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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:10102/13
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:07/11/2013
Relator:ANA CELESTE CARVALHO
Descritores:REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS, RECLAMAÇÃO DA CONTA
Sumário:I. O requerimento apresentado pela parte, após a notificação da sentença, da conta de custas e para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça devida, nos termos do artº 15º, nº 1, alínea a) e nº 2 da Lei nº 7/2012, de 13/02, em relação à entidade demandada que beneficiou da dispensa de prévio pagamento da taxa de justiça, discordando da aplicação da disciplina do Regulamento das Custas Processuais e da obrigatoriedade de pagamento da taxa de justiça, sem a indicação de qualquer norma jurídica ou do diploma legal em que alicerça essa sua posição, deve tal requerimento ser considerado como reclamação da conta.
II. O nº 5 do artº 161º do CPC tem aplicação quando um outro meio, em especial, não regule a situação jurídica em causa, permitindo que se reclame para o juiz de qualquer acto da secretaria.
III. Sendo prevista uma reclamação contra o acto que incide sobre a conta de custas e a respectiva notificação que foi efectuada pela secretaria, é esse o instituto o aplicável, aplicando-se o regime legal por que se rege tal reclamação.
IV. Em consequência, tem aplicação à reclamação apresentada pelo ora recorrente, não o regime previsto no nº 5 do artº 161º, mas o previsto quanto à reclamação da conta de custas, nos termos da legislação sobre custas.
V. Embora a instância se tenha constituído em momento em que vigorava o Código das Custas Judiciais, veio tal diploma a ser revogado pelo D.L. n.º 34/2008, de 26/02, o qual aprova o Regulamento das Custas Processuais, disciplinando sobre a sua aplicação aos processos pendentes.
VI. Nos mesmos termos o fizeram os demais diplomas que alteraram o D.L. n.º 34/2008, estabelecendo disposições sobre a aplicação da lei no tempo, de entre os quais a Lei nº 7/2012, de 13/02, que procede à 6ª alteração ao D.L. n.º 34/2008, de 26/02.
VII. Nos termos do artº 8º da Lei nº 7/2012, o Regulamento das Custas Processuais aplica-se, quanto a certos aspectos de regime, aos processos pendentes, designadamente, aos actos praticados a partir da sua entrada em vigor (nº 2).
VIII. Segundo tal preceito, “todos os montantes cuja constituição da obrigação de pagamento ocorra após a entrada em vigor da presente lei, nomeadamente os relativos a taxas de justiça, a encargos, a multas ou a outras penalidades, são calculados nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei” (nº 3).
IX. É aplicável ao presente processo, designadamente, no que respeita ao pagamento da taxa de justiça por parte da entidade demandada, dispensada do prévio pagamento, o disposto no Regulamento das Custas Processuais.
X. Tendo presente o disposto nos nºs 1 e 6 do artº 31º do RCP, notificada a conta de custas, as partes dispõem do prazo de dez dias para pedir a sua reforma, reclamar da conta ou efectuar o pagamento e da decisão do incidente de reclamação cabe recurso em um grau, mas apenas se o montante exceder o valor de 50 UC
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

O Ministério das Finanças e da Administração Pública, devidamente identificado nos autos, no âmbito da acção administrativa especial, de pretensão conexa com acto administrativo, instaurada pelo Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional do despacho do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datado de 26/12/2012, o qual decidiu pela aplicação da disciplina do Regulamento das Custas Processuais, na sequência da notificação pela secretaria da conta corrente, extraída do sistema informático de custas, nos termos do artº 30º, nº 2 da Portaria nº 419-A/2009, de 17/04 e para, em dez dias, a entidade demandada proceder ao pagamento da taxa de justiça.

Formula o aqui recorrente nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“a) Vem o presente recurso deduzido contra a decisão proferida nos autos de acção administrativa especial à margem referenciados que, por despacho de 26/12/2012, e na sequência de pedido de aclaração efectuado pela ora Recorrente, concluiu pela sua responsabilidade quanto ao pagamento de taxa de justiça, ao abrigo do art. 15º do RCP.

b) Sobre a admissibilidade do presente recurso, importa referir que a situação dos autos integra não uma reclamação da conta, a elaborar ao abrigo do nº 1 do art. 29° e nº 1 do art. 3° do RCP, mas uma reclamação judicial de acto da secretaria, ao abrigo do disposto no n.º 5 do art. 161.º do Código de Processo Civil (CPC), norma legal que dispõe: «Dos actos dos funcionários da secretaria judicial é sempre admissível reclamação para o juiz de que aquela depende funcionalmente».

e) Assim, e porque o valor da causa em que foi proferida a decisão recorrida excede a alçada do Tribunal que a proferiu que, nos termos do disposto no art. 6.º, n.º 2, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, corresponde à estabelecida para os tribunais judiciais de 1.ª instância, não ocorre o obstáculo à admissibilidade do recurso decorrente do valor da causa.

d) Entende a decisão sobre recurso que o nº 1 daquele art. 8° da Lei nº 17/2012 operou a derrogação implícita do art. 27° do Decreto-Lei nº 34/2008 ao dispor que o RCP, na sua nova redacção, se aplica tanto aos processos iniciados depois da sua entrada em vigor como aos instaurados antes do seu início de vigência,

e) Concluindo que tendo a decisão final tomada nos autos sido proferida a 14 de Agosto de 2012, já no domínio temporal da vigência do RCP, na redacção introduzida pela Lei nº 7/2012, a presente acção cai sob a alçada da lei nova, sendo, em consequência, devida pela ora Recorrente taxa de justiça em contrapartida do seu impulso processual.

f) Decorre deste entendimento que as alterações introduzidas pelo RCP, no que respeita à matéria de isenção de custas, se aplicam a todos os processos pendentes à data da sua entrada em vigor, ainda que o seu início seja anterior a 01 de Setembro de 2008, pelo simples facto de a decisão ter sido proferida depois da entrada em vigor da Lei nº 7/2012.

g) Por sua vez, a ora Recorrente entende que a decisão sob recurso incorre em erro na interpretação do disposto no art. 8° da Lei nº 7/2012, assim como no disposto no art. 27° do Decreto-Lei nº 34/2008, violando, ainda os princípios da legalidade e do acesso à justiça consignados nos art. 3º e 20º da CRP,

h) Uma vez que a acção administrativa especial em apreço teve o seu início no ano de 2007, na vigência do Código das Custas Judiciais, sendo, por conseguinte, aplicável à ora Recorrente a isenção de custas aí previstas, nos termos do disposto no art. 27° do Decreto-Lei nº 34/2008, e não a dispensa de pagamento prévio de taxa de justiça consignada no art. 15° do RCJ, conforme pretende aquele Tribunal.

i) Sobre o erro na interpretação do disposto no art. 27º do Decreto-Lei nº 34/2008, decorre deste normativo legal que as alterações introduzidas pelo RCP em matéria de isenção de custas aplicam-se apenas aos processos iniciados a partir de 1 de Setembro de 2008, com excepção dos procedimentos, incidentes, recursos e apensos que tenham início após aquela data, ou seja, relativamente aos processos pendentes à data da entrada em vigor do RCP, as alterações introduzidas em matéria de isenção de custas apenas se aplicam aos procedimentos, incidentes, recursos e apensos que tenham início após 01 de Setembro de 2008.

j) Quer isto dizer que os processos iniciados sob a vigência do Código de Custas Judiciais, e que beneficiavam de isenção de custas aplicável a alguma ou a ambas as partes, passam a reger-se pelo novo RCP, com a dispensa do pagamento prévio de taxa de justiça devida a final apenas relativa1nente aos procedimentos, incidentes, recursos e apensos que tenham início após aquela data.

k) O disposto no art. 27º do Decreto-Lei nº 34/2008 consubstancia uma importante salvaguarda dos interesses e das expectativas dos intervenientes processuais, constituídos sob a vigência das normas processuais anteriores às alterações introduzidas pelo RCP, ao assegurar que as regras processuais com que os intervenientes podem legitimamente contar são as que se encontram em vigor no início do processo ou, na pendência deste, no início de procedimento, incidente, recurso ou apenso a que haja lugar.

l) A tutela jurídica contida naquele normativo legal assegura o direito fundamental de acesso à justiça, permitindo aos litigantes decidir da sua intervenção jurisdicional atentas as regras processuais aplicáveis, no caso dos autos atentos os encargos associados à litigância jurisdicional, assim como os direitos e interesses cuja defesa se pretende acautelar.

m) O despacho objecto do presente recurso incorre, ainda, em erro de interpretação do disposto no art. 8º da Lei nº 7/2012, cujo elemento literal, maxime o seu nº 2, permite concluir, desde logo, que a aplicação das normas aí referidas respeita à sucessão no tempo de uma nova redacção do RCP face à sua redacção anterior à Lei nº 7/2012, e não à sucessão no tempo das alterações introduzidas pelo RCP face às normas do CCJ.

n) Mais, a conjugação do disposto no nº 1 do art. 8° com o seu nº 4 leva-nos, de igual modo, a concluir que se nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas ao abrigo do RCP e a isenção não tem correspondência nas alterações introduzidas pela Lei nº 7/2012, “mantém-se, em vigor, no respectivo processo, a isenção de custas”, então, por um critério de maioria de razão, no processo em que a ora Recorrente se encontrava isenta de custas ao abrigo do CCJ e a isenção não tem correspondência no RCP, mantém-se, igualmente, no respectivo processo a referida isenção.

o) Acresce, ainda, quanto à interpretação do disposto no art. 8° da Lei nº 7/2012, o que supra se disse a propósito do art. 27º do Decreto-Lei nº 34/2008, sobre a protecção dos interesses e legítimas expectativas dos intervenientes processuais na ponderação dos encargos associados ao seu acesso à justiça com os direitos e interesses legítimos cuja defesa perante os tribunais se pretende.

p) Decorre do supra exposto que a interpretação das aludidas normas, nos termos que servem de fundamento ao despacho recorrido, configura uma interpretação contrária à Constituição mais concretamente ao princípio da legalidade em que assenta o Estado de Direito Democrático, bem como ao direito de acesso à justiça consignados. respectivamente, nos art. 3º, n.º 2 e art. 20º nº 1 CRP.

q) Sobre a denegação do direito de acesso à justiça que tal interpretação representa, reitera­ se o que supra se disse a propósito de protecção dos interesses e legítimas expectativas dos intervenientes processuais na ponderação dos encargos associados ao seu acesso à justiça com os direitos e interesses legítimos cuja defesa perante os tribunais se pretende

r) Sobre a legalidade e o combate à injustiça, a admitir-se que a decisão proferida a final nos autos, por douta sentença de 14/08/2012, se afigura susceptível de afastar a isenção de custas prevista no CCJ para a entidade Recorrente, pelo simples facto de ter sido prolatada sob a vigência do RCP,

s) Estaríamos a acolher como elemento de conexão para aplicação da lei no tempo o momento da prolação da sentença, e não o momento da instauração do processo, o que seria, por um lado, impeditivo de qualquer planeamento necessário face aos encargos associados à litigância judicial, em claro prejuízo do direito de acesso à justiça, e, por outro lado, totalmente injusto ao fazer repercutir a menor celeridade dos tribunais na tornada de decisões numa eventual perda da isenção com que se podia legitimamente contar, em prejuízo da ora Requerente.

t) Concluindo, porque a acção administrativa especial em apreço teve o seu início no ano de 2007, na vigência do Código das Custas Judiciais, inexistindo na pendência da acção qualquer procedimento, incidente, recurso ou apenso posterior a 01 de Setembro de 2008, susceptível do pagamento de custas judiciais ao abrigo do RCP, com excepção do presente recurso,

u) Considera-se que a ora Recorrente, não é, por conseguinte, responsável pelo pagamento de taxa de justiça que lhe é exigida ao abrigo do art. 15º do RCP para as entidades dispensadas do pagamento prévio da taxa de justiça.”


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Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Ministério Público, notificado, emitiu parecer no sentido da inadmissibilidade do recurso, nos termos do nº 2 do artº 27º do CPTA, pugnando que contra o despacho recorrido cabia reclamação para a conferência.

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Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 660º, n.º 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, n.º 1, todos do CPC, ex vi, artº 140º do CPTA.

Porém, coloca-se a questão da inadmissibilidade do presente recurso, a qual precede o conhecimento do mérito do recurso, por em caso de procedência ter por efeito obstar ao seu conhecimento.

III. FUNDAMENTOS

DE FACTO

Com relevância para a decisão a proferir, dão-se como assentes os seguintes factos, alicerçados no processado adoptado nos autos:
A) Em 14/08/2012 foi proferida sentença, em cujo dispositivo se fixou o seguinte: “I – Julga-se a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolve-se o R. do pedido. II – Custas pela A. (calculadas nos termos do Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, de cujo preâmbulo resulta a aplicação do mesmo a todos os processos pendentes – art.º 8.º) (…)”;
B) Em 30/08/2012 a secretaria expediu ofício, destinado a notificar a entidade demandada da sentença, remetendo em anexo a conta corrente extraída do sistema informático de custas, correspondente à nota descritiva a que alude o artº 30º, nº 2 da Portaria nº 419-A/2009, de 17/04, com a seguinte notificação expressa: “nos termos e para os efeitos do disposto no artº 15º, nº 1, alínea a) e 2 (a que se refere o artº 7º do R.C.P.) da Lei nº 7/2012 de 13 de Fevereiro de 2012 para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça devida.”;
C) Em 11/09/2012 a entidade demandada apresentou requerimento onde invocou que não alcança a previsão que determine a obrigação de pagamento de taxa de justiça, por os autos terem sido intentados em Setembro de 2007, em data anterior à entrada em vigor do Regulamento de Custas Processuais, aprovado pelo D.L. nº 34/2008, de 26/02, defendendo a aplicação do Código das Custas Processuais e requerendo que o Tribunal “se digne clarificar a responsabilidade da Ré pelo pagamento da taxa de justiça, face ao teor da aludida notificação.”;
D) Em 18/12/2012 foi proferido o seguinte despacho: “Ao contador para informar os autos em cinco dias.”;
E) Em 20/12/2012 a Secretaria prestou a seguinte informação: “Informando V. Exa. que relativamente ao requerimento apresentado pela Entidade Demandada constante de fls. 216/217 e ao constante do disposto no art. 15º, nº 1, alínea a) e 2 (a que se refere o art. 7º do R.C.P.), da Lei nº 7/2012 de 13 de Fevereiro de 2012, todas as partes que se encontram dispensadas do pagamento prévio da taxa de justiça, independentemente da condenação a final, devem ser notificadas, com a decisão que decida a causa principal, ainda que susceptível de recurso, para efectuar o seu pagamento no prazo de 10 dias. Mais informo V. Exa. que de acordo com o disposto no art. 8º nº 1, 2 e 9 da Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro e ao facto da sentença proferida ser datada de 23.10.2012, foi a Entidade Demandada notificada para proceder ao referido pagamento em falta, apesar do articulado apresentado (contestação) pela Entidade Demandada ter data anterior a 29.03.2012 e da sentença não constar a sua condenação. (…)”;
F) Em 26/12/2012 foi proferido o seguinte despacho: “Considerando que o Regulamento das Custas Processuais (RCP), na redacção da Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, se aplica tanto aos processos iniciados depois da sua entrada em vigor como aos instaurados antes do seu início de vigência mas ainda pendentes nessa data (nº 1 do artº 8º da Lei nº 7/2012 cit.); Considerando que tal determina a derrogação implícita do artº. 27º do Decreto-Lei nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, invocado pelo requerente; Considerando que a decisão final tomada nos presentes autos foi proferida já no domínio temporal de vigência do RCP, na redacção da referida Lei nº 7/2012, pelo que a presente acção cai sob a alçada da lei nova (cfr. o artº 9º desta Lei e a data da decisão final, tomada nos autos, em 14 de Agosto de 2012); Considerando o disposto nos nºs 2 e 9 do artº 8º da Lei nº 7/2012, Bem andou a Secretaria, pelo que indefiro a reclamação em apreço. (…)”;
G) Contra o despacho antecedente, em 20/03/2013, a entidade demandada interpôs o presente recurso jurisdicional.

DO DIREITO

Da admissibilidade do recurso:

Delimitando os termos do presente litígio, vem impugnado o despacho proferido após a sentença, que decidiu pela aplicação da disciplina do Regulamento das Custas Processuais e que a entidade demandada deve liquidar taxa de justiça, na sequência da notificação pela secretaria da conta corrente, extraída do sistema informático de custas, nos termos do artº 30º, nº 2 da Portaria nº 419-A/2009, de 17/04 e para, em dez dias, liquidar a taxa de justiça.

No seu dispositivo a sentença fixou, de entre o mais, “II – Custas pela A. (calculadas nos termos do Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 7/2012, de 13 de Fevereiro, de cujo preâmbulo resulta a aplicação do mesmo a todos os processos pendentes – art.º 8.º)”.

Considerando a factualidade assente, verifica-se que, após a sentença, foi expedido ofício à ilustre mandatária da entidade demandada, notificando-a da sentença, mais tendo sido remetido, em anexo, a conta corrente extraída do sistema informático de custas, isto é, a nota descritiva, a que alude o artº 30º, nº 2 da Portaria nº 419-A/2009, de 17/04, com a notificação expressa, “nos termos e para os efeitos do disposto no artº 15º, nº 1, alínea a) e 2 (a que se refere o artº 7º do R.C.P.) da Lei nº 7/2012 de 13 de Fevereiro de 2012 para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça devida.”.

Em sequência dessa notificação, a entidade demandada apresentou requerimento, no âmbito do qual, sem invocar qualquer norma jurídica ou diploma legal em que alicerce o seu requerimento, invoca que não alcança a previsão que determine a obrigação de pagamento de taxa de justiça, por os autos terem sido intentados em Setembro de 2007, em data anterior à entrada em vigor do Regulamento de Custas Processuais, aprovado pelo D.L. nº 34/2008, de 26/02, sendo aplicável o Código das Custas Processuais, terminando pedindo ao Tribunal a quo que “se digne clarificar a responsabilidade da Ré pelo pagamento da taxa de justiça, face ao teor da aludida notificação.”.

Em sequência desse requerimento, foi proferido despacho a determinar que fosse prestada informação pelo contador, ao que se seguiu o despacho ora recorrido.

Relembrando o disposto no artº 664º do CPC, segundo o qual, o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito e ainda que o recorrente, no requerimento que apresentou em juízo, após a notificação da sentença e da conta de custas, não alicerçou de Direito a sua pretensão, não indicando qual a norma jurídica e o diploma legal em que se baseia para a sua apresentação, é de subsumir essa pretensão à reclamação da conta, nos termos do disposto dos artºs 29º, nº 1 e 3º, nº 1, ambos do RCP e não como, como o recorrente defende no presente recurso, no disposto no artº 161º, nº 5 do CPC, ou seja, como uma reclamação de um acto da secretaria, para o juiz da causa.

O ora recorrente antes de interpor o presente recurso apresentou requerimento em juízo, cujo teor e pretensão corresponde à reclamação da conta e não a uma qualquer reclamação de acto da secretaria.

O nº 5 do artº 161º do CPC tem aplicação quando um outro meio, em especial, não regule a situação jurídica em causa, permitindo que se reclame para o juiz de qualquer acto da secretaria.

Porém, sendo prevista uma reclamação contra o acto que incide sobre a conta de custas e a respectiva notificação que foi efectuada pela secretaria, é esse o instituto o aplicável, aplicando-se o regime legal por que se rege tal reclamação.

Assim sendo, tem aplicação à reclamação apresentada pelo ora recorrente, não o regime previsto no nº 5 do artº 161º, mas o previsto quanto à reclamação da conta de custas.

Aqui chegados, cumpre determinar qual o regime de custas aplicável, se o Código das Custas Judiciais, como defende o recorrente, se o Regulamento das Custas Processuais, como se fixou na sentença e no despacho ora recorrido.

Não existem dúvidas de que quando a instância se constituiu, em Setembro de 2007, não se encontrava em vigor o Regulamento das Custas Processuais, vigorando nessa data o Código das Custas Judiciais.

Porém, veio o D.L. n.º 34/2008, de 26/02 a revogar tal Código e a aprovar o Regulamento das Custas Processuais, disciplinando sobre a sua aplicação aos processos pendentes.

Nos mesmos termos o fizeram os demais diplomas que alteraram o D.L. n.º 34/2008, estabelecendo disposições sobre a aplicação da lei no tempo, de entre os quais a Lei nº 7/2012, de 13/02, que procede à 6ª alteração ao D.L. n.º 34/2008, de 26/02.

Com relevância, estabelece o artº 8º da Lei nº 7/2012, sobre epígrafe “Aplicação no tempo”, o seguinte:

1 – O Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei, é aplicável a todos os processos iniciados após a sua entrada em vigor e, sem prejuízo do disposto nos números seguintes, aos processos pendentes nessa data.

2 – Relativamente aos processos pendentes, sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei só se aplica aos actos praticados a partir da sua entrada em vigor, considerando-se válidos e eficazes todos os pagamentos e demais actos regularmente efectuados ao abrigo da legislação aplicável no momento da prática do acto, ainda que a aplicação do Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei, determine solução diferente.

3 – Todos os montantes cuja constituição da obrigação de pagamento ocorra após a entrada em vigor da presente lei, nomeadamente os relativos a taxas de justiça, a encargos, a multas ou a outras penalidades, são calculados nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei.

4 – Nos processos em que as partes se encontravam isentas de custas, ou em que não havia lugar ao pagamento de custas em virtude das características do processo, e a isenção aplicada não encontre correspondência na redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei, mantém -se em vigor, no respectivo processo, a isenção de custas.

(…)

9 – Nos processos em que, em virtude da legislação aplicável, houve lugar à dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça, essa dispensa mantém-se, sendo o pagamento dos montantes que a parte teria de ter pago caso não estivesse dispensada devidos apenas a final, ainda que a aplicação da redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei determinasse solução diferente.

10 – Nos processos em que a redacção que é dada ao Regulamento das Custas Processuais pela presente lei passa a prever a dispensa do pagamento prévio da taxa de justiça não há lugar à sua dispensa, excepto se ainda não tiver sido paga a segunda prestação da taxa de justiça, caso em que a dispensa de pagamento prévio se aplica apenas a esta prestação.

11 – Para efeitos de aplicação do Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei, aos processos iniciados antes de 20 de Abril de 2009, a taxa de justiça inicial é equiparada à primeira prestação da taxa de justiça e a taxa de justiça subsequente é equiparada à segunda prestação da taxa de justiça.

(…)

13 – Todos os pagamentos decorrentes do regime de custas processuais devem ser efectuados pelos meios previstos no Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei.”.

Em face do citado preceito é possível compreender que o Regulamento das Custas Processuais aplica-se, quanto a certos aspectos de regime, aos processos pendentes, designadamente, aos actos praticados a partir da sua entrada em vigor (nº 2).

De resto, “todos os montantes cuja constituição da obrigação de pagamento ocorra após a entrada em vigor da presente lei, nomeadamente os relativos a taxas de justiça, a encargos, a multas ou a outras penalidades, são calculados nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei”, segundo o nº 3 desse preceito.

Assim, não devem existir dúvidas de ser aplicável ao presente processo, designadamente, no que respeita ao pagamento da taxa de justiça por parte da entidade demandada, dispensada do seu prévio pagamento, o disposto no Regulamento das Custas Processuais.

Ao defender o contrário, carece, pois, o recorrente de razão.

Determinado o regime legal aplicável, isto é, a disciplina aprovada pelo Regulamento das Custas Processuais, vejamos da admissibilidade do presente recurso.

Tendo presente o disposto no nº 1 do artº 31º do RCP, notificada a conta de custas, as partes dispõem do prazo de dez dias para pedir a sua reforma, reclamar da conta ou efectuar o pagamento.

Apresentada a reclamação da conta, o funcionário judicial que a tiver efectuado pronuncia-se no prazo de cinco dias, depois o processo vai com vista ao Ministério Público, após o que o juiz decide, nos termos do nº 5 do artº 31º do RCP.

Mais estabelece o nº 6 do citado preceito que da decisão do incidente de reclamação cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC.

Ora, em face do valor da causa, fixado em € 14.963, 95 e sendo o valor das custas a liquidar inferior a 50 UC, não é admissível recurso do despacho proferido, objecto do presente recurso.

Termos em que, em função do respectivo valor, in casu, inferior a 50 UC, não cabe recurso do despacho impugnado, proferido no âmbito no disposto no artº 31º do RCP.


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Em consequência, não se admite o recurso jurisdicional que se nos mostra dirigido, por irrecorribilidade do despacho impugnado.

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Sumariando, nos termos do nº 7 do artº 713º do CPC, assim se conclui:
I. O requerimento apresentado pela parte, após a notificação da sentença, da conta de custas e para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da taxa de justiça devida, nos termos do artº 15º, nº 1, alínea a) e nº 2 da Lei nº 7/2012, de 13/02, em relação à entidade demandada que beneficiou da dispensa de prévio pagamento da taxa de justiça, discordando da aplicação da disciplina do Regulamento das Custas Processuais e da obrigatoriedade de pagamento da taxa de justiça, sem a indicação de qualquer norma jurídica ou do diploma legal em que alicerça essa sua posição, deve tal requerimento ser considerado como reclamação da conta.
II. O nº 5 do artº 161º do CPC tem aplicação quando um outro meio, em especial, não regule a situação jurídica em causa, permitindo que se reclame para o juiz de qualquer acto da secretaria.

III. Sendo prevista uma reclamação contra o acto que incide sobre a conta de custas e a respectiva notificação que foi efectuada pela secretaria, é esse o instituto o aplicável, aplicando-se o regime legal por que se rege tal reclamação.

IV. Em consequência, tem aplicação à reclamação apresentada pelo ora recorrente, não o regime previsto no nº 5 do artº 161º, mas o previsto quanto à reclamação da conta de custas, nos termos da legislação sobre custas.

V. Embora a instância se tenha constituído em momento em que vigorava o Código das Custas Judiciais, veio tal diploma a ser revogado pelo D.L. n.º 34/2008, de 26/02, o qual aprova o Regulamento das Custas Processuais, disciplinando sobre a sua aplicação aos processos pendentes.

VI. Nos mesmos termos o fizeram os demais diplomas que alteraram o D.L. n.º 34/2008, estabelecendo disposições sobre a aplicação da lei no tempo, de entre os quais a Lei nº 7/2012, de 13/02, que procede à 6ª alteração ao D.L. n.º 34/2008, de 26/02.

VII. Nos termos do artº 8º da Lei nº 7/2012, o Regulamento das Custas Processuais aplica-se, quanto a certos aspectos de regime, aos processos pendentes, designadamente, aos actos praticados a partir da sua entrada em vigor (nº 2).

VIII. Segundo tal preceito, “todos os montantes cuja constituição da obrigação de pagamento ocorra após a entrada em vigor da presente lei, nomeadamente os relativos a taxas de justiça, a encargos, a multas ou a outras penalidades, são calculados nos termos previstos no Regulamento das Custas Processuais, na redacção que lhe é dada pela presente lei” (nº 3).

IX. É aplicável ao presente processo, designadamente, no que respeita ao pagamento da taxa de justiça por parte da entidade demandada, dispensada do prévio pagamento, o disposto no Regulamento das Custas Processuais.

X. Tendo presente o disposto nos nºs 1 e 6 do artº 31º do RCP, notificada a conta de custas, as partes dispõem do prazo de dez dias para pedir a sua reforma, reclamar da conta ou efectuar o pagamento e da decisão do incidente de reclamação cabe recurso em um grau, mas apenas se o montante exceder o valor de 50 UC.


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Por tudo quanto vem de ser exposto, acordam os Juízes do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em não admitir o recurso, por irrecorribilidade do despacho impugnado, mantendo-se, em consequência, o despacho recorrido.

Custas pelo recorrente.


(Ana Celeste Carvalho - Relatora)



(Maria Cristina Gallego Santos)

(António Paulo Vasconcelos)