à soma dos seguintes valores parciais: quantia de € 9.400,00, correspondente ao depósito em numerário efetuado pela Exponente no dia 08.11.2010; transferência efetuada por Mário ………. no dia 26.07.2010, no valor de € 19.512,50; e depósito do cheque emitido pela sociedade P…………. a favor da sociedade J. R................, LDA., no valor de € 31.800,00.

Conforme já referido, o depósito da quantia de € 9.400,00 foi precedida de um levantamento através de 1 dos 4 cartões pré-pagos do companheiro da Exponente junto do Banco B…….., em Angola, pelo que deverá ser considerado "crédito justificado".

No que respeita à transferência de Mário …………., de referir que se trata de um colega de trabalho do companheiro da Exponente, em Angola. Esta transferência foi efetuada para a conta da Exponente por Mário ….., como devolução de uma antecipação de fundos do valor a ela correspondente, em Kwanzas, e que havia sido feita por P................, em Angola, ao seu colega Mário ………. Foi, assim, uma devolução, para uma das contas portuguesas do companheiro da Exponente, de um empréstimo que o companheiro da Exponente havia efetuado em Angola, a favor do seu colega de trabalho.

Atendendo a que o companheiro da Exponente, em Angola, tinha na altura alguns negócios pontuais com este colega, ambos acordaram que a devolução dos fundos antecipados seria feita não em Angola, mas sim em Portugal - o que seria mais cómodo para o companheiro da Exponente, que assim evitava enviar esses fundos por um dos vários meios de que dispunha (KUMBU, Cartão BNI, WESTERN UNION ou câmbio para dólares americanos que seriam trazidos para Portugal na próxima viagem que realizasse).

Tratando-se de uma remessa de dinheiro de Angola originada pela liquidação de uma dívida aí contraída junto do Exponente, também este crédito deverá ser considerado "justificado".

Por fim, o cheque emitido pela sociedade P……….L, no valor de € 31.800,00, foi depositado na conta bancária da Exponente após lhe ter sido entregue pelo gerente da sociedade J. R................, LDA. (ex-marido da Exponente), para liquidação de dívidas que este havia contraído com P................, na década de 90 e início dos anos 2000.

Tratando-se, como se tratou, de um empréstimo pessoal entre amigos, a possibilidade de este depósito ser considerado "justificado" pela AT não tem que estar dependente da inserção deste valor na escrita da sociedade J. R................, LDA. Assim, este valor tem que ser considerado como "crédito justificado".

Assim, estando justificada a realização destes depósitos na conta da Exponente, deverá o respectivo crédito, no valor total de € 60.712,50., ser considerado como "crédito justificado".

c. Na conta número …………. da Caixa ……………, são considerados "créditos não justificados", depósitos no valor total de € 300.339,58, efetuados através de depósitos em numerário, depósitos de cheques emitidos pela sociedade P………. a favor da sociedade J. R................, LDA., depósitos de cheques emitidos pela sociedade E………. (de que a Exponente foi sócia e gerente) e transferências efetuadas pela sociedade E………….

No que respeita aos depósitos dos chegues emitidos pela sociedade P.......... a favor da sociedade J. R................, e cujo valor total ascende à quantia de € 69.755,68, a Exponente dá nesta sede por reproduzido o acima exposto e que implica que estes valores sejam considerados "créditos justificados”.

De salientar que na análise desta conta, a AT considera "créditos não justificados", créditos a que a própria AT atribui descrição que implicitamente acarreta a aceitação da Justificação prestada pela Exponente. De facto, a AT descreve não raras vezes "Depósito - Cartão BNI Angola", "Compra do Moeda Estrangeira", "Depósito Western Union", o que manifestamente, implica que a AT aceita que estes depósitos correspondem a remessas de dinheiro de Angola. O valor total dos créditos assim descritos pela AT corresponde à quantia de € 40.893.89, que a AT deverá considerar como "créditos justificados”.

Sem prejuízo, também nesta conta se verifica que os depósitos de dinheiro constantes das páginas 16, 17, 31, 50, 52, 55 e 61 do Anexo 8, foram efetuados por P................, nas datas em que este veio a Lisboa em visita à família. O valor total destes depósitos ascende à quantia de € 32.103,89, que a AT deverá reconhecer como "créditos justificados", por manifestamente corresponderem a remessas de dinheiro de Angola.

No que respeita às transferências efetuadas pela sociedade E………, cujo valor total ascende à quantia de € 6.000,00, também deverão ser consideradas como "créditos justificados", por corresponderem à liquidação dos pagamentos de impostos e despesas de manutenção do domínio de e-mail, efetuados através das contas da Exponente e referentes a essa sociedade, de que a Exponente - contrariamente ao que é afirmado pela AT - era sócia - cfr. Doc. 4.

Verifica-se, assim, que sempre a AT deverá considerar "créditos justificados” os depósitos no valor total de € 116.649,57 (€ 69.755,68 + € 40.893,89 + € 6.000,00), efetuados nesta conta.

No que respeita aos restantes depósitos efectuados nesta conta e não aceites pela AT, a Exponente dá nesta sede por reproduzido o anteriormente e acima referido e que também deverá determinar a sua aceitação como 'créditos justificados".
(...)
a inspecção tributária, após análise do exercício do direito de audição, fundamentou a decisão de manutenção dos valores considerados na fixação dos rendimentos colectáveis (cfr.anexo 11 e ponto IX-Direito de audição do relatório da I.T. junto a fls.69 a 78 e de fls. 238 a 255 v. dos presentes autos);
3-Dá-se aqui por reproduzido o extracto da conta n°…………….. AKZ, junto do Banco angolano BNI, titulada por Paulo …………., de 3/06/2010 a 03/11/2010, no qual eram processados os vencimentos do titular, ao abrigo do qual eram efectuadas transferências para os cartões pré-pagos B……. aí identificados, os quais foram utilizados para a realização de levantamentos em Portugal em numerário, parcialmente depositados nas contas da recorrente e conjuntas com o depositante (cfr.documento de fls.763 a 766, e extracto de dois cartões pré-pagos do Banco BNI, com os n°s ……………, em nome de Sofia ……………… e n° ……………….., em nome de Isabel ………., de fls.810 a 827 e de fls. 868 a 887, respectivamente, dos presentes autos; depoimento das testemunhas Paulo ………………., Pedro ……………. e Maria ……………………., tudo conforme acta junta a fls.891 a 895 dos presentes autos);
4-Dão-se aqui por reproduzidas as declarações do Banco "M………….. BCP", referentes às remessas de dinheiro efectuadas de Angola para Portugal através da "Western Union" e tendo como destinatário a recorrente e outros familiares do Paulo …………., (cfr.documentos juntos a fls.599, 601, 602 e 603 dos presentes autos);
5-Dão-se aqui por reproduzidos os talões de depósito em numerário e de compra de moeda, efectuados nas contas da A. e objecto de correcção por parte da Adm. Fiscal durante o ano de 2010 (cfr.talões de entrega em numerário juntos a fls.898 a 908 e 911 a 989 dos presentes autos);
6-O mencionado Paulo ……………….., enquanto companheiro da recorrente, tinha a sua residência e exercia a sua actividade profissional em Angola, naquele ano de 2010, tendo subscrito cartões angolanos designados por "Kumbu" do Banco "Sol Angola", no qual efectuava carregamentos, sendo os mesmos utilizados em Portugal através de levantamentos identificados como "Visa Internacional", no valor de € 4.800,00, e depositados nas contas da recorrente e conjuntas com o depositante, sendo outros montantes utilizados em gastos vários (cfr.talões de levantamento juntos a fls.676 a 681 dos presentes autos; depoimentos das testemunhas Paulo …………….., Pedro ……………… e Maria ……………., tudo conforme acta junta a fls.891 a 895 dos presentes autos).

X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes do presente recurso, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, sendo que os depoimentos das testemunhas arroladas permite aferir da efectiva transferência de parte dos montantes objecto de correcção, os quais merecem credibilidade, com fundamento na sua participação directa nos factos sub judicio…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou, além do mais, em prova documental constante dos presentes autos e apenso e que a mesma foi impugnada parcialmente pelos recorrentes este Tribunal julga provada a seguinte matéria de facto que se reputa igualmente relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
7-A conta bancária nº……………. identificada no nº.1 supra, sediada no Montepio …………., tinha como titulares a recorrente, Isabel ……………, e o seu companheiro, Paulo ………….. (cfr.relatório da I.T. junto a fls.51 a 78 dos presentes autos; documento a prestar esclarecimentos à I.T. por parte da recorrente que se encontra junto como anexo 1 ao relatório a fls.85 a 99 dos autos);
8-Em 20/2/2014, na sequência do relatório identificado no nº.1 supra, o Director de Finanças de Lisboa determinou que se procedesse à fixação do rendimento tributável da recorrente Isabel ………………, em sede de I.R.S., rendimentos de categoria G, para o ano de 2010, com recurso a métodos indirectos, no montante de € 430.302,43, tudo ao abrigo dos artºs.87, nº1, al.f), e 89-A, nºs.3 e 5, da L.G.Tributária, e do artº.9, nºs.1, al.d), e 3, do C.I.R.S. (cfr.documentos juntos a fls.20 e 21 do processo administrativo apenso).
X
Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada uma dos números do probatório.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese:
1-Com base na prova produzida relativa à utilização dos cartões "Kumbo", justificada a quantia de € 4.800,00, objecto de depósito nas contas bancárias movimentadas pela recorrente Isabel …………………………….;
2-Com base na prova produzida relativa à utilização dos cartões pré-pagos "B…………", justificada a quantia de € 40.070,00, objecto de depósito nas contas bancárias movimentadas pela recorrente Isabel ……………….;
3-Em virtude da falta de legitimação para a determinação indirecta da matéria colectável derivada do exame dos valores creditados na conta bancária nº.165100059279, sediada no M.................(conta de que eram titulares a recorrente e o seu companheiro), em consequência do que se desconsiderou o valor de € 97.841,58, tudo devido à não possibilidade de aplicação da presunção de solidariedade activa de créditos prevista no artº.516, do C.Civil;
4-Assim julgando parcialmente procedente o recurso deduzido e justificada a utilização do montante de € 142.711,58, mais se mantendo o apuramento do rendimento tributável por métodos indirectos, em sede de I.R.S., categoria G, do ano de 2010, na quantia de € 287.590,85.
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Levando em consideração, segundo um prudente critério, a tutela mais eficaz dos interesses em presença no âmbito do presente processo, deve concluir-se pela necessidade de apreciação, em primeiro lugar, do recurso apresentado pela recorrente Isabel …………………, desde logo, por uma questão de prioridade temporal, apesar de entre os dois recursos não se estabelecer qualquer relação de subsidiariedade, visto terem por objecto partes distintas do dispositivo da decisão recorrida (cfr.artº.124, do C.P.P.Tributário).
X
1-A recorrente aduz, em primeiro lugar e em síntese, que à luz da razão de ciência dos depoimentos prestados por P................, M................ …………., Pedro ……………. e Graça ………..(intervenientes e com conhecimento total e directo dos factos sobre os quais prestaram os seus depoimentos de forma totalmente espontânea), tal como da prova documental por si produzida, deveria ter ficado cabalmente demonstrado nos autos que o acréscimo de património e de despesa verificado na esfera da recorrente resultou apenas e só (i) das remessas de dinheiro que o companheiro da recorrente (Paulo …………………….) realizou a partir de Angola, (ii) da liquidação das dívidas que Jorge R................ (sócio e gerente da J. R................, LDA.) tinha perante o companheiro da recorrente e que pagou através da entrega à recorrente dos cheques emitidos pela sociedade P.......... à sociedade J. R................, LDA. e, bem assim, (iii) da liquidação de uma dívida no valor de € 30.000,00 que o pai da recorrente tinha perante o seu companheiro, sendo que nenhum destes vectores é susceptível de tributação em sede de I.R.S. na esfera da recorrente (cfr.conclusões 7 a 16 do recurso), com base em tal alegação pretendendo, segundo percebemos, consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 27/02/2014, proc.7205/13).
Por outro lado, no que concretamente diz respeito à produção de prova testemunhal, refira-se que se a decisão do julgador estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.6280/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6418/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/10/2014, proc.7689/14).
No caso concreto, tanto no que diz respeito à produção de prova testemunhal, como à documental, não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devido a manifesta falta de cumprimento do ónus mencionado supra, desde logo, quanto aos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida.
Concluindo, este Tribunal não tem obrigação de conhecer do presente esteio da apelação.
Apesar disso, remete-se o recorrente para a factualidade aditada ao probatório e supra exarada.
Por último, no que, especificamente, se refere à prova documental sempre se deverá constatar, com o Tribunal "a quo", que não basta para afastar a constatação da divergência pressuposta no artº.87, nº.1, al.f), da L.G.T., a invocação de eventuais transferências de montantes provenientes de Angola, face aos quais se torne impossível estabelecer qualquer conexão entre os responsáveis pelo envio e os receptores dessas quantias, sem qualquer possibilidade de quantificação e de documentação dos mesmos.
Mais aduz a apelante Isabel Maria ……………….. que a sentença recorrida labora em erro de julgamento no que concerne aos pressupostos de direito, na medida em que o esforço probatório que é exigido pelo Tribunal "a quo" não tem apoio legal no artº.89-A, nº.3, da L.G.T. Que no entender da recorrente, o Mm.° Juiz "a quo" não teve em devida conta o entendimento jurisprudencial no exame que fez dos documentos e depoimentos produzidos nos autos, na medida em que parece ter exigido da recorrente um esforço probatório que não tem apoio legal no disposto no citado artº.89-A, nº.3, da L.G.T., nem na interpretação que o Tribunal Central Administrativo Sul tem feito do referido preceito legal, "maxime" na parte em que sufraga o entendimento de que à recorrente cumpria a prova da concreta origem de todo e qualquer depósito bancário efectuado pelo companheiro da recorrente e sua família, quando na verdade bastaria provar que os referidos meios financeiros não constituem rendimentos tributáveis na esfera da recorrente em 2010 (cfr.conclusões 4 a 6 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a sentença do Tribunal "a quo" comporta tal pecha.
A denominada Lei de Reforma da Tributação do Rendimento (cfr.Lei 30-G/2000, de 29/12) veio, no capítulo relativo às medidas de combate à evasão e fraude fiscais, introduzir uma importante alteração nas regras relativas ao ónus da prova e à possibilidade de recurso a métodos indirectos na determinação da matéria tributável (cfr.A Reforma Fiscal Inadiável, J. Pina Moura e R. Sá Fernandes, Revista Fisco, ano XII, nºs.95/96, Abril de 2001, pág.23 a 25).
O referido diploma excluiu da presunção de veracidade das declarações do contribuinte os casos em que os rendimentos declarados para efeitos de I.R.S. se revelem desproporcionados, para menos, sem razão justificativa, dos padrões de rendimento indiciados por determinadas manifestações de fortuna. Com o aditamento à L. G. Tributária da al.d), do nº.2, do artº.75, e do artº.89-A, efectuado pela Lei 30-G/2000, de 29/12, o legislador consagrou uma nova situação em que cessa a presunção de veracidade da declaração do contribuinte: o de existirem manifestações de fortuna em desproporção com os rendimentos declarados, tudo nos termos previstos na lei (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/8/2013, proc.6883/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/6/2014, proc.7727/14).
Na tributação com base nas mencionadas manifestações de fortuna, em sentido amplo, podem ser discernidas duas tipologias de situações:
a) A correspondente ao artº.87, nº.1, al.d), da L.G.T., que determina a possibilidade de avaliação indirecta quando “os rendimentos declarados em sede de I.R.S. se afastarem significativamente para menos, sem razão justificada, dos padrões de rendimento que razoavelmente possam permitir as manifestações de fortuna evidenciadas pelo sujeito passivo nos termos do artº.89-A”;
b) A constante da al.f), do nº.1, do artº.87, da L.G.T., segundo a qual é possível tal avaliação indirecta, quando haja “um acréscimo de património ou despesa efectuada, incluindo liberalidades, de valor superior a € 100.000, verificados simultaneamente com a falta de declaração de rendimentos ou com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados”.
Verifica-se, pois, uma dualidade de situações: a da existência de manifestações de fortuna, em sentido estrito, às quais correspondem determinados rendimentos padrão e a da existência de incrementos patrimoniais ou despesa não justificados. Ou seja, o artº.87, nº.1, al.f), da L.G.T., abrange uma realidade enquadrável num conceito amplo de manifestações de fortuna e designada por acréscimo ou incremento patrimonial não justificado, definido em concreto por comparação com o rendimento declarado, sendo precisamente esta a situação dos autos (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/8/2013, proc.6883/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/01/2014, proc.7264/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.760 e seg. e 778 e seg.; José Guilherme Xavier Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.363 e seg.).
Nestes casos, cabe ao contribuinte a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas. Para o efeito, o contribuinte deve apresentar os respectivos elementos probatórios demonstrativos de que a fonte das manifestações de fortuna apresentadas não é constituída por rendimentos indevidamente não declarados, conforme se retira do disposto no artº.89-A, nº.3, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 94/2009, de 1/9, a aplicável ao caso “sub judice” (cfr.artº.12, do C.Civil). Encontramo-nos perante regime dirigido à descoberta de rendimentos inominados sujeitos a I.R.S. Parte-se do consumo ou de aumentos de património evidenciados pelo sujeito passivo e de que a A. Fiscal tem conhecimento para a presunção de rendimentos que os sustentem (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/11/2012, rec.1197/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/01/2014, proc.7264/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.782 e seg.; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.299 e seg. e 310 e seg.; José Guilherme Xavier Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.370 e seg.).
Por último, deve mencionar-se que os ditos acréscimos patrimoniais não justificados consagrados no artº.87, nº.1, al.f), da L.G.T., são passíveis de enquadramento no artº.9, nºs.1, al.d), e 3, do C.I.R.S. (categoria G de rendimentos na cédula de I.R.S.), devendo visualizar-se este último preceito como uma verdadeira norma residual de incidência, dando melhor concretização à teoria do rendimento-acréscimo subjacente ao I.R.S. (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/11/2012, rec.1197/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/8/2013, proc.6883/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/01/2014, proc.7264/13; José Guilherme Xavier Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.363 e seg.; Rui Duarte Morais, Sobre o I.R.S., 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.126 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, de acordo com a factualidade provada (cfr.nº.1 do probatório), a A. Fiscal verificou que, em relação ao ano de 2010, a recorrente Isabel …………….o declarou, em sede de I.R.S., rendimentos no montante de € 46.123,66, embora tenha tido um acréscimo patrimonial constante das diversas contas bancárias que então movimentava na ordem de € 610.683,33, montante para o qual não encontrou justificação, em virtude do que lhe fixou, por métodos indirectos, a matéria colectável em € 471.572,09, nos termos do disposto nos artºs.87, nº1, al.f), e 89-A, nºs.3 e 5, da Lei Geral Tributária.
Cabia, então, ao recorrente a comprovação de que correspondem à verdade os rendimentos declarados e de que outra é a fonte do acréscimo de património em causa detectado pela A. Fiscal (cfr.artº.89-A, nºs.3 e 5, da L.G.T.).
Ora, conforme se retira do exame da factualidade provada (cfr.nºs.3 e 6 do probatório), o recorrente somente produziu prova justificativa parcial dos rendimentos depositados nas contas bancárias por si movimentadas, no que se refere a € 4.800,00, derivados da utilização dos cartões "Kumbo", e de € 40.070,00, provenientes do aproveitamento dos cartões pré-pagos "BNI".
E recorde-se que a doutrina e a jurisprudência mais recentes admitem a possibilidade do afastamento parcial da presunção de rendimento consagrada no artº.89-A, da L.G.T., no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., nas situações em que o sujeito passivo somente faz prova parcial da fonte dos seus sinais exteriores de riqueza (v.g.celebração de empréstimo bancário para adquirir imóvel). Nestes termos, embora só a justificação total do montante que permitiu a verificação da “manifestação de fortuna”, tenha a virtualidade de afastar a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram tais sinais exteriores de riqueza, já assim não é, contudo, no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., onde a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto. Pelo que, por exemplo, tendo o contribuinte demonstrado que recorreu a empréstimos bancários para adquirir imóveis cujo valor determinou a avaliação indirecta da matéria colectável, nos termos do artº.89-A, da L.G.T., a quantificação do rendimento tributável assim operado deve ser igual a 20% do valor de aquisição, mas deduzindo-se a este valor de aquisição o montante de tais empréstimos bancários, já que o respectivo montante destes não está, nem pode estar, sujeito a I.R.S., não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação (cfr.ac.S.T.A-Pleno da 2ª.Secção, 5/7/2012, rec.358/12; ac.S.T.A-2ª.Secção, 11/7/2012, rec.668/12; ac.S.T.A-2ª.Secção, 7/11/2012, rec.1088/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6579/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/6/2014, proc.7727/14; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.301 e seg.).
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido pela recorrente Isabel …………………………… e confirma-se a decisão recorrida neste segmento, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
X
2-A Fazenda Pública alega, em primeiro lugar e como supra se alude, que a sentença recorrida, ao decidir como decidiu, anulando o valor de € 44.870,00 ao rendimento colectável apurado pela A.T., em sede de avaliação indirecta do rendimento, incorreu em erro de julgamento da matéria de facto. Que não ficou demonstrado que os depósitos efectuados nas contas bancárias visadas tivessem a sua origem nos levantamentos dos cartões Kombu. O mesmo se diga, pelas mesmas razões, quanto ao decidido pelo Tribunal "a quo" relativamente aos cartões pré-pagos "BNI” (cfr.conclusões 1 a 7 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
Remetendo para o regime e considerandos tecidos a propósito do exame do fundamento de recurso paralelo, deduzido pela apelante Isabel …………………., também neste caso, tanto no que diz respeito à produção de prova testemunhal, como à documental, não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devido a manifesta falta de cumprimento do ónus consagrado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6, em virtude do que este Tribunal não tem obrigação de conhecer do presente esteio do recurso.
Aduz, igualmente, a Fazenda Pública que incorreu a decisão recorrida em erro de julgamento quando, relativamente às remessas provenientes da "Wester Union" que foram depositadas numa conta da recorrente Isabel …………………. em regime de contitularidade, entendeu que a Administração Tributária, na aferição do rendimento colectável, tinha tido em consideração a totalidade dos fundos depositados - o que não é verdade (cfr.conclusão 8 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar, supomos, um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a sentença do Tribunal "a quo" comporta tal pecha.
Se bem percebemos o presente esteio do recurso, a Fazenda Pública põe em causa a decisão do Tribunal "a quo" que julgou existir falta de legitimação para a determinação indirecta da matéria colectável derivada da análise dos valores creditados na conta bancária nº……………, sediada no M.................(conta de que eram titulares a recorrente Isabel ……………….. e o seu companheiro), em consequência do que se desconsiderou o valor de € 97.841,58, tudo devido à não possibilidade de aplicação da presunção de solidariedade activa de créditos prevista no artº.516, do C.Civil (cfr.quadros 3 e 8 constantes do nº.1 do probatório; nº.7 do probatório).
Conforme se retira do exame da factualidade provada (cfr.nºs.1 e 7 do probatório), a A. Fiscal na análise dos valores creditados na conta bancária nº…………., sediada no M.................(conta de que eram titulares a recorrente Isabel ………….. e o seu companheiro), em virtude da aplicação da presunção de solidariedade activa de créditos prevista no artº.516, do C.Civil, apenas considerou não justificada (para efeitos de tributação com base nos artºs.87, nº1, al.f), e 89-A, nºs.3 e 5, da Lei Geral Tributária) metade da quantia encontrada na identificada conta bancária.
O Tribunal "a quo", por sua vez, decidiu que a Fazenda Pública não tinha legitimidade para analisar os valores creditados na identificada conta bancária, em consequência do que desconsiderou o valor de € 97.841,58, tudo devido à não possibilidade de aplicação da presunção de solidariedade activa de créditos prevista no artº.516, do C.Civil.
Vejamos quem tem razão.
Encontramo-nos perante conta bancária colectiva, visto ter mais do que um titular, no caso dois titulares (a recorrente Isabel Maria …………….. e o seu companheiro). As contas bancárias colectivas podem ser solidárias (quando qualquer dos titulares pode movimentar sozinho a conta) ou conjuntas (quando os movimentos da conta exigem a intervenção simultânea de todos os seus titulares). Já no que respeita à titularidade dos valores depositados numa conta bancária colectiva, entendemos que, na falta de demonstração em contrário, se presume (cfr.artº.516, do C.Civil - presunção ilidível) que cada um dos depositantes, em conta bancária colectiva, é proprietário de metade dos fundos nela existentes (cfr.ac.S.T.J., 12/2/2009, proc.08A3714; ac.S.T.J., 31/3/2011, proc. 281/07.9TBSVV.C1.S1; ac.R.Lisboa, 26/1/2012, proc.355/09.1TVLSB.L1-6; P.Lima e A.Varela, C.Civil Anotado, 3ª. Edição, Coimbra Editora, 1982, vol.I, pág.502; A. Menezes Cordeiro, Direito Bancário, 5ª. Edição, Almedina, 2014, pág.594 e seg.).
De acordo com a visão doutrinal e jurisprudencial acabada de emitir e com a qual concordamos, deve concluir-se ser de aplicar, "in casu", a presunção ilidível (embora a recorrente Isabel Maria …………….. não tenha efectuado a prova do contrário nos presentes autos) prevista no citado artº.516, do C.Civil, como fez a F. Pública, com vista ao cálculo da titularidade dos valores depositados na conta bancária colectiva nº…………., sediada no Montepio …….., em consequência do que se julga procedente o presente fundamento do recurso, mais se anulando a decisão recorrida neste segmento.
Finalizando, sem necessidade de mais amplas ponderações, concede-se parcial provimento ao recurso deduzido pela Fazenda Pública e, em consequência, anula-se a decisão recorrida no segmento em que desconsiderou o valor de € 97.841,58 (fixando-se o montante do rendimento colectável global a considerar na quantia de € 385.433,67), constante da conta bancária colectiva nº………….., sediada no Montepio ……….., tudo devido à não possibilidade de aplicação da presunção de solidariedade activa de créditos prevista no artº.516, do C.Civil, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
1-NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO deduzido por Isabel ……………… e CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA NESSE SEGMENTO, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica;
2-CONCEDER PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO intentado pela Fazenda Pública, MAIS ANULANDO A DECISÃO RECORRIDA NO SEGMENTO em que desconsiderou o valor de € 97.841,58, constante da conta bancária colectiva nº…………, sediada no Montepio ……….
X
Condenam-se os recorrentes em custas, na proporção do respectivo decaimento, o qual se fixa em 90% pela recorrente Isabel …………………… e em 10% pela F.P., sendo dispensados do pagamento das custas na parte remanescente da taxa de justiça superior ao valor de € 275.000,00, em razão da conduta das partes e do grau de complexidade da causa (cfr.artº.6, nº.7, do R.C.P.).
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 16 de Outubro de 2014


(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)