Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1025/11.6BESNT
Secção:CA
Data do Acordão:05/14/2020
Relator:DORA LUCAS NETO
Descritores:RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO;
INTERVENÇÃO ACESSÓRIA;
DIREITO DE REGRESSO.
Sumário:
1. A placa de pré-sinalização que foi causa do acidente, embora seja propriedade da RECORRENTE, estava situada na propriedade da RECORRIDA, pelo que, a ambas caberia ter agido em tempo oportuno – se não antes, pelo menos em 2009 – não o tendo feito, agiram com culpa, a primeira, por não ter retirado/substituído a placa e/ou sinalizado o perigo – não tendo ilidido a presunção que decorre do n.º 3 do art. 10.º da Lei n.º 67/2007; e a segunda, por não ter sinalizado o perigo, pois, enquanto proprietária do terreno no qual a referida placa estava implantada e que se atravessava no passeio, era quem estava em melhores condições de o fazer – não tendo, por isso, ilidido a presunção que decorre do art. 493.º, n.º 1, do CC.

2. Pelo menos duas atuações se podiam prever da parte da RECORRIDA, a que concretizou, solicitando a remoção da placa à RECORRENTE, enquanto proprietária da mesma, e a que não concretizou, ao não sinalizar o perigo que resultava da localização de uma placa no seu terreno que se alongava para o passeio e que colocava notoriamente em perigo os peões, designadamente, seus clientes, como foi o caso.

3. Em virtude do que, conclui-se que são ambas responsáveis, RECORRENTE e RECORRIDA, pelos danos causados ao RECORRIDO, sendo de aplicar o art. 497.º, do CC, não pode manter-se a sentença recorrida, quanto à absolvição da RECORRIDA do pedido.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

J..., intentou uma ação administrativa comum para efetivação de responsabilidade civil extracontratual contra a EP-Estradas de Portugal, SA, peticionando a final que a R. seja condenada a pagar ao Autor a quantia global de 58.720,82€ de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais.

Requerida a intervenção provocada da N..., SA, foi esta intervenção admitida.

Por sentença de 19.03.2015, foi a R., EP-Estradas de Portugal, SA, condenada a pagar ao A., a quantia indemnizatória total de 40.720,82€ [quarenta mil, setecentos e vinte euros e oitenta e dois cêntimos], correspondente à soma das parcelas de 720,82€ [setecentos e vinte euros e oitenta e dois cêntimos] de danos materiais, com 40.000,00€ [quarenta mil euros] de danos morais. Mais foi absolvida a interveniente N...-Peças e acessórios para Automóvel, SA, dos pedidos.

A EP - Estradas de Portugal, S.A.(doravante Estradas de Portugal), R. e ora Recorrente, não se conformando com a sentença, veio dela recorrer, culimando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:

«I - A sentença erra de facto, conforme referido de 1 a 8 destas alegações porque deu por provado factos que o não deviam ser, pelo modo como consta da sentença, e outros devia ter dado por provados, não fazendo, nomeadamente, o douto Tribunal deveria ter precisado, inicialmente, até para respeito pelo historial, no ponto 5 o afirmado mas acrescentando - “A referida Estrada n° 249 era da jurisdição da Ré, EP - Estradas dc Portugal, SA, mas desclassificada e em transição para o Município de Sintra, que teve intervenções na zona dos autos”;

II- O Tribunal também errou, em 6) dos factos provados, porque a EP não possuía a placa metálica colocada em parte sobre o passeio destinado aos peões, e nos anos 90 a EP colocou a placa no terreno baldio onde não existia passeio algum, tendo posteriormente sido construída a Rotunda por acordo entre D... e Município de Sintra, com passeio por essas entidades acordado fazer em alguns metros e que não chegava à zona da placa de direções de trânsito;

III- No seu ponto 7 o douto Tribunal devia ter acrescentado por de grande relevância e como foi referido por todas as testemunhas sabedoras que “ A referida placa metálica de sinalização de trânsito foi ali colocada, sob jurisdição da Ré,..., nos anos 90 não havendo, na altura, passeios no local”;

IV- O Meritíssimo julgador, quanto aos pontos 23 e 29 da sentença errou porque não se provou que o Autor padecesse de um glaucoma, devendo a referência a tal lesão ser retirada do texto já que, para além de não haver testemunhos desse facto, objectivamente porque tal lesão resulta da destruição do nervo óptico por tensão ocular elevado durante um longo período de tempo, pelo que o embate do A. pode ter provocado uma lesão da retina mas não um glaucoma;

V- Existe erro no julgamento da matéria de facto do ponto 31) da sentença - Não se provou que a N... beneficiou de um alvará de licença de construção da V... já que a anterior licença caducou e as instalações da N... foram construídas à revelia da EP, sendo o pedido do licenciamento efetuado já depois das construção das instalações comerciais, da vedação, do prolongamento do passeio, do acesso, da N..., SA.

Assim, o Tribuna] ad quem deverá reformar esta resposta para “Essa edificação da V... nunca veio a ocorrer; e, no seu local, vieram a ser construídas, em 2009, as instalações da N..., sem alvará de licença de construção”;

VI- A sentença não apreciou correctamente os factos e a história do local, pelo que deve ser alterada a redacção do seu ponto 32) para “No local em causa, o passeio dos peões referido, onde o A. caminhava quando embateu na placa, foi construído pela N... com o mesmo tipo de construção e material e prolonga-se, agora, desde a rotunda situada junto à passagem por baixo do IC19, do lado do D… em relação as instalações da N..., terminando junto à entrada que dá acesso da via pública para estas instalações”;

VII- O mencionado no ponto 32) da sentença está errado, pois o que se provou foi que o passeio dos autos não estava construído quando a N... chegou ao local, o mesmo não chegava sequer à placa de pré-sinalização, o passeio que estava construído, antes da N... chegar ao local, era o do acordo da construção da rotunda entre o D... e o Município de Sintra e que ia da rotunda até perto da placa, ficando a alguns metros da placa, sem murete, nem vedação, nem edificações, em zona de baldio;

VIII- Aceita-se o referido no ponto 34 dos Factos provados da sentença, mas falta precisar um dado objectivo que é o local exato da colocação do painel/placa e assim se requer seja reformada resposta no sentido de “O painel de sinalização de trânsito (placa informativa) em causa foi colocado no local, num terreno baldio, no âmbito da empreitada de construção do IC19, havia mais de 15 anos à data do acidente - doc 9, fls 74, fls 11 do PA anexo”

IX- Refira-se, crê-se relevante fazê-lo agora em precisão, que “a placa dos autos é uma placa de pré-sinalização, donde de baixa altura regulamentar, um pouco acima do nível dos olhos dos condutores para melhor e rápida informação aos utentes da estrada - Art° 13° n° 9 e 36° do Regulamento de Sinalização de Trânsito”.

Sobre os factos não considerados provados, não se concorda com a formulação simples dada pelo douto Tribunal.

X- A sentença errou ao não ter dado por provado que a Interveniente N... instalou- se no local e fez logo as obras, à revelia da EP, tendo o licenciamento, sido dado, posteriormente, sob as condições relativas à segurança no ambiente rodoviário - Decreto-Lei n° 13/71 de 23 de janeiro - tendo havido reuniões em que foi referida a placa, em termos não bem especificados por falta de registo escrito;

XI- As condições acordadas entre a EP e a N... foram as conexas com a viabilidade, a posteriori, do licenciamento do já edificado, respeitados os limites das inovações e a segurança em redor das instalações e do acesso, como atestaram as testemunhas da EP, sendo que uma das testemunhas da Interveniente, o arquitecto, referiu recordar-se da existência dessas reuniões alegadas pela EP, mas já não se recordou do resultado das mesmas, nomeadamente sobre a questão da placa que acabou por dizer não teria sido tratada por ele, desconhecendo até quem construiu o passeio, em 2009 (naturalmente a N...) no segmento que passou a ligar o antigo troço de passeio, agora a um novo troço, conduzindo na figura em L, até mesmo à entrada da N...;

XII- A EP não sabe do teor das conversas da gerência da N... de Sintra com o seu arquitecto e demais colaboradores, mas a EP provou que houve, pelo menos, duas reuniões na sede da EP, no Pragal em Almada, precisamente a pedido da N... nos dias 9 e 19 de junho de 2009 sendo o assunto da placa um dos assuntos pendentes no dossiê do licenciamento;

XIII- Termos em que se requer que seja eliminado dos factos não provados o ponto 9.º e considerado como justa a resposta seguinte: “A concessão pela Ré, a posteriori, da licença para os trabalhos, já realizados, à N... de acesso à via rodoviária foi efectuada mediante as condições acordadas, referindo a EP ser uma das obrigações a retirada, do local, do painel dos autos, pela N..., no seguimento do pedido feito pela própria N...”;

XIV- Provou-se também que a EP entendeu, das reuniões havidas, ter ficado claro que, até no interesse da própria N..., tal empresa retiraria do local a placa, totalmente assente dentro da propriedade desta, depois das obras, e antes da concessão do licenciamento, referindo-se o muro localizado depois das instalações da N... como uma possível nova localização;

XV- Mais se provou que a N... não só poderia retirar a placa como, antes de o fazer, a podia assinalar como obstáculo, já que por causa das suas obras, a placa transformou-se num eventual obstáculo à circulação junto da vedação implantada;

XVI- No entendimento da EP o Tribunal a quo julgou mal ao não dar por provado nenhum acordo já que, do acervo documental, testemunhos, raciocínio lógico, se bem que não com a natureza de um protocolo administrativo, foi dada indicação da EP verbalmente em reunião realizada na sede da empresa na Praça da Portagem cm Almada, para a placa ser removida e indicado um local para a sua nova colocação;

XVII- Da prova parece resultar até que a N... não retirou a placa do local para a colocar junto do muro mais para Nascente, e perto da entrada das suas instalações, porque teria outros planos para o local, talvez a instalação de um tal PT - posto de transformação;

Facto que nunca levou ao conhecimento da EP.

XVIII- A N... nunca apresentou reacção contrária à remoção do painel para viabilizar o seu licenciamento da estrutura o qual, até de acordo com o projecto da própria N..., o licenciamento envolvia a retirada da placa totalmente assente na sua propriedade, isto é, para ver aprovado o licenciamento a N... sabia que não poderia estar lá colocada a placa e apresentou a sua planta/projecto dessa forma;

Termos em que, perante o expendido nas conclusões X a XV111 se requer que seja alterada a sentença no campo da resposta aos factos não provados, substituindo-se por uma douto Acórdão desse TCAS que admita o teor do sublinhado nestas conclusões.

A sentença ora colocada em crise, com o máximo respeito que se deve ter, e se tem, pelos nossos Tribunais, sendo a EP - Estradas de Portugal, SA do Estado, donde, também por isso, Pessoa de Bem, na opinião da autoridade administrativa Ré e Recorrente, faz errada interpretação do direito aos factos,

XIX- A sentença errou de direito porque descurou a culpa do lesado já que o Autor teve culpa, influência direta no seu acidente pedonal já que, em vez de olhar em frente, ia com os olhos virados para o chão, circulando de modo temerário, pelo que poderia ter embatido contra pessoas ou todo o tipo de objectos ou obstáculos que surgissem no seu caminho;

XX- A atuação do próprio lesado foi causal à verificação do, pelo mesmo, evitável acidente, excepcionando-se por via desse facto, a culpa da Ré EP, estranha ao embate e à colocação dos prumos da placa no terreno recentemente vedado pela Interveniente do processo:

XXI- A sentença errou de direito porque não verificou os requisitos legais das placas de pré-sinalização, no caso de 1,50 mts, designadamente no que às suas medidas e colocação respeita, ou seja, uma placa de pré-sinalização, não é um sinal de trânsito, de perigo ou outro, pelo que deve estar colocada do lado direito da faixa de rodagem a uma altura que seja adequada à visão dos condutores (sentados nas viaturas) sendo-lhes aplicável o disposto no n° 9 do Artigo 13“ e Artigo 36° do DL n“ 22/98 de 1/10 Regulamento de Sinalização do Trânsito;

XXII- Tais placas podem estar colocadas nos terrenos fora da faixa de rodagem, à margem das ENs a uma altura inferior a 2,20 mts, até a uma altura inferior a 1,50 mts, para possibilitar a leitura no campo visual direto dos condutores;

XXIII- Os sinais de trânsito, de perigos ou de obrigações, esses sim, quando colocados nos passeios deverão ser altos por causa do trânsito dos peões (que, não poucas vezes, desatentos, distraídos, embatem nos seus postes, o que não sucedeu com o Autor porque não havia poste! podendo resultar, de embates desse tipo, lesão na cabeça ou até um traumatismo craniano);

XXIV- A EP reforça o facto de, nos presentes autos, a placa indicadora dos sentidos de direção para as localidades ter sido por si colocada fora da faixa de rodagem e fora de qualquer passeio, inexistente á data da sua colocação pela ex-JAE;

XXV- A sentença errou no julgamento de direito ao condenar a EP por factos relacionados com a construção do passeio, o que não tem razão de ser pois, o passeio em questão, não é só um, são dois, porquanto na antiga EN249, ao Km 17, existia só a estrada e descampados e baldios de ambos os lados da mesma, quando foi lá colocada a placa pela então Junta Autónoma das Estradas, hoje EP, para depois, por acordo entre o Município de Sintra e diversas empresas, nomeadamente a D..., ter sido do lado poente construída uma Rotunda e estabelecido um passeio na direcção poente / nascente até à proximidade do local onde se situava a placa, sem ultrapassar tal local, ou seja, terminava o empedrado do passeio em terreno e mato, na margem da estrada, isto é, não tinha continuação, terminava em terra, situação que se verificava até 2009 e não fazia perigar qualquer tipo de circulação;

XXVI- Na altura da construção da Rotunda do D... e até mais alguns anos depois, até 2009, o terreno ao lado do passeio “municipal/D...” ou seja, junto do tal primeiro passeio, era um baldio, sem qualquer construção;

XXVII- Chegada ao local em 2009 a, N..., SA, com desconhecimento da ora Ré, iniciou construções na zona, e, é certo que, respeitando a tipologia da estrutura “primeiro” passeio, para vir a ter acesso à entrada das suas instalações em construção, prolonga o passeio existente, fazendo o tal “segundo” passeio que segue até à esquina para a sua entrada e fazendo rebordar o mesmo até à sua entrada, direccionando-o para o seu acesso, seu conhecimento da autoridade nacional de estradas;

XXVIII- Assim é que a coisa imóvel inovada, o tal novo, ou 2º passeio, foi obra nova da N... e afetou as dimensões da envolvente, passando a colocar a placa por sobre um passeio, até aí inexistente no preciso local;

XXIX- Foi a obra nova que gerou um perigo até aí inexistente pelo que a responsabilidade civil pela inovação cabe, em exclusivo, à sua criadora, a N...;

XXX- Errou no julgamento de direito porque desconsiderou uma realidade indiscutível, isto é, ao regularizar-se um terreno de terra batida, colocar-se uma plataforma para recepção de pedras e implantar uma camada de pedras, ou de tijolos, ou lajes de cimento, para fazer um passeio, obviamente que a cota é alteada porque deixa de se estar rente ao solo passa-se a estar mais alto;

XXXI- Visto de outro modo e aplicando-se aos presentes autos, se um peão circula por um caminho de terra batida, à margem de uma estrada, e mede 1,70 mts, a sua cabeça se de corpo direito e cabeça erguida, seguirá ao nível desses 1,70 mts, posto o que os olhos andarão por volta de um horizonte visual dos 1,65 mts de altura, mas quando o mesmo homem, sobe e passa a circular por um passeio que possui um camada de base terraplanada de, seja 2 cms, e uma camada de pedras de calçada ou passeio com a altura de 10 cms, a cabeça desse mesmo peão passa a circular a 1,82 de altura e o seu horizonte visual sobe para os 1,77- naturalmente;

XXXII- Erra o Tribunal ao referir que a atitude construtiva da N... não alterou as condições existentes no local da placa - antes só havia terreno junto da placa e não era passeio, com a construção da N... passou a haver terreno, passeio e vedação;

XXXIII- Mais erra o douto Tribunal quando refere que foi a EP a interventora no passeio, quando é sabido e resulta notório dos autos, que a EP não fez qualquer tipo de passeio nem até á placa a contar da Rotunda, nem depois da placa até à entrada da N..., tal como não é verdade que a placa se tenha prolongado para o passeio, ela não se mexeu, foi o passeio novo que prologou o anterior que finalizava a “céu aberto" em terra batida e criou um novo passeio, em cima da terra batida na zona circundante da placa e mais uma vedação e passou a dirigir os peões no sentido da entrada das instalações da N...;

XXXIV- Mais se equivoca o Tribunal porque não considera na sentença nem sequer que a N... tinha o dever de retirar a placa ou pelo menos de assinalar o obstáculo no acesso às suas instalações e que estava dentro da sua propriedade fixado, aliás tinha esse dever cívico, de alerta no mínimo, bem sabedora da situação em que ficou colocada a placa e a vedação;

XXXV- Finaliza-se, repetindo que o acidente nunca se teria dado se o autor caminhasse de modo normal e atento, olhando para a sua frente, mesmo se, ou ainda mais por causa de, estar tempo de chuva miudinha e não se deve, salvo melhor opinião, considerar provada a causalidade do embate no simples andar com a eclosão de um glaucoma pelo que, não só, mas também por tal aspeto, a indemnização é elevada, devendo ser consideravelmente reduzida no montante, sem prejuízo de a GP considerar que nem tem culpa leve e não omitiu dever funcional na situação descrita nos autos antes foi ultrapassada pela atuação da Interveniente N... à sua revelia.

XXXVI- A sentença, ao decidir como o fez, nos pontos referidos, é injusta e violou o disposto no DL 13/71, no Artigo 1.º n° 5, 4º, 7.º e 10º da Lei n" 67/2007 de 31/12 Artigo n° 483.º do C. Civil, Artigo 5° do Código da Estrada e Artigos 36°, 13.º n° 9 - (Quadros anexos IX e XXX) do DL n° 22-A/98 de 1/10, vulgo RST

Terminando, pedindo em suma, que:

a) seja o presente recurso julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida por um Acórdão que, reconhecendo que a atuação do próprio lesado foi a causa do acidente pedonal, ou, no mínimo, em grande medida contribui para a verificação do mesmo; e que

b) a atuação da N..., SA, a Interveniente, nos autos, e no local do acidente, foi determinante para a existência da placa nas condições descritas no processo, face à modificação realizada no preciso local por tal empresa privada, à revelia da Ré, ou seja, uma construção de passeio em extensão do antes construído pelo Município de Sintra, e fazendo-o, rebordar para as suas instalações, ou seja, até à entrada nas mesmas, obras essas sem qualquer comunicação prévia, ou indicação atempada do já realizado, à ora Recorrente EP - Estradas de Portugal, SA; e

c) absolva, esta entidade pública demandada, do pedido, com a condenação do A. nas custas judiciais em ambas as instâncias;

d) sem prescindir, a ser entendido diferentemente, então requer-se que os Exm°s Srs. Juízes Desembargadores se dignem proferir Acórdão que venha a atribuir repartição de culpas entre a parte condenada e o próprio lesado, com a decorrência em sede de custas judiciais, nas duas instâncias; e que

e) reconheça, em substituição da primeira instância, como culposa, no mínimo negligente, a atuação da Interveniente N..., a única autora da revolução causada no sistema pedonal da zona próxima da placa dos autos, face à construção de passeio, sem aviso nenhum, onde antes nada para além de simples terra batida existia, e implantação de um murete e vedação mais condicionante dos movimentos anteriores no local;

f) a manter-se o decisório, da sentença ora em crise, o que se considera injusto perante o facto de a EP não ter obrigado o peão a circular temerariamente como este o fez, ou seja não olhando em frente, nem ter a EP construído vedação ou passeio ou murete no local, o que modificou a situação anterior e que a EP, comprovadamente, desconhecia de todo, então seja reformada a sentença quanto à condenação desta em custas, porquanto o Autor decaiu no pedido formulado numa percentagem de 30,65%.

Juntou transcrição dos depoimentos das suas testemunhas.

O Recorrido J..., contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção do despacho e da sentença recorridos, alegando, em síntese, o seguinte:

I- Provado ficou através do relatório médico junto aos autos, que o Recorrido ficou a padecer de glaucoma traumático do seu olho, devendo a referida expressão manter-se nos precisos termos em que se encontra na Sentença;

II- Não se provou, a nosso ver, que o Recorrido tivesse de ir a marchar e a olhar em frente, quando na altura as condições meteorológicas eram adversas, chovia, fazia vento e havia nevoeiro e poder ao mesmo tempo reparar que adiante de si estava um objecto pendurado a baixo dos limites mínimos regulamentares para a instalação de sinalização;

III- No que concerne às conclusões apresentadas pela Recorrente, devem as mesmas improceder na sua totalidade.

Assim como a Recorrida N..., apresentou as suas contra-alegações, nas quais concluiu da seguinte forma:

«(…)

1. A apelada não podem deixar de manifestar a sua concordância com o teor da sentença objecto de recurso.

2. Do teor das alegações de recurso da apelante, não se vislumbra a indicação de quaisquer violações regras de direito probatório por parte do Meritíssimo Juiz a quo, mas tão só e apenas a discordância quanto à ponderação e apreciação dos elementos de prova.

3. A impugnação da decisão de facto, por parte da apelante, tem apenas e só por fundamento, a alegada incorrecta apreciação da prova testemunhal, traduzindo a sua discordância - que não incorrecção na valoração por parte do Meritíssimo Juiz a quo - quanto à valoração da prova testemunhal produzida nos autos.

4. Dispõe o art.° 396° do Código Civil, que a força probatória dos depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo tribunal, pelo que o Tribunal a quo ao decidir da forma constante da sentença fê-lo em consciência e tomando em devida conta, não só o conhecimento directo e preciso que as testemunhas demonstraram ter dos factos em discussão, mas igualmente, a equidistância que têm em relação às partes. É, pois, a consagração do principio da livre apreciação da prova.

5. O poder de cognição do Tribunal da Relação sobre a matéria de facto não assume uma amplitude tal que implique um novo julgamento.

6. A garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova.

7. Como refere Abrantes Geraldes, “é sabido que, frequentemente, tanto ou mais importante que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória...^.

8. Realça o mesmo autor que “a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância",0

9. Concluindo que “existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais poderão ficar gravados ou registados para aproveitamento por outro tribuna/ que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores”

10. Ao Juiz apenas se exige que no seu livre exercício de convicção, indique os fundamentos suficientes para que através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daqueles sobre o julgamento do facto dado como provado ou não provado.

11. Se a decisão do julgador se encontrar devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da experiência, ela será inatacável, visto ser em proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção”

12. A reapreciação da matéria de facto terá lugar em caso de manifesto erro na apreciação da prova, isto é, de desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto, designadamente, nos seguintes casos:

(i) apoiar-se a prova em depoimento de testemunhas, quando a prova só pode ocorrer através de outro sistema de prova vinculada;

(ii) apoiar-se exclusivamente em depoimentos de testemunhas que não depuseram à matéria em causa ou que tiveram expressão de sinal contrário daquele que foi considerado como provado, e

(iii) apoiar-se a prova exclusivamente em depoimentos que não sejam minimamente consistentes, ou em elementos ou documentos referidos na fundamentação que nada tenham a ver com o conteúdo das respostas dadas .

13. A decisão quanto à matéria de facto, não padece de qualquer erro de apreciação da prova, sendo que, na mesma são indicados os fundamentos e elementos de prova considerados na decisão quanto a cada um dos concretos pontos da matéria de facto, sendo aferível a forma como o Tribunal aquo firmou a sua convicção.

14. Com a reapreciação de tal matéria de facto a apelante pretende “sacudir a água do capote”, para que a interveniente seja responsabilizada pela sua (da apelante) conduta, o que a interveniente naturalmente não pode deixar de reprovar.

15. Relativamente ao PONTO 5 da matéria de facto, refira-se que, a circunstância de, no entender da apelante, se ter provado que a estrada em causa estava desclassificada e em transição para o Município, em nada diminui a responsabilidade da recorrente no que concerne ao estado em que o sinal se encontrava, designadamente, no que concerne à sua altura relativamente ao solo.

16. Na verdade, estando, ou não, o referido troço desclassificado e em transição para o Município de Sintra, sempre competiria à recorrente garantir a segurança do mesmo, designadamente garantindo o cumprimento das regras relativas à colocação e manutenção dos sinais aí existentes.

17. No que concerne aos pontos 6, 7 e 32 da matéria de facto, e ao contrário do que pretende a recorrente, a existência do passeio não é resultado das obras efectuadas pela N.... Neste sentido veja-se, designadamente, o depoimento quer do Eng.° J..., quer o do Arquitecto J....

18. No que concerne ao depoimento da testemunha J... (1 hora e 14 minutos do depoimento prestado em 18 de Fevereiro de 2015), confirma o mesmo que o passeio em causa já existia, e bem assim que apenas foi intervencionado aquando da construção do muro, sendo que tal intervenção em nada alterou a altura da placa, nem sequer a existência do próprio passeio.

19. O depoimento da testemunha J... (1 hora e 56 minutos do depoimento prestado em 18 de Fevereiro de 2015), aponta exactamente no mesmo sentido. Aliás, a própria referida testemunha (1 hora e 58 minutos do depoimento) confirma integralmente que a intervenção em causa não levou a qualquer alteração da altura do sinal, e que o passeio era pré-existente (2 horas e 2 minutos do depoimento).

20. De resto, é o próprio Eng.° J... (minutos 56 do depoimento prestado em 18 de Fevereiro de 2015) a reconhecer que o passeio já existia, tendo sido apenas intervencionado pela N..., sem que tal tenha levado a uma alteração da quota do solo (entenda-se altura do sinal), e que a mesma se destinou apenas e só a permitir a construção do muro por parte da N....

21. Na verdade, e pese embora todos os artificialismos criados à volta da questão de fundo por parte da apelante, a mesma, no modesto entendimento da ora recorrida, centra-se nos seguintes aspectos:

(i) Determinar quem colocou a placa no local;

(ii) Determinar se as obras efectuadas no local alteraram a altura da placa, passando esta a estar mais perto do solo;

(iii) Determinar quem era responsável pela remoção da referida placa

22. Quem colocou a placa no local, e nas mesmas circunstâncias (altura relativamente ao solo) em que a mesma se encontrava aquando do acidente foi a recorrente. Encontra- se provado nos autos (ponto 5o) que a placa foi colocada, sob jurisdição da ré, aquando da construção do IC 19, nos anos noventa do século passado.

23. As obras efectuadas pela N... no local não alteraram as condições da placa, a qual se manteve à mesma altura do solo que anteriormente.

24. Já no que concerne à responsabilidade pela remoção da referida placa, a recorrente afirma que era obrigação da N... retirar a referida placa (artigos 5o e 9o da contestação), que sempre insistiu para que a N... o fizesse (artigo 8o da contestação) e bem assim, que tal retirada da placa foi objecto de acordo entre a N... e a Estradas de Portugal (artigo 37° da contestação).

25. Tal factualidade que o Tribunal recorrido, e bem sublinhe-se, não deu por demonstrada, não tem qualquer suporte probatório com excepção dos testemunhos dos funcionários da recorrente. Aliás o depoimento de tais testemunhas é abertamente contrariado quer pelo depoimento da testemunha J..., quer pela testemunha A...,

26. Uma análise crítica da prova produzida, que não se limite à mera adesão ao depoimento das testemunhas P... e J..., como pretende a ré, levaria à decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal recorrido.

27. É que, a alegação de tal acordo por parte da recorrida só ocorre após o contacto da estação televisiva S..., em 16 de Março de 2010.

28. A própria sentença alude a tal circunstância ao referir “...só depois de a S... levar a público a situação é que a Ré mudou o discurso para o alegado protocolo ou acordo de retirada da placa, pela N...."

29. Não existe qualquer documento escrito que comprove a existência de tal alegado acordo, sendo que, a prova documental existente apenas comprova que, como bem se alude na sentença objecto de recurso, em data anterior já a N... tinha solicitado a remoção da placa por parte da ora recorrente.

30. Em 2 de Junho de 2009, já a N... tinha solicitado a remoção da placa (ponto 35 da matéria de facto), no que voltou a insistir em 9 de Junho de 2009 (ponto 36 da matéria de facto), conforme se comprova pelos documentos juntos aos autos.

31. Tais solicitações ocorrem meses antes da ocorrência do acidente, como aliás se afirma na sentença recorrida ao dizer-se “Muito antes de o A. ter embatido na placa em causa já a N... tinha solicitado à Ré, a retirada da placa sinalizadora”.

32. A existir tal mencionado acordo, naturalmente que a N... não solicitaria a remoção da placa, removê-la-ia por si mesmo, pois que era do seu interesse a sua remoção, de modo a não ter a sua vedação recortada com os contornos da placa.

33. Num juízo de verosimilhança e credibilidade, afigurasse-nos, como ao julgador se afigurou, que “não fazia sentido poder retirar o sinal e fazer a vedação em malha contínua, como é normal, e que não o tivesse retirado, antes fazendo o recorte na vedação para o manter no local”.

34. De resto, e como está documentalmente provado, no próprio dia do acidente, e sem conhecer a extensão ou gravidade do mesmo, o funcionário da ré, Sr. R... informou o autor que a N... já tinha solicitado a remoção do sinal à recorrente (cfr. documento 3 junto com a PI).

35. 0 que esta só fez após a reportagem da S....»

Cumpre apreciar e decidir.

I. 1. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar:

i) Do erro de julgamento de facto em 9 artigos da fundamentação da sentença sobre os factos provados em II.1, ou seja, nos factos n.º 5, 6, 7, 23 e 29, 31, 32, 33 e 34 da sentença.

ii) Do erro de julgamento na matéria de facto face aos factos tidos por não provados - os três mencionados no § 1º de fls. 7 da sentença, e que estão conexos com a concessão, com a remoção do painel e o relativo ao acordo.

iii) Do erro de julgamento de direito em que incorre a sentença recorrida, que a Recorrente identifica do seguinte modo:

A fls. 12 e 18 e a que dará a referência a) e f) da culpa do lesado;

A fls. 14 e a que dará a referência b) da placa de pré-sinalização;

A fls. 16 e a que dará a referência c) do passeio;

A fls. 16, também, e a que chamará d) da N... no local;

A fls. 17, a que chamará e) dos Serviços da Ré e da N....

*

A questão identificada em i) foi apreciada por decisão singular da primeira signatária, de 22.11.2019, que, ao abrigo do art. 662.º, n.º 2, alínea d) do CPC, ex vi art. 140.º, n.º 3, do CPTA, ordenou a baixa dos autos ao TAF de Sintra, a fim de que fosse devidamente fundamentada a decisão tomada especificamente quanto aos factos provados n.º 32, 33 e 34, tendo em conta os diversos e divergentes depoimentos prestados.

Na sequência do que, o tribunal a quo, a 28.01.2020, proferiu decisão/fundamentação nos termos requeridos, a qual se terá em conta no item seguinte do presente acórdão.

*

II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra:

«(…)

1) O Autor [A], J..., reside na praceta D... n° 6, 3° C, Sintra.

2) A Ré, EP-Estradas de Portugal, SA, tem sede na Praça da portagem, Almada;

3) No dia 04/02/2010, cerca das 12H, o Autor saiu das instalações da N... - Peças e Acessórios para Automóvel, SA, [N...], sitas na Estrada n° 2..., ao km 14,500, em Sintra, e seguiu, a pé, no sentido Nascente/Poente, pelo passeio dos peões, que ladeia aquelas instalações, em direcção à rotunda que se situa um pouco mais à frente.

4) Nesse dia 04/02/2010 e hora, no local caía uma chuva miudinha, puxada a vento.

5) Nessa ocasião e lugar, a referida Estrada n° 2..., ao km 14,500, em Sintra, era da jurisdição da Ré, EP-Estradas de Portugal, SA.

6) Naquela ocasião, na referida Estrada n° 249, ao referido km 14,500, a Ré possuía a placa metálica de sinalização de trânsito, representada nas fotos de fls 16, 17, 62, 63, e ainda nas fotos de fls 219 e 220, bem como de fls 15 e 16, do PA anexo, colocada em parte sobre o passeio destinado aos peões, no qual caminhava o Autor.

7) A referida placa metálica de sinalização de trânsito foi ali colocada, sob jurisdição da Ré, aquando da construção do IC-19 e dos respectivos ramais de acesso, nos anos 90.

8) No referido dia 04/02/2010, cerca das 12H, quando, como supra referido, o Autor seguia, a pé, no sentido Nascente/Poente, caminhando pelo passeio, o mesmo embateu com a cara, face esquerda e sobretudo com a vista esquerda na dita placa de sinalização, que se encontrava em cima do passeio conforme a representação fotográfica referida. [facto 6)]

9) No referido dia, hora e local, aquela placa encontrava-se com uma parte para o lado de dentro das instalações da N... e outra parte em cima do passeio, conforme a representação fotográfica já referida. [facto 6)]

10) Por via desse embate na placa de sinalização, o Autor sofreu escoriações nomeadamente na cara (sobrolho), no nariz e em particular na vista esquerda, ficando a sangrar da cana do nariz.

11) Perante os referidos ferimentos, o autor voltou de novo às instalações da N..., onde lhe foi prestado apoio pelo empregado, mas não foi chamada ambulância ao local, por, na altura, o Autor não prever essa necessidade.

12) No dia 06/02/2010, continuando com dores na vista e não sentindo melhoras, o Autor deslocou-se ao serviço de urgências do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, a fim de ser observado.

13) Nesse dia, no Hospital de Santa Maria, Lisboa, o Autor fez uma TAC, foi observado em oftalmologia e foi diagnosticado um traumatismo na região frontal, e deslocamento do humor simpático do olho esquerdo, originando alteração da acuidade visual, tendo sido medicado e continuado com tratamentos com vista á recuperação.

14) Em 18/02/2010, pelas 11:24H, não tendo recuperado, o Autor dirigiu à Ré o "mail" de fls 18 [doc 3], contando à mesma o sucedido, as suas lesões e que o responsável pela citada loja da N... o informou de que o sinal de trânsito era das EP e que já tinha sido pedida a sua remoção, e que o sinal não pertencia à N... e que a N... não lhe podia mexer.

15) Em 23/02/2010, pelas 9:30H, o Autor dirigiu à Ré o "mail" de fls 19 do PA anexo, na sequência do "mail" supra mencionado, dando de novo conta do sucedido e solicitando que o informassem «se efectivamente é da v/responsabilidade a manutenção deste sinal nestas condições».

16) Em 16/03/2010, pelas 15:44H, a Ré respondeu ao Autor, pelo "mail" n° 15058, de fls 19 [doc 4], comunicando, entre o mais, que a anomalia em causa [painel de sinalização] se devia ao incumprimento da N... do compromisso assumido de mudar o referido painel após a disponibilização do passeio ao tráfego.

17) Em 16/03/2010, na sequência de um telefonema que o Autor fez para o programa televisivo da S..., designado "N…'', a Ré dirigiu para J..., da S..., a comunicação de fls 20 [doc 5], informando que: « (...)

18) Em 24/03/2010, às 19:41H, o Autor dirigiu à Ré o "mail" de fls 22 [doc 6], comunicando- lhe o seu estado de saúde e a necessidade de ser observado por um oftalmologista, solicitando o informação sobre se a Ré assume as responsabilidades.

19) O Autor nunca obteve resposta da Ré ao "mail" de 24/03/2010, acabado de referir.

20) Em 20/04/2010, não tendo a situação clínica da vista esquerda melhorado, o Autor teve de consultar um oftalmologista, o Dr. N..., que o observou e medicou.

21) Em 18/05/2010, o Autor foi novamente à consulta daquele especialista, Dr. N..., que de novo o medicou, e, a pedido do Autor elaborou o relatório médico de fls 23 [doc 7], de 20/05/2010, do qual ora se destaca:

«(...) Refere ter sofrido uma contusão acidental no olho esquerdo, resultante de um embate numa placa (...). No exame objectivo há uma catarata OE, uma rotura radiária da iris esquerda e uma tensão ocular OE extremamente elevada (ou seja um glaucoma traumático). As lesões observadas e acima descritas coadunam-se com a referida tensão. (...)».

22) Posteriormente, o Autor só conseguiu arranjar nova consulta de oftalmologia no Hospital de Santa Maria, em Dezembro de 2010, mas continuou a ser seguido e medicado pelo médico acabado de referir.

23) O estado clínico da vista do Autor agravou-se, em consequência do acidente em causa, passando a padecer de catarata traumática e glaucoma, e, a fim de procurar recuperar parte da visão, o foi sujeito a uma intervenção cirúrgica à vista esquerda - doc 8 e 9, de fls 24 a 27 [consultas e proposta de intervenção cirúrgica].

24) O Autor foi sujeito a intervenção cirurgia "na vista esquerda'', realizada nos serviços de Oftalmologia do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, mas não recuperou praticamente nada, ficando apenas com 5% de visão, conforme doc fls 26/ss [docs 9/ss].

25) O Autor continua a ser assistido na Consulta de oftalmologia devido a problemas derivados do glaucoma, que se têm vindo a agravar à medida que o tempo passa [doc 10/ss, fls 28/ss].

26) Em consequência do acidente referido, o Autor, até à data da propositura desta acção, efectuou as despesas de natureza médica e medicamentosa no montante de 720,82€ de fls 29-46, [doc 11 a 28], tendo a Segurança Social assumido outros pagamentos, incluindo o pagamento da intervenção cirúrgica, acima referida.

27) Em consequência do acidente, o Autor teve de ser visto, tratado, medicado e operado à sua vista esquerda, no Hospital de Santa Maria em Lisboa.

28) Em consequência do acidente, o Autor perdeu 95% da visão da vista esquerda, o que lhe causa inerentes limitações, alguma ansiedade, desgosto e tristeza, e depreciação da sua apresentação fíS...a.

29) O Autor ficou, por isso, afectado na sua condição fíS...a e na sua consideração; bem como ficou triste e amargurado, tendo de continua r assim para o resto da vida, por não lhe ser possível recuperar mais a visão e o referido glaucoma da vista se ter vindo a agravar.

30) Em 2003, a então Direcção de Estradas de Lisboa licenciou para o local em causa, onde agora se encontram as referidas instalações da N..., a instalação de um edifício destinado a comércio e serviços em nome da firma V..., Investimentos Imobiliários e Turísticos, Lda - doc fls 11 e 41 do PA anexo.

31) Essa edificação da V... nunca veio a ocorrer; e, no seu local, vieram a ser construídas, em 2009, as instalações da N..., beneficiando do Alvará de licença da construção licenciada à V....

32) No local em causa, o passeio dos peões referido, onde o A caminhava quando embateu na placa, estava e está construído com o mesmo tipo de construção e material e prolongava-se e prolonga-se desde a rotunda situada junto à passagem por baixo do IC- 19, do lado da D... em relação às instalações da N..., terminando junto à entrada que dá acesso da via pública para estas instalações.

33) O passeio dos peões, acabado de referir, já se encontrava construído, aquando da construção das instalações da N..., em 2009; e sobre o mesmo já se encontrava, então, parte da placa de sinalização representada nas fotos supra mencionadas.

34) O painel de sinalização de trânsito [placa informativa] em causa foi colocado no local no âmbito da empreitada de construção do IC-19, havia mais de 15 anos à data do acidente - doc 9, fls 74, fls 11 do PA anexo.

35) Em 02/06/2009, aquando da construção das instalações da N..., esta solicitou à Ré, através do "mail" de fls 48-A e foto de fls 49, do PA, em face da informação da Câmara Municipal de Sintra, «a deslocação da placa de sinalização, o mais breve possível» uma vez que se encontrava na «propriedade» da N..., localizada em M… - Sintra, junto à EN249-4», indicando os contactos Eng J....

36) Em 09/06/2009, a N..., na qualidade de proprietária do terreno, solicitou de novo à Ré «que seja retirada a placa que consta da foto anexa», pelo mail de fls 48 do PA.

37) Em 18/06/2009, a N... requereu à Ré «o licenciamento da vedação e do acesso ao espaço comercial e prestação de serviços, situados na Estrada Nacional 2… - S. Pedro de Penaferrim - Sintra», juntando as plantas, termo de responsabilidade do projecto, memória descritiva e plantas de fls 24/ss, do PA.

38) Em 01/09/2009, a Ré dirigiu à N... o ofício 99118, de fls 22 do PA, sobre a legalização de edifício, informando que o mesmo «está em condições de merecer parecer favorável ao abrigo do disposto (...)».

39) Em 29/01/2010, a Ré dirigiu à N... o ofício DRLSB/075/2010 de fls 21, do PA anexo, notificando-a de que até então não tinha pago a «taxa relativa à Legalização» do edifício.

40) Em 01/03/2010, a N... dirigiu à Ré o "mail" de fls 17 do PA, com os comprovativos de pagamento do processo 9..., com referência DRLSB/439/2009, saída 4982/ 2010, informando que fez o pagamento em duplicado, aguardando a regularização do mesmo.

41) Em 16/03/2010, a Ré dirigiu à N... o ofício saída 14994, de fls 6 e 10, do PA, sob o assunto «licenciamento de vedação e acesso» alegando que «relativamente ao assunto em epígrafe e na sequência do processo de regularização dos arranjos exteriores e licenciamento da vedação e acesso à V. loja de Sintra, foi realizada uma reunião entre o Técnico de Licenciamento desta Delegação Regional e os Srs J... e Arqt. A... em representação da N..., na qual foram indicadas as condições de licenciamento do acesso e vedação e ainda a remoção do painel de pré-aviso gráfico ali existente e reinstalação do mesmo em local alternativo como encargo dessa Empresa, e isto de modo a permitir a regular construção da vedação.

Verifica-se agora que não foi por V.Exas cumprido este compromisso e mais, foi colocado em serviço o passeio entretanto realizado sem que fossem tomadas as devidas precauções de salvaguarda do trânsito pedonal. Assim sendo, e porque já existem reclamações acerca desta anomalia consideramos da vossa inteira responsabilidade quaisquer danos decorrentes desta irregularidade.

A Estradas de Portugal SA, substituindo-se ao compromisso do promotor, em 2010.03.16 procedeu à remoção do painel em causa. (...)».

42) Em 16/03/2010, a Ré procedeu à remoção do painel de sinalização —fls 10, do PA.

43) Em 16/03/2010, a Ré dirigiu ao A o "mail" de fls 19 [doc 4] e fls 8 do PA, em resposta ao "mail" de 18/02/2010, informando que «a anomalia em causa se deve a um incumprimento do estabelecido entre a EP (...) e a N... nos termos do qual aquela firma assumiu compromisso de mudança do painel após a disponibilização do passeio ao tráfego».

44) No local dos factos, dentro da vedação da N..., ainda se encontram os dois postes / barras metálicas verticais de suporte da placa de sinalização em causa; e a rede metálica de vedação das instalações da N... ainda se encontra aberta no sítio por onde se prolongava, para cima do passeio, a parte da placa na qual o Autor embateu.

45) A presente acção entrou em juízo em 31/08/2011 - fls 2 e 3.

Factos não provados:

Além dos factos mencionados, com interesse para a presente decisão, nada mais se provou; não se provou, nomeadamente:

-Que a concessão pela Ré à N... da licença de acesso à via rodoviária tivesse sido efectuada mediante as «condições protocoladas» e que uma das principais obrigações da N..., ao abrigo do protocolo, era a da retirada, do local, do painel dos autos.

-Que a remoção do painel/placa tenha sido encargo assumido pela N....

-Que tivesse sido celebrado qualquer ' protocolo' ou acordo entre a Ré e a N... pelo qual esta tivesse assumido a obrigação de retirar ou mudar de local a placa em causa

MOTIVAÇÃO quanto aos factos Provados e não provados.

O tribunal fundou a sua convicção na análise crítica dos documentos referidos em cada ponto antecedente, no alegado e contra-alegado pelas partes e respetivos acordos, tudo conjugado com o disposto nos artigos 341.º, 342.ºss e 362.ºss, todos do CC e ainda 607-4 e 5, do CPC, bem como nos depoimentos das testemunhas e na acareação que determinou. O tribunal tem em conta as regras da experiência comum da vida no que tange à conjugação dos factos representados nos documentos, bem como dos representados pelas testemunhas ouvidas e a que adiante se voltará. O tribunal procurou a descoberta da verdade material, buscando juízos de certeza, tendo em conta a plausibilidade, a lógica, a normalidade, a credibilidade e verosimilhança, exigíveis no Direito.

A testemunha A..., director de segurança, assistiu ao acidente embora não tenha visto exactamente a pancada contra a placa, deu apoio ao Autor, conhece a zona. Viu o A no local com a mão na cara, meio atordoado, com uma pequena escoriação junto à vista, descreveu o estado do tempo, que não estava bom e chuviscava, bem como a placa e a parte desta que invadia o passeio, a sua altura aproximada do chão, que lhe daria mais ou menos pelo ombro e pela face. Depôs com isenção, espontaneidade, coerência e razões de ciência, merecendo credibilidade.

A testemunha R..., gerente da N..., encontrava-se na ocasião do acidente na N..., viu o cliente, ora Autor, que "se tinha aleijado" na placa, e tinha um golpe na face. Conhecia bem o local. Descreveu o estado do tempo, cacimbo, chuvisco, chuvisco com vento; o A com um blusão e capuz, e que tinha lá o carro a arranjar; descreveu a placa, a altura do solo e a sua invasão do passeio; que a placa do sinal sempre esteve ali; onde começava e terminava o passeio; que o engenheiro e o arquitecto da N... tinham pedido à Ré, EP, a retirada da placa. Depôs com isenção, espontaneidade, coerência e conhecimentos de ciência, merecendo credibilidade.

A testemunha A..., amigo do Autor, não assistiu ao acidente; reportou conhecer o local, que descreveu, bem como a placa, ser amigo de "tertúlia" do A; que o A, nesse dia, estava sem carro, que tinha na oficina, e lhe telefonou para o ir buscar à N...; e quando lá chegou o viu a sangrar; acha que passados 3 dias ele terá ido ao hospital; o A deixou de aparecer na tertúlia do bilhar e contou-lhe. Depôs com algumas evasivas e artificialidade, tendendo a justificações e juízos. Ainda assim, depôs com alguma razão de ciência, merecendo credibilidade nessa parte.

A testemunha A…, amigo do A, não assistiu ao acidente, mas conhece o local, que descreveu; reportou que o A lhe contou que na altura do acidente estava a chover, que ia, por isso, a olhar para o chão e que bateu na placa; que o A não mais jogou bilhar por ter perdido a vista. Depôs com espontaneidade, isenção e coerência, merecendo credibilidade.

A testemunha P..., engenheiro da R, reportou a colocação da placa, que é muito antiga, remontando à construção do IC-19, nos anos 90, a construção do passeio pelo Município de Sintra, a descrição do passeio, o terreno baldio antes da N... e o projecto da V... em 1992, a aquisição do terreno pela N..., o conhecimento da existência da N... sem o licenciamento da R, quando a N... pede para a R retirar a placa, altura em que já se estava nos arranjos exteriores do edifício, e a placa estava a interferir na vedação da obra; o ter ficado por conta do requerente tirar a placa [segundo colheu do processo]; a taxa de licenciamento; que 'o passeio já existia até à placa antes de a N... lá estar'; o grafismo da placa desatualizado (entroncamento que passou a rotunda); foi a EP que retirou a placa; disse não ter tido conhecimento directo e teve por base o constante do processo; descreveu as medidas e altura das placas, de 1,50m (ou 2,20m), por então não ser local de passagem pedonal; descreveu a forma como se processa o licenciamento pela R. Depôs com isenção, espontaneidade, coerência, merecendo credibilidade; todavia depôs tendo por base sobretudo, por um lado, a documentação constante dos processos da Ré e, por outro, o seus conhecimentos técnico-profissionais.

A testemunha J..., engenheiro da R, reportou a colocação da placa no âmbito do plano de sinalização do IC-19, cerca do ano de 1992, a D... e a autorização para construir a rotunda, o passeio a terminar junto à placa, que, a seguir, dava acesso ao terreno; o projecto da V..., que nunca avançou, cujo dono terá sido assassinado; a surpresa perante o facto de a N... pedir para retirar a placa; a reunião ocorrida nas instalações R em Almada, não recordando a data, os assuntos da reunião, licenciamento e taxas, a questão do painel e um acordo/condição de retirada deste pela N...; as vedações da N... como um facto já consumado; o convencimento de que a N... agiu de boa-fé; o passeio que já era pré-existente à N... e o murete de suporte da vedação; os demais licenciamentos da Ré à N... [cablagens, águas, etc]; o alvará nunca levantado perante a obra já consumada; os "e-mails"; a altura regulamentar das placas nas estradas não era de 2,20m [que ali não era urbana]; os regulamentos e normas sobre colocação de placas; que esteve presente nessa reunião onde se falou na condição ["oral"] de retirada da placa pela N..., crê, com duas pessoas da N..., "logo a seguir ao e-mail". Depôs com isenção, espontaneidade, coerência e razões de ciência, merecendo credibilidade, ainda que em parte com apoio no que leu dos documentos do processo da Ré.

A testemunha J..., Engenheiro responsável da N..., acompanhou a construção; a descoberta do terreno já com projecto [da V...]; a pré-existência do sinal no local e a sua manutenção nas mesmas circunstâncias, sem alterações; o passeio já lá estava igual e apenas foi 'intervencionado'; o projecto; houve 3 licenciamentos pela Ré; o pedido da N... de remoção do sinal; os contactos quase semanais com a Ré 'sobre outros assuntos' mais importantes; não é verdade que tenha ficado combinado que a N... retirava a placa; esteve nas EP, uma vez com o A. J..., que hoje não reconhecia, acerca do licenciamento do muro, do atravessamento da via, sendo falada a questão da placa, a ser retirada pela EP, e, que se tivessem autorização das EP não tinham recortado o muro; que a EP disse sempre para aguardarem a retirada da placa, que a placa era da propriedade da EP; e que nunca a N... se comprometeu ou acordou em remover a placa; que foi sugerido pela EP deslocar a placa para outra posição, e 'respondemos que não podia porque ali teria de ser instalado um PT' [posto de transformação de electricidade]. Depôs com isenção, espontaneidade, coerência, razões de ciência, merecendo credibilidade.

A testemunha A…, arquiteto, reportou que elaborou o projeto da N... e foi às instalações da EP, que havia necessidade de licenciamento do muro de vedação, e que nunca ninguém falou que o sinal fosse retirado pela N...; apanhou o projecto da V... mas não directamente, ninguém mexeu na cota do chão; referiu a delimitação do terreno com arame; não alteraram nada em relação ao sinal e o passeio já lá estava; não sabe quem fez o passeio; o murete da vedação construído pela N...; a vedação no limite do lote, nada tendo sido recuado; Depôs com isenção, espontaneidade, coerência e razões de ciência, merecendo credibilidade.

Foi feita acareação entre o Eng J... e o Eng J..., quanto ao alegado acordo de retirada da placa, como da acta consta, mantendo cada qual a sua posição, mas, verificando, ambos, que não se lembram se estiveram um na presença do outro, e que há um outro J… [C… R…] da EP que também tratou assuntos com a N....

(…) (negritos e sublinhados nossos)

(cfr. decisão de 28.01.2020) Cumpre agora acrescentar que:

Quanto à pré-existência do passeio, em causa, a própria testemunha da Ré, EP, P..., declarou que é muito antiga, remontando à construção do IC-19, nos anos 90, a construção do passeio pelo Município de Sintra.

Afirma sem dúvidas que «A placa é muito antiga. Deve datar da altura da construção do IC-19, na E.N. 249 que é, actualmente, do município». «O IC-19 é dos anos 90». Foi confrontado com a fotografia de fls 122 dos autos, junta pela parte Interveniente N..., tirada do «google earth», [de acesso público, cuja fita do tempo «histórico» mostra, ao longo dos anos e das décadas, como era, em cada momento, o território. Foto essa que explicou e que condiz com o seu depoimento, sobre a pré-existência do passeio e da placa em questão. Repetiu que “o passeio já existia até à placa antes de a N... lá estar” e garantiu que foi a EP que retirou a placa.

O depoimento foi visto e tido em conta, pelo julgador, na sua totalidade, com as instâncias de ambos advogados e intervenções do juiz; e, visto na integralidade, nenhuma contradição existiu a nível interno do depoimento, nem a nível externo na relação com os outros depoimentos, não obstante a tentativa da R em atentar apenas em partes dos depoimentos; partes que, de resto, nenhuma contradição substancial evidenciam.

Na parte final do depoimento, a instância do Ilm° Mandatário da R, EP, tentou este, lançar a ideia de «6 ou 7 metros de passeio construído». No entanto, como resulta evidente das gravações, e é nossa convicção perante depoimento claro, credível, e provindo da própria testemunha da Ré, e perante o demais já referido, os factos provados n.° 32, 33 e 34 tem suporte neste depoimento, no conjunto dos demais depoimentos, na fotografia de fls 122, nos elementos documentais analisados e processos analisados, e nas Atas de julgamento.

Difícil ou impossível seria, a este tribunal, dar por provado o contrário que a Ré pretende, agora, acrescer, pois isso significaria subverter os testemunhos, os elementos fotográficos e os elementos documentais.

No mesmo sentido e quanto à pré-existência do passeio, em causa, a própria testemunha da Ré, EP, J..., engenheiro da R, declarou que a colocação da placa em causa foi colocada no local no âmbito do plano de sinalização do IC-19, no ano de 1992 «mais ou menos» [na construção do IC-19]. Disse claramente que o passeio terminava junto à placa, que, logo a seguir, dava acesso ao então terreno "baldio" [onde a N... veio a construiu o seu estabelecimento, aproveitando o projecto da V...], sabendo até que o dono da V... terá sido assassinado. Disse que a V... pediu para vedar esse terreno e ter acesso à estrada E.N.249 «hoje desqualificada pelo plano rodoviário de 198, aceite Pela CM de Sintra, mantendo-se nas EP (Ré) até final de 2013». Também foi confrontado com documentos, que esclareceu, nomeadamente o de fls 74 e uma grelha-mapa financeira. Repetiu que supõe que o passeio já era pré-existente [à N..., ou seja, à construção do estabelecimento], e coisa diferente construída foi o "murete" de suporte à vedação [da N...]. E que também a construção do Hotel I..., é posterior à N... e que «ficamos convencidos que a N... estava de boa fé». A instâncias do Ilm° Mandatário da N..., prestou ainda esclarecimentos vários, inclusive quanto a ter estado presente em reunião «e creio que o meu diretor».

Nenhuma contradição interna existe neste depoimento. Ele está de acordo também com a foto «google earth», junta pela parte Interveniente N... a fls 122 dos autos e nenhuma discrepância substancial apresenta na sua conjugação com os demais depoimentos, sendo que quanto à discrepância sobre um alegado «acordo», o julgador determinou a acareação, oficiosamente, e nela se apurou que nessa reunião, provavelmente, participou outra pessoa diferente com nome idêntico.

Repete-se, analisados documentos, fotos e processo no julgamento, e, apesar de a R, EP, pretender fazer retirar a atenção da essência da questão objeto da ação, para procurar desviar o enfoque para questões colaterais, nenhuma dúvida resultou, sobre a pré-existência do passeio. Os factos provados n.° 32, 33 e 34, tem suporte neste depoimento, no conjunto dos demais depoimentos, na fotografia de fls 122, nos elementos documentais analisados e processos analisados, como consta nomeadamente nas Atas de julgamento.

Repete-se, difícil seria, a este tribunal, dar por provado o contrário e que a Ré pretende, agora, acrescer, pois isso significaria subverter os testemunhos, os elementos fotográficos e os elementos documentais juntos, requisitados e analisados.

No mesmo sentido e quanto à pré-existência do passeio, em causa, a testemunha da Interveniente, N..., J..., Engenheiro responsável da N..., acompanhou a construção; explicou, com conhecimento de causa 'a descoberta do terreno já com projecto da V...' [que a N... aproveitou]; como resulta das gravações, integralmente vistas e não apenas vistas em trechos truncados, e com as perguntas das instâncias e intervenção do juiz, declarou que 'o passeio nunca foi mexido. Já lá estava o passeio. Igual. Em 2007/2008. O passeio terminava a 3 ou 4 metros da placa; embora eu nunca tenha visto muita gente a passar no passeio; o passeio terminava a 2 ou 3 metros da placa.' O passeio foi intervencionado, mas já lá se encontrava.

Não há aqui qualquer contradição entre 3 ou 4 e 2 ou 3 porque a testemunha nunca se referiu, nem quis, matematicamente, a medidas exatas, mas sim a medidas aproximadas. Sobre o «acordo» para retirada da placa, provavelmente, esteve presente outra pessoa com nome idêntico, como referido na acareação, sendo que disse «não reconheci o engenheiro das EP, hoje» [no tribunal]. Foi confrontado com e-mails, que disse «foram feitos por mim».

Foi confrontado pela R, EP, a instâncias do Ilm° Mandatário, no sentido de tentar usar as palavras «3 a 4 metros» e «antes» e «além da» placa, a testemunha nenhuma contradição cometeu. Nenhuma contradição interna existe neste depoimento. Ele está de acordo também com a foto «google earth», junta pela parte Interveniente N... a fls 122 dos autos e com as demais fotos juntas e analisadas ao longo da audiência, bem como os restantes testemunhos e elementos documentais requisitados, consultados e analisados.

Tendo em conta os documentos, fotos e processos, no julgamento, e, apesar de a R, EP, pretender fazer retirar a atenção da essência da questão objeto da ação, para procurar desviar o enfoque para questões colaterais, repete-se, nenhuma dúvida resultou, sobre a pré-existência do passeio. E em conformidade, os factos provados n.° 32, 33 e 34, tem suporte neste depoimento, no conjunto dos demais depoimentos, na fotografia de fls 122, nos elementos documentais e processos analisados, como consta nomeadamente nas Atas de julgamento.

Temos de repetir que, difícil seria, a este tribunal, dar por provado o contrário e que a Ré pretende, agora, acrescer, pois isso significaria subverter os testemunhos, os elementos fotográficos e os elementos documentais, requisitados, consultados e analisados.

Ainda quanto à pré-existência do passeio, em causa, a testemunha da Interveniente, N..., A..., foi o arquiteto que elaborou o projeto da Interveniente N... e foi às instalações da Ré, EP, conhecendo muito bem a realidade. Entre o mais, afiançou que a placa já existia, a qual "apesar de estar na propriedade privada é sempre das EP"; «limitei-me ao projeto», «apanhei o projecto da V...', mas não directamente, «ninguém mexeu na cota do chão»; e que "o passeio já ali estava, e o sinal".

A instâncias do Ilm° Mandatário do Autor, pronunciou-se sobre as redes de esgotos, e "O passeio só está feito frente à N...? Não sei. A vedação, creio, que está no limite do lote. Não foi recuada. O Murete [se suporte da vedação da N...] foi construído pela N...».

A instâncias do Ilm° Mandatário da Ré, EP, que insistiu no "licenciamento" questionando: 'quando foi feito o pedido de licenciamento as obras já estavam feitas? Não me recordo.'. O passeio já existia [e já tinha dito]. E insistiu, sempre a repetir, sobre a testemunha, sobre se combinaram a retirada da placa- "não faço a mínima ideia".

Mais uma vez, nenhuma contradição interna existe neste depoimento. Ele está de acordo também com a foto «google earth», junta pela parte Interveniente N... a fls 122 dos autos e com as demais fotos juntas e analisadas ao longo da audiência, bem como os restantes testemunhos e elementos documentais requisitados, consultados e analisados. Tendo em conta os documentos, fotos e processos, no julgamento, e, apesar de a R, EP, pretender fazer retirar a atenção da essência da questão objeto da ação, para procurar desviar o enfoque para questões colaterais, repete-se, nenhuma dúvida resultou, sobre a pré-existência do passeio.

Em conformidade, os factos provados n.° 32, 33 e 34, tem suporte neste depoimento, no conjunto dos demais depoimentos, na fotografia de fls 122, nos elementos documentais e processos analisados, como consta nomeadamente nas Atas de julgamento.

Temos de repetir que, difícil seria, a este tribunal, dar por provado o contrário e que a Ré pretende, agora, acrescer, pois isso significaria subverter os testemunhos, os elementos fotográficos e os elementos documentais, requisitados, consultados e analisados.

Em remate:

A convicção do tribunal, já se disse, resulta dos testemunhos claros, complementares, que nenhuma contradição substancial, interna ou externa, apresentam, sendo que cada uma tem a sua fonte de conhecimento de razões de ciência, e que os testemunhos não têm de ser exatamente iguais, com as mesmas expressões, pois isso, como é da pS...ologia judiciária, indicaria o contrário, ou seja, o discurso feito, ensaiado, tendencioso. A eventual não coincidência total das palavras nada tem que ver com qualquer contradição substancial, que no caso, não existe. Os discursos não negam uns o que outros afirmem.

A Ré não assinala, em concreto, onde é que alguma testemunha desdiga o que a outra diz, apresentando o exato recorte e contexto declarativo. Limita-se a adensar, de forma seletiva e sem transcrever as perguntas e sem indicar os interlocutores, passagens truncadas dos depoimentos. E nada refere sobre fotografias, documentos, processos consultados e demais elementos documentais dos autos. E, como se disse e repete, salvo o devido respeito, nenhuma contradição existe, antes pelo contrário, o conjunto probatório se adensa no sentido dos factos provados agora em causa.

O tribunal nenhuma dúvida teve quanto ao sentido e extensão dos referidos factos dados por provados, nomeadamente em 32, 33 e 34, do probatório, não se tendo, outrossim, deixado arrastar para questões colaterais irrelevantes para a questão essencial levada aos temas da prova, procurando evitar o entorpecimento da verdade em sede de audiência, e teve em conta os factos e questões alegados nos articulados, sem prejuízo das aquisições em sede de audiência de julgamento.

Nada foi requerido ao tribunal, em audiência ou fora dela, mormente no sentido de se indagar através do «google earth», cuja fidedignidade é reconhecida, pelo qual se pode ainda hoje verificar através da fita do tempo «histórico», a existência do passeio que, agora, a Ré pretende por em causa, apesar dos testemunhos inequívocos e da foto desse programa junta a fls 122, que o tribunal também consultou em face dessa junção. Aliás a dado passo [cfr pg 334v dos autos] da transcrição, ainda que transcrita sob a forma de interrogação, se diz «hoje em dia, vamos ao google earth e percebemos que há um passeio e que até determinada data existe até perto da placa muito perto da placa, isto no sentido Sintra-Lisboa».

Mas além do referido meio, haveria a possibilidade de a R requerer ou juntar (foto)cópia da carta topográfica e fotográfica e aéreas referentes ao momento/ano em que o passeio em causa surgiu construído, que têm por base registos também da Força Aérea e que de cujos programas e meios os municípios, mormente o Município de Sintra está dotado. Como certamente a R bem sabe, dada a sua natureza e ligação à construção e/ou gestão de vias.

Este tribunal não requereu esse meio comprovativo, ao Município de Sintra, porque nem lhe foi requerido pela R, que é a única que questiona, agora, a pré-existência desse passeio, nem teve qualquer dúvida perante a consistência dos elementos documentais juntos aos autos, a sua análise e os depoimentos acima referidos, inclusive das testemunhas da própria Ré.

Este tribunal já referiu o grau e porquê da credibilidade de cada testemunha. Não há qualquer contradição de testemunhos, de que tomamos devidas notas ao longo do depoimento de cada uma, bem como resulta do exposto e das gravações dos depoimentos, pelo que este tribunal não pode dizer, por ser material e legalmente impossível, por que razão acredita mais num do que noutro depoente, sendo os mesmos perfeitamente credíveis, não tendo que estabelecer tais graus de credibilidade porque, como é o caso, esses testemunhos não são substancialmente contraditórios, como se pode ver à saciedade das gravações e dos textos transcritos ou a transcrever, se transcritos e vistos no seu todo integral, e antes se revelam complementares densificando, no conjunto, o todo probatório a que o tribunal tem de se ater.

Nada mais se afigura ser possível e adequado fundamentar, atendo o já exposto.» (sublinhados e negritos nossos).

Na sequência da decisão do tribunal a quo de 28.01.2020, supra transcrita, foram as partes notificadas para se pronunciarem, tendo a Recorrente EP-Estradas de Portugal, SA., vindo dizer, em suma, o seguinte:

«(…)

2° - É óbvio que existe divergência entre os depoimentos das testemunhas da N..., SA (Gerente e outros, se bem que uma até admitiu intervenção ao nível de passeios por parte da N...) e da Infraestruturas de Portugal, SA;

3° - Não é verdade que a parte do passeio dos autos onde o Autor foi colidir, desatento, com a cabeça na placa, fosse pré-existente às instalações da N..., SA;

4° - Nunca foi dito pela Ré, ou seu mandatário, que nenhum passeio existisse na zona, antes e sempre o que foi dito que foi construído um passeio (com a chegada da D... em 2000) que, não chegava à placa, ficava perto, não chegava a ela, terminava num baldio, não existia continuidade pedonal;

5° - Não havia trânsito pedonal em passeio no local da placa do processo, antes de a N... o construir em 2010;

6°- Deturpa-se a realidade quando se refere que a Ré sempre afirmou (e mais ainda o seu mandatário) negar a pré-existência de um passeio, o que nunca aconteceu - o que sempre se negou e nega é que o passeio antes construído, que partia da Rotunda até ao D..., chegasse sequer à placa quanto mais para além desta e fosse até às instalações da N...;

6°- A N... intervencionou um passeio e segundo o projeto não aprovado pela IP na altura da construção das instalações, o passeio foi prolongado pela N... passando a zona da placa dos autos, continuando em frente e virando de modo contornado para a entrada N..., SA;

7° - Estranha-se o modo muito pouco isento, diga-se com respeito, como o Meritíssimo julgador do Tribunal a quo reage, esgrimindo opinião sobre o patrocínio forense da Ré imputando a atribuição de passagens truncadas dos depoimentos, desconsiderando o teor do depoimento das testemunhas da Ré, trazidos ao recurso, alegando que a Ré trouxe ao processo como que questões colaterais irrelevantes, para entorpecimento (?) da verdade em sede da audiência, o que é, ainda e por hoje, demonstrativo da sua ponderação sobre a prova produzida e documentos carreados, desconsiderando totalmente e criticando a posição assumida pela concessionária nacional de estradas;

8° - O mandatário da Ré, e esta como Pessoa de Bem (Estado) respeita todos os agentes do fenómeno judiciário, certamente credor de mais consideração porque a nutrindo e manifestando também ao longo de 36 anos de contencioso, pelo que não pode deixar de registar desagrado pelo modo como o Mto. Dto. Julgador, julgando a causa, desatendeu o depoimento, técnico, das testemunhas da Ré, a colaboração do mandatário desta, patenteado no texto do seu despacho TAF de Sintra de 28/1/2020 - bem exemplificativo da posição do juiz perante as partes e a ponderação da prova;

Na verdade, se uns dizem que o passeio ia da rotunda perto do D... mas não chegava à placa, terminava num baldio e se agora, depois da N... chegar e fazer a obra, passou a ser outro passeio porque mais longo, ultrapassando o local da placa e contornando mais à frente para a entrada das instalações da N... (testemunho gravado dos Engenheiros da IP) não haverá divergência, contradição, será invenção de patrocínio? para entorpecimento da verdade?

E se é dito que o projeto anterior não foi levado à obra, o passeio, murete, vedação da N... (inovações) eram inexistentes e a titular V... se extinguiu e o seu projeto caducou, tendo a N... se instalado no local à revelia da Ré, com um projeto novo sem aprovação da IP, tudo cristalinamente explicado pela testemunha Eng° J... dos Licenciamentos da IP, e outros dizem que o projeto sempre foi o mesmo, e o passeio total em extensão já existia, não se trata de divergência? é invenção de mandatário?

Porque a N... foi para o local onde só existia um baldio, sem infraestruturação, nada estava pré-licenciado, posto que o licenciamento foi dado a posteriori, ao dizerem as testemunhas da N... que estava tudo aprovado, não demonstra contradição face ao exaustivamente testemunhado, com recurso a processo administrativo instrutor, é apresentação truncada de transcrição de depoimentos, elementos ou questões colaterais?

Recorrendo-se ao google earth, como mencionado pelo Tribunal, ao ano de 1992/3, ao ano de 2000, ao ano de 2009/10, se consegue descortinar a inexistência de passeio na zona da placa dos autos, a implantação de passeio da Rotunda até ao D... que não chega à placa, e o passeio novo, prolongado junto da vedação e acesso da N... e que, por obra desta, contorna para o portão de acesso/entrada das instalações N..., SA.

No mais, encerrando-se a posição da Infraestruturas de Portugal, SA perante o despacho justificativo da posição do Meritíssimo Sr. Dr. Juiz do TAF de Sintra, a si, Excelentíssima Sra. Dra. Desembargadora-Relator, se dão integralmente por reproduzidas as alegações de recurso apresentadas por esta empresa de capitais exclusivamente públicos.»

Assim como a Recorrida N..., veio também dizer, em suma, o seguinte:

«(…)

3. Pese embora a reapreciação da matéria de facto tenha por base os artigos 32°, 33° e 34°, salvo melhor opinião, a questão de fundo subjacente consiste em determinar se, em momento prévio à construção das instalações da N..., em 2009, o passeio já se encontrava construido e se se prolongava até à placa de sinalização, que assim estava erigida em cima do referido passeio.

4. Uma análise objectiva dos elementos de prova juntos aos autos, a que o Tribunal a quo recorreu e a que faz expressa alusão na fundamentação da decisão da matéria de facto, designadamente o documento de fls. 122 (documento n° 1 junto com a contestação da ora requerente), demonstram de modo inequívoco que o passeio se prolongava, em momento anterior à construção do Centro Auto da N..., até à placa que se encontrava erigida sobre o passeio, tal como o demonstram os documentos cuja junção se requer - DOCUMENTO 1 (sinalizado no local da placa).

5. Ao invés, as imagens microscópicas onde a ré Infraestruturas de Portugal, S.A. pretende que o julgador veja aquilo que não é perceptível, não poderão servir para dissipar eventuais dúvidas que o Tribunal a quo efectivamente não teve, perante o documento de fl. 122, sendo que os documentos ora juntos atestam, de forma inequívoca, o acerto da decisão sobre a matéria de facto.

6. De resto, o Tribunal a quo, de modo muito claro, entende que a divergência de depoimentos das testemunhas P... e J. P..., por um lado, e de J... e J..., por outro, é meramente aparente e resulta do facto da ré, Infraestruturas de Portugal, S.A., na impugnação da decisão da matéria de facto, atender apenas a excertos dos referidos depoimentos.

7. O Tribunal a quo, com base na prova produzida, firmou a sua convicção e, em consonância, deu como provada a matéria dos artigos 32°, 33° e 34°, explicitando que a ré Infraestruturas de Portugal, S.A., ao pedir a reapreciação dessa matéria, atenta “apenas em partes dos depoimentos” (fls. 4 da fundamentação da decisão pelo Tribunal a quo).

8. A esta posição não será estranha a circunstância de a ré Infraestruturas de Portugal, S.A., ao pedir o reexame da matéria de facto, proceder à junção da transcrição do depoimento das testemunhas P... e J..., mas apenas parcial, concretamente do depoimento directo das testemunhas e não - também - dos esclarecimentos prestados por elas à instância dos demais mandatários, nos termos do previsto no n° 4 do artigo 516° do CPC.

9. Para além do depoimento directo das testemunhas P... e J..., releva igualmente aquilo que referiram as testemunhas às instâncias dos demais mandatários, designadamente a testemunha P... (gravação - 2h 32m do depoimento prestado na sessão de julgamento de 14 de Janeiro de 2015) quando claramente reconhece que, em 2007, antes de qualquer obra realizada pela N..., S.A., a placa dos autos já se encontrava apenas a um metro e meio do solo, sobre o passeio preexistente, e que a obra realizada pela N... apenas levou a que ao local acedessem mais pessoas, referindo que a situação de perigo preexistente, se acentuou pelo facto de passarem a aceder mais pessoas ao local e não por qualquer alteração da altura da placa face ao solo resultante de qualquer obra promovida pela N…, S.A.

10. No mesmo sentido, a testemunha J... que, reconhecendo que apenas se deslocou ao local após o acidente (gravação - 0h 54m do depoimento prestado na sessão de julgamento de 18 de Fevereiro de 2015), referiu que o passeio era preexistente e não sofreu alterações, ou alterações significativas, quanto à cota, entenda-se altura a que se encontrava edificado (gravação - 0h 54m do depoimento prestado na sessão de julgamento de 18 de Fevereiro de 2015).

11. Face ao exposto, entende a requerente que, face à prova produzida e como bem faz notar o Tribunal a quo, pesem embora as tentativas da R, EP, pretender fazer retirar a atenção da questão objecto da acção, para questões colaterais...” - designadamente dando enfoque na taxa de licenciamento, e da Ré “...atentar em partes dos depoimentos( ...) (...) difícil ou impossível seria a este Tribunal [Tribunal a quo], dar por provado o contrário o que a Ré pretende, agora, acrescer, pois isso significaria subverter os testemunhos, os elementos fotográficos e os elementos documentais”.

12. Na verdade, afigurasse-nos que a fundamentação do Tribunal a quo revela uma correcta ponderação da prova, rejeitando uma reflexão de excertos desgarrados e/ou descontextualizados, privilegiando uma visão global do depoimento das testemunhas, que inclui, não só depoimento directo, mas também os esclarecimentos prestados à instância dos demais mandatários.

13. Face à fundamentação expressa da decisão, nenhuma dúvida decorrente de contradição de depoimentos afectou a decisão sobre a matéria de facto do Tribunal a quo que, aliás, pela resposta à matéria de facto, apreendeu em absoluto que o posicionamento da ré Infra-Estruturas de Portugal, relativamente ao acidente em que foi vítima o autor, tem dois momentos distintos.

14. Assim, até 16 de Março de 2010 a conduta da ré pautou-se por uma completa inacção no que se refere à solicitação de retirada do sinal e/ou à comunicação do acidente de que o autor foi vítima (vide factos provados 14°, 15°, 16°, 17°, 35° e 36°) e depois, a partir dessa data e em virtude do telefonema que o autor fez para o programa “Nós por cá” da S... (facto provado 17°), por uma tentativa de sacudir a água do capote para cima da ora requerente, como resulta do provado no artigo 41° por oposição com o constante dos factos 35° e 36°.»

II.2. De direito

A Recorrente começa por impugnar a decisão sobre a matéria de facto, afirmando que deve esta deve ser alterada, como segue:

i) Do erro de julgamento de facto em [9] artigos da fundamentação da sentença sobre os factos provados em II.1, ou seja, nos factos n.º 5, 6, 7, 23 e 29, 31, 32, 33 e 34 da sentença;

ii) Do erro de julgamento na matéria de facto face aos factos tidos por não provados - os três mencionados no § 1º de fls. 7 da sentença, conexos com a concessão, com a remoção do painel e o relativo ao acordo.

Vejamos.

Em sede de impugnação da decisão da matéria de facto, como é consabido, a reapreciação da prova produzida em 1ª instância, enquanto garantia do duplo grau de jurisdição em matéria de facto, está subordinada à observância de determinados ónus que a lei adjetiva impõe ao recorrente.

Na verdade, a apontada garantia nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida na audiência final, impondo-se, por isso, ao recorrente, no respeito dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa-fé processuais, que proceda à delimitação com toda a precisão dos concretos pontos da decisão que pretende questionar, dos concretos meios de prova, disponibilizados pelo processo ou pelo registo ou gravação nele realizada, que imponham, sobre aqueles pontos, distinta decisão, e a decisão que, no ver do Recorrente, deve ser encontrada para os pontos de facto objeto da impugnação.

Com efeito, como decorre do n..º 1 do artigo 640º, do CPC, ex vi art. 140º, n.º 3, do CPTA, incumbe ao recorrente, em primeiro lugar, circunscrever o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considerados viciados por erro de julgamento, com indicação da decisão que a seu ver deveria ter sido proferida [als. a) e c) do n.º 1] e, em segundo lugar, fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa [al. b) do n.º 1].

De facto, se ao tribunal de 1ª instância (ou a qualquer outro) cumpre o dever de fundamentação e de motivação crítica da sua decisão em matéria de facto (art. 607º, n.º 4 do CPC, ex vi art. 140.º, n.º 3, do CPTA), facilmente se compreende que, em contraponto, o legislador tenha imposto à parte que pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto o respetivo ónus de impugnação, ou seja o ónus de expor, em termos claros e suficientes, os argumentos que, extraídos da sua própria apreciação crítica dos meios de prova produzidos, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido (1).

Assim, no caso de o recurso envolver a impugnação da matéria de facto, o recorrente, sob pena de rejeição, deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, explicitando a decisão de que facto deveria ter sido adotada pelo tribunal a quo, enunciar essa sua posição na motivação de recurso e sintetizá-la nas conclusões, bem como os concretos meios probatórios que, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizado, impunham decisão diversa da adotada quanto aos factos impugnados, indicando as passagens da gravação em que se funda , sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição – art. 640º, n.º s 1 e 2 do CPC, ex vi art. 1.º do CPTA (2).

Vejamos então se tais exigências foram cumpridas no caso em apreço:

· A Recorrente Estradas de Portugal indicou os segmentos da decisão de facto que considera viciados por erro de julgamento;

· fundamentou as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos que, no seu entender, implicavam uma decisão diversa, exceto quanto aos factos n.º 23 e 29; e,

· enunciou a decisão que, em seu entender, deveria ter tido lugar relativamente às questões de facto impugnadas, tudo, conforme melhor explicitaremos de seguida.

i) Da impugnação do facto provado n.º 5:

Pretende a Recorrente que seja acrescentado ao mesmo, o seguinte: “...mas desclassificada e em transição para o Município de Sintra, que teve intervenções na zona dos autos”.

Porém, resulta do depoimento das testemunhas que indicou para corroborar tal circunstância, que esta, mesmo sendo verdadeira, não afasta o que resulta do facto n.º 5, i.e. que a estrada n.º 249, em 04.02.2010, estava, ainda, sob jurisdição da Recorrente.

Razão pela qual, por inutilidade, se rejeita a impugnação deste facto.

ii) Da impugnação dos factos provados n.º 6 e 7:

Entende a Recorrente, que se deveria precisar o afirmado no facto n.º 6, completando-o nos seguintes termos: “...em resultado das obras realizadas no passeio pela N....” E que, no facto n.º 7 deveria ser acrescentado o seguinte: “…inexistindo, na altura, passeios no local.”

Esta impugnação surge prejudicada pela resposta que se dará à impugnação referente aos factos n.º 32, 33 e 34, na medida em que, nos factos n.º 6 e 7 tal asserção surgiria descontextualizada por se reportar a outros aspetos, embora conexos, distintos do iter factual seguido pela sentença.

iii) Da impugnação dos factos provados nº 23 e 29:

Quanto a estes factos a Recorrente apenas revela a sua discordância quanto à referência que nos mesmos se faz ao glaucoma, sem cumprir, porém, o ónus que sobre si impendia, a saber: fundamentar, e não apenas enunciar, as razões da sua discordância, e concretizar, apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos que, no seu entender, implicavam uma decisão diversa.

Razão pela qual terá de improceder a impugnação destes factos.

iv) Da impugnação do facto provado n.º 31:

Entende a Recorrente que padece de erro a referência, no facto em apreço, ao “Alvará de licença” alegando que o mesmo não existia à data das obras das instalações comerciais, da vedação, do muro e, do prolongamento do passeio, do acesso, da N..., SA., pelo que, requer, seja reformada a sua descrição nos seguintes termos: “Essa edificação da V... nunca veio a ocorrer; e, no seu local, vieram a ser construídas, em 2009, as instalações da N...”, sem mais.

Não se vislumbra qual a relevância de tal correção para a decisão da causa e do recurso, nem tal é alegado pela Recorrente, atentos também os factos provados sob o n.º 36) a 39), pelo que se indefere, tendo presente o objeto do recurso e conforme melhor se consubstanciará em sede de apreciação jurídica do presente litígio, a alteração da decisão de facto nesta sede requerida.

v) Da impugnação dos factos provados n.º 32, 33 e 34:

A Recorrente insurge-se contra a decisão recorrida, ao ter dado como provado a pré-existência de um passeio, uma pré-existência inalterada (factos n.º 32 e 33), desde os anos 90 até à data do acidente, sendo que, tal interfere, pois entende não ser indiferente a concreta identificação do local onde estava colocado o painel de sinalização em apreço e desde quando (facto n.º 34).

Identifica claramente os depoimentos que, no seu entender, corroboram decisão diversa e conclui pela necessária alteração dos mesmos, nos seguintes termos:

Facto n.º 32 - O passeio não estava construído, nem se prolongava, do modo que o Julgador refere. Quando a N... chegou ao local, em 2009, o passeio chegava apenas próximo da placa, vindo da Rotunda do D... e não se prolongava até junto da entrada que dá acesso da via pública às referidas instalações (refere: P..., fls. 8, 13, 14, 15 e 16 da transcrição e J. P.... fls. 5, 6, 7, 13 e 14 da transcrição).

Facto n.º 33 – O passeio que estava construído, antes da N... chegar ao local era o construído no âmbito do acordo da construção da rotunda entre o D... e o Município de Sintra e era o que ia da rotunda até perto da placa, ficava a uns metros da placa (que na altura não tina murete, nem vedação nem instalações edificadas) em zona de baldio (refere: testemunhos de P..., fls. 6, 7, 8, 14 e 15 da transcrição; J. P…. fls. 5, 6,7 e 15 da transcrição).

Facto n.º 34 - O painel de sinalização de trânsito (placa informativa) em causa foi colocado no local, num terreno baldio, no âmbito da empreitada de construção do IC19, havia mais de 15 anos à data do acidente - doc 9, fis 74, fls 11 do PA anexo (refere ainda: P..., fls. 5. 14 e 15 da transcrição; J. P..., fls. 5, 6, 15 e 16 da transcrição).

Cumpre decidir, tendo em conta a renovada fundamentação desta parte da decisão sobre matéria de facto supra transcrita.

Compulsados os autos, designadamente todas as referências documentais referidas na decisão proferida sobre estes factos, atentas as atas de julgamento e os depoimentos das testemunhas indicadas, conclui-se que não se pode acompanhar a convicção inabalável do tribunal a quo sobre a pré-existência do passeio em apreço e qual a sua extensão, assim como saber se a placa que deu origem ao acidente estava desde sempre colocada em cima desse passeio ou se passou a estar em momento posterior, designadamente, depois das obras de intervenção que a Recorrida N... levou a cabo no mesmo por forma a continuá-lo até às suas instalações, intervenção essa que faz todo o sentido, de resto.

Não resulta pois, para este tribunal ad quem, inequívoco, nem que o referido passeio se prolongava, em momento anterior à construção das instalações da Recorrida N..., até à placa de sinalização sob escrutínio, nem que o mesmo, pré-existindo, não chegava até à referida placa. Ou seja, se e quando é que a placa passou indubitavelmente a estar sobre o passeio.

E, na dúvida, perante uma situação de non liquet, importa decidir segundo as regras de ónus da prova.

Assim, sobre a versão dos factos alegada pela Recorrente Estradas de Portugal, que a si aproveitava, conclui-se que não logrou fazer a competente prova.

Assim como, sobre a distinta versão dos factos alegada pela Recorrida N..., que a si aproveitava, também se conclui que não logrou fazer a competente prova.

Ora, perante uma situação de falta ou insuficiência da prova relativamente a algum ou alguns dos factos alegados indispensáveis para a decisão da causa, estes devem ter-se como inexistentes, na medida em que não podem ser considerados como provados nem como não provados (Anselmo de Castro, Lições de Processo Civil, 4º Vol. (policopiadas), Coimbra, pág. 114); implicando que o tribunal deva emitir uma pronúncia desfavorável à parte a quem incumbia fazer a prova desses factos. (3)

A ideia fundamental que impera no domínio da repartição do ónus da prova "é não poder o juiz aplicar uma norma de direito sem estarem provados os diversos momentos de facto que integram a sua hipótese, e condicionam portanto a subsequente estatuição. Por isso o ónus da prova (e da afirmação) quanto a cada facto incumbe à parte cuja pretensão processual só pode obter êxito mediante a aplicação da norma de que ele é pressuposto; de onde que cada parte terá aquele ónus quanto a todos os pressupostos das normas que lhe são favoráveis". (4)

São estes justamente os critérios que decorrem do art. 342.º do CC, cujo n.º 1, dispõe que "àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado".

No caso vertente, quem poderia beneficiar de uma ou outra versão dos factos, quanto à concreta situação da placa de sinalização em apreço e do passeio, em momento anterior ao do acidente, in illo tempore, eram, respetivamente Recorrente Estradas de Portugal e Recorrida N..., que, perante a aquisição processual de prova sobre uma das versões, ficariam desoneradas da responsabilidade extracontratual que lhes é imputada a título principal.

Por conseguinte, era a estas que competia alegar e provar os factos dos quais, segundo a sua versão, pudesse resultar o facto ilícito.

Ora, tendo-se chegado a um non liquet probatório, terá de se desfazer a dúvida, na apreciação do direito, em desfavor da parte sobre quem impende o correspondente ónus de prova, se tal for necessário, conforme melhor se explicará infra, em sede de apreciação jurídica do presente litígio.

Razão pela qual e face a todo o exposto, retiram-se da matéria de factos os factos n.º 32, 33 e 34.

ii) Do erro de julgamento na matéria de facto face aos factos tidos por não provados - os três mencionados no § 1º de fls. 7 da sentença, conexos com a concessão, com a remoção do painel e o respetivo acordo entre a Recorrente Estradas de Portugal e a Recorrida N....

Insurge-se a Recorrente com a decisão tomada quanto a estes factos, que integram a matéria de facto que o tribunal a quo julgou não provada, porém, sem razão.

E isto, porque, na verdade, a Recorrente Estradas de Portugal não logrou provar a existência de tal acordo entre si e a Recorrida N... quanto à remoção da placa de sinalização em apreço através da prova testemunhal produzida, sendo de realçar o resultado da acareação efetuada entre a testemunha J..., por si indicado, e a testemunha J..., indicado pela Recorrida N....

Acresce que o único documento junto aos autos que refere explicitamente a existência de um compromisso/acordo entre as partes sobre este aspeto, tem data posterior à notícia que a Recorrente teve do acidente em causa nos presentes autos (cfr. factos 13), 14), 15) e 40), circunstância que este tribunal aprecia livremente, mas que não pode deixar de valorar no mesmo sentido em que o tribunal a quo o fez, razões pelas quais terá de improceder a impugnação destes factos.

iii) Do erro de julgamento de direito em que incorre a sentença recorrida, que a Recorrente Estradas de Portugal identifica do seguinte modo:

A fls. 12 e 18 e a que dará a referência a) e f) da culpa do lesado;

A fls. 14 e a que dará a referência b) da placa de pré-sinalização;

A fls. 16 e a que dará a referência c) do passeio;

A fls. 16, também, e a que chamará d) da N... no local;

A fls. 17, a que chamará e) dos Serviços da Ré e da N....

Vejamos cada um por sua vez.

a) Da culpa do lesado

Alega a Recorrente que «(…) o Autor teve influência direta no seu acidente pedonal já que, em vez de olhar em frente, ia com os olhos virados para o chão, ou seja, circulava de modo temerário, peio que poderia até ter chocado com outras pessoas clientes da N..., materiais que estivessem a ser transportados em mão para tal empresa, cargas ou outros obstáculos (…). Tivesse o autor atenção ao caminhar, olhando para o espaço à sua frente e desviar-se-ia do objecto que, só parcialmente, estava sobre a via, ou seja, nem sequer ocupava a largura do passeio. (…) o douto tribunal considerou a atitude pedonal adotada pelo que atribuiu culpa leve à EP e chega no penúltimo parágrafo de fls. 12 a referir a possível culpa do lesado mas não segue depois o raciocínio no sentido de julgar que este foi o responsável pelo acidente porque deveria olhar para a frente e não para o chão, ou, peio menos, o principal culpado no evento danoso (…)».

Mas sem razão.

Resulta da matéria de facto provada que no dia e hora do acidente caia uma chuva miudinha, puxada a vento (cfr. facto 4)), que o acidente ocorreu em fevereiro, mês de Inverno, circunstâncias que justificam uma alteração da postura ao caminhar, normalmente defensiva, mais reclinada ou inclinada, pelo que, segundo as regras da experiência comum, qualquer pessoa, colocada que fosse na situação do A. naquele dia, e naquelas circunstâncias, poderia ter embatido com um obstáculo que se atravessasse na zona pedonal, em regra, sem obstáculos à altura das suas cabeças, situação que a Recorrente admite ser de evitar, embora não diretamente, no vício seguinte que imputa à sentença recorrida, como veremos.

Improcede, assim, o imputado erro de direito referente à culpa do lesado.

2. Das placas de direção

Sobre este aspeto invoca a Recorrente o seguinte «(…) no parágrafo 2.º de fls. 14 da sentença o tribunal a quo refere legislação mas não o faz correctamente, com todo o respeito já que ao contrário do que afirma, estamos perante uma placa de pré-sinalização, não um sinal de trânsito de perigo ou outro, pelo que a mesma deve estar colocada do lado direito da faixa de rodagem a uma altura que seja adequada à visão dos condutores (sentados nas viaturas) pelo que lhes é aplicável, a estas pré-sinalizações, o disposto no n° 9 do Artigo 13° do Regulamento de Sinalização do Trânsito; (…) tais placas podem estar colocadas nos terrenos fora da faixa de rodagem, à margem das ENs a uma altura inferior a 2,20 mts, até a uma altura inferior a 1,50 mts, para possibilitar a leitura no campo visual direto dos condutores, quando em condução das suas viaturas, por serem de pré-sinalização e não de perigos ou de obrigações os quais, esses sim, colocados nos passeios deverão ser altos por causa dos peões (que, não poucas vezes, desatentos, distraídos, embatem nos seus postes).

Mas sem razão, na medida em que, pese embora à referência textual a “sinais de trânsito”, a verdade é que as referências legislativas constantes da sentença recorrida acabam por se reconduzir à norma citada pela Recorrente, designadamente, o art. 13° do Regulamento de Sinalização do Trânsito, na redação em vigor à data dos factos, sendo que, sempre este tribunal às mesmas não estaria vinculado, pelo que se esclarece que além do n.º 8 citado e transcrito na sentença, terá de se atender também ao n.º 9 do mesmo art. 13.º, invocado pela Recorrente, a saber:

«(…) 8. A altura referida no número anterior deve respeitar os seguintes valores: a) Fora das localidades — 150 cm; b) Dentro das localidades ou quando o sinal está colocado em cruzamentos, entroncamentos ou rotundas, sobre passeios ou vias destinadas a peões — não inferior a 220 cm; c) Sinais colocados sobre a via — não inferior a 550 cm.

9 — Exceptuam-se do disposto no número anterior os sinais de direcção e os sinais complementares, que podem ser colocados à altura mais conveniente, atendendo à sua localização.»

3. Da placa de pré-sinalização e da construção do passeio no local e dos serviços da Recorrente Estradas de Portugal e da Recorrida N....

Sobre estes aspetos alega a Recorrente que: «(…) A sentença errou no julgamento de direito ao condenar a EP por factos relacionados com a construção do passeio (…)» (cfr. conclusão XXV a XXXIII), e com razão.

Nesta parte, a sentença tem de ser revogada coerentemente com a decisão que se tomou quanto aos factos 32) a 34) supra.

E, julgando em substituição, adianta-se desde já que a responsabilidade da Recorrente e da Recorrida N..., relativamente ao acidente ocorrido não deixa de poder ser apurada se se desconsiderarem tais factos in illo tempore, que, embora pudessem trazer alguma luz a todo este caso, não são essenciais para o efeito, como se pretende demonstrar, recorrendo à restante matéria de facto provada e provada.

Resulta, assim, da matéria de facto provada, na parte que aqui releva, o seguinte:

«(…)

3) No dia 04/02/2010, cerca das 12H, o Autor saiu das instalações da N... - Peças e Acessórios para Automóvel, SA, [N...], sitas na Estrada n° 2..., ao km 14,500, em Sintra, e seguiu, a pé, no sentido Nascente/Poente, pelo passeio dos peões, que ladeia aquelas instalações, em direcção à rotunda que se situa um pouco mais à frente.

4) Nesse dia 04/02/2010 e hora, no local caía uma chuva miudinha, puxada a vento.

5) Nessa ocasião e lugar, a referida Estrada n° 2..., ao km 14,500, em Sintra, era da jurisdição da Ré, EP-Estradas de Portugal, SA.

6) Naquela ocasião, na referida Estrada n° 249, ao referido km 14,500, a Ré possuía a placa metálica de sinalização de trânsito, representada nas fotos de fls. 16, 17, 62, 63, e ainda nas fotos de fls. 219 e 220, bem como de fls. 15 e 16, do PA anexo, colocada em parte sobre o passeio destinado aos peões, no qual caminhava o Autor.

7) A referida placa metálica de sinalização de trânsito foi ali colocada, sob jurisdição da Ré, aquando da construção do IC-19 e dos respectivos ramais de acesso, nos anos 90.

8) No referido dia 04/02/2010, cerca das 12H, quando, como supra referido, o Autor seguia, a pé, no sentido Nascente/Poente, caminhando pelo passeio, o mesmo embateu com a cara, face esquerda e sobretudo com a vista esquerda na dita placa de sinalização, que se encontrava em cima do passeio conforme a representação fotográfica já referida. [em 6)]

(…)

35) Em 02/06/2009, aquando da construção das instalações da N..., esta solicitou à Ré, através do "mail" de fls. 48-A e foto de fls. 49, do PA, em face da informação da Câmara Municipal de Sintra, «a deslocação da placa de sinalização, o mais breve possível» uma vez que se encontrava na «propriedade» da N..., localizada em M…», indicando os contactos Eng J....

36) Em 09/06/2009, a N..., na qualidade de proprietária do terreno, solicitou de novo à Ré «que seja retirada a placa que consta da foto anexa», pelo mail de fls. 48 do PA.

(…).»

Assim como resultou não provado que:

«- Que a concessão pela Ré à N... da licença de acesso à via rodoviária tivesse sido efectuada mediante as «condições protocoladas» e que uma das principais obrigações da N..., ao abrigo do protocolo, era a da retirada, do local, do painel dos autos.

- Que a remoção do painel/placa tenha sido encargo assumido pela N....

- Que tivesse sido celebrado qualquer ' protocolo' ou acordo entre a Ré e a N... pelo qual esta tivesse assumido a obrigação de retirar ou mudar de local a placa em causa.»

Vejamos.

O regime que resulta da Lei n.º 67/2007, de 31.12, no que respeita à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas por factos ilícitos praticados pelos seus órgãos ou agentes corresponde, no essencial, ao conceito civilista de idêntica responsabilidade consagrada no art. 483.º, n.º 1, do CC, que exige a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:

a) o facto do lesante, constituído por um comportamento voluntário, que pode revestir a forma de ação ou omissão – in casu, a existência de uma placa de pré-sinalização num passeio, a uma altura, abaixo dos 220 cm (cfr. fls. 16, 17, 62, 63, 219, 220 dos autos, e fls. 15 e 16 do PA), sendo, aliás, muito baixa, tendo por medida a altura de uma pessoa adulta de estatura mediana.

b) a ilicitude, traduzida na ofensa de direitos de terceiros ou disposições legais emitidas com vista à proteção de interesses alheios – in casu, a violação do disposto nos n.° 8 e 9 do art. 13° do Regulamento de Sinalização do Trânsito, na redação em vigor à data dos factos, ao disporem que: «(…) 8. A altura referida no número anterior deve respeitar os seguintes valores: a) Fora das localidades — 150 cm; b) Dentro das localidades ou quando o sinal está colocado em cruzamentos, entroncamentos ou rotundas, sobre passeios ou vias destinadas a peões — não inferior a 220 cm; c) Sinais colocados sobre a via — não inferior a 550 cm. 9 — Exceptuam-se do disposto no número anterior os sinais de direcção e os sinais complementares, que podem ser colocados à altura mais conveniente, atendendo à sua localização.» Sendo que, resultando provado que no dia do acidente, existia uma placa de pré-sinalização colocada num passeio, a sua altura nunca poderia ser inferior 220 cm., nos termos das disposições legais citadas.

c) a culpa, nexo de imputação ético-jurídica que, na forma de mera culpa, traduz a censura dirigida ao autor do facto por não ter usado da diligência que teria um homem normal perante as circunstâncias do caso concreto; por seu turno, na Lei n.º 67/2007, no art. 10.º, n.º 3, consagra uma presunção de culpa leve sempre que tenha havido incumprimento dos deveres de vigilância, ou seja, consagra uma presunção de culpa “in vigilandum”, em termos semelhantes às previstas no art. 493.º, n.º 1, do CC. – in casu, impendia sobre a Recorrente Estradas de Portugal uma presunção de culpa, que não logrou ilidir (cfr factos não provados).

Mas também a Recorrida N..., que na mesma data em que avisou a Recorrente da situação que existia numa das extremas da sua propriedade e consciente da situação de perigo que a mesma implicava, nada fez para sinalizar tal perigo até que a placa fosse retirada pela Recorrente, retirada essa que só veio a ocorrer depois do acidente (cfr. facto 42)).

Na verdade, na ausência de prova de factos que afastem a presunção de culpa (e ilicitude) prevista no n.º 1 do art. 493.º, do CC, aqui aplicável à Recorrida N..., pois este impende, em regra, sobre o proprietário, mas também sobre quem está obrigado à vigilância da coisa (que pode não ser o proprietário, mas quem detenha o poder de facto sobre a mesma e esteja obrigado a vigiá-la) (5), responde pelos danos causados ao lesado pela coisa, pois que, em tal hipótese, concorrem todos os pressupostos da responsabilidade aquiliana, ou seja, facto, ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano sobrevindo.

Ora, dúvidas não há que a placa de pré-sinalização que foi causa do acidente, embora seja propriedade da Recorrente, estava situada na propriedade da Recorrida N..., pelo que, a ambas caberia ter agido em tempo oportuno – se não antes, pelo menos em 2009 (cfr. factos 35) e 36)) – não o tendo feito, agiram com culpa, a primeira, por não ter retirado/substituído a placa e/ou sinalizado o perigo – não tendo ilidido a presunção que decorre do n.º 3 do art. 10.º da Lei n.º 67/2007; e a segunda, por não ter sinalizado o perigo, pois, enquanto proprietária do terreno no qual estava implantada a placa de pré-sinalização, que se atravessava no passeio, era quem estava em melhores condições de o fazer – não tendo ilidido a presunção que decorre do art. 493.º, n.º 1, do CC. Na verdade, duas atuações se podiam prever da parte da Recorrida N..., a que concretizou, solicitando a remoção da placa à Recorrente Estradas de Portugal, enquanto proprietária da mesma (cfr. factos 35) e 36)), e a que não concretizou, ao não sinalizar o perigo que resultava da localização de uma placa no seu terreno que se alongava para o passeio e que colocava notoriamente em perigo os peões, designadamente, seus clientes.

Em virtude do que, conclui-se que são ambas responsáveis, Recorrente Estradas de Portugal e Recorrida N..., pelos danos causados ao Recorrido J..., sendo de aplicar o art. 497.º, do CC, não podendo manter-se, quanto à absolvição do pedido da Recorrida N..., a sentença recorrida.

d) o dano, lesão de ordem patrimonial ou não patrimonial, só havendo direito a indemnização, no caso desta última, quando o dano pela sua gravidade, avaliada segundo um padrão objetivo e não à luz de fatores subjetivos, mereça tutela do direito – in casu, a Recorrente questiona o valor atribuído aos danos não patrimoniais, que considera excessivo, sendo que o recurso à equidade não vem questionado pela Recorrente, mas apenas o montante arbitrado. Nada mais é dito/concretizado. Ou seja, nenhum vício aponta ao concretamente decidido, apenas discordando do valor fixado, mas sem que se perceba as razões da sua divergência, pois que, em bom rigor, nenhuma vem identificada. Neste particular, o que o recurso evidencia é que nenhuma crítica concreta vem imputada ao decidido (v. conclusão XXXV) das alegações da Recorrente). Pelo que a decisão tomada pelo tribunal a quo se deve manter.

e) e, por fim, o nexo de causalidade entre a conduta e o dano, apurado segundo a teoria da causalidade adequada, a que a Recorrente Estradas de Portugal apenas contrapõe, conclusivamente, que não existe, mas sem demonstrar em que termos, pelo que se considera que nenhuma crítica concreta vem imputada ao decidido (v. conclusão XXXV) das alegações da Recorrente, e, bem assim, porque com esta questão relacionada, cfr. o supra decidido relativamente à impugnação dos factos 23) a 29), na alínea iii) a fls. 40 supra). Pelo que, também quanto a este aspeto, a decisão recorrida se deve manter.

Nestes termos e face a todo o exposto, tendo a sentença recorrida concluído para condenação da Recorrente Estradas de Portugal e absolvição da Interveniente N..., essa decisão não se pode para manter, face à conclusão tirada no presente aresto de que são ambas responsáveis, Recorrente Estradas de Portugal e Recorrida N..., pelos danos causados ao Recorrido J..., sendo de aplicar o art. 497.º, do CC.

Porém, a Recorrida N... não pode ser condenada no âmbito do presente processo, atentos os termos em que foi admitida a sua intervenção acessória, ao abrigo dos art.s 330.º e ss. do CPC, atuais art. 321.º e ss. – cfr. despacho de de 10.07.2013 -, não obstante, ao abrigo do nº 4 do art. 323º, do CPC, ex vi art. 1.º do CPTA, a sentença proferida constitui caso julgado quanto ao chamado, nos termos previstos no artigo 332º, relativamente às questões de que dependa o direito de regresso do autor do chamamento, por este invocável em ulterior ação de indemnização.

III. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da secção de contencioso administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder parcial provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida na parte em que absolveu do pedido a interveniente acessória N....

Custas na 1.ª instância, na proporção do decaimento, que se fixa em 69,34% para a Ré Estradas de Portugal e em 30,65% para o então A., J..., e, em sede de recurso, pela Recorrente Estradas de Portugal e Recorrida N..., em partes iguais.

Notifique nos termos habituais, considerando-se que no presente processo, porque não urgente, os respetivos prazos para a prática de atos processuais pelas partes estão suspensos (cfr. art. 7.º, n.º 1, da Lei n.º 1-A/2020, de 19.03, na redação dada pela Lei n.º 4-A/2020, de 06.04.).

Lisboa, 14.05.2020.


Dora Lucas Neto

Pedro Nuno Figueiredo

Ana Cristina Lameira


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(1) Neste sentido, havendo impugnação da matéria de facto, com recurso à gravação da prova, o recorrente vê alargado o prazo geral de recurso em mais 10 dias para apresentar as suas alegações – art.s 638º, n.º 1 e 7 e 640º, ambos do CPC, ex vi art. 140.º, n.º 3, do CPTA. Este alargamento tem justificação no facto de permitir ao recorrente ouvir a prova gravada e proceder à identificação precisa e separada dos depoimentos e cumprir as especificações processuais exigidas.

(2) v. neste sentido, A. ABRANTES GERALDES, "Recursos no Novo Código de Processo Civil", 2ª edição, pgs. 132-135; e, na jurisprudência recente, ac. TRPorto, de 01.07.2019, P. 19413/18.

(3) Cfr. ac. STJ, de 12.01.2006, P. 05S2846.

(4) MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 1976, pgs. 199-200.

(5) Neste sentido v., a título de exemplo, ac. TRPorto, de 01.07.2019, P. 19413/18.5T8PRT.P1.