Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:98/18.5BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:05/07/2020
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:NULIDADES DO ACÓRDÃO
Sumário:I - A possibilidade de dedução do incidente de nulidade do acórdão visa satisfazer a preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e o entendimento de que será mais útil à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da Justiça coenvolve, corrigir do que perpetuar um erro juridicamente insustentável.
II - Ao arguir nulidades do acórdão do TCA, importava que a Requerente apontasse nulidades perpetradas pelo próprio acórdão do TCA, ou seja, importava que tivesse sido esclarecido em que medida o aresto deste Tribunal revela uma contradição entre os fundamentos e a decisão atingida e, bem assim, em que medida o acórdão violou o princípio do contraditório.
III - No caso, nada disso foi feito, sendo evidente que a Requerente apenas discorda da análise efectuada pelo TCA sobre a decisão arbitral objecto de impugnação.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO


RELATÓRIO
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L..., com os demais sinais dos autos, notificado do acórdão deste TCA Sul, datado de 11/04/19, e exarado a fls. 77 e ss dos presentes autos, o qual teve como objecto decisão arbitral, apresentou, em 22/05/19, requerimento destinado a interpor recurso de revista, dirigido ao STA, com fundamento no artigo 150º do CPTA, recurso este acompanhado das respectivas alegações de recurso.
Em 07/06/19, foi proferido despacho pelo, então, Relator, com o seguinte teor (cfr. fls. 162):
“Admite-se liminarmente o incidente de arguição de nulidade de acórdão suscitado no âmbito do requerimento de dedução de recurso de revista junto a fls.108 e seg. dos autos (cfr.conclusões L) a AH) do recurso).
Notifique a entidade recorrida, Autoridade Tributária e Aduaneira, de todo o conteúdo do requerimento, fixando-se em dez dias o prazo para se pronunciar sobre o mesmo incidente.
D.N”.
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É o seguinte o teor das conclusões L) a AH) referidas no despacho transcrito:
L - O aqui recorrente não pode, sem antes esgotar o poder jurisdicional, conceder em que o ónus supra enunciado fosse efetivo, sendo que tampouco foi alguma vez equacionada ou perspetivada a existência de tal ónus, tanto mais que é e sempre foi incontroversa a efetiva existência do contrato de trabalho, sendo a sua existência, aliás, o inelutável preliminar da inspeção inspetiva que determinou a tributação entretanto alvo de impugnação.
M - Por um lado, o próprio douto acórdão recorrido teve por pacífica a existência desse documento, uma vez que fez constar a sua existência no contexto da Fundamentação de Facto, mais concretamente nos seus pontos A) F) e G), cujo teor aqui se dá por reproduzido.
N - Além disso, tal como já aqui se mencionou, na génese do processo arbitral encontra-se, a situação de revogação desse contrato de trabalho e dos seus efeitos em sede de tributária, mais concretamente no que respeita à pretensão da AT em tributar o montante então recebido pelo aqui Impugnante.
O - Exigindo-se que para efeitos do direito à isenção de tributação em sede de IRS da indemnização aqui em causa, se comprovasse a existência de acordo entre o trabalhador e a nova entidade patronal (por regra, o contrato de trabalho) no sentido da relevância do tempo de serviço prestado a entidades do mesmo setor – e isto porque os dois restantes requisitos ficaram provados - tal terá que significar que podem sobrevir exceções à regra e que o acordo em questão será suscetível de ser comprovado por outras formas.
P - Assim, atendendo-se ao ponto F. dos Factos Provados (onde se lê: " ambos os outorgantes reconhecem o seu acordo na determinação da antiguidade do colaborador pela contagem de tempo de serviço em entidades bancárias indicadas na referida cláusula do ACT, para efeitos do disposto na al. b) do nº 4 do art. 2º do Código do imposto sobre rendimento das Pessoas Singulares, na redação que lhe foi dada pelo art. 108º da Lei nº 64B/2011, de 30 de Dezembro»), dúvidas não deveriam restar que se estava perante uma exceção à enunciada regra.
Q - Ou seja, se, por via de regra a prova do acordo entre a nova entidade patronal e o trabalhador para efeitos da relevância do tempo de serviço prestado a entidades do mesmo setor decorre de um contrato de trabalho, no caso vertente a prova desse acordo ficou - no mínimo - firmada fora da órbita do contrato de trabalho, ou seja, no documento que consignou a respetiva extinção.
R - Deste modo, evidencia-se uma oposição entre os fundamentos da decisão e a concreta e subsequente Decisão (final), o que, além do mais, despoleta a nulidade da Decisão Arbitral, bem como, por contaminação e no que ao caso importa, do douto acórdão recorrido, nos termos já aqui enunciados, ou seja, os preconizados nas alínea a) do nº1 do artigo 28° do RJAT, 125. º do CPPT e artigos 195º e 615º do Código de Processo Civil), aplicáveis ex vi alíneas c) e e) do n°1 do artigo 29° do RJAT, nulidade que deverá ser decretada.
III) A violação do princípio do contraditório, por parte da Decisão Arbitral e, consequentemente, do douto acórdão, em virtude da mesma ter surgido nos autos como uma "decisão surpresa", sendo que previamente à Decisão deveria ter-se suscitado a agilização de tal princípio por parte do aqui Recorrente, convidando-o a apresentar o documento alegadamente em falta.
S - Encontra-se firmado no artº.3, nº.3, do Código de Processo Civil, que o Juiz (no caso concreto o Árbitro), deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de Direito ou de Facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.
T - O aditamento desta norma, operado pelo Decreto - lei nº 329-A/95, de 12/12, visou-se a proibição da prolação das denominadas «decisões-surpresa», constituindo-se um princípio basilar do nosso direito processual, sendo reconhecido, genericamente, no artº. 3 do Código de Processo Civil e, por sua vez, surge consagrado no artº.16, al. a), do R.J.A.T., e deve ser assegurado através da faculdade conferida às partes de poderem pronunciar-se sobre quaisquer questões de facto ou de direito suscitadas no âmbito do processo.
U - Um outro afloramento deste princípio encontra-se consignado no artº.18, nº.1, al. b), do R.J.A.T., norma em que se impõe a audição das partes quanto a eventuais excepções que seja necessário apreciar e decidir antes de conhecer do pedido.
V - Esse princípio há-de ser observado não apenas em relação à argumentação de uma qualquer contraparte, mas igualmente no que respeita a qualquer pronuncia, ou entendimento que tenha a sua génese oficiosa, ou seja, da lavra do próprio Tribunal, ou melhor, do Juiz do processo (no caso, do Árbitro).
W - Ao não haver acolhido a tese de estarmos perante a necessidade de conceder ao ora Recorrente a possibilidade de contraditar a intenção de ter por primordial o oferecimento do documento em questão (contrato de trabalho), o Exmo. Árbitro e, consequentemente o douto acórdão recorrido, impediram o cabal e genuíno exercício do dito contraditório e, bem assim, que o mesmo fosse então (facilmente) apresentado nos autos, ainda que sujeito ao pagamento de uma multa por eventual apresentação tardia.
X - Dessa forma, foi, igualmente, contrariado o disposto no artigo 590º, nº 3, do Código do Processo Civil, que determina que o Juiz (no caso o Árbitro), deve convidar as partes a suprir irregularidades, designadamente quando a parte não haja apresentado documento essencial.
Y - Mais, de acordo com a leitura deste último preceito esse convite seria mesmo obrigatório ao ter-se a existência do documento (contrato de trabalho) por essencial para a verificação dos referidos requisitos.
Z - Tudo somado, não pode deixar de perspetivar-se estarmos também perante a violação de um preceito constitucional, mais concretamente o nº 4 do artigo 20º da CRP, ou seja, o do direito a uma justiça e a um processo equitativo.
AA - Daí que a violação do princípio do contraditório, para além de constituir uma omissão grave, representa uma nulidade processual, na medida em que no caso em apreço a sua omissão veio a influir, aqui decisivamente, no exame e decisão da causa.
AB - Assim, perspetivando o Exmo. Árbitro do processo a quo que (no que foi validado pelo douto acórdão que antecede), que se revelava necessária a prova da existência do contrato de trabalho em questão, ou que seria necessário aceder ao respetivo conteúdo (para assim aferir da existência do requisito que se entendia como essencial à pretensão), deveria ter suscitado tal questão junto do aqui recorrente, dando-se-lhe, assim e mormente, a possibilidade de efetivar a respetiva junção aos autos, assim se evitando a surpresa que constitui a decisão impugnada, e que se vem a situar nas antípodas da sempre desejável verdade material.
AC - Com tal convite, honrar-se-ia o referido princípio do contraditório, consignado no art. 3º do C.P.C e, bem assim, no art. 11º, alínea b), do Regulamento de Arbitragem, bem como do mencionado artigo 590º, nº 3, do CPC (tendo implícito um dever de boa gestão processual), e, quiçá acima de tudo, do mencionado artigo 20º, nº 4 da CRP.
AD - Além disso, para além do citado preceito do processo civil, a solicitação desse contrato de trabalho por parte do Exmo. Árbitro, poderia, por exemplo, ter ocorrido sob a égide do art. 18º, nº 6, alínea c) do referido Regulamento, do qual resulta que:
"[...] o tribunal arbitral pode ordenar, por sua iniciativa [...], com observância do princípio do contraditório, a realização das diligências de prova que entender convenientes, designadamente: [...] c) promover a entrega de documentos em poder das partes [...]."
AE - Desse modo, beliscada ficou também a parte final do nº 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil, uma vez que a violação do princípio do contraditório teria também o condão de despoletar a nulidade da Decisão Arbitral, uma vez que a "irregularidade" cometida influiu, decisivamente, no - bom - exame e decisão da causa.
AF - Ao contrário do entendimento sancionado pelo douto aresto recorrido, ainda que se pudesse perspetivar que a concretização realizada pelo aqui recorrente possa ter sido parca ou deficiente, certo é que se explicitou (concretizou) o motivo que determinou o então Impugnante a alegar a verificação da violação do dito princípio do contraditório, tendo concretizado esse ónus - também - em conexão com a referida matéria respeitante à «decisão-surpresa».
AG - Estamos, assim, perante a verificação de diversos vícios como sejam o de a oposição dos fundamentos com a decisão, e violação do princípio do contraditório, que constituirão causa expressa de nulidade da decisão arbitral impugnada, e, mais concretamente, do douto acórdão recorrido, em virtude do disposto no artigo 125. º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, bem como dos artigos 195º, 590º, nº 3 e 615º do Código de Processo Civil, sendo que a violação do princípio do contraditório terá também o condão de despoletar a dita nulidade uma vez que a "irregularidade" cometida influi no exame e decisão da causa.
AH - É que em virtude da primordial importância do respeito pelo princípio do contraditório, é indiscutível que a inobservância desse princípio, com a prolação de decisão-surpresa, influi, inequivocamente, no exame ou decisão da causa, daí decorrendo a invocada nulidade por verificação de uma omissão de cariz objetivamente grave”.
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Notificada do requerimento a suscitar o presente incidente, a entidade requerida, Fazenda Pública, respondeu nos termos seguintes:
“A AT – Autoridade Tributária e Aduaneira, Recorrida nos autos em referência, onde é Recorrente L..., notificada do douto despacho de 07/06/2019, vem pronunciar-se sobre o incidente de arguição de nulidade do acórdão do TCA Sul no âmbito do requerimento de dedução de Recurso de Revista (conclusões L) a AH) do recurso), o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. O Recorrente invoca no âmbito do Requerimento de Recurso de Revista e nas respectivas Alegações de Recurso, mais concretamente nas alíneas L) a AH), o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, bem como o vício de violação do princípio do contraditório, os quais vem assacar, “por contaminação”, ao acórdão do TCA Sul sob recurso.
2. A AT entende que não se verificam os vícios ora em causa, devendo o incidente de nulidade do acórdão sob recurso improceder nos termos a seguir explicitados.
3. Vejamos, por partes.
Vício de oposição entre os fundamentos e a decisão
4. Em sede do alegado vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, vem o Recorrente invocar que sendo “incontroversa a efectiva existência do contrato de trabalho”, e “exigindo-se que para efeitos do direito à isenção de tributação em sede de IRS da indemnização aqui em causa, se comprovasse a existência de acordo entre o trabalhador e a nova entidade patronal (…) no sentido da relevância do tempo de serviço prestado a entidade do mesmo setor”,
5. Haveria que atender a que “no caso vertente a prova desse acordo ficou – no mínimo – firmada fora da órbitra do contrato de trabalho, ou seja, no documento que consignou a respectiva extinção”.
6. Verifica-se, porém, acompanhando-se o entendimento já proferido em sede do acórdão sob recurso, não existir violação do silogismo judiciário na decisão arbitral e, na mesma lógica, do acórdão do TCA Sul,
7. Remetendo-se para a apreciação efectuada naquele douto acórdão quanto a esta matéria.
Vício de violação do princípio do contraditório
8. Em sede do alegado vício de violação do princípio do contraditório, entende a Recorrente que devia ter sido convidada a apresentar o documento alegadamente em falta, o que veio a terminar numa decisão surpresa sobre cujos pressupostos de facto e de direito o Recorrente não teve possibilidade de se pronunciar,
9. Mais concretamente que não teve a possibilidade de “contraditar a intenção de ter por primordial o oferecimento do documento em questão (contrato de trabalho)” o qual veio a ser considerado “documento essencial”.
10. Assim, quanto à pretendida junção do contrato individual de trabalho, remete-se para o acórdão sobre recurso o qual conclui pela extemporaneidade da junção daquele documento uma vez que o mesmo respeita a matéria de facto que já no âmbito do processo arbitral estava sujeita a produção de prova pelo Requerente,
11. A que acresce a recusa do TCA Sul em admitir a junção do documento em sede de impugnação da decisão arbitral uma vez que a sua competência não abrange o exame do mérito da decisão arbitral.
12. Nos termos supra expostos, deve o incidente de nulidade do acórdão prolatado pelo TCA Sul ser julgado improcedente.
Nos termos supra expostos, deve o incidente de nulidade do acórdão prolatado pelo TCA Sul ser julgado improcedente”.
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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal teve vista nos autos.
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Com dispensa dos vistos dos Exmos. Adjuntos vêm os autos à conferência para decisão.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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“Uma vez proferida a sentença (ou acórdão), imediatamente se esgota o poder jurisdicional do Tribunal relativo à matéria sobre que versa (cfr.artº.613, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Excepciona-se a possibilidade de reclamação com o objectivo da rectificação de erros materiais, suprimento de alguma nulidade processual, esclarecimento da própria sentença ou a sua reforma quanto a custas ou multa (cfr.artºs.613, nº.2, e 616, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.125, do C.P.P.Tributário).
Tanto a reclamação, como o recurso, passíveis de interpor face a sentença (ou acórdão) emanada de órgão jurisdicional estão, como é óbvio, sujeitos a prazos processuais, findos os quais aqueles se tornam imodificáveis, transitando em julgado. A imodificabilidade da decisão jurisdicional constitui, assim, a pedra de toque do caso julgado (cfr.artºs.619 e 628, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6).
A possibilidade de dedução do incidente de nulidade da sentença (acórdão) visa satisfazer a preocupação de realização efectiva e adequada do direito material e o entendimento de que será mais útil à paz social e ao prestígio e dignidade que a administração da Justiça coenvolve, corrigir do que perpetuar um erro juridicamente insustentável, conforme se retira do preâmbulo do dec.lei 329-A/95, de 12/12 (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.400/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 19/10/2011, rec.497/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/4/2013, proc.3013/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc. 5594/12; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.356 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.321 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.133 e seg.).
Tal como as sentenças de 1ª. Instância, os acórdãos proferidos pelos Tribunais Superiores podem ser objecto de arguição de nulidade. Além das nulidades previstas nas diferentes alíneas do artº.615, nº.1, do C.P.Civil, surgem-nos ainda duas situações decorrentes da colegialidade do Tribunal que profere o acórdão e que dão origem a nulidades específicas deste: o acórdão ser lavrado contra o vencido e, por outro lado, sem o necessário vencimento (cfr.artº.666, nº.1, e 667, do C.P.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 9/7/2013, proc.5594/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2014, proc.7094/13; Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, II Volume, Áreas Editora, 2011, pág.356 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.133 e 134; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.59 e seg.)” – cfr. Ac. do TCA SUL, de 11/10/18, proc. Nº 380/17.9BESNT.
Vejamos.
Entende o Requerente que se verifica a oposição entre os fundamentos e a decisão.
Especificamente, e como resulta sintetizado na conclusão R, a apontada nulidade do acórdão proferido pelo TCA (oposição entre os fundamentos e a decisão) é o resultado, “por contaminação”, da nulidade já verificada na decisão arbitral.
Tal nulidade, como evidenciou o acórdão posto em causa, remete-nos para os “termos do preceituado no citado art°.615, n°.1, al.c), do C.P.Civil”, pois é “nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no art°.154, n°.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada”.
Como se verifica, sem hesitações, o acórdão do TCA Sul ora posto em causa não sofre da apontada nulidade, ou seja, não evidencia qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão.
O que ocorre, no caso concreto, é que o ora Requerente discorda da resposta que este Tribunal deu à invocada nulidade da decisão arbitral, a propósito precisamente da oposição entre os fundamentos e a decisão.
Com efeito, no acórdão do TCA lê-se a este propósito o seguinte:
“No caso "sub judice", examinando a decisão do Tribunal Arbitral, deve concluir-se pela manifesta improcedência deste fundamento da impugnação, visto que aquela não padece da violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial. Concretizando, o Tribunal Arbitral concluiu que o impugnante apenas produziu prova de que a antiguidade do sector foi considerada no acordo de revogação do contrato de trabalho, para efeitos de cálculo do valor da indemnização (cfr.al.F), do probatório). No entanto, não tendo o requerente junto aos autos o contrato individual de trabalho celebrado com o Banco Barclays", não pode o Tribunal Arbitral averiguar se o tempo prestado a outras e anteriores entidades bancárias para efeitos de indemnização estaria previsto no mesmo contrato, razão pela qual se não encontram reunidos todos os pressupostos para assegurar que o conceito de antiguidade abranja o serviço prestados nas instituições bancárias anteriores, assim improcedendo a pretensão anulatória do requerente (cfr.enquadramento jurídico da decisão arbitral impugnada cuja cópia se encontra a fls.37 a 46 do processo físico). Em sede de dispositivo, em consonância com a fundamentação da decisão, julgou totalmente improcedente o pedido de pronúncia arbitral.
Em suma, não se vê que a decisão arbitral impugnada padeça do vício de oposição entre os fundamentos de facto e de direito e o seu dispositivo, nestes termos, improcedendo também este fundamento da apelação”.
Ora, ao arguir a nulidade do acórdão do TCA, importava que a Requerente apontasse uma nulidade perpetrada pelo próprio acórdão do TCA, no caso, importava que tivesse sido esclarecido em que medida o próprio aresto do TCA Sul revela uma contradição entre os fundamentos e a decisão atingida.
Ao invés, repete-se, o que a Requerente sustenta é a sua discordância face à resposta que o acórdão deste Tribunal deu à invocada nulidade da decisão arbitral.
Concluindo, sem necessidade de mais considerandos, dir-se-á que a apontada nulidade está incontornavelmente votada ao insucesso.
Avançado para a nulidade seguinte, a saber, a alegada violação do princípio do contraditório.
Vejamos.
A este propósito, sustenta o ora Requerente que devia ter sido convidado a apresentar o documento em falta (leia-se, contrato de trabalho), o que, ao não ter sido feito, redundou numa decisão surpresa, sobre a qual não se pôde pronunciar.
Mais uma vez, a alegada nulidade do acórdão do TCA Sul surge como uma “contaminação” relativamente à decisão arbitral, em concreto por não ter validado a invocada nulidade relativamente à decisão arbitral.
Veja-se, a este propósito, o que se escreveu no aresto do TCA, após o devido enquadramento legal e doutrinário do princípio do contraditório:
“Voltando ao caso concreto e examinando a decisão arbitral impugnada cuja cópia se encontra junta a fls.37 a 46 do processo físico, não vislumbra este Tribunal com base em que fundamento se possa concluir que a decisão arbitral violou o dito princípio do contraditório ou possa consubstanciar uma decisão-surpresa, matéria que também não é concretizada pelo impugnante. E recorde-se que não pode configurar-se como alegada violação do dito princípio do contraditório a necessidade de junção de um novo documento ao processo”.
Ora, também aqui não se vê a invocação de uma concreta violação do princípio do contraditório, levada a cabo pelo acórdão do TCA Sul. Também aqui, e uma vez mais, o que se verifica é que o Requente discorda da análise efectuada pelo TCA sobre a decisão arbitral, na parte correspondente à invocada violação do princípio do contraditório.
Nestes termos, atenta a perspectiva que defendemos, improcede a nulidade que vimos de analisar, tal como alegada no requerimento em apreciação.
Atento tudo quanto ficou relatado, e sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente incidente de nulidade de acórdão, ao que se provirá na parte dispositiva que se segue.
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Sobre a interposição do recurso de revista, oportunamente o Tribunal emitirá pronúncia, fazendo recair um despacho sobre tal requerimento.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em INDEFERIR A REQUERIDA NULIDADE DO ACÓRDÃO exarado a fls. 77e ss do presente processo.
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Condena-se o requerente em custas pelo presente incidente, fixando-se a taxa de justiça em uma (1) U.C. (cfr.artº.7 e Tabela II, do R.C.Processuais).
Registe.
Notifique.
Lisboa, 7 de Maio de 2020

(Catarina Almeida e Sousa)

(Vital Lopes)

(Anabela Russo)