Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06563/02
Secção:Contencioso Tributário (1.º Juízo Liquidatário do TCA- Sul)
Data do Acordão:12/17/2003
Relator:Francisco António Pedrosa de Areal Rothes
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IVA
LIQUIDAÇÃO ADICIONAL POR DEDUÇÕES INDEVIDAS
FUNDAMENTAÇÃO FORMAL
FUNDAMENTAÇÃO SUBSTANCIAL
ÓNUS DA PROVA
SIMULAÇÃO DE PREÇO
Sumário:I - De acordo com o entendimento actual do princípio da legalidade administrativa, incumbe à AT o ónus de prova da verificação dos requisitos legais das decisões positivas e desfavoráveis ao destinatário, como sejam a existência dos factos tributários e a respectiva quantificação (ressalvadas as excepções do art. 121.º, n.º 2, do CPT, em vigor à data), isto quando o acto por ela praticado tem por fundamento a existência do facto tributário e a sua quantificação.
II - No caso da liquidação adicional de IVA ter por fundamento o não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte, à AT compete apenas fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, constantes do art. 82.º, n.º 1, do CIVA, competindo ao contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do art. 19.º do CIVA.
III - Assim, se o juízo da AT assenta em ter considerado que o montante das facturas em causa (cujo IVA foi deduzido) excede o valor das operações realmente efectuadas, bastar-lhe-á demonstrar a existência de indícios sérios de que o preço referido nas facturas foi simulado, passando então a competir ao contribuinte o ónus de provar que esse preço é o real, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade (o art. 121.º, n.º 1, do CPT, a que corresponde hoje igual número do art. 100.º do CPPT, não logra aqui aplicação, pois não está em causa a prova sobre a existência e quantificação do facto tributário, que competiria à AT nos termos referidos em I).
IV - Para que o Tribunal considere que a AT podia proceder à liquidação adicional de IVA com aquele fundamento não basta que verifique se a AT fundamentou formalmente a sua actuação, ou seja, se disse por que se convenceu de que não há lugar às deduções de imposto constante das referidas facturas, mas haverá também que aferir da correcção do juízo formulado pela AT, ou seja, se este se deve ter como objectiva e materialmente fundamentado.
V - Estando em causa nove facturas respeitantes à prestação de serviços de publicidade, se a única fundamentação objectiva aduzida pela AT para considerar que o preço referido nas facturas excedia o preço real das operações e, consequentemente, que não havia lugar à dedução do imposto nelas liquidado foi a de que:
­ o emitente das facturas não declarou nem entregou a totalidade do IVA liquidado,
­ os cheques emitidos pela contribuinte para o pagamento de sete dessas facturas foram descontados ao balcão da instituição sacada e não depositados,
­ os dois restantes cheques, apesar de depositados na conta do emitente das facturas, foram seguidos de levantamentos dessa conta de quantias correspondentes a cerca de 90% do seu valor,
não pode ter-se aquele juízo por materialmente fundamentado.
VI - Na verdade, aqueles factos, por si só, contrariamente ao que pretende a AT, não indiciam suficientemente que parte do valor dos cheques tenha sido restituído à contribuinte pelo emitente das facturas, não sendo de excluir, sem mais, que os serviços referidos naquelas factura tenham realmente sido prestados por aqueles valores, tanto mais que os cheques foram emitidos à ordem do emitente das facturas e descontados pelos dirigentes deste.
VII - Pretendendo a AT que o preço constante das facturas excede o preço real por que as operações foram realizadas, deveria ter colhido outros indícios factuais que pudessem justificar materialmente essa conclusão, designadamente e a título meramente exemplificativo: a desproporção entre os valores facturados e os valores de mercado dos serviços prestados, a divergência entre os valores das facturas em causa e de outras emitidas para serviços semelhantes e a desproporção entre as receitas geradas pelo emitente das facturas e a actividade por ele desenvolvida.
VIII - No contencioso tributário, que é de mera anulação, o tribunal não pode conhecer da legalidade do acto impugnado a coberto de pressupostos que não estiveram na base da sua prática, sendo que apenas se poderão considerar como pressupostos do acto tributário aqueles que a Administração tributária fez constar da declaração fundamentadora (parte integrante do próprio acto e dele coeva) que externou quando da prática do mesmo, não relevando para esse efeito outros eventuais fundamentos que não constem daquela declaração, não sendo admissível a fundamentação a posteriori.
IX - Sendo de considerar que a AT não fez prova dos requisitos legais que lhe permitiam a sua actuação ao abrigo do art. 82.º, n.º 1, do CIVA, não merece censura a decisão por que foi julgada procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IVA respeitante às deduções que considerou indevidas.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:1. RELATÓRIO

1.1 A FAZENDA PÚBLICA (adiante Recorrente) veio recorrer para este Tribunal da sentença do Juiz do Tribunal Tributário de 1.ª instância de Aveiro, que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade denominada “SOM... - Sociedade ..., Lda.” (adiante Contribuinte ou Impugnante) deduziu contra as liquidações de IVA dos anos de 1993 a 1996 e respectivos juros compensatórios, do global de esc. 9.724.369$00, que foram efectuadas por a Administração tributária (AT) ter considerado que a “SOM...” registou na sua contabilidade facturas, emitidas pelo “Clube Desportivo ...”, cujo valor não corresponde ao preço real das prestações de serviços de publicidade realizadas, motivo por que aquela não podia deduzir, como deduziu, o IVA nelas mencionado.
Segundo a AT, a Contribuinte, para comprovar o pagamento das prestações de serviços referidas nas facturas, emitia cheques pelo montante total das facturas, IVA incluído, mas o emitente das facturas devolvia-lhe parte do respectivo valor, guardando para si o montante do IVA, que não entregava no totalidade nos cofres do Estado, e a parte restante do valor da factura.

1.2 Na petição inicial a Impugnante alegou, em síntese e na parte que ora nos interessa (1):
- que as liquidações impugnadas não estão suficientemente fundamentadas (pretendendo referir-se, não à fundamentação formal, mas à fundamentação substancial (2)), pois a AT não reuniu dados que lhe permitam concluir que às facturas em causa não correspondem operações reais, antes presumiu, sem que a lei lho permita, que as operações a que se referem essas facturas são simuladas, quando lhe competia «provar inequivocamente a existência dos factos consubstanciadores da simulação» (3), designadamente o «acordo entre declarante e declaratário no sentido de haver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declaratário, no sentido de enganar terceiros (art. 240º do C. Civil)», pretendendo a AT assim transferir para a Contribuinte o ónus de provar que as operações foram efectivamente praticadas, o que «é de todo inconcebível, já que, se tal fosse de aceitar, seriam perfeitamente inócuos os arts. 78º e 121º do C.P.Tributário»;
- que as liquidações impugnadas enfermam de erro nos pressupostos de facto, pois, contrariamente ao que entendeu a AT, às facturas em causa correspondem efectivas prestações de serviços na âmbito da publicidade, «[o] que não é posto em causa pelo relatório da inspecção tributária», publicidade essa que se traduz em «placards estáticos colocados no estádio desportivo», em «publicidade nas camisolas e equipamentos desportivos da equipa sénior do clube», em «painéis de publicitação dos jogos a realizar», sendo que os montantes constantes das facturas correspondem ao acordado entre a Impugnante e a direcção do clube e os pagamentos foram efectuados «de acordo com as disponibilidades da impugnante, na sequência da solicitação da direcção do clube».

1.3 Na sentença recorrida, na parte que ora nos interessa (4), considerou-se, em síntese, o seguinte:
- «Da análise do relatório da fiscalização efectuada resulta que foram duas as circunstâncias tidas em conta pela Administração Fiscal para concluir que a Impugnante emitia cheques de determinado valor ao Arrif... e que depois, parte era de novo devolvido pelo clube à Impugnante:
- os cheques foram levantados em dinheiro;
- há apenas dois cheques que foram depositados na conta bancária do clube, seguindo-se um levantamento em que fica depositado 10% do valor da factura acrescido de Imposto sobre o Valor Acrescentado»;
- «Tais factos são insuficientes para que se possa concluir que os cheques não formam emitidos e entregues para pagamento de publicidade.
A Administração Fiscal não põe em causa que a publicidade foi efectuada pelo Arrif.... E nada refere quanto à proporção entre as quantias pagas pela Impugnante e a publicidade que foi produzida.
Não há qualquer indício de que o dinheiro levantado da conta da Impugnante tenha retornado à Impugnante. Estamos perante meros juízos conclusivos, porque sem suporte factual».

Com esta argumentação, considerou-se na sentença recorrida que os actos impugnados enfermavam de insuficiência de fundamentação, equiparada à falta de fundamentação, nos termos do art. 125.º, n.º 2, do Código de Procedimento Administrativo (CPA), a qual, gerando vício de forma, impõe a anulação daqueles actos (5). Decidiu-se em conformidade.

1.4 A Fazenda Pública discorda da sentença pelos seguintes fundamentos sintetizados nas conclusões do recurso:

«I - A douta decisão estribou-se na falta de prova fundamentadora do acto tributário por parte da Administração Fiscal.

II - Mas verificou-se na inspecção cruzada indícios, através de irregularidades como seja a retenção de apenas uma determinada percentagem no destinatária das verbas, à semelhança do que aconteceu com outras entidades contributivas, que permitem retirar com segurança existir um "negócio" escondido de empolamento dos pagamentos com benefícios recíprocos de aumentos de custos e de dedução indevida de IVA.

III - O desmesuramento das facturas em relação ao pretenso serviço de publicidade são factos notórios pela dimensão localizada e a pouca projecção do clube que as emitiu.

IV - Os factos-índice elencados pela Administração Fiscal, não contraditados pela impugnante, tem que servir de suporte às suas ilações que, por sua vez, caucionam o acto tributário praticado e têm que transferir o ónus de prova para a parte que considera agora que os seus direitos estão violados, sob pena de remeter a intervenção inspectiva para o campo da quase inutilidade.

V- Sendo o processo de impugnação uma acção de tipo constitutivo compete pois, a quem alega um direito, o ónus de fazer a prova dos factos que enformam esse direito.

VI - Se não foi exercitada qualquer prova, com um mínimo de consistência, que atestasse a veracidade e a correcta dimensão mesmo comparativa do serviço alegadamente prestado, ou mesmo a sua relação com a promoção das vendas da impugnante, não se pode com justiça dizer a desqualificação dos documentos não esteja devidamente fundamentada e isso constitua um vício de forma.

Nos termos expostos e nos que Vªs. Exªs, mui doutamente, suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, substituir a decisão por outra que julgue a impugnação totalmente improcedente como se nos afigura mais conforme com o que achamos ser o

Direito e a Justiça».

1.5 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.6 Dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal emitiu o parecer que se transcreve na íntegra:

«1. O Recurso não merece provimento.
2. A sentença apreciou todas as questões suscitadas e fez correcta subsunção legal, pelo que deve ser mantida na ordem jurídica».

1.7 Foram dados os vistos legais.

1.8 A questão que cumpre apreciar e decidir, tal como delimitada pelas conclusões da legação da Recorrente, é de saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento por ter considerado que a AT não logrou recolher indícios suficientes de que o montante dos cheques não fosse integralmente destinado ao pagamento dos serviços de publicidade prestados pelo “Clube Desportivo ...” à Impugnante e por ter considerado que era à AT que competia recolher indícios de facto suficientes para autorizar essa conclusão.

* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

2.1.1 Na sentença recorrida o julgamento de facto foi efectuada nos seguintes termos:

«Compulsados os autos dou como assente o seguinte circunstancialismo fáctico:
1- Na sequência de inspecção efectuada ao Clube Desportivo ..., a Administração Fiscal considerou indevidamente deduzido o Imposto sobre o Valor Acrescentado constante das facturas emitidas por aquele clube e contabilizadas pela Impugnante, por entender que o seu valor era simulado
2- Dou aqui por reproduzido o teor do relatório da fiscalização ao referido clube que se encontra junto a fls. 42 e seguintes.
3- Deste entendimento resultaram as seguintes liquidações de Imposto sobre o Valor Acrescentado:
n.º 98046793, no montante de 2.550.000$00, ano de 1996
n.º 98046790, “ 2.125.000$00, ano de 1995
n.º 98046787, “ 1.520.000$00, ano de 1994
n.º 98046782, “ 800.000$00, ano de 1993
e de juros compensatórios:
n.º 98046792, 295.602$00, período 9609
n.º 98046791, 183.360$00, 9605
n.º 98046789, 438.128$00, 9508
n.º 98046788, 345.438$00, 9505
n.º 98046786, 313.397$00, 9408
n.º 98046785, 321.296$00, 9407
n.º 98046784, 100.826$00, 9404
n.º 98046783, 103.062$00, 9403
n.º 98046781, 629.260$00, 9308
4- A data limite de pagamento voluntário das referidas liquidações ocorreu em 31-05-98.
5- Em 05-05-98 foi solicitada certidão nos termos do artigo 22° do Código de Processo Tributário, a qual foi entregue em 01-06-98.
6- A Impugnação foi deduzida em 31-08-98.
7- A impugnante nos anos de 1993, 1994, 1995 e 1996 pagou ao Clube Desportivo ... serviços de publicidade, efectuada por meios sonoros e por meios estáticos, nas camisolas e fatos de treino dos jogadores e nos programas de jogos semanais - depoimento das testemunhas, documentos 3, 4 e 5 junto com a petição.
8- O pagamento dessa publicidade foi efectuado através de cheques.
9- Os montantes pagos dependiam da disponibilidade da Impugnante - depoimento das testemunhas».

2.1.2 Atento o disposto no art. 712.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil (CPC), damos ainda como provados os seguintes factos (6):
10- O “Clube Desportivo ...” é uma associação desportiva que tem como finalidade a promoção e prática desportiva, essencialmente o futebol, e, acessoriamente, efectua prestações de serviços de publicidade (cfr. n.º 2.1 do ponto 2. do relatório da inspecção a esse clube, com cópia de fls. 42 a 62 e de fls. 70 a 104);
11- Nas épocas futebolísticas de 1993/1994, 1994/1995 e 1995/1996 a equipa de futebol daquele clube disputou o campeonato da 3.ª Divisão Nacional e na época 1996/1997, o campeonato da 2.ª Divisão Nacional B - Zona Norte (cfr. os mesmos elementos referidos na alínea anterior);
12- Durante aquelas épocas o Clube teve como presidente Mário ... e como vice-presidentes, pelo menos em algumas daquelas épocas, Manuel ..., Delfim ..., Ilídio de ... (cfr. o relatório da inspecção a ao clube);
13- As facturas a que se alude em 1, emitidas pelo “Clube Desportivo ...” e registadas pela Impugnante na sua contabilidade têm os elementos constantes do seguinte quadro:

Número da factura
Data
Valor (escudos)
IVA (escudos)
Total (escudos)
0078
31/08/93
5 000 000$
800 000$
5 800 000$
0163
15/03/94
1 000 000$
160 000$
1 160 000$
0177
11/04/94
1 000 000$
160 000$
1 160 000$
0218
26/07/94
3 750 000$
600 000$
4 350 000$
0220
24/08/94
3 750 000$
600 000$
4 350 000$
0331
04/05/95
5 000 000$
850 000$
5 850 000$
0351
31/08/95
7 500 000$
1 275 000$
8 775 000$
0512
02/05/96
5 000 000$
850 000$
5 850 000$
0556
01/09/96
10 000 000$
1 700 000$
11 700 000$
(cfr. o n.º 1 do ponto 3.2.1 do relatório da inspecção ao emitente das facturas, com cópia de fls. 42 a 62 e de fls. 70 a 104);
14- Para titular o pagamento das referidas facturas foram emitidos pela Impugnante cheques, todos à ordem do “Clube Desportivo ...”, nos termos do quadro que se segue:

Número da factura
Número do cheque
Valor
0078
4644167753
5 800 000$
0163
2453101283
1 160 000$
0177
1553101284
1 160 000$
0218
0751326581
4 350 000$
0220
3241835510
4 350 000$
0331
1857836850
5 850 000$
0351
6573976185
8 775 000$
0512
5480478883
5 850 000$
0556
9087515259
11 700 000$
(cfr. os elementos referidos na alínea anterior e cópia dos cheques de fls. 24 a 35);
15- Dos referidos cheques
15.1- os que têm os n.ºs 4644167753, 2453101283, 1553101284, 0751326581, 3241835510, 1857836850 e 6573976185 foram descontados em numerário ao balcão da instituição bancária sacada, deles constando as assinaturas referidas no quadro que se segue:

Número dos cheques
Endosso
Levantado por
4644167753
Mário ...
o mesmo
2453101283
Mário ... e Manuel ...
Aníbal ...*
1553101284
Mário ... e Manuel ...
Aníbal ...*
0751326581
Mário ... e Manuel ...
um dos endossantes
3241835510
Mário ... e Henrique Gaspar Soares Costa
Mário ...
1857836850
Mário ... e Ilídio Oliveira Soares
um dos endossantes
6573976185
Mário ... e Delfim ...
um dos endossantes
* Aníbal ... era empregado de Manuel ...; e
15.2- os que têm os n.ºs 5480478883 e 9087515259 foram depositados em conta bancária do “Clube Desportivo ...”
(cfr. os mesmos elementos referidos na alínea anterior);
16- Depois de terem sido depositados os cheques com os n.ºs 5480478883 e 9087515259 foram efectuados levantamentos em numerário da mesma conta, no montante equivalente a 90% do valor de cada uma das facturas (IVA excluído);
17- Na informação que serve de fundamentação às correcções que determinaram as liquidações impugnadas ficou dito, para além do mais, o seguinte:

«Através de fiscalização efectuada ao CLUBE DESPORTIVO ... NIPC 501 ... foram recolhidos vários elementos e provas que indiciam este clube como emitente de “facturas falsas”.

Um forte indício desde logo detectado foi o facto de o clube ter enviado as declarações de IVA com valores bastante inferiores aos efectivamente facturados, conforme se detectou através de listagens que o clube possuía com a discriminação das facturas emitidas, e através dos duplicados das próprias facturas. Desta situação constatou-se que não entregou nos cofres do Estado as seguintes importâncias de IVA:

[segue-se um quadro do qual resulta que no período compreendido entre o quarto trimestre de 1992 e o segundo trimestre de 1996, o Clube deixou de entregar IVA liquidado no montante de esc. 57.517.408$00]

(...)

Foram recolhidas provas de o clube ter recebido todo o IVA mencionado nas facturas emitidas atendendo ser emitido um recibo com o mesmo número pelo que desde logo não se compreende muito bem o motivo das divergências a não ser que era intenção do Clube não efectuar o pagamento do Iva que liquidou e recebeu.

Desta situação pode aferir-se que o clube se financiou através do IVA recebido das firmas às quais emitiu as facturas que deveria ser entregue nos cofres do Estado, que poderão ser o motivo dos elevados montantes facturados.

(...)»

(cfr. cópia da informação de fls. 67 a 69);
18- No relatório do exame à escrita dito em 2, depois de se salientar que os serviços de publicidade prestados pelo “Clube Desportivo ...” estão sujeitos a IVA, e de se descrever a situação verificada relativamente às facturas emitidas em nome da Impugnante de outras entidades, ficou dito, para além do mais, o seguinte, sob o item «4 – Correcções Propostas»:

«4.1.- Relativamente ao Clube

Está provado que o clube é emitente de facturas que não correspondem a serviços prestados efectivos nomeadamente quanto à sua valorização, recorrendo à técnica de efectuar retornos de importâncias a mais recebidas relativamente a empresas que efectuaram publicidade. Estão nesses casos as firmas Som... [segue-se a indicação de outras duas sociedades]
(...)
4.2.- Relativamente às firmas utilizadoras das facturas

Relativamente ao IRC nas empresas que utilizam as facturas é nossa convicção que:

a) Existem fortes indícios que o clube utiliza o esquema da emissão de facturas por valores superiores aos recebidos existindo posteriormente um retorno à entidade doadora, conforme se apurou relativamente às firmas Som... [segue-se a indicação das outras duas sociedades já acima referidas]
b) É assim certo que as empresas têm na sua posse documento que não traduz a veracidade da transacção efectuada.
c) Dada a incorporabilidade dos ‘serviços prestados’ pelo clube não se consegue medir o valor desses mesmos serviços em termos rigorosos e face ainda à discrepância de valores para serviços iguais isto é empresas (...) como por exemplo a Som... que no ano de 1993 lhe facturou 5 000 contos, 9 500 contos em 1994, 12 500 contos em 1995 e 15 000 contos em 1996.

Nos termos do artigo 23.º do CIRC são custos ‘os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou a manutenção da fonte produtora’. Pelo exposto ao longo deste ponto é inquestionável que as empresas ao utilizarem as facturas do clube não tiveram em atenção o princípio enunciado no artigo 23.º mas sim o empolamento do custo com vista à diminuição do rendimento tributável, pagando para isso e de forma ilícita uma percentagem que variava.

Assim propomos que as verbas em questão não sejam consideradas como custo em todos os casos em que subsistem indícios do uso de ‘facturação falsa’.

Relativamente ao IVA nos termos do nr. 3 do artigo 219.º do CIVA é cortado o direito à dedução pois o valor mencionado nas facturas é simulado»
(cfr. cópia do relatório, de fls. 70 a 104);
19- Assim, propôs-se no mesmo relatório que se considerasse indevidamente deduzido o IVA mencionado nas facturas emitidas pelo “Clube Desportivo Arrifa...” à Impugnante, nos montantes do quadro que consta do n.º 13
(cfr. cópia do relatório, de fls. 70 a 104).
2.2 DE DIREITO

2.2.1 AS QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR

Na sequência da fiscalização efectuada ao “Clube Desportivo Arrifa…”, a AT concluiu que este tinha emitido diversas facturas nas quais o preço dos serviços de publicidade prestados excedia o realmente praticado, sendo que, embora o pagamento das facturas estivesse titulado por cheque, o Clube devolvia parte do respectivo valor, guardando para si apenas o montante do IVA, que não entregava nos cofres do Estado, e a parte restante do valor da factura.
Relativamente à Impugnante, a AT não aceitou a dedução do IVA (7) constante das nove facturas que lhe foram emitidas por aquele Clube. Para justificar tal conclusão, a AT louvou-se nos seguintes indícios:
o «Clube Desportivo ...» não declarou nem entregou a totalidade do IVA liquidado nas facturas que emitia,
os cheques emitidos pela Contribuinte para o pagamento de sete dessas facturas foram descontados ao balcão da instituição sacada e não depositados,
os dois restantes cheques, apesar de depositados na conta do emitente das facturas, foram seguidos de levantamentos dessa conta de quantias correspondentes a cerca de 90% do seu valor.

Em virtude da não aceitação daquelas deduções, a AT procedeu às correspondentes liquidações adicionais de IVA e dos respectivos juros compensatórios.
A Contribuinte não aceitou tais liquidações e foi impugná-las com diversos fundamentos, dos quais ora nos interessa apenas considerar os seguintes: a AT não recolheu, como lhe competia, os indícios suficientes que lhe permitissem concluir pela simulação do preço constante das facturas; os serviços constantes das facturas em causa foram prestados pelo preço que delas consta.
Na sentença recorrida julgou-se a impugnação procedente com o primeiro daqueles fundamentos, mas considerando-se que o vício em causa era de forma, por insuficiência de fundamentação, que o n.º 2 do art. 125.º do CPA faz equivaler à falta de fundamentação.
Salvo o devido respeito, a argumentação aduzida na sentença não permite concluir pela verificação de vício de forma por insuficiência ou falta de fundamentação, bem pelo contrário, mas antes pela falta de fundamentação substancial ou material do acto praticado pela AT. Na verdade, na sentença não se põe em causa que a AT tenha externado de forma suficiente os motivos por que entendeu que a Contribuinte não podia deduzir, como deduziu, o IVA constante das facturas em causa, e que essa eventual falta tenha impedido a Contribuinte de optar conscenciosamente entre o conformar-se com as liquidações adicionais de IVA ou reagir contra elas; o que se diz na sentença recorrida é que os factos invocados pela AT para considerar que o IVA fôra indevidamente deduzido e, consequentemente, para proceder à respectiva liquidação adicional, não suportam essa conclusão. Tal argumentação situa-se já no domínio da validade substancial do acto, que não no da sua validade formal, onde se situa o vício de falta de fundamentação.
A Fazenda Pública discorda da sentença, entendendo que a prática das liquidações impugnadas está materialmente fundamentada pois «verificou-se na inspecção cruzada indícios, através de irregularidades como seja a retenção de apenas uma determinada percentagem no destinatária das verbas, à semelhança do que aconteceu com outras entidades contributivas, que permitem retirar com segurança existir um "negócio" escondido de empolamento dos pagamentos com benefícios recíprocos de aumentos de custos e de dedução indevida de IVA», sendo que o «desmesuramento das facturas em relação ao pretenso serviço de publicidade são factos notórios pela dimensão localizada e a pouca projecção do clube que as emitiu» (cfr. conclusões de recurso com os n.ºs II e III). Mais considerou o Representante da Fazenda Pública que «Os factos-índice elencados pela Administração Fiscal, não contraditados pela impugnante, tem que servir de suporte às suas ilações que, por sua vez, caucionam o acto tributário praticado e têm que transferir o ónus de prova para a parte que considera agora que os seus direitos estão violados, sob pena de remeter a intervenção inspectiva para o campo da quase inutilidade», isto porque «Sendo o processo de impugnação uma acção do tipo constitutivo compete, pois, a quem alega um direito, o ónus de fazer a prova dos factos que enformam esse direito» (cfr. conclusões de recurso com os n.ºs IV e V).
Assim, as questões a apreciar e decidir são as de saber se a sentença fez correcto julgamento de direito quando considerou que era à AT que competia recolher indícios de facto suficientes para autorizar a conclusão de que o preço constante das facturas excedia o realmente pago pelos serviços de publicidade prestados pelo “Clube Desportivo ...” e que os indícios apurados pela AT não permitiam concluir nesse sentido.

2.2.2 SOBRE O ÓNUS DA PROVA

Na sentença recorrida considerou-se, ainda que de forma implícita, que, para não aceitar as deduções do IVA mencionado nas facturas, competia à AT demonstrar a existência de indícios bastantes da simulação de preço que considerou verificada nessas facturas.
A Recorrente parece não concordar com essa tese. Na verdade, depois de no art. 8.º das alegações de recurso dar a entender que aceita que recai sobre a AT o ónus da prova dos factos indiciadores de que o valor mencionado nas facturas não corresponde ao efectivamente praticado, no n.º V das conclusões deixou expressamente referido o seguinte: «Sendo o processo de impugnação uma acção do tipo constitutivo compete, pois, a quem alega um direito, o ónus de fazer a prova dos factos que enformam esse direito».
Assim, antes do mais, afigura-se-nos pertinente deixar algumas notas a esse propósito, realçando desde já que na situação sub judice a liquidação resulta da não aceitação pela AT de factos tributários declarados pela Contribuinte como constitutivos do seu direito à dedução do IVA pago a montante, e não da afirmação pela AT da existência de factos tributários.
Essas notas vão na esteira da orientação jurisprudencial que consideramos ser a melhor e que foi consagrada no acórdão da 2.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 17 de Abril de 2002 (8), que seguiremos de perto, e que faz luz sobre uma questão que nem sempre tem sido correctamente tratada: a da distribuição do ónus da prova no caso em que o acto da Administração se traduz no não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte (9).
Não existe hoje a presunção da legalidade do acto administrativo, nem do acto tributário, presunção essa que não está, nem estava, expressamente prevista em norma legal alguma, antes constituindo um princípio de origem doutrinal e jurisprudencial que, face à actual compreensão do princípio da legalidade administrativa (10), se tem por ultrapassado, surgindo a Administração, em termos de justiça administrativa e tributária, em situação de paridade com o particular. Assim, não pode hoje buscar-se hoje qualquer apoio numa alegada presunção da legalidade do acto tributário para fazer recair sobre o contribuinte o ónus da prova da ilegalidade do acto tributário.
VIEIRA DE ANDRADE, depois de salientar que o ónus da prova deve aqui entender-se, não como ónus da prova “subjectivo”, “formal” ou de “produção”, «que implicaria que o juiz só pudesse considerar os factos alegados e provados por cada uma das partes interessadas», mas antes como ónus da prova objectivo (11), «na medida em que pressupõe uma repartição adequada dos encargos de alegação, de modo a repartir os riscos da falta da prova», diz que o ónus da prova, assim entendido, «vai depender da posição processual das partes, mas – porque depende de valorações normativas e não de imperativos de pura lógica – terá de determinar-se, na ausência de norma expressa, de acordo com um quadro de normalidade concreto ou típico, construído com base nas regras específicas do domínio da vida em causa e nos princípios próprios do direito administrativo.
A regra geral, nos termos da qual quem invoca um direito tem o ónus da prova dos respectivos factos constitutivos, cabendo à contraparte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos (artigo 342.º do Código Civil) pode entender-se aplicável, em princípio, no processo administrativo, mas aqui, como de resto no âmbito do direito civil, não é suficiente para a resolução de todos os tipos de situações – sobretudo porque não faz diferenciações conforme as posições das partes e os interesses e situações em jogo nos domínios específicos da realidade normativamente concebida.
Não pode ser, designadamente, aplicada aos processos mais típicos do contencioso administrativo, aos meios impugnatórios de actos e de normas, até porque não está em causa directamente um direito substantivo do recorrente (que pode até nem existir e nunca existe no caso da acção pública), mas a conformidade com o ordenamento jurídico de uma decisão administrativa de autoridade (é essa a “questão de direito” a resolver).
Assim, não pode exigir-se ao recorrente prova dos factos constitutivos da sua pretensão de anulação (desde logo, e por exemplo, a prova da não verificação dos pressupostos legais da prática do acto), de modo a caber à Administração apenas provar as excepções invocadas – tal equivaleria na prática à pura e simples invocação da “presunção da legalidade do acto administrativo”, fazendo recair sobre o particular o ónus da prova (subjectivo) da ilegalidade do acto impugnado.
Deve, pelo contrário, levar-se em conta, em geral, para a construção do quadro de normalidade que há-de servir de paradigma normativo para a distribuição das responsabilidades probatórias, a sujeição da Administração aos princípios da legalidade e da juridicidade e, pelo menos no que respeita aos actos desfavoráveis, o dever de fundamentação.
Isto é, parece que há-de caber à Administração o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos.
Por outras palavras ainda, deve ser a Administração a suportar a desvantagem de não ter sido feita a prova (de o juiz não se ter convencido) da verificação dos pressupostos legais que permitem à Administração agir com autoridade (pelo menos, quando produza efeitos desfavoráveis para os particulares); deve ser o particular a suportar a desvantagem de não ter sido feita a prova (de o juiz não se ter convencido) de que, no uso de poderes discricionários, a Administração actuou contra princípios jurídicos fundamentais» (12).
Assim, se actualmente, em princípio, à AT cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) e, em contrapartida, cabe ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos, solução que corresponde à regra geral do art. 342.º do Código Civil (CC), de que quem invoca um direito tem o ónus da prova dos factos constitutivos, cabendo à contra-parte a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos e que foi acolhida no art. 121.º, n.º 1, do CPT (13) (e também no art. 100.º, n.º 1, do Código de Procedimento e Processo Tributário, disposição legal que reproduz aquela), nem sempre será assim.
Como decorre do que vem de se dizer, o ónus da prova variará consoante o tipo de acto administrativo em causa, havendo de ser decidida a questão da respectiva repartição «de acordo com a posição que as partes ocupam no processo e com o tipo de relação jurídica que constitui o seu objecto e, decorrentemente, no domínio do contencioso de anulação, com o tipo de acto anulando, tal qual a lei o caracteriza ou define os seus elementos constitutivos» (14).
No caso dos autos (de liquidação adicional de IVA com fundamento em que as deduções declaradas são superiores às devidas uma vez que, porque o preço mencionado nas facturas em causa não corresponde ao realmente praticado nas operações efectuadas, não haveria lugar à dedução do imposto nelas mencionado), não é a AT que está a afirmar a existência e dimensão do facto tributário, mas a Contribuinte. A AT limita-se a não reconhecer o direito que a Contribuinte se arroga – de deduzir o IVA suportado a montante – com fundamento na existência dos factos tributários tais como declarados (as concretas operações que diz tituladas pelas facturas em causa).
Assim, de acordo com que ficou dito, para saber sobre quem recai o ónus da prova da existência dessas operações e respectivo valor, teremos que analisar as normas de cuja aplicação resultou a liquidação impugnada, isto é, os arts. 19.º e 81.º, n.º 1, do CIVA.
Nos termos desta última disposição legal, «O chefe da repartição de finanças competente procederá à rectificação das declarações dos sujeitos passivos quando fundamentadamente considere que nelas figura um imposto inferior ou uma dedução superior aos devidos, liquidando-se adicionalmente a diferença».
Ou seja, segundo esta norma, a AT, para proceder à rectificação das declarações e liquidação adicional do imposto considerado indevidamente deduzido, haverá de considerar que naquelas figura dedução superior à que resulta da aplicação das normas que a regulam, sendo que tal juízo deve ser fundamentado formal e substancialmente, podendo a sindicância judicial recair sobre ambas as vertentes da fundamentação (a formal e a material).
Quanto ao direito de dedução do imposto pago a montante, que é o que ora nos interessa, ele faz parte da própria natureza do IVA e como é óbvio, ele só pode existir em relação a imposto efectivamente suportado e em operações reais, como afirmado no n.º 3 do art. 19.º do CIVA, que se limita a explicitar formalmente algo que decorre daquela natureza.
Assim, no caso dos autos, de liquidação adicional de IVA com fundamento em que as deduções declaradas são superiores às devidas, à AT compete provar a verificação dos pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, os constantes do art. 82.º, n.º 1, do CIVA, competindo neste caso ao contribuinte o ónus da prova da existência e da dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito à dedução do imposto nos termos do art. 19.º do CIVA (15).
Voltamos a citar o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17 de Abril de 2002, cuja exposição, ainda que de forma muito resumida, se tem vindo a seguir, a propósito dos requisitos legalmente previstos como de legitimação da actuação da AT para que possa liquidar IVA respeitante a deduções indevidas:
«Relativamente a esta matéria, a lei basta-se com um juízo administrativo de adequação entre os factos e valorações em que a administração diz, formalmente, suportar a sua actuação e o resultado desse juízo no sentido de se lhe afigurar ter sido declarada uma dedução superior à devida, e com a prova perante o tribunal da pertinência desse juízo, ou seja, com a prova perante o tribunal da existência dos elementos que torna possível ter como adequada a consideração por si feita de que o contribuinte declarou uma dedução superior à permitida pela lei. É nesta perspectiva que se poderá, de algum modo, falar que a administração apenas terá de fazer a prova, em tribunal, do bem fundado da formação das suas presunções de inexistência dos factos tributários e que, na falta dessa prova, essa questão – ou seja a questão relativa à legalidade do seu agir praticando o acto tributário – terá que ser resolvida contra ela. Um tal entendimento é, aliás, aquele que se afigura mais razoável e mais consentâneo com as próprias regras gerais estabelecidas nos art.ºs 342º e 343º do C. Civil sobre o ónus da prova, na medida em que assim se afasta a exigência da denominada prova diabólica, porque relativa à verificação dos factos em cuja afirmação de existência a recorrente fundamenta o seu direito, a que conduziria a posição contrária, numa solução que assim se ajusta perfeitamente à que o último preceito consagra, de que “nas acções de simples apreciação ou de declaração negativa, compete ao réu a prova dos factos constitutivos do direito que se arroga”. E é um resultado que está, também, em perfeita sintonia com o princípio da veracidade que está assumido no art.º 78º do CPT. Na verdade, a única veracidade que, numa tal circunstância, este preceito impõe que se presuma é a de que a recorrente deduziu um montante de imposto equivalente ao que consta das facturas em causa, e que o fez com base na existência e registo destas na sua contabilidade, e não já que os factos constantes dessas facturas (os factos tributários) se hajam de presumir por verídicos, pois estes seriam já dados cuja veracidade apenas poderia ser presumida à face da escrita do contribuinte que as emitiu e da qual constituiriam uma decorrência lógico-legal, dado tratar-se de um acto praticado por este e não pela recorrente (contribuinte que apenas deduziu o imposto), se, porventura, fosse feita a prova que dela constavam».
Face ao que ficou dito, e tendo como pano de fundo o caso sub judice, podemos avançar as seguintes conclusões:
- porque a liquidação adicional de IVA tem por fundamento o não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte, compete à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, constantes do art. 82.º, n.º 1, do CIVA, ou seja, tendo o juízo da AT assentado na consideração de que o valor mencionado nas facturas em causa não corresponde ao preço realmente praticado nas operações efectuadas, haverá de demonstrar a existência de indícios sérios de que o preço referido nas facturas cuja IVA foi deduzido é simulado (16);
- feita essa prova, compete à Contribuinte o ónus da prova da exacta dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do art. 19.º do CIVA, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade, ainda que fundada, pois neste caso o art. 121.º do CPT não tem aplicação (17); na verdade, o ónus consagrado no art. 121.º, n.º 1, do CPT, contra a AT (de que a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário deve ser decidida contra a AT: in dubio contra Fisco) apenas existe quando seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação e não quando, como in casu, é ao contribuinte que compete demonstrar a existência e quantificação dos factos tributários em que se funda a dedução do imposto 18).

2.2.3 A ACTUAÇÃO DA AT ESTÁ MATERIALMENTE FUNDAMENTADA ?

Será que a AT fez prova, como vimos já que lhe competia, da verificação dos requisitos estabelecidos no art. 82.º, n.º 1, do CIVA, para que possa liquidar adicionalmente o IVA respeitante a deduções indevidas?
Como ficou já dito, não basta à AT a fundamentação formal do seu juízo de que figura na declaração uma dedução superior à permitida por lei; exige-se-lhe também que demonstre em tribunal a pertinência desse juízo, ou seja, que prove a existência de indícios que permitam concluir pela correcta fundamentação material daquele juízo. Ou seja, como se disse no citado acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, «para emitir o seu juízo sobre se se deve ter por materialmente fundamentada a consideração da administração, o tribunal não se pode ater apenas à existência de uma fundamentação formal e aos elementos nela externados, (...) mas terá de formar o seu próprio juízo probatório sobre a correspondência à realidade fáctico-jurídica dos elementos em que a administração disse apoiar a sua consideração e aferir, então, sobre eles se esta deve ter-se por correcta».
Deverá, pois, o tribunal verificar se podem ou não ser dados como provados os factos invocados pela AT para considerar que nas declarações da Contribuinte constavam deduções superiores às que resultavam da lei e se tais factos permitem a conclusão de que o preço constante das facturas não foi o efectivamente praticado.
Nessa análise, a sentença recorrida, merece o nosso acordo (19).
Aí se deixou escrito que a AT, para concluir que o preço mencionado nas facturas não correspondia ao preço efectivamente praticado e que parte do valor dos cheques emitidos pelo valor total de cada factura, IVA incluído, retornava ao emitente do cheque, se limitou a recolher e referir os seguintes factos-índice:
os cheques emitidos pela contribuinte para o pagamento de sete dessas facturas foram descontados ao balcão da instituição sacada e não depositados,
os dois restantes cheques, apesar de depositados na conta do emitente das facturas, foram seguidos de levantamentos dessa conta de quantias correspondentes a cerca de 90% do seu valor.

A estes dois factos, acrescentamos outros dois, também referidos na informação que serviu de fundamentação aos actos impugnados e no relatório de fiscalização do “Clube Desportivo ...”, deixando para depois a análise da sua relevância para a conclusão a que chegou a AT: o Clube não tinha arquivado uma das facturas e não entregou nos cofres do Estado a maior parte do IVA que liquidou e recebeu.
Estes factos, aduzidos pela AT com vista a demonstrar a legalidade da sua actuação, não são suficientes para fundamentar materialmente a conclusão de que o preço constante das facturas em causa é simulado.
Na verdade, como bem ficou dito na sentença recorrida, porque a AT não pôs em causa a realização dos serviços referidos nas facturas e nada referiu quanto à divergência entre os valores facturados e os valores de mercado dos serviços prestados, não são os referidos factos, por si só, que indiciam suficientemente a simulação do preço mencionado nas facturas, nada permitindo concluir, contrariamente ao que pretende a AT, que parte do valor dos cheques emitidos para titular o pagamento das facturas tenha sido restituído pelo “Clube Desportivo ...” à Impugnante.
Não pode excluir-se, sem mais, que os serviços referidos naquelas factura tenham sido realmente prestados por aqueles valores, tanto mais que os cheques foram emitidos à ordem do emitente das facturas e descontados pelos dirigentes deste.
Pretendendo a AT que o preço constante das facturas excede o preço real por que as operações foram realizadas, deveria ter colhido outros indícios factuais que pudessem justificar materialmente essa conclusão, designadamente e a título meramente exemplificativo: a desproporção entre os valores facturados e os valores de mercado dos serviços prestados, a divergência entre os valores das facturas em causa e de outras emitidas para serviços semelhantes e a desproporção entre as receitas geradas pelo emitente das facturas e as despesas resultantes das actividades por ele desenvolvidas.
A AT deveria ter efectuado outras diligências no sentido de apurar, com a certeza jurídica exigida, outros indícios de que o preço referido nas facturas em causa é simulado.
Sustenta a Recorrente que os referidos factos são suficientes para fundamentar materialmente a conclusão de que o preço referido nas facturas é simulado e, consequentemente, para legitimar a sua actuação e pretende ainda que se considerassem outros factos, que na sua perspectiva são «públicos e notórios». Vejamos:
Relativamente aos supra referidos factos-índice, argumenta a Recorrente: «de todas as facturas emitidas para a impugnante durante os quatro anos, e isso não foi contraditado nos autos, uma delas, no valor de 7 500 000$00, nem sequer estava arquivada na entidade emitente, o que revela uma certa ligeireza e falta de rigor na sua emissão, própria do pouco significado de tais documentos; por outro lado, à excepção de duas quantias, todos os cheques emitidos pela impugnante foram de imediato levantados em dinheiro, como se isso fosse comum e normal no giro comercial para tão elevadas quantias; por último e o mais significativo é sem dúvida o facto de os dois únicos cheques depositados terem sido de seguida movimentados, restando na conta do clube apenas e em qualquer dos casos 10%, exactamente o mesmo procedimento e percentagem verificados com um sem número de cheques e empresas a quem foram dirigidas facturas com a mesma origem» (cfr. art. 3.º das alegações de recurso).
Salvo o devido respeito, o primeiro facto pouca relevância pode assumir, uma vez que a responsabilidade pela desorganização da contabilidade do emitente das facturas não pode ser assacada à Impugnante, como igualmente lhe não pode ser imputada qualquer responsabilidade pelo facto de aquele não ter feito a entrega de parte do IVA que liquidou e recebeu da Impugnante.
Quanto ao facto de sete dos cheques terem sido descontados em numerário ao balcão da instituição bancária sacada e de os dois únicos que foram depositados terem sido seguidos de levantamentos de 90% do seu valor, excluído o IVA, só por si, não justificam a conclusão de que o preço referido nas facturas seja simulado. Na verdade, todos esses levantamentos foram efectuados por membros dos órgãos sociais do “Clube Desportivo ...” ou à ordem destes e nada ficou demonstrado quanto ao destino dado a esse dinheiro. Aliás, tendo os dirigentes daquele Clube referido aos Serviços de Fiscalização que todos os pagamentos efectuados pelo Clube o eram em numerário, esta afirmação não foi posta em causa.
Quanto aos demais factos que a Fazenda Pública pretende que também concorreram para sustentar a sua conclusão de que os preços mencionados nas facturas não correspondem aos realmente praticados e que, por serem públicos e notórios, deveriam também ter sido levados em conta pelo Tribunal a quo para sindicar a legalidade da sua actuação, recordemos também a argumentação da Recorrente: «A estes factos poder-se-á acrescentar outros que são públicos e notórios como são os desmesurados montantes revelados para um serviço de publicidade circunscrito a uma área muito restrita; o tipo de campeonato que disputa o clube envolvido, sem projecção ou impacto televisivo; o número e repetição dos adeptos que frequentam o estádio, dada a sua natureza quase e rural etc» e «Se a Administração Fiscal não alude à desproporção entre o alegado serviço prestado e os valores envolvidos é porque isso é um facto de tal maneira evidente, mercê da dimensão do clube e da sua projecção no “ranking” nacional, conjugado com os demais valores percebidos de outras empresas “doadoras”, que dispensava tais considerações» (cfr. arts. 4.º e 7.º das alegações de recurso).
Concordamos com a Recorrente que essencial para se averiguar da simulação de preços é a eventual desproporção entre os preços constantes das facturas e o valor dos serviços prestados, mas já não podemos aceitar a sua argumentação de que tal desproporção se deve ter como assente com base na factualidade por ela considerada pública e notória.
Desde logo, factos públicos e notórios são, na definição do art. 514.º, n.º 1, do CPC, e que também aqui deve ser a adoptada (cfr. art. 12.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária), «os factos que são do conhecimento geral». Ora, os factos respeitantes quer à dimensão e projecção do “Clube Desportivo ...” quer aos custos dos serviços publicitários prestados pelos clubes desportivos não são, manifestamente, do conhecimento geral. Careciam, pois, de ser alegados e demonstrados pela AT para fundamentar a sua actuação.
Por outro lado, sobre a desproporção entre o valor de mercado dos serviços prestados e o preço constante das facturas que, a nosso ver, constituiria a pedra de toque para indagar da simulação do preço declarado, no relatório que serviu de fundamentação às liquidações impugnadas não descortinamos referência alguma. Naquele relatório apenas vislumbramos uma referência à dificuldade em avaliar esses serviços – «Dada a incorporabilidade dos ‘serviços prestados’ pelo clube não se consegue medir o valor desses mesmos serviços em termos rigorosos» – desacompanhada de qualquer factualidade no sentido de indagar quais os serviços efectivamente prestados e quais os preços praticados pelo mesmo clube relativamente a outros clientes ou por outros clubes de idêntica dimensão e projecção para serviços do mesmo tipo.
É certo que no relatório da fiscalização detectamos uma referência à variação de preços ao longo do tempo para serviços alegadamente iguais prestados à Impugnante – «face ainda à discrepância de valores para serviços iguais isto é empresas (...) como por exemplo a Som... que no ano de 1993 lhe facturou 5 000 contos, 9 500 contos em 1994, 12 500 contos em 1995 e 15 000 contos em 1996». No entanto, porque aí se não referem quais os serviços concretos que foram prestados ao longo dos anos, não podemos sequer averiguar se estes se mantiveram os mesmos ao longo de todo esse tempo, sendo que a Impugnante afirma que não (cfr. art. 51.º da petição inicial). Em todo o caso, fica por demonstrar que essa evolução dos montantes facturados não corresponda a uma elevação dos preços resultante do funcionamento das regras do mercado.
Finalmente, é de referir que, pese embora o esforço argumentativo desenvolvido pela Recorrente, a única fundamentação dos actos impugnados que podemos levar em conta é a que consta da informação e relatório referidos; não podemos levar em conta qualquer fundamentação, por muito pertinente que se revele, aduzida depois da prática daqueles actos. Na verdade, como é sabido, no contencioso tributário, que é de mera anulação, o tribunal não pode conhecer da legalidade do acto impugnado a coberto de pressupostos que não estiveram na base da sua prática, sendo que apenas se poderão considerar como pressupostos do acto tributário aqueles que a Administração tributária fez constar da declaração fundamentadora (parte integrante do próprio acto e dele coeva) que externou quando da prática do mesmo, não relevando para esse efeito outros eventuais fundamentos que não constem daquela declaração, não sendo admissível a fundamentação a posteriori.
Não somos insensíveis à argumentação expendida pela Recorrente no art. 5.º das alegações de recurso, na parte que respeita às dificuldades dos Serviços de Fiscalização Tributária, mas pensamos ter demonstrado a irrelevância dos factos-índice apresentados quando, como no caso, desacompanhados de outros, alguns dos quais referimos a título meramente exemplificativo, que permitissem chegar, com a certeza jurídica exigível, à conclusão de que a AT podia desconsiderar as deduções declaradas pela Impugnante.
Por tudo o que ficou dito, afigura-se-nos que a AT não logrou provar a verificação dos requisitos que permitiam a sua actuação. Assim sendo, haverá que concluir-se pela ilegalidade dessa actuação e, consequentemente, pela ilegalidade das liquidações impugnadas.
A sentença recorrida decidiu nesse sentido, anulando, como pedido pela Impugnante, aquelas liquidações; por isso, não merece censura.

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulam-se as seguintes conclusões:
I - De acordo com o entendimento actual do princípio da legalidade administrativa, incumbe à AT o ónus de prova da verificação dos requisitos legais das decisões positivas e desfavoráveis ao destinatário, como sejam a existência dos factos tributários e a respectiva quantificação (ressalvadas as excepções do art. 121.º, n.º 2, do CPT, em vigor à data), isto quando o acto por ela praticado tem por fundamento a existência do facto tributário e a sua quantificação.
II - No caso da liquidação adicional de IVA ter por fundamento o não reconhecimento das deduções declaradas pelo contribuinte, à AT compete apenas fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, constantes do art. 82.º, n.º 1, do CIVA, competindo ao contribuinte o ónus da prova da existência e dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do art. 19.º do CIVA.
III - Assim, se o juízo da AT assenta em ter considerado que o montante das facturas em causa (cujo IVA foi deduzido) excede o valor das operações realmente efectuadas, bastar-lhe-á demonstrar a existência de indícios sérios de que o preço referido nas facturas foi simulado, passando então a competir ao contribuinte o ónus de provar que esse preço é o real, não lhe bastando criar dúvida sobre a sua veracidade (o art. 121.º, n.º 1, do CPT, a que corresponde hoje igual número do art. 100.º do CPPT, não logra aqui aplicação, pois não está em causa a prova sobre a existência e quantificação do facto tributário, que competiria à AT nos termos referidos em I).
IV - Para que o Tribunal considere que a AT podia proceder à liquidação adicional de IVA com aquele fundamento não basta que verifique se a AT fundamentou formalmente a sua actuação, ou seja, se disse por que se convenceu de que não há lugar às deduções de imposto constante das referidas facturas, mas haverá também que aferir da correcção do juízo formulado pela AT, ou seja, se este se deve ter como objectiva e materialmente fundamentado.
V - Estando em causa nove facturas respeitantes à prestação de serviços de publicidade, se a única fundamentação objectiva aduzida pela AT para considerar que o preço referido nas facturas excedia o preço real das operações e, consequentemente, que não havia lugar à dedução do imposto nelas liquidado foi a de que:
­ o emitente das facturas não declarou nem entregou a totalidade do IVA liquidado,
­ os cheques emitidos pela contribuinte para o pagamento de sete dessas facturas foram descontados ao balcão da instituição sacada e não depositados,
­ os dois restantes cheques, apesar de depositados na conta do emitente das facturas, foram seguidos de levantamentos dessa conta de quantias correspondentes a cerca de 90% do seu valor,

não pode ter-se aquele juízo por materialmente fundamentado.
VI - Na verdade, aqueles factos, por si só, contrariamente ao que pretende a AT, não indiciam suficientemente que parte do valor dos cheques tenha sido restituído à contribuinte pelo emitente das facturas, não sendo de excluir, sem mais, que os serviços referidos naquelas factura tenham realmente sido prestados por aqueles valores, tanto mais que os cheques foram emitidos à ordem do emitente das facturas e descontados pelos dirigentes deste.
VII - Pretendendo a AT que o preço constante das facturas excede o preço real por que as operações foram realizadas, deveria ter colhido outros indícios factuais que pudessem justificar materialmente essa conclusão, designadamente e a título meramente exemplificativo: a desproporção entre os valores facturados e os valores de mercado dos serviços prestados, a divergência entre os valores das facturas em causa e de outras emitidas para serviços semelhantes e a desproporção entre as receitas geradas pelo emitente das facturas e a actividade por ele desenvolvida.
VIII - No contencioso tributário, que é de mera anulação, o tribunal não pode conhecer da legalidade do acto impugnado a coberto de pressupostos que não estiveram na base da sua prática, sendo que apenas se poderão considerar como pressupostos do acto tributário aqueles que a Administração tributária fez constar da declaração fundamentadora (parte integrante do próprio acto e dele coeva) que externou quando da prática do mesmo, não relevando para esse efeito outros eventuais fundamentos que não constem daquela declaração, não sendo admissível a fundamentação a posteriori.
IX - Sendo de considerar que a AT não fez prova dos requisitos legais que lhe permitiam a sua actuação ao abrigo do art. 82.º, n.º 1, do CIVA, não merece censura a decisão por que foi julgada procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IVA respeitante às deduções que considerou indevidas.

* * *

3. DECISÃO

Termos em que acordam, em conferência, os juizes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.

Sem custas, por delas estar isenta a Recorrente.


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Lisboa, 17 de Dezembro de 2003

Francisco António Pedrosa de Areal Rothes

João António Valente Torrão
Joaquim Casimiro Gonçalves

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(1) A Impugnante alegou também a falta de comunicação dos fundamentos das liquidações impugnadas, irregularidade que confundiu com o vício de falta de fundamentação das liquidações, sendo que a sentença considerou não se verificar tal irregularidade e, nessa parte, transitou em julgado.
(2) Isto, pese embora a impugnante aludir à alínea c) do art. 120.º do CPT (cfr. art. 40.º da petição inicial).
(3) As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente, aqui como adiante, constituem transcrições.
(4) Ver nota 2.
(5) Como procuraremos demonstrar adiante, o vício em causa será de falta de fundamentação substancial, vício de violação de lei, e não de falta de fundamentação formal, este sim vício de forma.
(6) Salientamos que dar como reproduzido o teor do relatório dos Serviços de Fiscalização Tributária no elenco dos factos provados não é a mesma coisa que dar como provados os factos constantes desse relatório.
(7) Também relativamente ao IRC, a AT desconsiderou como custos da Impugnante o valor daquelas facturas.
(8) Proferido no recurso com o n.º 26635 e cujo texto se encontra disponível no site da Direcção-Geral dos Serviços Informáticos (www.dgsi.pt).
(9) Vide também, quanto ao ónus da prova, da 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, os acórdãos de 24 de Novembro de 1999 e de 26 de Janeiro de 2000, proferidos nos recursos com os n.ºs 32434 e 37739 e publicados no Boletim do Ministério Justiça n.ºs 491, págs. 115 a 125, e 493, págs. 225 a 232, tudo respectivamente.
(10) O princípio da legalidade deixou de surgir como um mero limite à actividade da Administração para passar a ser o fundamento de toda sua actividade. Assim, de acordo com o disposto no art. 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, a Administração só pode agir nas condições em que a lei lho autoriza e nada poderá fazer contra a lei.
(11) No mesmo sentido, vide SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 2.ª edição, pág. 287.
(12) Cfr. VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), 3.ª edição, págs. 279 a 282.
(13) Segundo o qual «sempre que da prova produzida resulte a fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário, deverá o acto impugnado ser anulado».
(14) Cfr. o referido acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17 de Abril de 2002.
(15) Note-se que já não seria assim se a liquidação resultasse, não de deduções consideradas indevidas, mas de operações não declaradas, caso em que recairia sobre a AT o ónus da prova da existência dos factos tributários.
(16) Note-se, de passagem, que, contrariamente ao que afirmou a Impugnante na petição inicial, não se exige à AT a prova dos pressupostos exigidos pela lei civil para que se verifique a simulação (cfr. art. 240.º do Código Civil), bastando-lhe recolher indícios sérios de que o preço não corresponde ao real.
(17) Daí que, como será referido adiante, fique prejudicada a questão da aplicação no tempo do regime legal previsto neste artigo, suscitada pela Recorrente.
(18) Neste sentido, vide também o acórdão deste Tribunal Central Administrativo de 9 de Maio de 2000, proferido no recurso com o n.º 3066/99.
(19) Com a ressalva, já efectuada, de que a questão se situa, não no domínio da validade formal do acto, mas no da sua validade material.