Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07252/11
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:05/23/2013
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:MODIFICAÇÃO OBJECTIVA DE INSTÂNCIA, ARTº 63º DO CPTA, IMPUGNAÇÃO DE ACTO REVOGATÓRIO
Sumário:I. O artº 63º do CPTA, com a epígrafe “Modificação objectiva de instância”, veio admitir a ampliação da instância mediante cumulação superveniente de pedidos, isto é, uma alteração que ocorre estando pendente a acção.

II. Consiste a ampliação do objecto do processo numa das principais alterações introduzidas ao contencioso administrativo, enquanto corolário do princípio da flexibilidade do processo, concretizador da tutela jurisdicional efectiva que enforma o sistema judicial.

III. À luz do disposto no artº 63º do CPTA é possível cumular a impugnação de novos actos administrativos que tenham sido proferidos no âmbito do mesmo procedimento, na pendência do processo impugnatório, bem como a formulação, em acumulação, de outro tipo de pretensões.

IV. Além disso, nos termos da parte final do disposto no nº 2 do artº 63º do CPTA é possível impugnar o acto que, praticado na pendência do processo impugnatório, impede a satisfação do interesse do impugnante ou cujos efeitos se oponham à utilidade pretendida no processo.

V. O âmbito de previsão do artº 63º do CPTA é muito vasto, não exigindo que o acto primitivamente impugnado no processo se mantenha, como no presente caso, em que mediante a prática de acto revogatório na pendência da lide, foi revogado o acto inicialmente impugnado, requerendo a autora a ampliação do objecto da presente instância de forma a impugnar o acto revogatório, em relação ao qual invoca, quer vícios próprios, quer a sua invalidade consequente, por já antes, na petição inicial, ter assacado a nulidade do acto revogado.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

Rural …………… – Exploração ……………………, Lda., devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, datada de 09/11/2010, que no âmbito da acção administrativa especial instaurada contra o IPAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas indeferiu a requerida modificação objectiva da instância e o pedido do prosseguimento dos autos e declarou a inutilidade da lide, declarando-a extinta, nos termos do artº 287º alínea e) do CPC.

Formula a aqui recorrente nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“1 – Na pendência da acção o recorrido revogou o acto administrativo impugnado e em sede de contestação requereu a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, tendo a recorrente, em resposta a esta excepção, invocado a invalidade do acto de revogação e requerido a modificação objectiva da instância para apreciar tal invalidade, e, como tal, o prosseguimento dos autos, tudo ao abrigo da faculdade prevista no art. 63°, n° 2 do CPTA;

2 - A douta sentença a quo indeferiu a mencionada modificação da instância e declarou a inutilidade superveniente da lide com fundamento (único) na revogação do acto impugnado;

3 - A possibilidade de ampliar o objecto do processo prevista no art. 63° do CPTA visa assegurar que a impugnação judicial de actos administrativos abranja toda a relação jurídico-administrativa em que se insere o acto impugnado e não apenas este, o que acontece no caso sub judice pois o acto de revogação foi praticado no âmbito do mesmo procedimento administrativo em que o foi o acto impugnado, e ambos dizem respeito à mesma relação jurídica subjacente, existindo entre os dois uma relação directa;

4 - A possibilidade de ampliação do objecto a que alude o art. 63° do CPTA refere-se a situações em que é possível cumular pedidos, mas que ocorreram supervenientemente em relação ao acto impugnado, sobretudo quando impeçam a produção do efeito útil da sentença, situação que se verifica no caso dos autos;

5 - De facto, se a decisão a quo ampliasse o objecto da acção ao abrigo do disposto no art. 63° do CPTA e conhecesse da invalidade do acto de revogação declarando a sua nulidade, manter-se-ia na ordem jurídica o acto primário, e o Tribunal recorrido teria que apreciar o mérito da acção proposta pela ora recorrente, o que em caso de procedência implicaria vantagens para a ora recorrente (nomeadamente a declaração de invalidade de acto administrativo impugnado que onera a recorrente com o pagamento de uma quantia);

6 - Deste modo, não se revela in casu que é absolutamente inútil prosseguir com a lide, pelo que, ao decidir como decidiu, a sentença a quo violou o disposto no art. 287°, al. e) do CPC;

7 - E, por outro lado, ao indeferir a modificação objectiva da instância, a decisão recorrida violo o art. 63° do CPTA, e os princípios da flexibilidade da instância, da celeridade e economia processuais, do favorecimento do processo e da tutela jurisdicional efectiva.”.

Termina pedindo que seja concedido provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida.


*

O ora recorrido, notificado, apresentou contra-alegações, no âmbito das quais formulou as seguintes conclusões:

“A) O artigo 63° do CPTA não é aplicável aos casos em que, na pendência de processo destinado à impugnação de acto administrativo, seja proferido acto revogatório do mesmo;

B) O caso dos autos não é subsumível à previsão do artigo 63° do CPTA, devendo ser reconduzido ao estatuído no artigo 64° do CPTA, uma vez que o novo acto administrativo produzido é um acto de natureza revogatória;

C) Quando seja proferido, na pendência de acção destinada à impugnação de acto administrativo, acto revogatório com eficácia retroactiva, a modificação objectiva da instância apenas é admissível se aquele trouxer à relação jurídico-administrativa, nova regulação da situação;

D) No caso dos autos o acto revogatório com eficácia retroactiva não regulou a situação jurídico-administrativa;

E) Razão pela qual não é possível reconduzir a factualidade do caso sub judice à previsão do artigo 64" do CPTA, porquanto não se verifica o preenchimento do requisito ali previsto relativo à nova regulação da situação.”.


*

O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no artº 146º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*

Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1, todos do CPC ex vi artº 140º do CPTA, além das questões que são de conhecimento oficioso.

A questão suscitada resume-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida enferma de erro de julgamento de Direito, em violação dos artºs. 287º, alínea e) do CPC e 63º do CPTA.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

O Tribunal a quo deu como assentes os seguintes factos:

A – A Autora e o Réu firmaram um acordo escrito em 12.03.2004, que designaram por “Contrato de atribuição de ajuda ao abrigo do Programa Agro – Medida 1: Modernização, reconversão e diversificação das explorações agrícolas (Co-financiado pelo FEOGA – Orientação)” (cfr. doc. n.º 1 junto com a petição inicial que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

B – Em ofício do Réu com o n.º 004492/2010, de 28/04/2010, firmado pelo respectivo Sr. Vogal do Conselho Directivo, dirigido à Autora e por esta recebido, extrai-se que: “[…] Pelo exposto e em conformidade com o disposto nos art. 11º e 12º do Decreto- Lei nº 163-A/2000 de 27 de Julho, encontram-se reunidos os requisitos para a modificação unilateral do contrato com reposição da quantia de 41.410,11 € acrescida de juros contabilizados desde que as ajudas foram colocadas à sua disposição, até à data do presente ofício, perfazendo o capital e juros em dívida o montante total de 47.032,18€ considerado como indevidamente recebido, o que se determina […]” (cfr. doc. n.º 4 junto com a petição inicial que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

C – A Autora formulou um depósito autónomo a favor do IGFIJ, I.P. no valor de 47.032,81 € (cfr. doc. a fls. 74 dos presentes autos que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).

D – O Réu foi citado para os presentes autos em 21.07.2010 (cfr. fls. 75 e 82 dos autos).

E – Em ofício do Réu, datado de 24.09.2010, sob o assunto «Audiência Prévia nos termos dos artigos 100º e 101º do Código do Procedimento Administrativo», assinado pelo Sr. Vogal do Conselho Directivo do Réu, dirigido à Autora e por esta recebido, retira-se que: “[…] Na sequência da reclamação apresentada por essa Sociedade, e após a reanálise do projecto em causa, constatou-se que a decisão final proferida a coberto do citado ofício 004492/2010 padece de um vício de forma, razão pela qual, ao abrigo do disposto nos artigos 138º e seguintes do C.P.A. se procede à sua revogação […]”. Do mesmo documento extrai-se, igualmente, que: “[…] Face às irregularidades detectadas em sede de controlo administrativo supra identificado, e, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 100º e 101º do Código de Procedimento Administrativo, fica essa Sociedade notificada da intenção deste Instituto de determinar a devolução do valor indevidamente recebido, no montante de 41.410,11€, relativo a subsídio, acrescido de juros contabilizados à taxa legal desde a data de disponibilização da ajuda – 23/11/2006, até à data de elaboração do presente ofício, i.e. 6.339,72 €, perfazendo o capital e juros em dívida o montante total de 47.749,83 €, podendo informa por escrito sobre o que se lhe oferecer, no prazo máximo de dez dias úteis, contados a partir da data de recepção do presente ofício ou, supletivamente, contados a partir do terceiro dia após a data constante do carimbo de expedição dos CTT […]” (cfr. doc. n.º 1 junto com a contestação que aqui se dá, para todos os efeitos legais, como integralmente reproduzido).”.

DO DIREITO

Importa entrar na análise dos fundamentos do presente recurso jurisdicional, segundo a sua ordem de precedência.

Dirige a ora recorrente a censura à sentença recorrida, com fundamento em erro de julgamento de Direito, em violação dos artºs. 287º, alínea e) do CPC e 63º do CPTA.

Alega que na pendência da acção o recorrido revogou o acto administrativo impugnado, tendo em sede de contestação requerido a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide.

A autora, ora recorrente, em resposta, invocou a invalidade do acto de revogação e requereu a modificação objectiva da instância para apreciar essa invalidade e o prosseguimento da lide, à luz do artº 63º do CPTA.

Na sentença, foi indeferida a modificação objectiva da instância e declarada a inutilidade superveniente da lide, com fundamento na revogação do acto impugnado.

Defende que a possibilidade de ampliar o objecto do processo, prevista no artº 63º do CPTA visa assegurar que a impugnação judicial de actos administrativos abranja toda a relação jurídico-administrativa em que se insere o acto impugnado e não apenas este, o que acontece no caso sub judice, por o acto de revogação ter sido praticado no âmbito do mesmo procedimento administrativo e ambos dizem respeito à mesma relação jurídica subjacente.

No seu entender não se revela in casu, absolutamente inútil prosseguir com a lide, pelo que, ao decidir desse modo, a sentença violou o disposto no artº 287º, alínea e) do CPC.

Vejamos.

Compulsando o objecto do litígio, nos termos estruturados pelo pedido e pela causa de pedir, extrai-se que a autora veio a juízo pedir a declaração de nulidade ou a anulação do acto administrativo consubstanciado na decisão do Vogal do Conselho Directivo do IFADAP, pela qual se determinou a modificação unilateral do contrato de atribuição de ajuda ao abrigo do Programa Agro – Medida 1 e a consequente reposição voluntária de quantias percebidas pela autora ao abrigo do citado contrato – cfr. alínea B dos factos assentes.

Tal despacho veio a ser revogado, conforme demonstrado na alínea E) da selecção da matéria de facto.

Em sequência, a autora veio a juízo pelo articulado, datado de 14/10/2010, alegar a ilegalidade do acto revogatório, requerendo, por um lado, a ampliação do objecto da lide, nos termos do artº 63º do CPTA, pedindo a invalidade do acto de revogação e, por outro, firmando ainda o propósito de impugnar o acto que venha a ser praticado, nos termos do artº 64º do CPTA.

A questão objecto do presente recurso consiste, pois, em saber se procede o erro de julgamento de direito invocado contra a sentença, quanto a saber se não obstante a revogação do acto impugnado, a instância pode prosseguir, sendo possível ou, pelo menos, útil para a autora o seu prosseguimento.

Considerando o teor da alínea E) do probatório, decorre que tendo sido revogado o acto administrativo impugnado, além do acto de revogação, não foi praticado qualquer outro acto administrativo que possa ser impugnado em juízo.

À revogação do acto administrativo impugnado seguiu-se a emissão de um projecto de decisão administrativa, sendo a autora notificada em audiência prévia, nos termos do disposto no artº 100º do CPA, para sobre ele se pronunciar, mas sem que tivesse sido praticado qualquer acto administrativo que permita a sua impugnação contenciosa por parte da autora, ora recorrente, nos termos do artº 64º do CPTA.

Assim, carece se sentido a requerida ampliação da instância, nos termos do artº 64º do CPTA, porque, embora tenha sido revogado o acto impugnado, o acto revogatório não foi acompanhado de nova regulação da situação, não tendo sido praticado acto administrativo que regule a situação jurídica em causa, mas apenas projecto de decisão que, enquanto tal, carece dos requisitos de impugnabilidade contenciosa, referidos no artº 51º do CPTA.

Resta, pois, apreciar se procede o erro de julgamento assacado contra a sentença recorrida, em relação à requerida modificação objectiva da instância, à luz do disposto no artº 63º do CPTA, mediante impugnação em juízo do próprio acto de revogação.

A sentença recorrida denegou essa possibilidade, invocando a seguinte fundamentação: “A questão aqui controvertida é, agora, tão só, a de saber se é útil ou possível prosseguir a presente lide. Assim, nesta senda, veio a Autora solicitar a prossecução da presente lide ao abrigo do disposto no art.º 63.º do CPTA. Ora, o prosseguimento da lide nos casos previstos na norma citada, diz respeito a actos que venham na sequência dos actos inicialmente impugnados e que com estes primeiros se conformem. Não é certamente este o caso de um acto revogatório como o que nos surge, agora, nestes autos. Assim, este último acto destrói os efeitos do acto originalmente recorrido que, por via disso, deixa de ter existência jurídica.”.

Este juízo não se pode manter, por não se conformar com a interpretação a expender em relação ao disposto no artº 63º do CPTA.

Esse preceito que tem como epígrafe “Modificação objectiva de instância”, vem admitir a ampliação da instância, mediante cumulação superveniente de pedidos, isto é, uma alteração que ocorre estando pendente a acção.

Consiste a ampliação do objecto do processo numa das principais alterações introduzidas ao contencioso administrativo com a reforma de 2002, enquanto corolário do princípio da flexibilidade do processo, concretizador da tutela jurisdicional efectiva que enforma o sistema judicial nos termos do artº 20º da Constituição.

Como refere a doutrina, “a ampliação do objecto do processo é assim configurada em termos inteiramente inovatórios, visando assegurar que o contencioso de impugnação de actos administrativos “não se circunscreva necessariamente à apreciação da validade de um único acto administrativo, mas passe a disciplinar todo o quadro da relação judícia.administrativa em que se inscreve o acto impugnado.” – cfr. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos Almedina, 2005, pág. 318 apud Mário Aroso de Almeida “O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos”, 3ª edição, Almedina, 2004, pág. 173.

À luz do disposto no artº 63º do CPTA é possível cumular a impugnação de novos actos administrativos que tenham sido proferidos no âmbito do mesmo procedimento, na pendência do processo impugnatório, bem como a formulação, em acumulação, de outro tipo de pretensões.

Além disso, nos termos da parte final do disposto no nº 2 do artº 63º do CPTA é possível impugnar o acto que, praticado na pendência do processo impugnatório, impede a satisfação do interesse do impugnante ou cujos efeitos se oponham à utilidade pretendida no processo.

O âmbito de previsão do artº 63º do CPTA é muito vasto, não exigindo que o acto primitivamente impugnado no processo se mantenha, como no presente caso, em que mediante a prática de acto revogatório na pendência da lide, foi revogado o acto inicialmente impugnado, requerendo a autora a ampliação do objecto da presente instância de forma a impugnar o acto revogatório.

Para o efeito invoca a autora, quer vícios próprios ao acto revogatório, quer a sua invalidade consequente, por já antes, na petição inicial, ter assacado a nulidade do acto revogado e nos termos do disposto na alínea a) do nº 1 do artº 139º do CPA o acto nulo não ser susceptível de revogação.

Assim, considerando: (i) a configuração da lide, concretizada no pedido e na causa de pedir, nos termos constantes da petição inicial, (ii) o próprio teor do acto revogatório e, por último, (iii) a pronúncia que a sua prática mereceu por parte da autora, que mediante requerimento apresentado no processo vem requerer a ampliação do objecto do processo, impugnando o acto revogatório, pedindo a sua declaração de nulidade, é de entender ter a sentença procedido a errada interpretação e aplicação do disposto no artº 63º do CPTA, ao indeferir a requerida modificação objectiva da instância e em declarar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide.

A autora, ora recorrente, tem interesse em impugnar o acto revogatório, nos exactos termos que resultam da sua resposta apresentada em juízo, o que se mostra consentido nos termos do disposto no artº 63º do CPTA, o qual permite a modificação objectiva da instância em termos amplos.

Tal disposição consente a impugnação de novos actos que venham a ser praticados pela Administração, na pendência da lide, que se inseriam no âmbito do mesmo procedimento administrativo ou que sejam conexos com o acto impugnado primitivamente na instância, de forma a acompanhar a realidade processual à realidade dos factos e a conferir utilidade à decisão judicial que venha a ser proferida.

Por isso, se impõe à Administração que informe o processo a existência dos actos conexos com o acto impugnado que venham a ser praticados na pendência do processo, nos termos do nº 3 do artº 63º e dos nºs 3 e 4 do artº 8º, ambos do CPTA.

A instância processual não assume a rigidez de outrora e embora a cumulação de pretensões constitua uma faculdade que se confere à parte, podendo este instaurar processo autónomo de forma a fazer valer nele a respectiva nova pretensão, também se permite que cumule nova pretensão impugnatória.

Termos em que, pelo exposto, procede a censura dirigida contra a sentença recorrida, incorrendo em erro de interpretação e aplicação do artº 63º do CPTA e, em consequência, em erro quanto à interpretação do disposto na alínea e) do artº 287º do CPC, em indeferir a requerida modificação objectiva da instância e o pedido de prosseguimento dos autos em relação à nova pretensão deduzida e quanto à declaração de extinção da lide, por inutilidade superveniente da lide.

Em consequência, deve determinar-se a baixa dos autos, para o seu prosseguimento, se nada mais obstar.


*

Em suma, pelo exposto, será de conceder provimento ao recurso, em revogar a sentença recorrida, por erro de julgamento de direito quanto à interpretação e aplicação do disposto nos artºs 63º do CPTA e 287º, alínea e) do CPC e em determinar a baixa dos autos à 1ª instância, para o prosseguimento dos autos, se nada mais obstar.

*

Sumariando, nos termos do nº 7 do artº 713º do CPC, conclui-se da seguinte forma:

I. O artº 63º do CPTA, com a epígrafe “Modificação objectiva de instância”, veio admitir a ampliação da instância mediante cumulação superveniente de pedidos, isto é, uma alteração que ocorre estando pendente a acção.

II. Consiste a ampliação do objecto do processo numa das principais alterações introduzidas ao contencioso administrativo, enquanto corolário do princípio da flexibilidade do processo, concretizador da tutela jurisdicional efectiva que enforma o sistema judicial.

III. À luz do disposto no artº 63º do CPTA é possível cumular a impugnação de novos actos administrativos que tenham sido proferidos no âmbito do mesmo procedimento, na pendência do processo impugnatório, bem como a formulação, em acumulação, de outro tipo de pretensões.

IV. Além disso, nos termos da parte final do disposto no nº 2 do artº 63º do CPTA é possível impugnar o acto que, praticado na pendência do processo impugnatório, impede a satisfação do interesse do impugnante ou cujos efeitos se oponham à utilidade pretendida no processo.

V. O âmbito de previsão do artº 63º do CPTA é muito vasto, não exigindo que o acto primitivamente impugnado no processo se mantenha, como no presente caso, em que mediante a prática de acto revogatório na pendência da lide, foi revogado o acto inicialmente impugnado, requerendo a autora a ampliação do objecto da presente instância de forma a impugnar o acto revogatório, em relação ao qual invoca, quer vícios próprios, quer a sua invalidade consequente, por já antes, na petição inicial, ter assacado a nulidade do acto revogado.


*

Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso, em revogar a sentença recorrida, por erro de julgamento de direito em relação à interpretação e aplicação dos artºs 63º do CPTA e 287º, alínea e) do CPC e em determinar a baixa dos autos à 1ª instância e o prosseguimento dos autos, se nada mais obstar.

Custas pelo recorrido.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)

(Maria Cristina Gallego Santos)

(António Paulo Vasconcelos)