Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:839/15.2BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:09/28/2017
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:INTIMAÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE INFORMAÇÕES, CONSULTA DE PROCESSOS OU PASSAGEM DE CERTIDÕES
Sumário:A intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, regulada no artigo 104º do CPTA, é inequivocamente aplicável em matéria tributária, como resulta do artigo 49º, nº1, alínea e), vi, do ETAF, alusivo à competência dos tribunais tributários
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1 - RELATÓRIO

O Município de Sintra, inconformado com a decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que, no âmbito da impugnação judicial nº 839/15.2 BELLE, declarou a “nulidade por erro na forma do processo” e rejeitou a impugnação deduzida, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional.

Formula, para tanto, as seguintes conclusões:
                                                                     A)
A Recorrente deduziu, em 9 de Novembro de 2015, uma impugnação judicial relativamente à decisão da Directora de Serviços de Justiça Tributária da Administração Tributária e Aduaneira, de 10 de Julho de 2015, que indeferiu parcialmente o Recurso Hierárquico que interpôs contra o acto do Chefe de Serviço de Finanças de ..., que, por sua vez, lhe havia indeferido um pedido de informações sobre uma contribuinte por considerar estarem abrangidas pelo dever de sigilo.

B)
Como decorre da lei, nomeadamente do disposto do artº144º do Código do Processo Civil, a impugnação judicial deve ter-se como apresentada, não na data da sua recepção pelos serviços tributários, mas na data da efectivação do respectivo registo postal.
C)
Contrariamente ao referido na sentença recorrida, o artº146º nºl do CPPT não prevê qualquer processo relativo à prestação de informações, já que os meios processuais acessórios previstos são a intimação para consulta de documentos e passagem de certidões.
D)
Como decorre do pedido, a situação objecto de litígio não visa o acesso a documentos nem passagem de certidões, apenas a prestação de simples informações.
E)
O pedido apresentado na acção proposta corresponde a:
"(...) Termos em que:
Deverá a decisão impugnada ser revogada, por ilegal, substituindo-se por outra, que contemple a prestação das informações requeridas, nos termos acima peticionados. "
F)
Em função da situação em causa, é manifesta a natureza tributária da matéria em causa respeitante ao sigilo fiscal e ao próprio conceito de Administração Tributária, reguladas na Lei Geral Tributária.
G)
Como decorre da alínea c), a impugnação tributária não é um meio processual exclusivo de situações em que é posta em causa a liquidação de tributos ou a fixação da matéria colectável, já que também vem legalmente prevista e contemplada para a apreciação de indeferimentos de reclamações graciosas dos atos tributários.
H)
Por outro lado, a lei também não exige que os actos tributários previstos in fine na alínea c) do nº1 do artº 97 do CPPT respeitem a matérias que envolvam a liquidação de tributos ou a fixação da matéria colectável.
J)
Isso mesmo, já foi doutamente determinado pelo Supremo Tribunal Administrativo, conforme Acórdão do STA, de 02.04.2009, 2ª Secção, Processo 0125/09, Relator António Calhau;
K)
O facto de a presente impugnação não ter sido deduzida na sequência do indeferimento duma reclamação graciosa, mas dum recurso hierárquico, não pode constituir fundamento bastante, que justifique o afastamento ou a inaplicabilidade do meio processual lançado, da impugnação judicial.
L)
Isso mesmo, redundaria numa violação do princípio da igualdade, sendo portanto, legalmente inadmissível, já que uma decisão nesse sentido apenas se poderia fundamentar à luz de aspectos meramente formais, sem qualquer substância ou substracto lógica subjacente. Cfr. Artº 97º nº1 c) CPPT
M)
Termos em que o Tribunal A quo deveria ter concluído que a Impugnação Judicial constitui um meio processualmente idóneo para o conhecimento da questão em apreço.
Sem prescindir, subsidiariamente,
N)
Contrariamente ao que o Tribunal A quo refere, a acção para a prestação de informações não vem prevista no Código do Procedimento e Processo Tributário, e muito menos no artº 146º do CPPT.
O)
Como decorre do pedido supra mencionado, não estará em causa a consulta de documentos, a passagem de certidões, a produção antecipada de prova e de execução de julgados.
P)
Nos termos do disposto no nº2 do artº97º do CPPT, "o recurso contencioso dos actos administrativos em matéria tributária, que não comportem a apreciação do acto de liquidação, da autoria da administração tributária, é regulado pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos.
Q)
A Remissão aqui efectuada para o regime do contencioso de anulação dos actos administrativos deverá ser considerada feita para o regime da impugnação dos actos administrativos previsto nos art 50º e seguintes do CPTA.
R)
Como decorre da lei, no âmbito desta acção cabem os seguintes pedidos principais, com correspondência ao que foi peticionado na situação em apreço: anulação de um acto administrativo;
S)
Naturalmente, entre as matérias que devam ser apreciadas nesta sede, refere-se os actos administrativos de natureza tributária que não envolvam a apreciação de questões relacionadas com a legalidade da liquidação de tributos. Cfr.Artº 97º n º2 CPPT.
T)
Na  hipótese  de  não se entender  de que  a  impugnação judicial  constitui  um meio processualmente idóneo para a apreciação da situação em causa, dever-se-á concluir que o meio processual a empregar deverá ser a mencionada impugnação do acto administrativo previsto no artº 50º e seguintes do CPTA, em detrimento da intimação para prestação de informações referenciada na sentença recorrida.
U)
Assim não se entendendo, o que apenas por mera cautela de patrocínio se pondera, dever­ se-á considerar como processualmente adequada a acção administrativa para a prática de ato devido, prevista nos artºs 66º e seguintes do CPTA;
V)
Atendendo ao momento em que a impugnação em causa foi apresentada (09.11.2015), nada (nem mesmo a tempestividade) impedia a que o processo fosse convolado no meio processual tido como adequado.
X)
Como decorre da lei, qualquer dos meios processuais acima indicados prevê o mesmo prazo de 90 dias, seguido e respeitado pelo Recorrente para a apresentação da impugnação judicial apresentada.

                                                                       Termos em que a sentença recorrida deverá ser revogada, substituindo-se por outra que, nos termos acima peticionados, reconheça a impugnação judicial como meio processualmente válido ou, subsidiariamente, reconheça como meio processualmente adequado a acção para impugnação de acto administrativo ou, assim não se entendendo, a acção administrativa para condenação à prática de acto devido.

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Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de este TCA ser hierarquicamente incompetente para o conhecimento do recurso.

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A, então, Relatora do processo proferiu decisão declarando este Tribunal incompetente em razão da hierarquia.

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Já no STA, o Exmo. Juiz Conselheiro Relator proferiu decisão, nos termos da qual julgou o STA incompetente em razão da hierarquia e declarou competente este TCA Sul, ordenando a remessa dos autos em conformidade.

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Distribuídos os autos à ora Relatora, foi dada nova vista ao EMMP, tendo o mesmo tomado posição no sentido de acolher o parecer do EMMP junto do STA, ou seja, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*

Dispensando-se os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.

*
Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim sendo, a questão que constitui objecto do presente recurso consiste em saber se a decisão de rejeição da impugnação judicial encerra um erro ao considerar verificar-se a nulidade correspondente ao erro na forma processual utilizada – a impugnação judicial – não passível de convolação.

Antes, porém, haverá que apreciar o alegado erro verificado na matéria de facto, quanto à data em que a impugnação judicial foi deduzida, já que, contrariamente ao fixado pelo Mmo. Juiz a quo, a Recorrente entende que a data a considerar corresponde ao dia 09/11/15 (e não o dia 10/11/15).

2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

Não tendo a decisão recorrida autonomizado expressamente a matéria de facto relevante, importa que deixemos devida nota do teor da referida decisão que infra se transcreve.

Assim:


“I

MUNICÍPIO DE SINTRA, com o número de identificação fiscal 680.000.054, vem impugnar a  decisão da Directora da Direcção de Serviços de Justiça Tributária da Administração Tributária  e Aduaneira, de 10 de Julho de 2015, que lhe indeferiu parcialmente o  Recurso  Hierárquico  que interpôs contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de ... que, por sua vez, lhe havia indeferido um pedido de informações sobre uma contribuinte por considerar estarem abrangidas pelo dever de sigilo, por força do artigo 64.º da Lei Geral Tributária.

Alega, em síntese, que no exercício das competências que a lei lhe confere enquanto órgão  de execução fiscal solicitou ao Serviço de Finanças as seguintes informações: se existiam de créditos de IVA e de Imposto sobre o Rendimento; se no último ano alguma entidade apresentou declaração anual em que a Executada constasse como beneficiária de rendimentos e, em caso afirmativo, a identificação dessa entidade; quais os bens imóveis registados em nome da Executada, constantes da base de dados do IMI; quais as matrículas associadas ao Imposto de Circulação; e qual o actual domicílio fiscal e/ou morada do cadastro da Executada.

Pede a anulação da decisão impugnada – que apenas lhe facultou o domicílio fiscal - e a sua substituição por outra que contemple a prestação das informações  requeridas.


II.

A Impugnação Judicial é o meio processual adequado para obter a declaração de nulidade ou a anulação de actos de liquidação de tributos – artigo 99.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

O acto em crise nos autos não é um acto de liquidação, mas um acto administrativo em questão tributária que indeferiu parcialmente o pedido de prestação de  informações  sobre  uma contribuinte.

Ora, o meio processual adequado para obter a prestação de informações  é  o  previsto genericamente no ponto vi) da alínea e) do n.º 1 do artigo 49.º (Competência dos Tribunais Tributários) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais e, em concreto, no artigo 146.º, n.º 1, do CPPT que, sendo regulado “pelo disposto nas normas sobre o  processo  nos  tribunais administrativos”, remete para a Intimação para a Prestação de Informações  regulada  nos  artigos 104.º e seguintes do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Há, pois, erro na forma  do processo.


*

Dispõem os artigos 98.º, n.º 4, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e 97.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária, que se ordenará a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei.

Como referem LEITE DE CAMPOS E OUTROS, Lei Geral Tributária anotada, nota 3 ao artigo 97.º, “o n.º 3 do preceito visa obstar a que, por via de uma errada eleição da forma de processo, o tribunal deixe de se pronunciar sobre o mérito da causa. Trata-se de uma injunção ao próprio juiz. Este só estará desonerado da obrigação de ordenar a correcção da forma de processo quando ela se mostre de todo inviável”, sendo que – nota 4 – “a solução da ‘convolação’ do processo tem sido várias vezes aflorada e decidida no contencioso tributário,  tendo-se a jurisprudência firmado no sentido da sua admissibilidade desde que o pedido formulado e a causa de pedir invocada se ajustem à forma adequada de processo e a ‘acção judicial’ não esteja caducada”, atento o princípio da proibição da prática de actos inúteis no processo, previsto no artigo 130.º do Código de Processo Civil.


*

Como se viu, consideradas as causas de pedir invocadas e o pedido formulado, o meio processual adequado à obtenção da pretensão do Impugnante é a Intimação para a Prestação de Informação, que não a Impugnação judicial.

Ora, a Intimação deve ser requerida no tribunal competente no prazo de 20 dias a contar da satisfação parcial do pedido – cfr. a alínea c) do artigo 105.º do CPTA.

Pelo que, tendo sido notificado em 10 de Agosto de 2015 – cfr. a impressão efectuada do site dos CTT relativa ao registo de fls. 22 que ora se junta aos autos -, o Impugnante dispunha de 20 dias para apresentar a Intimação.

Todavia, só reagiu em 10 de Novembro de 2015 – cfr. fls. 24 dos autos -, pelo que não é possível a convolação do processo, dada a intempestividade  da Intimação.

Assim, os autos enferma m de uma nulidade que afecta todo o processo (artigos 193.º e  198.º), excepção dilatória (artigo 577.º, alínea b)) que consequência a sua rejeição (artigo 590.º, n.º 1, todos do CPC).


III.

Termos  em que, declarando a nulidade por erro na forma  do processo, se rejeita a Impugnação. Custas pelo Impugnante - artigos 527.º do CPC e 6.º, n.º 1, do RCP”.

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2.2. De direito

            Vistas as questões a tratar, comecemos, então, pelo apontado erro de julgamento de facto.

Na decisão recorrida considerou-se que a impugnação judicial foi deduzida em 10/11/15.

A Recorrente, por seu turno, considera que a data relevante é o dia 09/11/15, já que “a impugnação judicial deve ter-se como apresentada, não na data da sua recepção pelos serviços tributários, mas na data da efectivação do respectivo registo postal” – cfr. conclusão B.

Com efeito, não sofre dúvidas que se a petição inicial de impugnação for remetida por correio, então, a data relevante a ter em conta é a da sua expedição.

No caso, contudo, não é possível concluir nos termos em que a Recorrente pretende, pois que, nem se mostra junto aos autos o envelope /vinheta com a indicação da data do registo de expedição, nem a Recorrente junta qualquer talão de registo que contrarie a data fixada pelo Mmo. Juiz, ou seja, o dia 10/11/15.

Resulta, sim, da análise dos autos que o registo de entrada da petição de impugnação no TAF de Loulé ocorreu no dia 13/11/15, data em que foi aposto o respectivo carimbo no articulado inicial, sendo também essa a data constante da menção ao registo indicada no print respeitante ao comprovativo de entrega de documento (cfr. fls. 1 e 2 dos autos).

Resulta, ainda, da análise dos autos que a impugnação judicial foi remetida por correio para o Serviço de Finanças de ... (cfr. fls. 24 e 25 dos autos), o que naturalmente ocorreu em momento anterior ao dia 13. Aliás, o ofício de remessa ao TAF da impugnação, oriundo do Serviço de Finanças, data de 11/11/15, pelo que remessa postal da impugnação à AT necessariamente ocorreu, pelo menos, no dia 10/11/15.

Ora, o dia 10/11/15, data considerada pelo Mmo. Juiz a quo, corresponde precisamente ao carimbo aposto no ofício que acompanhou a expedição da impugnação ao Serviço de Finanças de ... (cfr. fls. 24 dos autos), admitindo-se que esta menção ali tenha sido aposta pelo expedidor, ora Recorrente.

Assim sendo, não tendo o Recorrente junto qualquer prova demonstrativa da remessa da p.i através de correio expedido no dia 09/11/15, deverá considerar-se a data tida em conta na sentença, ou seja, o dia 10/11/15, por ser essa – repete-se – a data que consta do ofício de remessa ao Serviço de Finanças do articulado inicial.

Seja como for, adianta-se, desde já, que, para a decisão do presente recurso é absolutamente indiferente que a petição tenha sido remetida por correio no dia 9 ou no dia 10 de Novembro, pois que da diferença de um dia na data de expedição não resultará, em qualquer caso, uma diferente solução de direito.

Com isto dito e, como tal, estabilizada a matéria de facto, avancemos.


*

Tenhamos presente a decisão do TAF de Loulé transcrita.

A Recorrente insurge-se contra o decidido defendendo que não se verifica erro na forma processual por si utilizada, o que equivale a dizer que, para o Município de Sintra, a impugnação judicial é o meio adequado a obter a satisfação do seu pedido de revogação de decisão do recurso hierárquico, na medida em que aí não se atendeu o pedido anteriormente dirigido ao Serviço de Finanças de ... de prestação de informações sobre a situação tributária da sociedade ..., Imobiliária, Lda. Mais diz que, sendo esse o meio processual adequado, o mesmo afigura-se tempestivo.

Para o caso de assim não se entender, deve considerar-se, ainda, “que o meio processual a empregar deverá ser a mencionada impugnação do acto administrativo previsto no artº 50º e seguintes do CPTA, em detrimento da intimação para prestação de informações referenciada na sentença recorrida” ou “assim não se entendendo, (…), dever­se-á considerar como processualmente adequada a acção administrativa para a prática de ato devido, prevista nos artºs 66º e seguintes do CPTA”.

Em qualquer caso, para o Recorrente, sempre a tempestividade, para efeitos de convolação, estaria assegurada, considerando “que a impugnação em causa foi apresentada (09.11.2015)”, devendo-se tomar em linha de conta o prazo de 90 dias.

Como se verá, nenhuma razão tem o Recorrente.

Em causa está impugnação judicial deduzida contra o indeferimento parcial do recurso hierárquico interposto pelo Município de Sintra contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças que lhe indeferiu um pedido de informações relativas ao contribuinte ... Imobiliária, Lda, com fundamento em tratar-se de informação coberta pelo dever de sigilo.

Inicialmente, a ora Recorrente havia solicitado ao Serviço de Finanças as seguintes informações: se existiam de créditos de IVA e de Imposto sobre o Rendimento; se no último ano alguma entidade apresentou declaração anual em que a Executada constasse como beneficiária de rendimentos e, em caso afirmativo, a identificação dessa entidade; quais os bens imóveis registados em nome da Executada, constantes da base de dados do IMI; quais as matrículas associadas ao Imposto de Circulação; e qual o actual domicílio fiscal e/ou morada do cadastro da Executada.

Em sede de recurso hierárquico da decisão de indeferimento proferida pelo Chefe de Finanças, foi parcialmente satisfeita a pretensão da requerente, concretamente quanto à informação sobre o domicílio fiscal da sociedade visada, indeferindo-se o recurso quanto ao mais.

É este o despacho objecto da impugnação judicial, deduzida com expressa invocação do artigo 102º do CPPT.

Como salienta Jorge Lopes de Sousa, in CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO, ANOTADO, 6ª edição, Vol. II, Áreas Editora, págs. 107 e 108, «... o processo de impugnação será de utilizar quando o acto a impugnar é um acto de liquidação ou um acto administrativo que comporta a apreciação de um acto desse tipo e, relativamente a actos de outro tipo, quando a lei utilizar o termo «impugnação» para referenciar o meio processual a utilizar.

Assim, podem ser objecto de impugnação judicial, nalguns casos com inclusão de algumas normas especiais, os seguintes actos:

 - actos de liquidação dos tributos, incluindo os actos de autoliquidação, de retenção na fonte e pagamento por conta [art. 97.º, n.º l, alínea a), do CPPT e 95.º, n.º 1, alínea a), da L.G.T.

 - actos de fixação da matéria tributável, quando não haja lugar a liquidação (casos em que houve prejuízos) [art. 97.º, n.º 1, alínea b), do CPPT e 95.º, n.º l, alínea c), da L.G.T.];

 - actos de indeferimento total ou parcial de reclamações graciosas de actos tributários [art. 97.º, n.º 1, alínea c), do CPPT e 95.º, n.º 1, alínea d), da L.G.T.] ;

 - actos administrativos que comportem a apreciação da legalidade de actos de liquidação (como os actos que apreciem recursos hierárquicos interpostos de decisões de indeferimento de reclamações graciosas e os que recusem a revisão de actos tributários) [art. 97.º, n.º 1, alínea d), do CPPT e 95.º, n.º 1, alínea d), da L.G.T.];

 - actos que decidam agravamentos à colecta, por falta de fundamento razoável de reclamação ou recurso hierárquico (como os previstos nos arts. 91.º, n.ºs 9 e 10, da L.G.T. e 77.º, n.º 3, deste Código) [art. 97.º, n.º 1, alínea e), do CPPT e 95.º, n.º 1, alínea e), da L.G.T.];

 - impugnação dos actos de fixação de valores patrimoniais (com as especialidades constantes do art. 134.º deste Código) [art. 97.º, n.º 1, alínea, deste Código e 95.º, n.º 1, alínea b), da L.G.T.];

 - impugnação de providências cautelares adoptadas pela administração tributária (com as especialidades que constam do art. 144.º) [art. 97.º, n.º 1, alínea g), do CPPT];

 -a impugnação dos actos de apreensão (art. 143.º do CPPT)».

Porque a cada direito corresponde um meio processual de o fazer valer em juízo, a questão colocada pelo impugnante (obtenção de informações de natureza tributária sobre determinado contribuinte) não pode ser conhecida em processo de impugnação judicial, cujos fundamentos se encontram previstos no artigo 102º do CPPT e se referem, exclusivamente, aos vícios dos actos tributários que constituem o seu objecto.

Portanto, como está bem de ver, o pedido visado pela aqui Recorrente não é adequado ao meio processual escolhido – de impugnação judicial – sendo certo que é pelo pedido que se deve aferir da adequação - ou falta dela - da forma processual utilizada.

Havendo erro na forma de processo, como no caso é patente, cabe ao Tribunal ordenar a convolação para a forma processual adequada, a menos que a mesma se mostre inviável, o que ocorre, desde logo, se a petição inicial for intempestiva em face do meio processual considerado idóneo – cfr. artigos 98º, nº4 do CPPT e 97º, nºs 2 e 3 da LGT.

No caso sub judice, como se retira da decisão, o Mmo. Juiz a quo considerou – e bem, diga-se - como forma processual adequada à pretensão da impetrante a Intimação para a Prestação de Informações, regulada no artigo 104º do CPTA, nos termos do qual “Quando não seja dada integral satisfação a pedidos formulados no exercício do direito à informação procedimental ou do direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, o interessado pode requerer a correspondente intimação, nos termos e com os efeitos previstos na presente secção” (nº1).

Com efeito, como evidencia o EMMP junto do STA, “o acesso à informação não procedimental, constitui, a par do acesso à informação procedimental, uma garantia constitucional (artigo 268º, nºs 1 e 2 da CRP).

À luz do princípio da tipicidade das formas processuais é a Intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões e não a acção administrativa para condenação à prática de acto devido, o meio específico e adequado para se obter a tutela judicial desse direito quando, como é o caso, não seja dada integral satisfação aos pedidos formulados.

Com efeito, o que está em causa nos autos é a obtenção pela Impugnante, ora Recorrente, das informações que pediu ao SF de ..., o que se reconduz a uma prestação de facto, e não a prolação de qualquer acto administrativo em matéria tributária que legalmente seja devido”.

A intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões, regulada no artigo 104º do CPTA, é inequivocamente aplicável em matéria tributária, como resulta do artigo 49º, nº1, alínea e), vi, do ETAF, alusivo à competência dos tribunais tributários – “1 - Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, compete aos tribunais tributários conhecer: e) Dos seguintes pedidos: vi) De intimação de qualquer autoridade fiscal para facultar a consulta de documentos ou processos, passar certidões e prestar informações”.

Neste sentido, veja-se J. Lopes de Sousa, obra citada, Vol. II, pag. 512, segundo o qual “Apesar de no CPTA não se incluir, relativamente a estes meios processuais, uma norma idêntica ao seu art. 191 .°, em que se redireccionam para a acção administrativa especial as remissões para o recurso contencioso, é inequívoco que é o processo de «intimação para a prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões» previsto no CPTA tem aplicação em matéria tributária, pois o ETAF de 2002, nos arts. 49.°, n.4 1, alínea e), subalínea vi), e 49.4-A, n.4 3, alínea e), subalínea iv), prevê a competência dos tribunais tributários para o conhecimento dos pedidos de «intimação de qualquer autoridade fiscal para facultar a consulta de documentos ou processos, passar certidões e prestar informações» e não há qualquer norma nas leis tributárias que preveja o regime de tal meio processual.

Por isso, sendo as normas sobre processo nos tribunais administrativos de aplicação subsidiária no processo tributário [art. 2.º, alínea c), da LGT e 2.º, alínea c), do CPPT], deverá aplicar-se aquele meio processual previsto no CPTA, abrangendo não só a consulta de documentos e processos e à passagem de certidões, mas também à prestação de informações”.

Assente que a intimação para a prestação de informações era, no caso, o meio adequado a satisfazer a pretensão do ora Recorrente, colocava-se a questão da tempestividade desse meio, para efeitos de aferir da possibilidade de convolação.

E, aqui, novamente a resposta há-de ser negativa, com isso se confirmando a linha argumentativa seguida na sentença recorrida.

Vejamos.

Na sequência da apresentação à administração tributária de um pedido de prestação de informações, o requerente pode pedir ao tribunal tributário a intimação da autoridade para satisfazer o seu pedido se, decorrido o prazo legal que for aplicável, as informações não forem prestadas ou se for indeferido o respectivo pedido ou se lhe for dada satisfação parcial (neste sentido, J. Lopes de Sousa, obra citada, pág. 513).

Ora, o prazo para requerer a intimação judicial é de 20 dias, a contar do termo do prazo, ou do indeferimento ou da satisfação parcial - arts. 105º do CPTA e 146.°, n.°3, do CPPT - “Quando o interessado faça valer o direito à informação procedimental ou o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, a intimação deve ser requerida no prazo de 20 dias, a contar da verificação de qualquer dos seguintes factos: a) Decurso do prazo legalmente estabelecido, sem que a entidade requerida satisfaça o pedido que lhe foi dirigido; b) Indeferimento do pedido; c) Satisfação parcial do pedido”.

Resulta da análise dos autos e consta da decisão recorrida (sem que tal tenha sido posto em causa pelo Recorrente) que o indeferimento parcial da pretensão deduzida no recurso hierárquico lhe foi notificado em 10/08/15 (cfr. fls. 22 e 29).

Por seu turno, a impugnação judicial foi deduzida em 10/11/15.

Destes dois factos se conclui, sem hesitações, que, à data em que a p.i de impugnação foi apresentada, há muito que se mostrava ultrapassado o prazo de 20 dias legalmente estabelecido para a Intimação para a prestação de informações.

Como está bom de ver, à mesma conclusão se chegaria ainda que tivesse ficado provado que a data de expedição, por correio, do articulado de impugnação correspondia ao dia 09/11/15.

Portanto, tal como decidido, a convolação afigura-se incontornavelmente inviável, por razões de (in)tempestividade.

E, assim sendo, como é, perante a nulidade a que corresponde o erro na forma do processo, sem possibilidade de convolação, conclui-se que bem andou o Mmo. Juiz a quo ao decidir nos termos em que o fez, rejeitando liminarmente a p.i.

Tanto basta, pois, para concluir que não pode o recurso ser provido, considerando-se improcedentes todas as conclusões da alegação do recurso, mantendo-se a decisão recorrida que decidiu no sentido da verificação do erro na forma de processo, sem possibilidade de convolação da impugnação judicial em intimação para a prestação de informações.


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3. DECISÃO

Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 28 de Setembro de 2017


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(Catarina Almeida e Sousa)

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(Bárbara Teles)

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(Jorge Cortês)