Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 788/22.8 BESNT |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 02/16/2023 |
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Relator: | ANA CRISTINA DE CARVALHO |
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Descritores: | GARANTIA DISPENSA ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA DÉFICE INSTRUTÓRIO DO PEDIDO PRINCÍPIOS DA COLABORAÇÃO, DO INQUISITÓRIO E DA PROPORCIONALIDADE |
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Sumário: | ![]() |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, as Juízas que compõem a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul I – RELATÓRIO
T. N. Unipessoal, Lda, ora recorrente, inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal deduzida contra o despacho do Director de Finanças Adjunto de Lisboa que, em sede do processo de execução fiscal n.º ….529, indeferiu o seu pedido de dispensa de prestação de garantia, formulado na sequência do deferimento quanto ao pagamento em prestações das respectivas dívidas exequendas de acordo com o plano prestacional n.º 3654.2022.8500, veio deduzir o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões: «1. O presente recurso vem interposto da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, proferida no âmbito do Processo n.º 788/22.8BESNT, a qual julgou improcedente a Reclamação deduzida pela ora Recorrente, pedindo a anulação do despacho do Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, que indeferiu o seu pedido de dispensa de prestação de garantia, no âmbito do plano de pagamento em prestações melhor id. nos respetivos autos. 2. Afigura-se à Recorrente que a Sentença aqui recorrida, ao decidir pela improcedência da Reclamação apresentada, enfermará de error in iudicando na medida em que procedeu a uma errada aplicação do Direito, devendo, pois, o Tribunal Central Administrativo Sul intervir em sede de Apelação reapreciar e alterar o conteúdo da mesma em conformidade. 3. Como se sabe, a execução fiscal visa a cobrança coerciva das dívidas elencadas no art.º 148.º do CPPT. É, pois, um processo de natureza judicial, como decorre expressamente do n.º 1 do art.º 103.º da LGT, sem prejuízo de ser instaurada e se desenvolver perante órgãos da AT, que nela praticam os actos de natureza não jurisdicional que couberem, tudo nos termos dos artigos 10.º, n.º 1, alínea f), 149.º, 150.º e 151.º todos do CPPT. 4. Entre tais actos incluem-se os concernentes à prestação de garantia, quando a ela houver lugar, e às respetivas vicissitudes: apreciação da suficiência, dispensa, reforço, redução e levantamento. 5. É, pelo menos, o que se extrai das disposições dos artigos 169.º, 170.º, 183.º, 195.º, 199.º n.ºs 8, 9 e 10, todos do CPPT. 6. Em síntese, tudo quanto respeite à garantia prestada no âmbito da execução fiscal, quer tenha em vista a sua suspensão, quer o pagamento em prestações da dívida exequenda, é da competência do órgão da execução fiscal. 7. O pedido de dispensa de garantia deve, pois, ser apresentado ao órgão da execução fiscal, nos termos do n.º 1 do art.º 170.º do CPPT – que regulamenta o pedido de dispensa de prestação de garantia previsto no n.º 4 do art.º 52.º da LGT-, pois é a esse órgão que está legalmente atribuída a competência exclusiva para decidir sobre esse pedido. 8. Isto, sem prejuízo de o tribunal tributário competente poder ser chamado, mediante solicitação de qualquer interessado, a sindicar a legalidade da atuação da Administração no âmbito desse pedido (cf. artigos 151.º, n.º 1, e 286.º do CPPT). 9. Estamos, pois, perante um procedimento administrativo tributário enxertado no processo de execução fiscal, sendo a respetiva decisão um verdadeiro acto administrativo. 10. Esse procedimento da iniciativa do executado é um procedimento formal, que deve obedecer às regras legais; designadamente, deve seguir a forma escrita (cf. n.º 3 do art.º 54.º da LGT), deve indicar o órgão a que se dirige, identificar o requerente, com indicação do nome e domicílio [cf. art.º 102.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código do Procedimento Administrativo (CPA)], expor os fundamentos de facto e de direito em que se baseia o pedido e instruir o requerimento com a prova documental pertinente (cf. n.º 3 do art.º 170.º do CPPT). 11. Como expressamente referido em sede de Reclamação, não se pode deixar de sublinhar que o requerimento apresentado pela sociedade Executada, ora Recorrente não foi efetuado por um profissional do foro (vulgo mandatário judicial), antes tendo sido efetuado e assinado pelos respetivos gerentes da ora Recorrente. 12. Ora, em face dessa circunstância afigura-se que maxime o princípio da colaboração plasmado no art.º 59.º da LGT, impunha-se à AT, por efeito da densificação daquele princípio maxime ex vi art.º 7.º do CPC, enquanto órgão de execução fiscal, o dever de auxílio da parte na remoção de dificuldades ao exercício dos seus direitos ou faculdades ou ao cumprimento dos seus ónus ou deveres processuais. 13. E se o dever de colaboração deve ser cumprido quando a parte esteja representada por advogado, não pode deixar de se entender que, não estando a parte patrocinada por mandatário judicial, deve aumentar a diligência da AT, enquanto no cumprimento desse dever de assistência ao executado. 14. Por outro lado, a decisão de imediato indeferimento com base na falta de junção de prova, mas a qual havia sido efetuada noutros processos de execução fiscal anteriores e que, pois, era do perfeito conhecimento da AT, em especial tratando-se de factos negativos, sempre se revela, no caso, uma decisão absolutamente desproporcionada. Tanto mais que quanto às exigências do requerimento de dispensa de prestação de garantia, o artigo 170.º, n.º 3 do CPPT limita-se a referir de forma vaga que o pedido deve conter a “fundamentação de facto e de direito” e ser “instruído com a prova documental necessária. 15. Donde, não se vislumbra quais os interesses que possam justificar a inexistência sequer de um convite para a Executada, ora Recorrente, vir juntar meios de prova adicionais, em curto espaço de tempo, que permitissem aferir da bondade de quanto por si requerido. 16. Afigura-se, pois, à Recorrente que devendo sempre a justiça material prevalecer sobre a justiça formal, e sabendo desde logo que a executada não se encontrava patrocinada por mandatário judicial, caberia à AT convidar a Recorrente suprir a omissão da prova dos factos que alegou, e assim se obviaria a que uma omissão de natureza meramente procedimental conduzisse de imediato ao que veio a constituir uma denegação quase automática e cega do requerimento da ora Recorrente, quando por sinal a própria AT conhecia de uma vário conjunto de processos pelos quais a Recorrente havia já prestado várias garantias e ainda que a ora Recorrente estava e está a ser objeto de um outro conjunto variado de execuções fiscais. 17. O dever de colaboração - que deve mediar as relações entre os sujeitos do procedimento – não foi, pois, cumprido pela AT, sendo que a desproporção entre a irregularidade cometida pela ora Recorrente (não juntar os documentos obre os factos por si alegados) e a consequência que lhe é associada pela AT é manifesta, não se revelando adequada nem, pois, proporcional. 18. Atenta a redação do n.º 3 do artigo 170.º do CPPT, de onde não resulta expressamente quais as consequências do incumprimento ou cumprimento defeituoso do ónus de instrução do incidente de dispensa de garantia, tal resposta só poderá ser, pois, negativa; e para mais quando a executada não vem representada por mandatário judicial. Impondo-se ao órgão de execução, diligências no sentido do suprimento da irregularidade, ora “convidando” a executada requerente a instruir o pedido ou a vir esclarecer melhor as razões por que alegou a insuficiência económica ou a ausência de mais garantias que pudesse prestar. 19. A tal obriga a constatação de que, na compatibilidade entre o princípio da autorresponsabilidade das partes, concretizado no ónus de instrução do requerimento, com o princípio da colaboração, tem preponderância este último, dada a circunstância de a sociedade executada nem se encontrar sequer representada por advogado, poder apresentar prova de factos negativos de que lhe são exigidos, em tão curto espaço de tempo. 20. Donde, aplicando-se supletivamente as regras do processo civil, maxime o princípio da cooperação plasmado no art.º 7.º, n.º 4 do referido diploma, chega-se à conclusão que o órgão de execução fiscal não poderia ficar indiferente à ausência de patrocínio judicial da executada ora Recorrente e avançar desde logo para a aplicação das regras do ónus da prova, impondo-se, antes, uma atitude pro actione que, antes de mais, implicaria desde logo averiguar toda a prova documental que já estava em poder da AT e que imporia desde logo uma diferente decisão ou, no limite, o pedido de apresentação de prova adicional. 21. Acresce que sendo o despacho de indeferimento de pedido de isenção de prestação de garantia não precedido de audição prévia, afigura-se que o princípio do inquisitório e o já supracitado dever de colaboração devem assumir uma dimensão com maior significado e alcance. 22. A aplicação prática dos acima referidos princípios deve ser enquadrada, pois, com maior rigor, no sentido de impor à AT uma atuação mais proactiva, designadamente, na determinação da situação patrimonial concreta do interessado quando são alegados no pedido apresentado junto do órgão de execução fiscal os factos constitutivos do direito à isenção de prestação de garantia, tal como sucedeu in casu e também quando a AT não pode desconhecer que a Recorrente previamente a tal decisão carreou um conjunto de prova documental que não foi sequer levada em linha de conta pela AT. 23. Ora, optando a AT por indeferir logo o pedido, verificamos que não foi dado cumprimento ao princípio da descoberta da verdade material, enquanto corolário do princípio do inquisitório, e que, no fundo, constituem pedras angulares do procedimento administrativo tributário e, pior do que isso, foram violados os princípios da colaboração e da cooperação que se impunham à AT. NESTES TERMOS, E NOS MAIS DE DIREITO QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS SUPRIRÃO, DEVERÁ O PRESENTE RE-CURSO SER DADO COMO PROCEDENTE E, EM RESUL-TADO, DETERMINAR-SE A ANULAÇÃO DA SENTENÇA RE-CORRIDA, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS.»
* A Recorrida não apresentou contra-alegações. * O Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso. * Com dispensa dos vistos legais, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão. * II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Importa assim, decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, ao manter a decisão reclamada, no entendimento de que não cabe à administração tributária, ao abrigo dos princípios da colaboração e do inquisitório solicitar prova adicional ao reclamante ou efectuar diligências para suprir o défice instrutório de que o requerimento de dispensa de garantia padece. E, sendo a resposta negativa, importa ainda apreciar e decidir se tal decisão viola o princípio da proporcionalidade.
III - FUNDAMENTAÇÃO III – 1. De facto
É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:
«A) Em 01/04/2022, o serviço de finanças de Oeiras-1 instaurou contra a ora Reclamante T. N. UNIPESSOAL LDA., o processo de execução fiscal n.º ….529, para cobrança coerciva de dívidas de IVA, referentes ao ano de 2022, cujo prazo de pagamento voluntário havia terminado em 21/03/2022 as quais perfaziam em 11/04/2022 - data da citação da ora reclamante para os termos do processo de execução fiscal - o montante global de € 132.212,09 (cento e trinta e dois mil, duzentos e doze euros e nove cêntimos) - ofício de citação de fls. 16, certidão de dívida de fls. 17 e 18 e informação do serviço de finanças de fls. 19 e segs. do SITAF ; * MOTIVAÇÃO A convicção do Tribunal, quanto aos factos provados, decorre da análise crítica dos documentos juntos aos autos, supra identificados a propósito de cada uma das alíneas do probatório e cujo conteúdo não foi impugnado pelas partes.» * III – 2. Da apreciação do recurso
A recorrente requereu a dispensa da prestação e garantia no âmbito do plano de pagamento em prestações das dívidas exequendas no PEF n.º ….529. O órgão da execução fiscal indeferiu tal pedido com fundamento na falta de prova da manifesta falta de meios económicos por inexistência ou insuficiência de bens. No presente recurso vem imputada a sentença recorrida a verificação de erro de julgamento pois considera a Recorrente que, atenta a circunstância de o pedido de dispensa da prestação de garantia em causa nos autos ter sido efectuado e apresentado pelos gerentes da recorrente sem intervenção de profissionais do foro, se impunha à AT, por força do princípio da colaboração e da cooperação o dever de assistência ao executado convidando a executada a instruir o seu requerimento. Considera ainda que enquanto corolário do princípio do inquisitório devia ter sido dado cumprimento ao princípio da descoberta da verdade material, impondo-se ao órgão da execução diligências no sentido do suprimento da irregularidade, convidando-a a instruir o pedido no sentido do cumprimento dos seus ónus ou deveres processuais. Alega ainda que, a decisão de imediato indeferimento com base na falta de junção de prova, em especial tratando se de factos negativos, sempre se revela, no caso, uma decisão absolutamente desproporcionada entre a irregularidade cometida, isto é, a não junção de documentos sobre os factos alegados, e a consequência que lhe está associada. Importa, antes de mais, referir que as questões invocadas neste recurso foram já, por diversas vezes, objecto de análise e julgamento neste TCA Sul, salientando-se que os factos são em tudo semelhante, em termos uniformes. A título de exemplo, citam-se os acórdãos proferidos nos processos nºs 138/22.3 BESNT, de 13/10/22, 139/22.1BESNT, de 15/09/22 e 25/22.5BESNT, 652/22.0BESNT de 24/11/2022 relatado pela aqui 2ª Adjunta, 663/22.6BESNT, de 20/12/22 este último em que a aqui relatora integrou o colectivo como 1ª Adjunta. Seguindo, para já, o que se escreveu no acórdão respeitante ao processo nº 138/22.3 BESNT, importa dizer o seguinte: «(…) Nos termos do art.º 52.º da LGT, é admissível a suspensão do processo de execução fiscal, designadamente em virtude de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação e oposição à execução, desde que prestada garantia idónea ou desde que a AT, a requerimento do executado, o isente de tal prestação (cfr. art.º 52.º, n.º 4). O art.º 170.º do CPPT determina os termos do procedimento do pedido de dispensa em causa, decorrendo do seu n.º 3 que “[o] pedido a dirigir ao órgão da execução fiscal deve ser fundamentado de facto e de direito e instruído com a prova documental necessária”. Como resulta do quadro normativo referido, a dispensa de prestação de garantia depende da verificação cumulativa de dois requisitos: - Um requisito objetivo: a situação causar prejuízo irreparável ou a manifesta falta de meios económicos, revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido; - Um requisito subjetivo, consubstanciado na imputação da insuficiência ou inexistência de bens ao executado. Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 04.11.2020 (Processo: 0289/20.9BEALM): “Estamos (…) perante um procedimento administrativo tributário enxertado no processo de execução fiscal, sendo a respectiva decisão um verdadeiro acto administrativo (…). Esse procedimento da iniciativa do executado (cf. art. n.º 4 do art. 52.º da LGT, que diz «a requerimento do executado» e o art. 170.º do CPPT, que diz «deve o executado requerer») é um procedimento formal, que deve obedecer às regras legais; designadamente, deve seguir a forma escrita (cf. n.º 3 do art. 54.º da LGT), deve indicar o órgão a que se dirige, identificar o requerente, com indicação do nome e domicílio [cf. art. 102.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código do Procedimento Administrativo (CPA)], expor os fundamentos de facto e de direito em que se baseia o pedido e instruir o requerimento com a prova documental pertinente (cf. n.º 3 do art. 170.º do CPPT). (…) (…) [O] procedimento de dispensa de prestação de garantia tem regras próprias de alegação e prova dos factos (cf. art. 52.º, n.º 4, da LGT e art. 170.º, n.º 1, do CPPT) (…): (….) [nele] está em causa a pretensão do executado a obter um efeito que se há de ter como excepcional em sede de execução fiscal a norma é a prestação da garantia em ordem a obter a suspensão da execução fiscal e, portanto, o procedimento tem início a pedido do interessado e a decisão fica sujeita ao que foi pedido” fim de citação. Feito este introito, cumpre apreciar, deixando, para já e no que mais releva, devida nota daquele que foi o discurso fundamentador adotado pelo TAF de Sintra. Aí se escreveu: “(…) Em síntese, a AT indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, com o fundamento de que a Executada não demonstrou a invocada manifesta falta de meios económicos por inexistência ou insuficiência de bens (cf. artigo 52.º, n.º 4, da LGT) e por possuir bens sobre os quais podiam ser constituídas garantias. Considerou, assim, a AT que, não ocorre a manifesta falta de meios económicos uma vez que a Reclamante pode oferecer como garantia o seu estabelecimento comercial; além de que, os valores evidenciados na declaração anual de IES referentes a 2020, conforme resulta do probatório, não se coadunam com uma situação de manifesta falta de meios económicos. A Reclamante invocou, ainda, na petição inicial, a violação do princípio do inquisitório, alegando que caberia à AT convidá la a suprir a omissão da prova dos factos alegados. No entanto, mostra se evidente que, a AT não terá sentido essa necessidade, uma vez que, desde logo, identificou bens que a executada possuía sobre os quais podiam ser constituídas garantias. Ora, não tendo a AT ficado convencida quanto à insuficiência de bens, mostra se destituído de sentido solicitar documentos que comprovassem essa mesma insuficiência de bens (cf. acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 28/04/2016, proferido no processo n.º 02303/15.0BEPRT). Nestas circunstâncias, o indeferimento do pedido de dispensa de garantia não terá que ficar dependente de quaisquer diligências a efectuar oficiosamente pela AT”. E, detendo a ora Reclamante um estabelecimento comercial e atentos os valores evidenciados a título de activos fixos tangíveis e activos intangíveis, bem como o volume de vendas e de prestação de serviços da sua declaração IES de 2020 (cf. alínea f) do probatório), exigia se um cuidado acrescido, pois a alegação de insuficiência económica pressupõe uma análise cuidada da sua situação económica e patrimonial. Assim, não tendo a Reclamante instruído o seu pedido com quaisquer documentos e tendo a AT identificado factos que não se coadunam com uma situação de manifesta falta de meios económicos, o pedido de dispensa de garantia, formulado junto do órgão da execução fiscal, não poderia deixar de ser indeferido» – fim de citação. Impõe-se desde já adiantar que o decidido pela Mma. Juíza não merece a censura que lhe vem dirigida. Na indicação das razões para assim concluirmos louvamo-nos no citado Acórdão nos seguintes termos: «Como já referimos supra, este TCAS já se pronunciou em situações similares à ora sob análise, (…) Assim se escreveu no Acórdão de 15.09.2022 (Processo: 139/22.1BESNT): “[C]onstata-se que a AT negou abrigo à pretensão da reclamante, aqui recorrente, porquanto e como se alcança do despacho reclamado a que se refere a alínea D) da matéria assente e cuja fundamentação se transcreve na sua alínea C), «no caso em apreciação, a executada…, cingiu se a apresentar um requerimento no qual alega que tentou por todos os meios ao seu alcance apresentar garantia idónea sob a forma de garantia bancária, porém, tal não lhe foi possível por vários obstáculos criados pelas instituições bancárias, e ainda que os activos que a empresa possui já estão dados como garantia, não detendo a empresa outros bens ou rendimentos que possam servir de garantia. Não instruindo, porém, o pedido de dispensa com a prova documental necessária exigida pelo n.º 3 do art.º 170.º do CPPT». Ora, este suporte fundamentador não padece contextualmente de erro nos pressupostos, nem a sentença que o validou enferma de erro de julgamento, como pretende a recorrente, para quem a AT deveria, previamente à decisão de indeferimento, tê-la convidado a suprir as deficiências instrutórias do requerimento que contém o pedido. Mas não assiste razão à recorrente. Tal como se aponta o Ac. do STA de 04/11/2020, tirado no proc.º 0289/20.9BEALM, «…o procedimento de dispensa de prestação de garantia tem regras próprias de alegação e prova dos factos (cf. art. 52.º, n.º 4, da LGT e art. 170.º, n.º 1, do CPPT), não podendo, sem mais, aplicar--se--lhe as regras do procedimento tributário de liquidação, tanto mais que não é possível estabelecer paralelismo entre ambos: enquanto naquele está em causa a pretensão do executado a obter um efeito que se há--de ter como excepcional em sede de execução fiscal - a norma é a prestação da garantia em ordem a obter a suspensão da execução fiscal - e, portanto, o procedimento tem início a pedido do interessado e a decisão fica sujeita ao que foi pedido (cf. art. 56.º da LGT), neste estamos perante um procedimento tributário que pode ser iniciado oficiosamente (cf. art. 57.º, n.ºs 1 e 7, da LGT) e em que a AT não vê a sua decisão limitada senão pela prossecução do interesse público e pelos princípios enunciados no art. 54.º da LGT; enquanto naquele o interessado pretende obter um efeito constitutivo de direitos, neste o efeito será a declaração (concretização) de uma obrigação tributária. …». Ou seja, invocando a executada a manifesta falta de meios económicos por insuficiência de bens penhoráveis susceptíveis de garantir a dívida exequenda e o acrescido, em ordem a obter a dispensa de prestação de garantia nos termos do art.º 52.º, n.º 4, da LGT, incumbe--lhe o ónus de alegar e demonstrar os factos susceptíveis de integrarem essa insuficiência, o que deve fazer com o requerimento de pedido, instruindo-o com a documentação pertinente, nos termos das disposições combinadas dos artigos 342.º do Cód. Civil e 170.º, n.º 3, do CPPT. Não quer isto dizer que a AT se deva eximir à avaliação crítica da prova que tenha na sua posse, em ordem a ver se pode (ou não) concluir, com base nela, pela alegada insuficiência de meios económicos. Mas isso, como se alcança da fundamentação do despacho reclamado, foi feito, tendo a AT concluído não se verificar uma situação de manifesta falta de meios económicos em vista dos valores dos bens e rendimentos constantes da declaração anual IES submetida pela reclamante com relação ao ano anterior ao do pedido de dispensa de garantia. Se este juízo conclusivo da AT se mostra erróneo, a verdade é que a recorrente não demonstra factos que o permitam infirmar. (…). Na verdade, decisivo era a recorrente demonstrar que a penhora dos activos efectuada nesses outros processos executivos comprometia a possibilidade de prestação de outras garantias, nomeadamente bancárias (o que, obviamente, a AT não tem meios de comprovar), como ainda que se mostra impossibilitada de dar à penhora rendimentos, ou seja, a facturação correspondente às vendas e serviços prestados no montante de 13.446.355,34€, que mencionou na declaração de IES do anterior ano de 2020, ou que a penhora desses rendimentos inviabilizava o prosseguimento da actividade empresarial. Em suma e concluindo, invocando a executada a manifesta falta de meios económicos por insuficiência de bens penhoráveis susceptíveis de garantir a dívida exequenda e o acrescido, em ordem a obter a dispensa de prestação de garantia (cf. art.º 52.º, n.º 4, da LGT), incumbe-lhe o ónus de alegar e demonstrar os factos susceptíveis de integrarem essa insuficiência, o que deve fazer com o requerimento de pedido, instruindo--o com a documentação pertinente. Não o fazendo, não há lugar a convite ao suprimento do deficit instrutório do pedido, sem prejuízo de a AT dever proceder à avaliação da prova na sua posse, de modo a verificar se a mesma lhe permite concluir pela alegada insuficiência de meios económicos da executada. Tendo a AT feito essa avaliação no caso em apreço e concluído não se verificar uma situação de manifesta insuficiência de meios económicos, juízo que não merece censura face aos meios de prova de que dispunha, nenhuma outra diligência ou pedido de informação à executada se lhe impunha com vista ao esclarecimento da situação económica desta”. Refere--se ainda no Acórdão deste TCAS de 29.09.2022 (Processo: 26/22.3BESNT), já citado: “[N]a senda do doutrinado no Acórdão proferido pelo STA no processo nº 1298/12, datado de 19 de dezembro de 2012, e demais jurisprudência convocada, encontra-se plasmado, neste particular, o princípio de preclusão procedimental dirigido ao executado que pretende obter a aplicação do benefício da dispensa de prestação de garantia para alcançar suspensão da execução fiscal, cuja ratio se coaduna com “[i]nteresses de eficiência, celeridade e economia procedimental, prevenindo o arrastamento de um procedimento que é da estrita iniciativa do interessado e que assume carácter célere e urgente, em que ao requerimento se segue imediatamente a decisão (no prazo de dez dias), não prevendo a lei, sequer, actividade instrutória a desenvolver pelo órgão decisor, que decidirá de imediato em face das razões de facto e de direito invocadas no requerimento e da prova que nele tiver sido oferecida, como se de um deferimento ou indeferimento liminar se tratasse”. Esclarecendo, ainda neste particular, que “[o] curtíssimo prazo concedido ao órgão administrativo para a decisão do pedido, conjugado com a obrigatoriedade de o executado apresentar imediatamente toda a prova no requerimento onde formula a pretensão, denuncia objectivamente o carácter urgente deste procedimento, onde o tempo constitui um elemento determinante na finalidade pública que se visa prosseguir, de obviar ao sumiço de bens que possam garantir o pagamento integral da dívida exequenda e do acrescido. O que traduz uma opção legislativa perfeitamente razoável de valorar negativamente a total inércia probatória do interessado e que não comporta, a nosso ver, um ónus desproporcionado, atenta a natureza e finalidade deste procedimento. O indeferimento imediato do pedido por total ausência de requerimento probatório representa, no fundo, um sibi imputet que não se nos afigura excessivo, na medida em que o requerente não pode deixar de estar ciente, perante a claríssima letra da lei, do seu dever de iniciativa e de instrução, e na medida em que é ele quem está em melhores condições para apresentar os meios de prova da factualidade por si alegada”(destaques e sublinhados nossos). (…) Não procedendo, in fine, a alegação de que a atuação da AT e interpretação sufragada pela decisão recorrida, acarretam uma solução manifestamente desproporcional, sendo, aliás, exigível -- apelando, desde logo, à figura do homem médio, que o Requerente saiba que deve comprovar a insuficiência de bens penhoráveis. Ademais, in casu, a AT procedeu à avaliação da prova na sua posse --juízo que não merece censura face aos meios de prova de que dispunha - e concluiu pela insuficiência de meios económicos da executada. Note-se que da conjugação dos normativos 55.º da LGT e 46.º do CPPT, atinentes ao princípio da proporcionalidade, o que resulta é que a AT deve abster-se da imposição aos contribuintes de obrigações que comportem e traduzem injustiças, que sejam desnecessárias ou inadequadas à satisfação dos fins que aquela visa prosseguir ou que vão além do que seja necessário e adequado impor aos mesmos contribuintes. Logo, face ao supra expendido, é por demais evidente que a atuação da AT e do Tribunal a quo, em nada configuram violação do aludido princípio, limitando-se a cumprir os requisitos consignados na lei para efeitos de concessão da dispensa de prestação de garantia e inerente ónus probatório”. Considerando o entendimento vertido nestes arestos, a que se adere, resulta, pois, que não assiste razão à Recorrente»- fim de citação. Não havendo razões de facto ou de direito que imponham diferente ponderação daquilo que foi decidido em 1ª instância e que se mostra em linha com a jurisprudência reiterada destes Tribunal, sem necessidade de demais considerações, impõe-se concluir como se concluiu no Acórdão citado, julgando improcedentes as conclusões da alegação de recurso, negar provimento ao mesmo e manter a sentença recorrida. * No que se refere às custas, o artigo 527.º do CPC consagra o princípio da causalidade, de acordo com o qual custas são pagas pela parte que lhes deu causa. Atendendo à improcedência do recurso, considera-se que foi a Recorrente que deu causa às custas do presente processo (cf. n.º 2), e, portanto, deve ser condenada nas custas (cf. n.º 1, 1.ª parte). *
IV – CONCLUSÕES
I - Invocando o executado a manifesta falta de meios económicos por insuficiência de bens penhoráveis suscetíveis de garantir a dívida exequenda e o acrescido, em ordem a obter a dispensa de prestação de garantia, incumbe-lhe o ónus de alegar e demonstrar os factos suscetíveis de integrarem essa insuficiência, o que deve fazer com o requerimento de pedido, instruindo-o com a documentação pertinente. II. Não o fazendo, não há lugar a convite ao suprimento do deficit instrutório do pedido, sem prejuízo de a AT dever proceder à avaliação da prova na sua posse, de modo a verificar se a mesma lhe permite concluir pela alegada insuficiência de meios económicos da executada. III. Tendo a AT feito essa avaliação no caso em apreço e concluído não se verificar uma situação de manifesta insuficiência de meios económicos, juízo que não merece censura face aos meios de prova de que dispunha, nenhuma outra diligência ou pedido de esclarecimento à executada se lhe impunha com vista ao esclarecimento da situação económica desta. IV. A opção legislativa de valorar negativamente a total inércia probatória do interessado não comporta, um ónus desproporcionado, atenta a natureza e finalidade do procedimento de pedido de dispensa de prestação de garantia.
V – DECISÃO
Termos em que, acordam as juízas da 1ª Subsecção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso jurisdicional, mantendo a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe e Notifique.
Lisboa, 16 de Fevereiro de 2023. Ana Cristina Carvalho - Relatora Hélia Gameiro – 1ª Adjunta Catarina Almeida e Sousa – 2ª Adjunta |