Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:124/17.5BCLSB
Secção:CT
Data do Acordão:03/22/2018
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:DECISÃO ARBITRAL INTERLOCUTÓRIA
INIMPUGNABILIDADE
Sumário:i) A decisão interlocutória que julga improcedente a extemporaneidade do pedido de pronúncia arbitral faz caso julgado formal, mas não forma caso julgado material, pelo que apenas pode ser impugnada através da impugnação da decisão que conheça do fundo da causa.
ii) Nada impede que na impugnação da decisão arbitral que conheça do mérito da causa sejam conhecidos os vícios assacados à decisão interlocutória que julgou improcedente a excepção da caducidade da acção.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I- Relatório

Autoridade Tributária e Aduaneira vem deduzir a presente impugnação contra a decisão interlocutória proferida no Processo arbitral n.º 724/2016-T,[CAAD] instaurado por “..., S.A.”, que julgou improcedente a excepção de caducidade do direito de acção, invocada em sede de resposta ao pedido de  pronúncia arbitral.

A impugnante termina as alegações de impugnação, formulando as conclusões seguintes:
I. Constitui objecto da presente impugnação a decisão interlocutória proferida em 21 de Julho de 2017, pelo Tribunal Arbitral Colectivo em matéria tributária constituído sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) em 21 de Março de 2017, na sequência de pedido de pronúncia arbitral com opção por designação de árbitro aceite em 07 de Dezembro de 2016, ao abrigo do regime aprovado pelo Decreto-Lei nº10/2011, de 20 de Janeiro (PJAT) e que corre termos sob o n.º 724/2016-T.
II. A decisão objecto da presente impugnação apreciou a excepção peremptória de caducidade do direito de acção suscitada pela ora impugnante em sede de Resposta ao pedido de pronúncia arbitral, apresentado em 06-12-2016, no âmbito do qual a Requerente arbitral peticionou a «declaração de ilegalidade integral dos atos de liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios», respeitantes ao exercício de 2011, cujo termo do prazo para pagamento voluntário ocorreu em 18-01-2016, ou seja, após o términus do prazo de 90 dias previsto na alínea a) do n.º l do artigo 10º do RJAT.
III. No decurso da realização da reunião do artigo 18º do RJAT na qual se discutiu a excepção invocada, foi proferida, em 21 de Julho de 2017, a decisão interlocutória que concluiu pela improcedência da excepção.
IV. De acordo com o n.º l do artigo 27º do RJAT, «A decisão arbitral pode ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo, devendo o respectivo pedido de impugnação, acompanhado de cópia do processo arbitral, ser deduzido no prazo de 15 dias, contado da notificação da decisão arbitral.»
 (…)
VII. Tenha-se ainda presente que o n.º 2 do artigo 27º do RJAT determina que «ao pedido de impugnação da decisão arbitral é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso de apelação definido no Código do Processo dos Tribunais Administrativos».
VIII. Ora, o artigo 142º, n.º 5, do CPTA estabelece uma regra especial no tocante ao regime de subida e à tramitação dos recursos dos despachos interlocutórios, segundo a qual estes despachos são impugnados no recurso que venha a ser interposto da decisão final, excepto nos casos em que o recurso deva subir imediatamente previstos no CPC.
IX. Ora, nos termos do artigo 644º, nº l, alínea b), primeira parte, do CPC, determina-se que «Cabe recurso de apelação [...] Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa [...].»
       (…)
XIII. Mais invoca que do artigo 142º, nº5 do CPTA e do artigo 644º, nº l, alínea b) do CPC, resulta, pois, evidente que se pretendeu abranger no âmbito das decisões susceptíveis de recurso imediato e autónomo da decisão final, o despacho saneador que não ponha termo ao processo por julgar procedente ou improcedente apenas algum ou alguns dos pedidos relativamente a todos ou algum dos interessados, bem como, para o que ora importa, o despacho saneador onde se aprecie excepção peremptória, seja no sentido da procedência, seja no sentido da improcedência da mesma, ainda que, neste último caso, apenas com efeitos parciais na lide.
XIV. Ora, é pacífico o entendimento no sentido de que no contencioso tributário a caducidade do direito de acção tem natureza de excepção peremptória (cfr. Acórdão do STA de 22-05-2013, proferido no processo nº0340/13);
XV. E tal como se consigna no douto Acórdão do STA de 17-06-2015, proferido no proc. 0194/15: «II - Não sendo impugnada a sentença que assim decide forma-se caso julgado material quanto a essa questão, nos termos do disposto nos artigos 619º, nº l e 621º do NCPC;».
XVI. Pelo que, atentas as normas legais aplicáveis, acima identificadas, bem como a doutrina e a jurisprudência citadas, não pode senão concluir-se que pode ser objecto de impugnação, com subida imediata, a decisão arbitral interlocutória que determine a improcedência da excepção de caducidade do direito de acção, nos termos do disposto no artigo 27º do RJAT, no artigo 142º, nº5 do CPTA e no artigo 644º, nº l, alínea b) do CPC;
XVII. Mais refere que a decisão arbitral padece dos vícios de (i) oposição dos fundamentos com a decisão e de (ii) omissão de pronúncia, nos termos do disposto nas alínea b) e c) do nºl do artigo 28º do PJAT.
(…)


X

A fls. 89/119, a impugnada apresentou pronúncia, na qual pugna pela improcedência da impugnação e pela manutenção da decisão impugnada.

Formula as conclusões seguintes:
I.      Vem a AT Impugnar da douta Decisão Interlocutória proferida pelo CAAD, mais concretamente da decisão que julgou improcedente a exceção de caducidade do direito da Recorrida;
II.   Para além de não assistir razão à AT, não estão preenchidos os Requisitos de admissibilidade da presente Impugnação;
III.  O processo ainda não se encontra findo, encontrando-se em fase de alegações, logo, não é suscetível de Impugnação a decisão interlocutória, porquanto esta, para além de não se ter pronunciado sobre o mérito da ação, não pôs fim à causa;
IV.   A AT assenta a sua construção argumentativa selecionando factos que, apesar de servirem melhor a sua tese, não correspondem à realidade;
V.     A regra é a irrecorribilidade da decisão arbitral em matéria tributária;
VI.   Sendo que, o legislador determinou que a sentença arbitral fosse suscetível de anulação pelo TCA, estabelecendo nos artigos 27º e 28º do RJAT o regime dessa impugnação, também denominada de ação de anulação;
VII.   O Artigo 27.º, do RJAT, sob a epígrafe, Impugnação da decisão arbitral prevê, no seu nº l que, “A decisão arbitral pode ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo, devendo o respectivo pedido de impugnação, acompanhado de cópia do processo arbitral, ser deduzido no prazo de 15 dias, contado da notificação da decisão arbitral ou da notificação prevista no artigo 23º, no caso de decisão arbitral emitida por tribunal colectivo cuja intervenção tenha sido requerida nos termos da alínea b) do nº2 do artigo 6º";
VIII. Ora, in casu estamos perante um Tribunal Coletivo, requerido nos termos da alínea b), do nº2, do artigo 6º, do RJAT, pelo que, apenas com a notificação prevista no nº23º, do mesmo diploma, poderia a Impugnante lançar mão da presente impugnação;
IX. No caso concreto, não foram, ainda, notificadas as partes da dissolução do Tribunal Arbitral, pelo que, não poderia a AT lançar mão da presente, dendo ser, desde já, recusada a admissão da presente, por ser praticada em momento processual impróprio;
X. Do mesmo modo, não estão preenchidos quaisquer dos requisitos que a lei faz depender para admissão da presente;
Senão vejamos,
XI. De acordo com o disposto no nº2, do artigo 27º, do RJAT "Ao pedido de impugnação da decisão arbitral é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso de apelação definido no Código do Processo dos Tribunais Administrativos";
XII. Por seu turno, o artigo 142º, nº5, do CPTA, prevê que "Decisões proferidas em despacho interlocutório podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto da decisão final, excepto nos casos em que é admitida apelação autónoma nos termos da lei processual civil";
XIII. Seguindo o artigo 644º, nºl, al. b), do CPC, cabe apelação autónoma "Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos"; 
XIV. Ou seja, é condição imprescindível para a admissão da presente Impugnação que o Tribunal Coletivo do CAAD, se tivesse pronunciado sobre o mérito da acão, tal como vem configurado o Recurso pela AT;
XV. Ora, in casu, a decisão ora impugnada não é suscetível de Impugnação, porquanto, trata-se de uma decisão sobre a improcedência de uma exceção de caducidade do direito de ação, logo, não houve aqui qualquer decisão sobre o mérito da causa suscetível de impugnação junto deste Venerando Tribunal;
(…)
XVIII. Isto porque, é jurisprudência pacífica e unânime do Supremo Tribunal Administrativo que no julgamento de exceções dilatórias ou peremptórias o Tribunal não conhece do mérito da ação;
XIX. Na verdade, exceções dilatórias ou peremptórias obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa e dão lugar à absolvição da instância ou à remessa do processo para outro tribunal ou importam a absolvição total ou parcial do pedido, sendo que, “em ambas o tribunal não prossegue com a apreciação da causa" [Vide: Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, proferido no Processo nº: 0340/13, datado de 22-05-2013, disponível em www.dgsi.pt];
XX. Ou seja, o efeito característico das exceções é, precisamente, o de obstar a que o Tribunal conheça do mérito ou do fundo da causa, limitando a actividade jurisdicional ao conhecimento da exceção, que é o que sucede no caso da caducidade do direito de ação;
XXI. Isto porque, ao julgar uma exceção, o Tribunal limita-se a verificar, face aos factos pertinentes (invocados pelo Réu ou de conhecimento oficioso), se está, ou não, precludido o conhecimento do mérito da causa, não extravasando o plano processual da (in)tempestividade da ação;
XXII. Sempre que o Supremo Tribunal Administrativo foi chamado a pronunciar-se sobre esta matéria a conclusão foi a mesma, na apreciação da exceção de caducidade do direito o Tribunal não aprecia nem decide o mérito da causa;
XXIII. Assim, não se afigura que a presente Impugnação seja admissível, porquanto não foi apreciado o mérito da acção, sendo pacífica a esse propósito a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo [Vide neste sentido: Acórdão proferido no processo nº0275/15, datado de 16/03/2016, Acórdão proferido no processo nº0243/16, datado de 20/04/2016 e Acórdão proferido no processo nº01566/16, datado de 18/05/2016, todos disponíveis em www.dgsi.pt]:
XXIV. Ou seja, sendo o julgamento da exceção de caducidade, uniformemente, considerado - e bem - como sendo uma decisão que não aprecia o mento da causa, bom está de ver que, no caso dos autos, a situação trazida á liça pela AT não se enquadra no disposto no artigo 644º, nºl, alínea b), primeira parte do CPC;
XXV. Logo, não se trata de um caso em que o Recurso deva subir imediatamente, nos termos previstos no CPC (vide artigo 142º, nº5, do CPTA);
XXVI. Em suma, a situação de facto trazida a este Venerando Tribunal não se enquadra no recorte jurídico do disposto nos artigos 27º e 28º, do RJAT, 142º, nº5, do CPTA e 644º, nºl, al. b), do CPC, porquanto, a decisão interlocutória não apreciou, nem se debruçou sobre o mérito da acção, logo, não pode ser, neste caso concreto, objeto de Impugnação (nos termos dos artigos 27º e 28º do RJAT) a Decisão Arbitral Interlocutória que determinou a improcedência da exceção de caducidade;
XXVII. Devendo ser liminarmente rejeitada a Impugnação da AT;
(…)


X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal notificado nos termos e para os efeitos do disposto no nº1 do artigo 146º do CPTA, nada disse.

X

Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência para decisão.

X

II- Fundamentação

1.De Facto.

A decisão impugnada julgou provada a seguinte matéria de facto:

1- Na sua resposta, a AT alegou que, sendo o pedido da Requerente a anulação de uma liquidação adicional de IRC e a dos correspondentes juros compensatórios, cujo prazo para pagamento voluntário terminara em 19-01-2016, o pedido de constituição de Tribunal Arbitral (apresentado em 6 de dezembro de 2016) é intempestivo, atento o disposto no artigo 102º, nº l, al. a) do CPPT, aplicável por força do disposto no art.º 10º, nº l, do RJAT, pelo que o direito à ação teria caducado.

2- A Requerente respondeu a esta exceção alegando ter apresentado reclamação graciosa de tais liquidações em 09 de maio de 2016, a qual foi expressamente indeferida em 06 de setembro de 2016.

3- Notificada para se pronunciar, a AT aceitou a existência de tal reclamação graciosa, bem como as datas da sua apresentação e indeferimento expresso indicadas pela Requerente, juntando aos autos a pertinente documentação.


X

2. De Direito.

2.2.1. Nos presentes autos vem impugnado o despacho do tribunal arbitral que julgou improcedente a excepção da caducidade da acção, relativamente ao pedido de pronúncia arbitral, consistente na «declaração de ilegalidade integral dos actos de liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios, respeitantes ao exercício de 2011, cujo termo do prazo de pagamento voluntário ocorreu em 18.01.2016».

2.2.2. A presente pretensão anulatória centra-se sobre os alegados vícios de (i) oposição dos fundamentos com a decisão e (ii) omissão de pronúncia, nos termos do disposto nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 28.º do RJAT.

Nos presentes autos, vem impugnado o despacho do tribunal arbitral que julgou improcedente a excepção da caducidade da acção, invocada pela ora impugnante, na resposta ao pedido de pronúncia arbitral.

Para justificar a impugnabilidade do despacho em crise, a impugnante alega nos termos seguintes:

1) Do artigo 142º, nº 5 do CPTA e do artigo 644º, nº l, alínea b) do CPC, resulta que são impugnáveis por meio de recurso imediato os despachos saneadores que conheçam de excepção peremptória;

2) É pacífico o entendimento no sentido de que no contencioso tributário a caducidade do direito de acção tem natureza de excepção peremptória.
3) Não sendo impugnada a sentença que assim decide forma-se caso julgado material quanto a essa questão, nos termos do disposto nos artigos 619º, nº l e 621º do NCPC.
4) Pode ser objecto de impugnação, com subida imediata, a decisão arbitral interlocutória que determine a improcedência da excepção de caducidade do direito de acção, nos termos do disposto no artigo 27º do RJAT, no artigo 142º, nº5 do CPTA e no artigo 644º, nº l, alínea b) do CPC;

Por seu turno, a impugnada defende a irrecorribilidade da decisão questionada.

Vejamos.

2.2.3. A norma de referência para aferir da impugnabilidade da decisão em liça é a que consta do artigo 27.º do RJAT (“Impugnação da decisão arbitral”), o qual dispõe:

«1. A decisão arbitral pode ser anulada pelo Tribunal Central Administrativo, devendo o respectivo pedido de impugnação, acompanhado de cópia do processo arbitral, ser deduzido no prazo de 15 dias, contado da notificação da decisão arbitral ou da notificação prevista no artigo 23.º, no caso de decisão arbitral emitida por tribunal colectivo cuja intervenção tenha sido requerida nos termos da alínea b), do n.º 2 do artigo 6.º.

2. Ao pedido de impugnação da decisão arbitral é aplicável com as necessárias adaptações, o regime do recurso de apelação definido no Código do Processo dos Tribunais Administrativos».

Estatui o artigo 142.º, n.º 5, do CPTA, que: «As decisões proferidas em despacho interlocutório podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto da decisão final, excepto nos casos em que é admitida apelação autónoma nos termos da lei processual civil».

O artigo 644.º, do CPC (“Apelações autónomas”) estabelece que cabe recurso de apelação da «decisão, proferida em 1ª instância, que ponha termo à causa» e do «despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos» (n.º 1). O n.º 3 do preceito dispõe que as «restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1».

A este propósito, afirma-se que «o despacho saneador incide sobre o mérito da causa quando nele se julga procedente ou improcedente algum ou alguns dos pedidos relativamente a todos ou algum dos interessados; outrossim, quando, independentemente da solução dada da posterior evolução processual, nele se apreciem, no sentido da procedência ou da sua improcedência, exceções peremptórias, como a caducidade, a prescrição, a compensação, a nulidade ou a anulabilidade. Em qualquer dos casos, ainda que o despacho saneador não determine a extinção total da instância, prosseguindo esta para apreciação de outras questões, está sujeito a recurso imediato»[1].

Sem embargo, a solução preconizada não se aplica ao caso em exame, pelas razões que se enunciam de imediato:

iii)  A remissão para o regime do recurso de apelação, tal como este resulta das normas pertinentes do CPTA, é feita com a ressalva das “necessárias adaptações” (V. artigo 27.º/2, do RJAT).

iv) A extemporaneidade do pedido de pronúncia arbitral não implica a preclusão do direito de impugnação administrativa ou contenciosa do acto tributário (artigos 13.º, n.º 4, in fine, e 24.º, n.º 3, do RJAT[2]).

v) Constitui jurisprudência assente a de que, «[n]os termos do disposto no nº 2 do art. 25º do RJAT, só as decisões arbitrais que conheçam de mérito são susceptíveis de recurso para o STA, quando estejam em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com acórdão proferido por algum dos Tribunais Centrais Administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo»[3].

vi) A decisão interlocutória que julgou improcedente a extemporaneidade do pedido de pronúncia arbitral faz caso julgado formal[4], mas não forma caso julgado material, pelo que pode ser impugnada através da impugnação da decisão que conheça do fundo da causa[5].

Ou seja, nada impede que na impugnação da decisão arbitral que conheça do mérito da causa sejam conhecidos os vícios assacados à decisão interlocutória que julgou improcedente a excepção da caducidade da acção. Como se consigna nos preceitos dos artigos 644.º/3[6], do CPC e 142.º/5, do CPTA[7], «as decisões interlocutórias podem ser impugnadas [na impugnação] interposta da decisão final».

Em face do exposto, impõe-se concluir no sentido da não impugnabilidade da decisão objecto da presente impugnação, o que determina a rejeição da mesma.

Termos em que se procederá no dispositivo.

2.2.4. No que respeita à dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP.

Nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, «[n]as causas de valor superior a €275000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento». Como decorre da Tabela I do RCP, quando o valor da causa seja superior a €275.000,00, ao valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada €25.000 ou fracção, três unidades de conta, no caso da coluna A, uma e meia unidade de conta no caso da coluna B e quatro e meia unidades de conta no caso da coluna C. «É esse remanescente, ou seja, o valor da taxa de justiça correspondente à diferença entre €275.00,00 e o efectivo superior valor da causa para efeito da determinação daquela taxa, que deve ser considerado na conta final, se o juiz não dispensar o seu pagamento»[8].

«A referência à complexidade da causa significa, em concreto, a sua menor complexidade ou simplicidade e a positiva atitude de cooperação das partes»[9].

Nos termos do artigo 527.º, n.º 1, do CPC, «[a] decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito». Nos termos do n.º 2 do preceito, «[e]ntende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for».

No caso em exame, o valor da causa corresponde a €3.663.018,11.

Sobre a matéria constitui jurisprudência assente a de que: «[o] direito fundamental de acesso aos Tribunais, que o artº.20, nº.1, da C.R.P., previne, comporta, numa das suas ópticas, a necessidade de os encargos fixados na lei ordinária das custas, pelo serviço prestado, não serem de tal modo exagerados que o tornem incomportável para a capacidade contributiva do cidadão médio. Sob este ponto de vista, pode acontecer que a fixação da taxa de justiça calculada apenas com base no valor da causa (particularmente se em presença estiverem procedimentos adjectivos de muito elevado valor), patenteie a preterição desse direito fundamental, evidenciando um desfasamento irrazoável entre o custo concreto encontrado e o processado em causa». [Ac. do TCAS, de 13.03.2014, P. 07373/14].

No caso em exame, a especialidade da causa não é de molde a afastar o limiar do valor de €275.00,00, dado que a complexidade ou especificidade não justificam a imposição de encargos dissuasores do acesso à justiça. O mesmo se diga do comportamento processual das partes, em particular da ora requerente, o qual se pautou pelo cumprimento do dever de boa fé processual.

Por outras palavras, atendendo à lisura do comportamento processual das partes e considerando a relativa complexidade do processo, afigura-se ser de deferir a dispensa do pagamento da taxa de justiça na conta final.

Pelo exposto, impõe-se deferir a dispensa de pagamento da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º/7, do RCP, para ambas partes.


Dispositivo

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em rejeitar, por inimpugnabilidade da decisão, a presente impugnação relativa ao despacho do tribunal arbitral que julgou improcedente a excepção da caducidade da acção, relativamente ao pedido de pronúncia arbitral, consistente na declaração de ilegalidade integral dos actos de liquidação adicional de IRC e respectivos juros compensatórios, respeitantes ao exercício de 2011, cujo termo do prazo de pagamento voluntário ocorreu em 18.01.2016.

Custas pela impugnante, com dispensa de pagamento da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º/7, do RCP, para ambas partes.

Registe.

Notifique.


(Jorge Cortês - Relator)

(1ª. Adjunta – Cristina Flora)

(2ª Adjunta – Ana Pinhol)



[1]       António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2016, 3.ª Edição, p. 169.
[2]       V. Jorge Lopes de Sousa, “Comentário ao Regime Jurídico da Arbitragem”, in Guia da Arbitragem, Coordenação Nuno Villa-Lobos e Mónica Brito Vieira, Almedina, 2013, p. 179.
[3]       Acórdão do STA (Pleno da Secção de Contencioso Tributário), de 16.03.2016, P. 0275/15. No mesmo sentido, V. Acórdão do STA, de 16.11.2016, P. 0650/16.
[4]       Artigo 620.º, n.º 1, do CPC, ex vi artigo 29.º/1/e), do RJAT.
[5]       Nuno Andrade Pissarra, Breves Notas sobre os artigos 678.º, 691.º, 721.º e 721.º-A, do CPC, in “O Direito”, 144º, 2012, II, pp. 259 a 315, máxime, pp. 266/268.
[6]       Ex vi  artigo 29.º/1/e), do RJAT.
[7]       Ex vi  artigo 29.º/1/c), do RJAT.
[8] Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, anotado, 4.ª ed., p. 236.
[9] Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais, anotado, 4.ª ed., p. 236.