Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03025/09
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:03/19/2015
Relator:CREMILDE MIRANDA
Descritores:DIREITOS ADUANEIROS DE IMPORTAÇÃO
REEMBOLSO
JUROS INDEMNIZATÓRIOS - ART. 241º DO CÓDIGO ADUANEIRO
COMUNITÁRIO
Sumário:I. Nos termos do art. 241º do Código Aduaneiro Comunitário, o reembolso, pelas autoridades aduaneiras, de montantes relativos a direitos de importação ou de exportação, não implica qualquer pagamento de juros por parte das referidas autoridades, a não ser que, entre a decisão de deferimento do pedido de reembolso e a execução de tal decisão, decorra período de tempo superior a três meses ou o pagamento de juros se encontre previsto nas disposições nacionais.

II. Não se encontrando previsto na lei nacional - art. 24º do CPT, na vigência deste código e, posteriormente, arts. 43º e 100º da LGT, - o pagamento de juros indemnizatórios nos casos de reembolso, pela autoridade aduaneira, de montantes relativos a direitos de importação ou de exportação, não são tais juros devidos se, entre a data da decisão que deferiu o pedido de reembolso e a data do efectivo reembolso, decorreu período de tempo inferior a três meses.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


O DIRECTOR GERAL DAS ALFÂNDEGAS E DOS IMPOSTOS ESPECIAIS SOBRE O CONSUMO, dizendo-se inconformado com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que, nos presentes autos de impugnação judicial deduzida pela sociedade……………………………., LDA, julgou procedente o pedido de condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios “pelo período compreendido entre 20.10.1997 e 10.04.2002, calculado pela aplicação das taxas legais tendo por base o valor de €4.238,88, pago anteriormente pelo impugnante”, vem dela interpor recurso nas suas alegações as seguintes conclusões:


1. No ponto 1 da matéria dada como provada a douta sentença recorrida deu como provado que foram pagas as quantias ali referidas, sendo que o que se passou foi que na data em questão, 17.07.97, aquelas quantias foram liquidadas, mas não pagas, tendo vindo a ser pagas em data posterior;


2. A douta sentença invoca nos respectivos fundamentos os artigos 43° e 100° da LGT, bem como o artigo 24° do CPT, não resultando claro qual o regime jurídico aplicado ao caso concreto, se foi o regime do CPT, o da LGT, ou ambos;


3. O regime a aplicar ao caso concreto, nesta matéria, é o do artigo 24° do CPT, sendo que, independentemente do regime aplicável, no que concerne ao direito aos juros indemnizatórios, a sentença em crise olvidou um aspecto essencial, o de verificar se estão, ou não reunidos os pressupostos legais (constantes quer do artigo 43° da LGT, quer do artigo 24° do CPT) para poder ser reconhecido o direito aos juros indemnizatórios;


4. Com efeito, não se verificou qualquer erro imputável aos serviços, condição necessária para o reconhecimento do direito aos juros indemnizatórios, direito esse que o aresto em crise ilegalmente reconheceu;


5. A sentença recorrida violou os artigos 241 do CAC e 24° do CPT.


Nestes termos e nos demais de direito e com o douto suprimento de V. Exas deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, ser, em conformidade, anulada a decisão em crise do Tribunal Tributário de Lisboa assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!

A Recorrida, sociedade …………………………., Lda, contra-alegou, formulando as conclusões que na íntegra se transcrevem:

1. A Administração Aduaneira procedeu, ilegalmente, à cobrança da dívida fiscal apurada sem que a mercadoria tivesse sido introduzida em livre prática.


2. A não consolidação do regime de introdução em livre prática pela não entrega da mercadoria e cumprimento integral das formalidades aduaneiras integrantes do respectivo regime são factores de inexigibilidade do pagamento da dívida.


3. Ao exigir, nestas condições, o pagamento da dívida, a autoridade aduaneira praticou um erro que, sendo da sua iniciativa, lhe é directamente imputável.


4. Nos termos do artigo 24° n°1 do CPT são devidos, nestas circunstâncias, juros indemnizatórios a favor do contribuinte.


Nestes termos e nos demais de direito e com o douto suprimento de V. Exas. deve o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado e, em conformidade, ser confirmada a decisão recorrida do Tribunal Tributário de Lisboa, assim se fazendo a costumada justiça.

Neste Tribunal, o Digno Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido da procedência do recurso.


*

As questões a decidir, delimitadas pelas conclusões das alegações, são as de saber se o Recorrido tem direito ao pagamento de juros indemnizatórios sobre quantia, indevidamente paga, de que foi reembolsado em cumprimento de despacho da Directora Regional de Contencioso Aduaneiro de Lisboa da Direcção Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais Sobre o Consumo, e, se sim, a partir de que data são os juros devidos.

Quanto à conclusão nº 1 das alegações, onde se refere que no ponto 1 da matéria dada como provada dá a sentença recorrida por provado que as quantias ali referidas foram pagas em 17.07.97, trata-se de lapso manifesto da Recorrente, já que, como adiante se verá, no ponto 1 da matéria dada como provada pela sentença recorrida, não se faz referência a qualquer quantia nem a qualquer data.

Corridos os vistos legais, há que apreciar e decidir.


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Na sentença recorrida julgaram-se provados os seguintes factos:


1. Pelo DU 200227.8 de 17/07/97 da Alfândega do Jardim do Tabaco, em nome de……….................... foram submetidos a despacho 399 caixa de Whisky relativamente às quais foram pagas as quantias de 854.064$00 € 4.260,05 referente a Direitos Aduaneiros e 310$00 1,54€ (fl. 114 do processo administrativo).


2. Em 21/07/97, foram apreendidas 397 caixas, cf., alto de selagem (fl..114 do processo administrativo).


3. Em 15/10/97 Rui…………….., despachante oficial, como a mercadoria tinha sido apreendida, solicitou que os valores referidos no nº1 fossem desafectos à sua caução global (fl. 8 e 114 do processo administrativo).


4. Em 20/10/97, foi pago o imposto (fl. 7 do processo administrativo).


5. O pedido referido no n° anterior não foi atendido, e em 27/10/97, foi solicitado o reembolso no pagamento efectuado pelo registo de liquidação 97/572611 e nº de receita 97/136560 de 09/09/97 no valor de 854.374$00 (fl. 9 e 114).


6. O pedido de reembolso foi indeferido (fl. 20 e 21 e 115 do processo administrativo).


7. Por despacho de concordância de 29/09/02 que incidiu na informação da Direcção Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo foi autorizado o reembolso do valor de 4.238,88 €, 849.820$00 (fl. 114 a 117 e fl. 120).


8. Em 10/04/02, foi efectuado o reembolso de € 4.238,88 (fl. 113 e seguintes).



Quanto à decisão da matéria de facto, lê-se, ainda, na sentença recorrida:

Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes do recurso, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra.

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.

Ao abrigo do art. 662º do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 2º, al. e), do CPPT, corrigem-se os nºs. 7 e 8 dos factos julgados provados por incorrecção das datas referidas, nos seguintes termos:

7. Por despacho de concordância de 27 de Setembro de 2002 que incidiu na informação da Direcção Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo foi autorizado o reembolso do valor de 4.238,88 €, 849.820$00 (fl. 105 a 112 do proc. administrativo).


8. Em 4 de Outubro de 2002, foi efectuado o reembolso de € 4.238,88 (fl. 113 do proc. administrativo).


Quanto à fundamentação de direito, para decidir no sentido de serem devidos juros indemnizatórios ao ora Recorrido, pondera-se na sentença recorrida:

Quanto ao pagamento de juros indemnizatórios, os mesmos só são devidos, face ao disposto no artº43º da Lei Geral Tributária, quando se determine em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.
Já o artº 24º do Código de Processo Tributário previa o pagamento de juros indemnizatórios.
No artº100º da Lei Geral Tributária, prevê-se também a possibilidade de haver lugar a pagamento de juros indemnizatórios, a partir do termo do prazo da execução da decisão, em todos os casos em que foi decidida a anulação de um acto tributário de que resulte o dever da restituição de uma quantia ao contribuinte.
Jorge Lopes de Sousa (Em Problemas Fundamentais do Direito Tributário, 1999, Vislis Editores, Pag. 157), defende que a previsão no artº 43º da Lei Geral Tributária, dos casos em que há direito a juros indemnizatórios, numa interpretação compatível com a Constituição, deve ser interpretada, não como uma indicação exaustiva dos casos em que o contribuinte tem direito a serem indemnizados por actos da Administração Tributária, mas como uma listagem de situações em que é de presumir a existência de um prejuízo para os contribuintes e a responsabilidade da Administração Tributária pela ocorrência do mesmo.
Defende ainda o Ilustre autor (Obra citada pag.159), que embora não se refira expressamente no artº 43º, nº1, que o acto viciado por erro deve ser o acto de liquidação, são actos desse tipo os que provocam directamente o pagamento de uma dívida tributária, daí que é em relação a eles que se reporta esta disposição.
Tendo em conta o exposto, entendemos que também o artº 24º do Código de Processo Tributário não deve ser interpretado como uma indicação exaustiva dos casos em que o contribuinte tem direito a serem indemnizados.

Resulta do exposto que a sentença recorrida decidiu no sentido de ser devido ao Recorrente o pagamento de juros indemnizatórios com fundamento no disposto no art. 24º do CPT.

No art. 24º CPT, com a epígrafe Direito a juros indemnizatórios, previa-se o seguinte:

Haverá direito a juros indemnizatórios a favor do contribuinte quando, em reclamação graciosa ou processo judicial, se determine que houve erro imputável aos serviços.
Haverá também direito aos juros indemnizatórios quando, por motivo imputável aos serviços, não seja cumprido o prazo legal da restituição oficiosa dos impostos.
(…)
No caso dos autos, é do reembolso de direito de importação pela autoridade aduaneira que se trata e não de qualquer das situações previstas no art. 24º do CPT, sendo, portanto, de aplicar o que sobre esta matéria dispuser o Código Aduaneiro Comunitário.
Nos termos do art. 241º do CAC: O reembolso pelas autoridades aduaneiras de montantes de direitos de importação ou de exportação, bem como dos juros de crédito ou de mora eventualmente cobrados quando do pagamento desses direitos não implica qualquer pagamento de juros por parte das referidas autoridades. Todavia, serão pagos juros:- sempre que uma decisão de deferimento de um pedido de reembolso não seja executada no prazo de três meses a contar da adopção da referida decisão, - sempre que estiver previsto nas disposições nacionais. O montante destes juros deverá ser calculado de forma a ser equivalente àquele que seria exigido nas mesmas circunstâncias no mercado monetário e financeiro nacional.

Resulta da norma citada que há lugar ao pagamento de juros, desde que previstos nas disposições nacionais, nos casos, como o dos autos, em que haja reembolso, por parte das autoridades aduaneiras, de montantes de direitos de importação, mas só quando entre a decisão de deferimento do pedido de reembolso e o reembolso efectivo decorrerem mais de três meses. Não é o caso dos autos. Como foi julgado provado na sentença recorrida, o pedido de reembolso foi deferido em 27 de Setembro de 2009 e o efectivo reembolso foi efectuado em 4 de Outubro do mesmo ano.

É, pois, de concluir que não existe no caso dos autos o direito ao pagamento de juros indemnizatórios, assim se julgando procedentes as conclusões das alegações de Recurso com os números 2, 3, 4 e 5.

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Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em, concedendo provimento ao Recurso, revogar a sentença recorrida, mantendo-se o acto objecto de recurso contencioso.

Custas pela Recorrida.

19 de Março de 2015


Cremilde Abreu Miranda

Pereira Gameiro

Catarina Almeida e Sousa