Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:126/08.2BEFUN
Secção:CT
Data do Acordão:07/08/2021
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:PROCEDIMENTOS INSPECTIVOS EXTERNOS
CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS
Sumário:I - Estando provado nos autos que quanto aos exercícios de 2003, 2004 e 2005, e relativamente à Recorrente decorreram dois procedimentos inspectivos, e que ambos decorreram nas instalações do impugnante, forçoso é concluir que ambos os procedimentos se devem qualificar como externos, não pode senão concluir-se pela ilegalidade do procedimento. A esta conclusão não obsta o facto de os objectivos visados serem distintos uma vez que a restrição prevista no n.° 4 do artigo 63.° da LGT, é estabelecida em função, não do tipo ou fim do procedimento, mas sim do local onde o mesmo deva ocorrer: a lei visa impedir os incómodos que as fiscalizações externas são susceptíveis de provocar ao sujeito passivo inspeccionado, assegurando, por essa via, a adequação e proporcionalidade entre tais incómodos e os fins que a inspecção visa prosseguir.

II - Estando nós perante um método directo de determinação do imposto devido – correcções meramente aritméticas -, deveria ter sido usado um método directo de avaliação. Assim, as correcções à matéria colectável com base em pressupostos de exercícios diferentes, não se podem manter.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

B....., vem recorrer da sentença de fls.892 a 954 do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal que lhe julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios dos anos de 2003 a 2007.

Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões:


A) A sentença recorrida incorreu em errada apreciação das provas, em contradição com os concretos meios probatórios constantes do processo (cfr. supra, capítulo II. a) das presentes alegações), meios probatórios estes que impunham uma decisão diferente da tomada sobre a matéria de facto e de direito, e fez incorrecta interpretação e aplicação do direito, nomeadamente do disposto nos artigos 268° n°3, da Constituição da República Portuguesa e 77° da Lei Geral Tributária, violando tais disposições ao não julgar procedente o invocado vício de forma, por falta de fundamentação clara congruente e suficiente, dos actos tributários em crise no presente recurso;


B) A sentença recorrida incorreu errada apreciação das provas (cfr. supra, capítulo II b), das presentes alegações) e em manifesta contradição entre os factos dados como provados no segmento probatório, nomeadamente a credenciação da acção inspectiva consubstanciada na exibição - e assinatura pelo Impugnante do Despacho N° ..... (cfr. artigo 46° n°2 in fine do RCPIT) e as consequências jurídicas de deles extraiu, designadamente ao julgar não ter havido credenciação no âmbito do procedimento inspectivo ao abrigo do Despacho N°.....;


C) A sentença recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 13°, 46° 49° e 51° do RCPIT ao não julgar os procedimentos de inspecção ao abrigo do Despacho N°..... e ao abrigo da Ordem de serviço n°..... procedimentos de inspecção externa nos termos da Lei (cf. artigo 13° do RCPIT), e coincidentes no sujeito passivo, imposto e períodos de tributação (2003 a 2005), e, consequentemente, ao não julgar ilegal o segundo daqueles procedimentos - em que assentam as liquidações ora impugnadas - em violação expressa do artigo 63°, n°3 da LGT (cfr. supra, capítulos III. b) e IV. b) das presentes alegações);


D) A sentença recorrida fez também errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 49° do RCPIT ao não julgar o procedimento de inspecção ao abrigo do Despacho N°..... ilegal, por violação expressa do artigo 63°, n°3 da LGT (cfr. supra, capítulos III. b) e IV. b) das presentes alegações);


E) A sentença recorrida incorreu numa interpretação contra legem das disposições conjugadas nos artigos 13° e 49° do RCPIT - ao negar a qualificação de procedimento externo de inspecção ao abrigo do Despacho N°..... - interpretadas no sentido de que o procedimento de inspecção externo, ainda que materialmente externo por se consubstanciar em actos materialmente inspectivos realizados nas instalações do contribuinte só se tem por verificado se cumprida a formalidade de notificação prévia prevista no citado artigo 49° (cfr. supra, capítulos III b.) e IV b), das presentes alegações);


F) A interpretação, levada a cabo pela sentença recorrida, das disposições do RCPIT sobre a natureza externa do procedimento de inspecção, de que resulta a violação da proibição prevista no artigo 63°, n°3 da LGT, acarreta a violação de garantias dos contribuintes legal e constitucionalmente consagradas, designadamente o princípio da proporcionalidade consagrado no citado normativo a as normas e princípios constitucionais de que decorrem, violando também o disposto no artigo 266°, n°2 e da CRP e o princípio da proporcionalidade nele consagrado (cfr. supra, capítulos II. b) e IV. b) das presentes alegações);


G) Tal interpretação, in casu, dos preceitos legais referidos, designadamente as disposições dos artigos 13°, 46° 49° e 51° do RCPIT seria também inconstitucional, por violação do princípio da segurança jurídica e da protecção da confiança, o qual garante a certeza de segurança nos direitos e expectativas juridicamente tuteladas, com alicerce no princípio do Estado de Direito democrático ínsito no artigo 2° da Constituição da República Portuguesa (cfr. supra, capítulo IV. b), das presentes alegações);


H) A sentença recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação do disposto n°3 do artigo 63° da LGT, ao não julgar que o procedimento de inspecção ao abrigo do Ordem de serviço nº..... foi realizado de forma ilegal, por manifesta violação daquele normativo com a consequente ilegalidade dos consequentes actos que absorvem essa mesma ilegalidade e nenhum efeito em relação aos ora impugnantes com respeito aos exercícios de 2003, 2004 e 2005 (cfr. supra, capítulo IV. b) das presentes alegações);


I) A sentença recorrida fez ainda incorrecta interpretação e aplicação das normas sobre a repartição do ónus da prova, ao manter correcções à matéria colectável com base em pressupostos de exercícios diferentes, designadamente correcções do ano de 2006 baseadas em supostas anulações indevidas alegadamente verificadas com respeito ao exercício de 2007, e consequentemente, ao não julgar ilegais as consequentes liquidações por erro sobre os pressupostos de facto e de direito (cfr. supra, capítulo IV. c) das presentes alegações);


J) A sentença recorrida incorreu em errada interpretação e aplicação das disposições conjugadas do artigo 45°, nº1 e 46°, n°1, da LGT ao não julgar caducado o direito à liquidação do IVA relativo ao exercício de 2003 (cfr. supra, capítulo IV d), das presentes alegações), ao atribuir efeito suspensivo do respectivo prazo à acção inspectiva ao abrigo da Ordem de serviço n°....., sendo esta era proibida pelo 63° da LGT, e ao não dar como provado que os respectivos actos de liquidação foram notificadas ao Impugnante em 3 de Janeiro de 2008 (cfr. doc. n°71 anexo à p.i.), ou seja para além do prazo de quatro anos de caducidade do respectivo direito à liquidação, em violação do disposto no artigo 45°, n°1, da LGT. (cfr. supra, capítulos IV b) e IV d) das presentes alegações);


K) A sentença recorrida não considerou ou apreciou acriticamente a prova documental e produzida em sede de audiência, da qual não resulta ter havido incumprimento das normas fiscais, designadamente as supostas anulações alegadamente indevidas por parte do Recorrente - prescindindo o Tribunal a quo da culpa como pressuposto da responsabilidade por juros compensatórios em violação do disposto nos artigos 96° do Código do IVA e 35° da Lei Geral Tributária (cfr. supra, capítulo IV. e) das presentes alegações);


L) A decisão recorrida é ainda contraditória com a sua fundamentação de direito em matéria de responsabilidade por juros compensatórios, na medida em que se baseia em jurisprudência de sentido totalmente oposto ao da decisão, assim como num parecer junto a outros autos que não os presentes autos, não conhecendo, como devia, das circunstâncias do caso (cfr. supra, capítulo IV e) das presentes alegações).


Termos em que a sentença recorrida merece inteira censura - ao decidir manter na ordem jurídica os actos de liquidação de IVA e juros compensatórios em crise no presente recurso - devendo em consequência V. Exas., concedendo provimento ao recurso jurisdicional, revogá-la in totum, e, consequentemente, anular integralmente tais liquidações por vício de forma decorrente de falta de fundamentação, erro nos pressupostos de facto e de direito, errónea qualificação e quantificação da matéria colectável e pelos restantes vícios invocados de violação de lei, designadamente os artigos 63°, n°3, 74° e 77° da LGT.


Só assim decidindo, com o douto suprimento de Vossas Excelências, revogando a sentença recorrida será respeitado o DIREITO e farão Vossas Excelência, JUSTIÇA.


*

Não foram apresentadas contra-alegações.

*

O Ministério Público, junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso (cfr. fls.1070 dos autos).


*

Colhidos os Vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

***

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1. De Facto

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:


A) B..... (doravante apenas impugnante), com actividade de Comércio a Retalho de Produtos Farmacêuticos, em Estabelecimentos Especializados, com o CAE 47730, é sujeito passivo de IVA encontrando-se enquadrado no regime normal mensal (fls 464, dos autos);

B) Em 22-03-2007 foi emitida pela Direcção de Serviços de Inspecção Tributária -Investigação da Fraude e Acções Especiais (DSIT) uma proposta para emissão de despachos com vista à recolha de elementos em diversos sujeitos passivos no sector das farmácias da RAM (fls.466, dos autos);
Da proposta referida no ponto anterior são explicitados os motivos que tornavam necessárias as acções de inspecção (fls 466, dos autos):
Na sequência de uma análise à situação tributária de várias farmácias situadas na RAM, detectou-se que algumas mantiveram-se abaixo da média do sector. Tal facto foi possível verificar através das baixas margens de comercialização ou pelas baixas rendibilidades fiscais nos últimos exercícios.

C) Em 30-03-2007 foi exarado o despacho n°..... com vista a Recolha Consulta e Cruzamento de Informações aos exercícios de 2003, 2004 e 2005 (fls. 468, dos autos);


D) Em 18-04-2007 o impugnante assinou o despacho referido no ponto anterior (fls.468, dos autos);


E) Em 22-06-2007 foi encerrada a inspecção efectuada ao abrigo do despacho n°..... (fls. 470, dos autos);


F) Em 03-07-2007 o Inspector tributário lavrou a informação de fls 473 a 479, que se dá por reproduzida para todos os efeitos legais, propondo a emissão de uma Ordem de Serviço Externa para os exercícios de 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007, por forma a averiguar de deduções indevidas de IVA e regularização das vendas;

G) Nessa informação é referido que o sujeito passivo regularizou a situação descrita com a apresentação de declarações periódicas de IVA dos períodos 0303T a 05/12T e das declarações de rendimentos respeitantes aos exercícios de 2003, 2004 e 2005, acrescendo aos quadros 421 e 04 os montantes de €26.664,28, €6.269,20 e €35.014,16, respectivamente (fis 478, dos autos);

H) Em 12-07-2007 foi proferido despacho de concordância para emissão da Ordem de Serviço no âmbito do IRS de 2003 a 2006 e do IVA de 0303T a 07/06T (fls.473, dos autos);


I) Em 13-07-2007 foi remetida Carta Aviso, ao impugnante, ao abrigo da Ordem de Serviço n°....., com incidência aos exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006, em IRS e IVA (fls. 481, dos autos);


J) A Ordem de Serviço n°.....foi emitida em 1207-2007 (fls.486, dos autos);


K) No âmbito da Ordem de Serviço referida no ponto anterior foi realizado em 30-10-2007 o Projecto de Relatório da Inspecção Tributária, que foi notificado ao impugnante para exercer o direito de Audição nos termos do art°60° da LGT e 60° do RCPIT (fls.483 a 490, dos autos);

L) Em 28-11-2007 foi elaborado o Relatório de Inspecção Tributária, que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais e que com interesse se reproduz (fls.722 a 741, dos autos):
II- OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO
1. Credencial e período em que decorreu a acção
Ordem de Serviço n°.....de 2007-07-12 - PNAIT-321,22 (Sujeitos passivos que se
encontram em situação de reporte de crédito de IVA, em períodos sucessivos) com despacho de 2007-07-12.
2. Motivo, âmbito e incidência temporal
A emissão da Ordem de Serviço foi motivada pelo facto do Sujeito Passivo A – B....., no decurso da sua actividade de comércio a retalho de farmacêuticos, apresentar no campo 40 das Declarações Periódicas de IVA, regularizações materialmente relevantes, a seu favor. A incidência temporal compreende os exercícios de 2003 a 2006, tendo o âmbito da acção inspectiva incidido sobre o IRS e o IVA.
III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
No decorrer da acção inspectiva foram detectadas as seguintes situações:
1- Anulações indevidas de vendas
Através de uma análise às declarações de IVA, constatou-se que o contribuinte apresentava consecutivamente no campo 40, regularizações a seu favor, com alguma materialidade. Estes valores originavam na sua maior parte, declarações de IVA com crédito de imposto. Uma vez solicitado um esclarecimento sobre tal facto, o contribuinte alegou tratarem-se de regularizações afectas a vendas a clientes habituais da farmácia, apresentando também extractos contabilísticos que as evidenciavam.
Ao consultar o mapa recapitulativo do dia 28 de Março de 2007 (doc. 1), juntamente com a sua contabilização, verificámos os seguintes factos:
Mapa recapitulativo Contabilização Valores c/ IVA
Taxa Reduzida Taxa Normal Total
Emissão de Talões
a)
509.43
14,65
524,08
Facturas/Recibo
111/711 -2433
639.75
109,75
749,50
Anulação de Talões
717/321 -24342
(18.84)
0.00
(18,84)
Emissão de Facturas
b)
0,00
0.00
0,00
a) Rubrica não utilizada para efeitos contabilísticos:
b) Só é movimentada no último dia do mês:
Contas: 111 - Caixa: 711 - Vendas de existências; 2433 - IVA Liquidado: 717 - Devoluções de vendas; 321 - Existências. 24342 - Reg. de IVA a favor do SP
Notas explicativas:
Emissões de talões, resultam das vendas a clientes habituais que adquirem diariamente em grandes quantidades, como é o exemplo da Casa de Saúde Câmara Pestana, sendo facturado numa data posterior. São ainda emitidos talões, quando são concedidos descontos ao balcão, uma vez que se torna necessário emitir dois documentos, sendo o primeiro, um sem efeitos para o IRS, onde é apurado o desconto, que seguidamente é anulado (anulações de talões), por via de uma Factura/Recibo.
Facturas / Recibo, representam as vendas normais ao balcão.
Anulação de Talões, podem derivar de várias situações: pelos factos supra referidos; pela ocorrência de alguns lapsos na emissão dos mesmos ou no caso de processamento de facturas;
Emissão de facturas, indica o valor facturado aos clientes, anulando todos os talões emitidos no decorrer do mês aos mesmos.
Como podemos verificar no quadro supra, a emissão dos talões não é considerado para efeitos contabilísticos, contudo as anulações dos mesmos, dá origem a um lançamento de regularização e consequente anulação de vendas, conforme quadro seguinte referente ao dia 31 de Março de 2007 (doc. 2), onde verificámos o seguinte:
Mapa recapitulativo
Contabilização
Vendas (IVA incluído)
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Emissão de Talões
a)
24,73
0.00
24,73
Facturas/Recibo
111/711 -2433
686.94
116,60
803,54
Anulação de Talões
717/321 -24342
(14.393,34)
(463,49)
(14.856,83)
Emissão de Facturas
211/711 -2433
14.218,38
    434,41
14.652,87
a) Rubrica não utilizada para efeitos contabilísticos;

Como podemos verificar neste quadro, os talões que não foram contabilizados durante a sua emissão, são tratados contabilisticamente na sua anulação.
A contabilização destas regularizações tem vindo a constituir desde 2003 até 2006, omissões/inexactidões na contabilidade e consequentemente nos valores apresentados nas declarações de rendimentos do contribuinte, representando uma infracção ao n°1 do artigo 57° do C.I.R.S.. Destes factos, resultam também a falta de entrega de IVA ao Estado, infracção ao nº1 do artigo 26° e artigo 10,° ambos 46 C.I.V.A..
Sendo assim, foram apurados os valores facturados por exercício, que posteriormente foram indevidamente anulados e consequentes regularizações de IVA, conforme quadros abaixo:
Exercício
2003
Anulações de vendas indevidas
IVA Deduzido indevidamente (C40)
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Janeiro
5.598,09
213,15
5.811,24
223,92
27,71
Fevereiro
1.651,11
0,22
1.651,33
66,04
0,03
Março
6.986,74
263,36
7.250,10
279,47
34,24
631,41
Abril
4.744.62
101,70
4.846,31
189,78
13,22
Maio
5.805,82
220,38
6.026,20
232,23
28,65
Junho
4.748,27
369,85
5.118,12
189,93
48,08
701,90
Julho
7.791,94
259,58
8.051,52
311,68
33,74
Agosto
7.027,97
208,72
7.236,69
281,12
27,13
Setembro
6.803,43
196,50
6.999,94
272,14
25,55
951,36
Outubro
9.182,56
211,83
9.394,39
367,30
27,54
Novembro
6.500,75
223,06
6.723,81
260,03
29,00
Dezembro
7.616,57
337,07
7.953,64
304,66
43,82
1.032,35
Total
74.457,86
2.605,42
77.063,28
2.978,31
338,71
3.317,02
Exercício
2004
Anulações de vendas indevidas
IVA Deduzido indevidamente (C40)
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Janeiro
6.527,42
232,05
6.759,48
261,10
30,17
Fevereiro
6.533,71
121,79
6.655,50
261,35
15,83
Março
5.845,93
178,09
6.024,02
233,84
23,15
825,43
Abril
7.033,34
228,54
7.261,88
281,33
29,71
Maio
6.095,11
235,34
6.330,44
243,80
30,59
Junho
7.218,87
144,87
7.363,73
288,75
18,83
893,03
Julho
7.564,53
263,91
7.828,44
302,58
34,31
Agosto
6.443,36
62,48
6.505,83
257,73
8,12
Setembro
7.991,22
273,23
8.264,46
319,65
35,52
957,92
Outubro
9.215,67
172,50
9.388,18
368,63
22,43
Novembro
8.428,83
316,84
8.745,67
337,15
41,19
Dezembro
7.002,79
282,49
7.285,28
280,11
36,72
1.086,23
Total
85.900,77
2.512,14
88.412,91
3.436,03
326,58
3.762,61
Exercício
2005
Anulações de vendas indevidas IVA Deduzido indevidamente (C40)
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Janeiro
7.977,33
206,10
8.183,42
319,09
26,79
345,89
Fevereiro
7.461,77
131,83
7.593,60
298,47
17,14
315,61
Março
8.591,93
142,04
8.733,98
343,68
18,47
362,14
Abril
7.180,91
286,85
7.467,77
287,24
37,29
324,53
Maio
7.460,72
148,90
7.609,63
298,43
19,36
317,79
Junho
7.157,84
194,03
7.351,87
286,31
25,22
311,54
Julho
5.979,98
91,83
6.071,81
239,20
13,77
252,97
Agosto
7.798,60
210,45
8.009,05
311,94
31,57
343,51
Setembro
9.515,06
293,48
9.808,54
380,60
44,02
424,62
Outubro
9.683,44
188,99
9.872,43
387,34
28,35
415,69
Novembro
7.103,37
285,83
7.389,19
284,13
42,87
327,01
Dezembro
6.750,02
296,39
7.046,41
270,00
44,46
314,46
Total
92.660,96
2.476,73
95.137,69
3.706,44
349,31
4.055,75
Exercício
2006
Anulações de vendas indevidas
IVA Deduzido indevidamente (C40)
Taxa Reduzida Taxa Normal
Total
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Janeiro
7.251,61
167,87
7.419,48
290,06
25,18
315,24
Fevereiro
6.283,10
123,10
6.406,19
251,32
18,46
269,79
Março
11.140,00
306,26
11.446,26
445,60
45,94
491,54
Abril
8.623,20
109,31
8.732,51
344,60
16,40
361,33
Maio
9.710,59
239,00
9.949,59
388,42
35,85
424,27
Junho
8.032,64
300,78
8.333,43
321,31
45,12
366,42
Julho
7.571,59
204,48
7.776,06
302,86
30,67
333,54
Agosto
8.448,13
341,72
8.789,86
337,93
51,26
389,18
Setembro
10.031,93
338,97
10.370,90
401,28
50,84
452,12
Outubro
11.208,26
188,25
11.396,51
448,33
28,24
476,57
Novembro
11.529,25
116,74
11.645,99
461,17
17,51
478,68
Dezembro
8.587,29
353,26
8.940,55
343,49
52,99
396,48
Total
108.417,59
2.789,74
111.207,33
4.336,70
418,46
4.755,16
Em resultado destas correcções, obtém-se os seguintes valores corrigidos para os campos 40 das declarações periódicas seguintes:
Valores Corrigidos (C40 DP)
Período
2003
2004
2005
2006
Declarado
Corrigido
Declarado
Corrigido
Declarado
Corrigido
Declarado
Corrigido
Janeiro
1.784,47
1.153,06
1.670.75
845,32
562,85
216,96
500,16
184,92
Fevereiro
493,27
177,66
416,09
146,30
Março
608,92
246,78
714,82
223,28
Abril
1.492,52
790,62
1.588.33
695,30
645,60
321,07
567,98
206,65
Maio
508,01
190,22
700,15
275,88
Junho
504,83
193,29
689,04
322,62
Julho
1.484,58
533,22
2.201.90
1.243.98
440,12
187,15
1.156,50
822,96
Agosto
540,45
196,94
622,00
232,82
Setembro
630,00
205,38
609,08
156,96
Outubro
2.174,71
1.142,36
1.818,20
731,97
638,67
222,98
683,55
206,98
Novembro
529,46
202,45
660,88
182,20
Dezembro
619,06
304,60
652,49
256,01
Total
6.936,28
3.619,26
7.279,18
3.516,57
6.721,24
2.665,49
7.972,74
3.217.58
2- inexistência de inventários de existências finais
Ainda foi detectado que o contribuinte não possui uma listagem comprovativa das existências finais dos exercícios em análise, no entanto, aquilo que comprova o valor de existências finais, caracteriza-se num documento interno, que refere o valor de existências no finais de cada exercício (doc. 3 a 6). Contudo era elaborado um controlo por amostragem, de um determinado número de produtos, que estando de acordo com os valores obtidos pelo sistema informático, era considerado o valor total de existências extraídas no mesmo.
3- Notificação
O sujeito Passivo foi notificado em 10-08-2007, por carta registada, para colocar à disposição ou assegurar a sua apresentação em caso de impedimento pessoal, na sua sede, todos os documentos de suporte legalmente exigidos nos termos da alínea a) do n°3 e n°5 do art°115° do CIRC, por remissão dos n.°s 1 e 2 do art. 117° do CIRS.
(...)
IX - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
IX — 1. Fundamentos do direito de audição
O contribuinte exerceu o direito de audição alegando, sinteticamente três factos, sendo estes os seguintes:
• A presente acção inspectiva não tem qualquer razão de existir uma vez que sucede a uma outra acção inspectiva sobre o mesmo objecto, de que aliás resultaram regularizações de imposto efectuadas pelo ora requerente;
• Conforme o ponto 4 da referida exposição, alega que o projecto de relatório apresenta de uma forma geral, falta de fundamentação;
• Referiu ainda que, não foi possível compreender os cálculos efectuados e apresentados no projecto de correcções.
IX — 2. Análise aos Fundamentos da Reclamação
Em primeiro lugar, subsiste a necessidade de distinguir os dois tipos de procedimentos de acções inspectivas, que o contribuinte em epígrafe foi alvo, nomeadamente o Despacho e a Ordem de serviço. Conforme contempla o artigo 46° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (R.C.P.I.T.), o despacho surge numa fase de única e exclusiva consulta, recolha e cruzamento de elementos. Já o procedimento inspectivo credenciado por ordem de serviço surge, numa fase em que, há suspeita de que existem factos tributários que carecem de correcção, e que de certo modo resultarão correcções desfavoráveis ao contribuinte, sobre um ou mais âmbitos, de um ou mais exercícios.
Assim, a acção desenvolvida com o n°.....de 2007-03-26- PNAIT - 622,25 (Acção Especial implementada pela DF's) com despacho de 2007-03-30, resultou com o objectivo de confrontar as margens comerciais declaradas pelo contribuinte à Administração Fiscal, com aquelas que vinha a praticar no exercício da sua actividade de farmacêutico. Ainda no decorrer da acção, o contribuinte efectuou voluntariamente regularizações às declarações de IRS e IVA, anteriormente entregues, em que acresceu à sua Matéria Colectável os montantes de 26.664,28 €6.269,20 €35.014,16€, para os exercícios de 2003, 2004 e 2005, respectivamente. No entanto, e em resultado do cruzamento efectuado no procedimento acima referido, foi possível verificar através das declarações de IVA apresentadas pelo contribuinte, que este declarava no campo 40, valores anormais de regularizações de imposto a seu favor, campo este que normalmente é movimentado quando existem devoluções de vendas, prática que não é muito comum na actividade que o mesmo desenvolve, muito menos por aqueles montantes. Destes factos, surgiu a necessidade de emitir um novo procedimento inspectivo, de forma a analisar mais pormenorizadamente essa situação de dedução de imposto, procedimento este que teve por base o âmbito de IVA e IRS, para os exercícios possíveis de conter erros e distorções nas declarações entregues e de ser possível a sua correcção, sendo estes de 2003 a 2007.
Uma vez que o contribuinte refere no exercício do direito de audição, que os cálculos apresentados não estão perceptíveis, tentarei num exemplo prático explanar a situação que tem vindo a constituir erros constantes na contabilidade do contribuinte e por conseguinte nas demonstrações financeiras e declarações entregues pelo mesmo à administração fiscal. Para este exemplo, foi seleccionado aleatoriamente o mês de Abril de 2005 e durante este mês, o contribuinte vendeu mercadorias ao Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, com o NIF 500 989 001 (cliente da farmácia com conta corrente), valorizadas em 28.159,95€ (IVA incluído), resultando este cálculo e com base na factura n°58 em anexo (doc. 200 a 213). da multiplicação das quantidades vendidas pelos preços unitários respectivos, nas colunas 3 e 4, estando mais detalhado nos documentos em anexo numerados de 217 a 229. Contudo, grande parte da venda destas mercadorias foi comparticipada pelo Estado (74%), o que faz com que a farmácia tenha que facturar a várias entidades pelas vendas efectuadas à entidade supra referida.
Conforme a factura n°58 (doc. 200 a 213), de 2005/04/30 emitida pelo contribuinte em epígrafe, podemos constatar que foi facturado à entidade acima referida o valor de 6.993,32 € (IVA incluído), referente a aquisições efectuadas durante o mês de Abril, onde foram emitidos vários talões, sendo estes posteriormente anulados por conta de uma factura global, em conformidade com o n°6 do artigo 28° do C.I.V.A.. Deste montante, já havia sido debitado um desconto concedido àquele cliente no valor de 1.234,12 €, constante da última linha da factura em anexo (doc. 213). Os restantes 19.932,51 E (IVA incluído), que correspondem à parte da venda que é comparticipada, foram também facturados às várias entidades Estatais, que têm protocolos com o Ministério da Saúde, como é o caso da ADSE. Segurança Social, entre outros. Sendo assim, esta venda caracteriza-se da seguinte forma:
Descrição
Valores com IVA
Valor das Mercadorias
28.159,95 €
Factura n ° 58 (I.I H.S.C.J.) Líquido do desconto
6.993,32 €
Desconto concedido na factura n° 58
1. 234,12 €
Valor Facturado às Entidades Estatais
19.932,51 €
Também no dia 2005/04/30 e à semelhança do que é feito durante o mês, foi extraído um mapa recapitulativo das vendas diárias (Doc. 119 em anexo ao projecto de correcções), que serviu de base à contabilidade, para registar as vendas ao balcão, que juntamente com as facturas emitidas aos clientes com conta corrente e às entidades Estatais, perfazem o montante de vendas diário. Sendo assim, o mapa recapitulativo apresenta os seguintes valores:
Mapa recapitulativo
Valores com IVA
Valores sem IVA
IVA
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Emissão de Talões
291,54
15,45
280,33
13,43
11,21
1,75
Facturas/Recibo
326,17
63,95
313,63
55,61
12,55
7,23
Emissão de Facturas
7.468,15
329,88
7.180,91
286,85
287,24
37,29
Anulação de Talões
(8.841,36)
(329,88)
(8.501,31)
(286,85)
(340,05)
(37,29)

Acrescento ainda, que o valor facturado ao Instituto das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, está contemplado na rubrica de Emissão de Facturas, uma vez que foi facturado ao cliente através da referida factura n°58, mas também encontra-se na rubrica descrita em baixo como anulação de talões, uma vez que existiam talões que foram emitidos durante o mês e que no acto da emissão da factura foram anulados. No que respeita às anulações de talões, foi possível verificar o seguinte:

Mapa recapitulativo
Valores com IVA
Valores sem IVA
IVA
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Anulação de Talões
(8.841,36)
(329.88)
(8.501.31)
(286.85)
(340.05)
(37,29)
Emissão de Facturas
7.468.15
329,88
7.180.91
286,85
287.24
37,29
Diferença
(1.373,21)
0,00
(1.320.40)
0,00
(52,81)
0,00
Esta diferença resulta dos descontos concedidos ao balcão, de lapsos cometidos na emissão de talões, entre outras situações que levaram à anulação dos mesmos.
Sendo assim e uma vez que quer a factura n°58, quer as anulações dos talões que a originaram.
foram contabilizados na sua totalidade, torna-se evidente que o saldo da conta de proveitos vai estar a transmitir valores que não correspondem com a realidade, quando a única anulação que devia ser efectuada seria a referida no quadro supra (diferença), resultante da diferença entre os montantes facturados e o montante das anulações de talões.
Assim os valores que se corrige para este mês de Abril são os seguintes:
• O montante de 7.180.91€ incluído no valor de 8.501.31 € de anulações de talões à taxa reduzida, que ao ter um tratamento contabilístico equiparado à anulação de vendas, tem que ser rectificado;
• O montante de 286,85 € que perfaz o total das anulações de talões à taxa normal, que ao ter um tratamento contabilístico equiparado à anulação de vendas, tem que ser rectificado;
• Os montantes de IVA, que estão subjacentes aos lançamentos contabilísticos descritos acima, nomeadamente de 287,24 € (7.180,91 X 4%) e 37.29 E (286.85 X13%), respectivamente.
Todos estes valores podem ser observados no quadro referente às correcções para o exercício de 2005, referente ao mês de Abril, na página 5.
Nos restantes meses não abordados, as situações irregulares são totalmente equiparadas à anteriormente relatada, sendo os valores a única variável.
Mais se refere que quanto aos mapas apresentados n° capítulo III do presente relatório, respeitantes aos exercícios de 2004 e 2005, apresentam algumas distorções, pelo facto de ter sido utilizado uma taxa de IVA normal, que ainda não estava em vigor de 15%, quando deveria ter sido a de 13%, estando o resultado destas alterações em anexo, nos documentos 214, 215 e 216.
Contudo e pelo facto dos montantes que resultam do lapso acima referido, caracterizarem-se em diferenças irrisórias a favor do Estado, os valores que servirão de base para as correcções oficiosas, serão os que constam do projecto de correcções.
Os documentos em anexo numerados de l a 199 apresentados no projecto de correcções, não serão incluídos no presente relatório, uma vez que já foram facultados ao contribuinte.
O contribuinte, na sua exposição não apresenta factos que possam justificar de certa forma, os lançamentos contabilísticos, que originam as irregularidades descritas no capítulo III do presente relatório.

M) Dão-se por reproduzidos para todos os efeitos legais os anexos de 1 a 199, que fazem parte integrante do Relatório de Inspecção Tributária;


N) O Relatório de Inspecção foi notificado ao impugnante por ofício n°....., datado de 07-12-2007 (processo instrutor apenso);

O) Em virtude da Inspecção foram efectuadas as seguintes liquidações adicionais de IVA dos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 (fls 46 a 77, dos autos):





P) Em 13-07-2007 foi enviada Carta Aviso em cumprimento da Ordem de Serviço n°....., para inspecção tributária em IVA ao ano de 2007 (fls 733, dos autos);


Q) Em 30-10-2007 foi realizado o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária e anexos, notificado ao impugnante por ofício n° ....., datado de 07-11-2007 (fls 736 a 782, dos autos);

R) Em 28-11-2007 foi realizado o Relatório de Inspecção Tributária, que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais e que se reproduz por interessar para a decisão da causa (junto ao processo instrutor apenso):
II -OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO
1. Credencial e período em que decorreu a acção
Ordem de Serviço n°.....de 2007-07-12 - PNAIT-321,22 (Sujeitos passivos que se encontram em situação de reporte de crédito de IVA, em períodos sucessivos) com despacho de 2007-07-12.
2. Motivo, âmbito e incidência temporal
A emissão da Ordem de Serviço foi motivada pelo facto do Sujeito Passivo A — B....., no decurso da sua actividade de comércio a retalho de produtos farmacêuticos, apresentar no campo 40 das Declarações Periódicas de IVA, regularizações materialmente relevantes, a seu favor. A incidência temporal compreende o exercício de 2007, tendo o âmbito da acção inspectiva incidido sobre o IRS e o IVA.
III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE
ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL
No decorrer da acção inspectiva foram detectadas as seguintes situações:
1- Anulações indevidas de vendas
Através de urna análise às declarações de IVA, constatou-se que o contribuinte apresentava consecutivamente no campo 40, regularizações a seu favor, com alguma materialidade.
Estes valores originavam na sua maior parte, declarações de IVA com crédito de imposto. Uma vez solicitado um esclarecimento sobre tal facto, o contribuinte alegou tratarem-se de regularizações afectas a vendas a clientes habituais da farmácia, apresentando também extractos contabilísticos que as evidenciavam.
Ao consultar o mapa recapitulativo do dia 28 de Março de 2007 (doc. 1), juntamente com a sua contabilização, verificámos os seguintes factos:
Mapa recapitulativo
Contabilização
Valores c/ IVA
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Emissão de Talões
a)
509,43
14,65
524,08
Facturas/Recibo
111/711 -2433
639,75
109,75
749,50
Anulação de Talões
717/321 -24342
(18.84)
0,00
(18,84)
Emissão de Facturas
b)
0.00
0;00
0,00
a) Rubrica não utilizada para efeitos contabilísticos;
b) Só é movimentada no último dia do mês;
Contas: 111 - Caixa; 711 - Vendas de existências; 2433 - IVA Liquidado; 717 - Devoluções de vendas; 321 - Existências, 24342 - Reg. de IVA a favor do SP
Notas explicativas:
Emissões de talões, resultam das vendas a clientes habituais que adquirem diariamente em grandes quantidades, como é o exemplo da Casa de Saúde Câmara Pestana, sendo facturado numa data posterior. São ainda emitidos talões, quando são concedidos descontos ao balcão, uma vez que torna-se necessário emitir dois documentos, sendo o primeiro um sem efeitos para o IRS, onde é apurado o desconto, que seguidamente é anulado (anulações de talões), por via de uma Factura/Recibo.
Facturas / Recibo, representam as vendas normais ao balcão.
Anulação de Talões, podem derivar de várias situações: pelos factos supra referidos; pela ocorrência de alguns lapsos na emissão dos mesmos ou no caso de processamento de facturas;
Emissão de facturas, indica o valor facturado aos clientes, anulando todos os talões emitidos no decorrer do mês aos mesmos.
Como podemos verificar no quadro supra, a emissão dos talões não é considerado para efeitos contabilísticos, contudo as anulações dos mesmos, dá origem a um lançamento de regularização e consequente anulação de vendas, conforme quadro seguinte referente ao dia 31 de Março de 2007 (doc. 2), onde verificámos o seguinte:

Mapa recapitulativo Contabilização Vendas (IVA incluído)
Taxa Reduzida Taxa Normal Total
Emissão de Talões
a)
24,73
0.00
24,73
Facturas/Recibo
111/711 -2433
686,94
116.60
803,54
Anulação de Talões
717/321 -24342
(14.393,34)
(463,49)
(14.856,83)
Emissão de Facturas
211/711 -2433
14.218,38
434,41
14.652,87
a) Rubrica não utilizada para efeitos contabilísticos;
Como podemos verificar neste quadro, os talões que não foram contabilizados durante a sua emissão, são tratados contabilisticamente na sua anulação.
A contabilização destas regularizações tem vindo a constituir no exercício de 2007, omissões/inexactidões no apuramento do IVA, de onde resulta a falta de entrega de IVA ao Estado, infracção ao n°1 do artigo 26° e artigo 40° ambos do C.I.V.A..
Sendo assim, foram apurados os valores facturados por exercício, que posteriormente foram indevidamente anulados e consequentes regularizações de IVA, conforme quadros abaixo:
Exercício
2007
Anulações de vendas indevidas
IVA Deduzido indevidamente (C40)
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Taxa Reduzida
Taxa Normal
Total
Janeiro
10.045,73
188,15
10.233,88
401,83
28,22
430,05
Fevereiro
8.491,86
203,72
8.695,58
339,67
30.56
370,23
Março
13.671,52
377,75
14.049,27
546,86
56,66
603,52
Abril
-
-
-
-
-
-
Total
39.963,20
1.025,10
40.988,30
1.288,36
115,44
1.403,81
No mês de Abril, o contribuinte procedeu a uma alteração do sistema informático que auxilia no processo de stock. Segundo afirmações do mesmo, refere que esta nova aplicação é mais elucidativa, no que diz respeito às vendas diárias.
Como podemos verificar no último período de análise (Abril/2007), o contribuinte substituiu a primeira declaração periódica, rectificando exactamente as deduções indevidas de IVA, estando o extracto das anulações de vendas ("717"), em conformidade com este facto. Sendo assim, não existem valores a corrigir para este período, nem nos seguintes, uma vez que deixaram de ser efectuadas as anulações de vendas supra referidas.
Em resultado destas correcções, obtém-se os seguintes valores corrigidos para os campos 40 das declarações periódicas seguintes:
Período
2007
Declarado
Corrigido
Correcção
Janeiro
618,13
188,08
430,05
Fevereiro
547,03
176.80
370,23
Março
890.56
287.04
603,52
Abril
186,71
186,71
-
Total
2.242,43
838,62
1.403,81
2- Notificação
O sujeito Passivo foi notificado em 10-08-2007, por carta registada, para colocar à disposição ou assegurar a sua apresentação em caso de impedimento pessoal, na sua sede, todos os documentos de suporte legalmente exigidos nos termos da alínea a) do n°3 e n°5 do art°115.°do CIRC, por remissão dos n °s 1 e 2 do art. 117° do CIRS.
(...)
IX - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
IX — 1. Fundamentos do direito de audição
O contribuinte exerceu o direito de audição alegando, sinteticamente três factos, sendo estes os seguintes:
• A presente acção inspectiva não tem qualquer razão de existir uma vez que sucede a uma outra acção inspectiva sobre o mesmo objecto, de que aliás resultaram regularizações de imposto efectuadas pelo ora requerente;
• Conforme o ponto 4 da referida exposição, alega que o projecto de relatório apresenta de uma forma geral, falta de fundamentação;
• Referiu ainda que, não foi possível compreender os cálculos efectuados e apresentados no projecto de correcções.
IX - 2. Análise aos Fundamentos da Reclamação
Em primeiro lugar, subsiste a necessidade de distinguir os dois tipos de procedimentos de acções inspectivas, que o contribuinte em epígrafe foi alvo, nomeadamente o Despacho e a Ordem de serviço. Conforme contempla o artigo 46° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (R.C.P.I.T.), o despacho surge numa fase de única e exclusiva consulta, recolha e cruzamento de elementos. Já o procedimento inspectivo credenciado por ordem de serviço surge, numa fase em que, há suspeita de que existem factos tributários que carecem de correcção, e que de certo modo resultarão correcções desfavoráveis ao contribuinte, sobre um ou mais âmbitos, de um ou mais exercícios.
Assim, a acção desenvolvida com o n°.....de 2007-03-26 - PNAIT - 622,25 (Acção Especial implementada pela DFs) com despacho de 2007-03-30, resultou com o objectivo de confrontar as margens comerciais declaradas pelo contribuinte à Administração Fiscal, com aquelas que vinha a praticar no exercício da sua actividade de farmacêutico. Ainda no decorrer da acção, o contribuinte efectuou voluntariamente regularizações às declarações de IRS e IVA, anteriormente entregues, em que acresceu à sua Matéria Colectável os montantes de 26.664,28, 6.269,20 E, 35.014,16 E, para os exercícios de 2003, 2004 e 2005, respectivamente.
No entanto, e em resultado do cruzamento efectuado no procedimento acima referido, foi possível verificar através das declarações de IVA apresentadas pelo contribuinte, que este declarava no campo 40, valores anormais de regularizações de imposto a seu favor, campo este que normalmente é movimentado quando existem devoluções de vendas, prática que não é muito comum na actividade que o mesmo desenvolve, muito menos por aqueles montantes.
Destes factos, surgiu a necessidade de emitir um novo procedimento inspectivo, de forma a analisar mais pormenorizadamente essa situação de dedução de imposto, procedimento este que teve por base o âmbito de IVA e IRS, para os exercícios possíveis de conter erros e distorções nas declarações entregues e de ser possível a sua correcção, sendo estes de 2003 a 2007.
No que diz respeito ao esclarecimento dos cálculos e critérios adoptados para o apuramento das correcções apresentadas, proposto pelo contribuinte no seu exercício do direito de audição, acresce-me referir que, encontra-se na sua íntegra explanado na Ordem de Serviço ....., urna vez que a presente acção inspectiva foi desenvolvida e informada ao contribuinte em simultâneo.

S) Dão-se por inteiramente reproduzidos os anexos ao relatório de Inspecção que dele fazem parte integrante;


T) O impugnante foi notificado do Relatório de inspecção referido no ponto anterior, por ofício n°....., datado de 07-12-2007 (processo instrutor apenso);


W) Na sequência da acção inspectiva foram realizadas as seguintes liquidações adicionais (fls. 78 a 80, dos autos):




U) Foram liquidados os juros compensatórios seguintes (fls. 81 a 98, dos autos):
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 631,41
Período a que se aplica a taxa de juro De 2003/05/15 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art°559° do CC
Valor dos juros 114,73
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 701,90
Período a que se aplica a taxa de juro De 2003/08/18 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N°1 do art°559° do CC
Valor dos juros 120,23
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 951,36
Período a que se aplica a taxa de juro De 2003/11/17 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 153,47
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 1.032,35
Período a que se aplica a taxa de juro De 2004/02/18 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art°559° do CC
Data limite de pagamento 2008/02/28
Valor dos juros 156,01
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 825,43
Período a que se aplica a taxa de juro De 2004/05/17 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N°1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 116,69
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 893,03
Período a que se aplica a taxa de juro De 2004/08/16 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 117,34
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 957,92
Período a que se aplica a taxa de juro De 2004/11/15 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 116,32
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 1.086,23
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/02/15 a 2007/11/18
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 120,94
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 345,89
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/03/10 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 37,64
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 315,61
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/04/11 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 33,24
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 362,14
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/05/10 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 36,99
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 324,53
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/06/13 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 31,94
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 317,79
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/07/11 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 30,30
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 311,54
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/08/11 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 28,68
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 343,51
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/10/10 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 29,33
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 424,62
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/11/10 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 34,81
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 415,69
Período a que se aplica a taxa de juro De 2005/12/12 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 32,62
Data limite de pagamento 2008/02/28
Imposto em falta sobre o qual incidem juros 491,54
Período a que se aplica a taxa de juro De 2006/05/10 a 2007/11/28
Taxa de juro aplicável ao período N° 1 do art° 559° do CC
Valor dos juros 30,54
Data limite de pagamento 2008/02/28

V) A presente impugnação deu entrada em 28-04-2008 (carimbo aposto no rosto de fls 1, dos autos).

*

Em sede de fundamentação da matéria de facto consignou-se o seguinte:

A convicção do Tribunal formou-se no teor dos documentos juntos em cada ponto dos factos provados e na inquirição das testemunhas. Da inquirição das testemunhas salienta-se o seguinte:
P..... é ajudante técnica de farmácia sendo funcionária da Farmácia há 11 anos. Em Abril de 2007 o Dr. Recebeu o Dr. H..... para fazer uma fiscalização. Esteve lá durante 2 meses. Pedia documentos. O Sr. J..... contabilista da farmácia foi várias vezes lá. A mim chamou-me para ver o stock da farmácia. Antigamente havia uma receita e agora há as receitas triplicadas: as receitas agora só podem ter 2 medicamentos e os médicos de família passam 3 receitas que dá para 6 meses. O Dr. Acabou por pagar por insistência do Dr. H...... Desconhece porque foram feitas as correcções. O Sr. H..... foi novamente por volta de Julho.
Esteve a consultar documentos. Existem: venda directa em que o cliente paga a sua parte e a outra é facturada à entidade; leva a factura; venda a crédito não entra dinheiro; é lançado o medicamento para controlo do stock. A factura é emitida quando for paga; abate ao stock e sai um documento com um valor a crédito. Venda suspensa: anula-se o talão anterior e emite novo documento. 90% dos medicamentos são comparticipados e os 10% não têm expressão. Se não houver factura o Estado não paga: factura ao cliente/factura ao Estado. Há descontos que são feito quando imprime a factura. J..... é o TOC há cerca de 10 ou 12 anos. Na primeira inspecção quase toda ela foi no meu gabinete. Todos os documentos que pediu eram da contabilidade. A farmácia tinha uma margem de cerca de 3% para menos. É uma farmácia de bairro e por isso há necessidade de descontos. Pode haver vários descontos depende da disponibilidade financeira da farmácia. Eu, o Dr. e o Inspector tivemos uma reunião e se concordasse com aquele aumento ficava por ali, senão o fisco ia fazer uma fiscalização durante 15 dias. Foi feita a correcção com base nas margens de 2007. Acho que não há descontos nos medicamentos comparticipados; há nos medicamentos de venda livre e outros produtos. As correcções foram enviadas por internet. Na 2ª feira apareceu novamente no meu escritório e queria levar o documento que encerrava a inspecção porque tinha ordens superiores para continuar. Doc n° 11 nunca viu. Notas de anulação: anulo uma venda que está efectuada, uma venda suspensa. Na contabilidade e na altura era melhor fazer em partidas dobradas. O stock estava correcto. Na 2ª inspecção as correcções foram feitas de uma maneira apressada, foram feitos com base nos mapas recapitulativos. No campo 40 da declaração periódica do IVA regista as eventuais regularizações porque pode ser a favor do Estado ou do contribuinte. O campo 40 vai sempre assinalado com correcções por causa da venda suspensa. É dos resultados que a contabilidade apresente que faz o IRS. O talão recapitulativo compreendia a vários documentos da contabilidade.
M....., assistente administrativa de contabilidades e trabalha há mais de 10 anos para a farmácia. Queriam fiscalizar o IVA, mas ao fazer a fiscalização do IVA implica com o IRS. Na fiscalização de 2003, 2004 e 2005 o inspector achou que a farmácia tinha uma margem inferior em 3% e disse que havia coisas mal lançadas. Apresentou as declarações corrigidas. No dia 22 de Junho foi assinada a nota de diligências e, na segunda- feira o inspector disse que ia anular a nota de diligências e a inspecção seguia. Em Julho voltou e depois em Setembro.
H....., inspector tributário. Foi apurado a margem de comercialização e foram seleccionadas 15 farmácias que tinham margens mais baixas. No 1° despacho não houve lugar a correcções, o contribuinte fez correcções voluntárias. As correcções a efectuar seriam no âmbito de Ordem de Serviço. Na fase da validação o superior hierárquico verificou haver divergências ao nível do IVA que constituíam irregularidades. Na 1ª inspecção foi para recolha de elementos: recolhi facturas de fornecedores e através delas constatei as margens do contribuinte. Verificou-se quais as margens do sector e foi apurada a margem de comercialização do sujeito passivo. Como indicar médio do sector utilizou o ano de 2007. Foi proposto ao contribuinte proceder à regularização voluntária e, por sua vontade apresentou as declarações de substituição. As declarações foram submetidas e liquidadas - encerrei o despacho. Foi feita uma informação ao trabalho realizado e entreguei ao sujeito passivo a mesma nota a que refere a informação. Houve depois uma ordem de serviço externa - o campo 40 foi o motivo que levou a emitir a Ordem de Serviço, para novas inspecções. Foram enviadas duas cartas aviso. No decurso dessa acção detectou-se que o sujeito passivo procedia à emissão de facturas de clientes habituais. Emitia um talão de forma a que retire os produtos do stock. No final do mês emitia uma factura global dos talões, anulando todos os outros, para poder emitir um único documento e, nessa altura emitia factura aos diversos organismos que comparticipavam. O mapa recapitulativo eram acompanhados pelos rolos das caixas registadoras. Aleatoriamente foi feito um teste para verificar os valores. Quando havia necessidade de fazer desconto era necessário recorrer aos talões de anulação; tratamento contabilístico: não contabilizava os talões, contabilizava as notas de anulação, facturas, recibos facturas. Na contabilidade quando eram efectuadas as vendas e anuladas as vendas e esta anulação de vendas originava uma regularização de IVA a favor da empresa. Era a prática contabilística. No dia em que são feitas muitas anulações era emitida uma factura. Por exemplo a factura n° 58 de 30-04-2005 (Casa de Saúde Câmara Pestana) - anulação superior ao valor da factura porque aplica alguns descontos, tem tratamento preferencial. O talão é emitido o valor normal e a factura aplica o desconto. O valor da factura continua a ser inferir ao valor do talão e existem outras diferenças que são dos lapsos, erros. Na farmácia no sistema de facturação estava correcto o que não estava correcto era o que vinha para a contabilidade.

*

A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte:

Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.
*
Ao abrigo do art. 662º do CPC, por se encontrar provado documentalmente, e poder relevar para a decisão da causa, adita-se o seguinte facto:

X) A acção de inspecção a que se referem as alíneas B), C), D) e E) teve o seu início em 16/04/2007 e conclusão em 22/06/2007, cfr. doc. a fls. 470 dos autos.

Z) Na Informação referida na alínea F), o Inspector Tributário escreveu o seguinte (cfr. fls. 473 a 479 dos autos) :
«1.1 Metodologia
A amostragem da Margem Bruta de Vendas, foi efectuada de acordo com a seguinte metodologia:
1.1.1 Relativamente a cada fornecedor procedeu-se ao apuramento das margens brutas de comercialização, separando-se as mercadorias à taxa reduzida e à taxa normal, por forma a obter-se as respectivas margens.
1.1.2 Por forma a assegurar a representatividade da amostragem, procedeu-se à selecção aleatória de diversas facturas, calculando-se para cada uma (separada por taxas de IVA), os respectivos valores globais de venda e de custo. Há que referir que a maioria das mercadorias comercializadas, são medicamentos, sujeitos a preços fixos (constantes da respectiva embalagem). É prática dos fornecedores facturarem as mercadorias pelo preço de venda, deduzindo diversos descontos, os quais constituem a margem de comercialização da Farmácia. (…)»

***

II.2. De Direito

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou improcedente a presente impugnação, mantendo as liquidações impugnadas, por legais.

Inconformado, o impugnante veio interpor recurso da referida decisão discordando da mesma, fundamentalmente, por duas ordens de razões [conclusão de recurso A)]:

- Errada apreciação das provas, em contradição com os concretos meios probatórios constantes do processo que impunham uma decisão diferente da tomada em matéria de facto e de direito;

- Incorrecta interpretação e aplicação do direito, nomeadamente, do disposto nos arts. 268º, nº 3 da CRP e 77º da LGT, violando tais disposições ao não julgar procedente o invocado vício de forma, por falta de fundamentação dos actos tributários em crise.

Vejamos.

Nas conclusões de recurso B) a H), o recorrente vem invocar a errada apreciação das provas e incorrecta interpretação e aplicação do disposto nos artigos 13º, 46º, 49º e 51º do RCPIT ao não julgar os procedimentos de inspecção ao abrigo do Despacho Nº ..... e ao abrigo da Ordem de Serviço nº .....procedimentos de inspecção externa nos termos da Lei e coincidentes no sujeito passivo e períodos de tributação (2003 a 2005) e, consequentemente, ao não julgar ilegal o segundo daqueles procedimentos, em que assentam as liquidações impugnadas. Mais alega que a sentença recorrida fez incorrecta interpretação e aplicação do disposto no nº 3 do art. 63º da LGT.

Sobre esta matéria, escreveu-se, em síntese, na sentença recorrida:

«Resulta da Informação emitida ao abrigo do Despacho n° ..... para recolha de informação e onde foi verificado a existência de margens brutas inferiores ao praticado para o sector e, por amostragem foram determinadas e apurou-se o custo das mercadorias vendidas e cada uma das taxas. Em consequência da correcção efectuada quanto à margem bruta os valores de IVA foram corrigidos.

Porém, e como resulta da mesma Informação o impugnante regularizou a situação com entrega de declarações de substituição e, por isso não deu lugar nem à emissão de um relatório de inspecção nem das consequentes liquidações.

Da mesma informação resultou ainda uma proposta: a emissão de Ordens de Serviço para inspecção tributária aos exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006 (.....) e 2007(.....).

Ambas tiveram início em 13-07-2007 e vieram originar a elaboração dos respectivos Relatórios de Inspecção. Foram enviadas as respectivas cartas aviso, como determina o RCPIT, pois tratavam-se de acções externas (artº 49).

Daí entende o impugnante que houve violação do artº 63° do RCPIT, uma vez que a inspecção ao abrigo do despacho n° ..... e da Ordem de Serviço n° ..... abrangeram os mesmos anos e incidiram sobre os mesmos impostos.

Atente-se ao disposto no artº 63° da LGT que, versando sobre a "Inspecção", estabelece que os órgãos competentes podem, nos termos da lei, desenvolver todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes, (...) (nº 1), precisando que o procedimento da inspecção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objectivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalizacão (sublinhado nosso) respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspecção ou inspecções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas (n°3).

Decorre deste preceito legal que apenas para os casos de um novo procedimento externo, a lei exige um despacho especialmente qualificado do ponto de vista da sua fundamentação, tendo em vista garantir ao contribuinte não poder ser inspecionado diversas vezes quanto aos mesmos factos tributários já existentes à data da 1ª inspecção realizada, bem como, ao mesmo tempo, contribuir para a estabilização das relações jurídico-tributárias.

Manifestamente não foi o que ocorreu in casu em que o despacho ....., destinava-se a consulta recolha e cruzamento de elementos e daí não ter exigências formais, por exemplo a notificação prévia.

Note-se que não houve lugar neste procedimento ao cumprimento do disposto nos art.ºs 46.º (credenciação dos funcionários intervenientes), 49.º (notificação do início do procedimento), artº 50° (Notificação prévia) e 51º (Data do Inicio do procedimento de inspecção) do mesmo RCPIT, e nem teria de haver, por se não tratar de um procedimento externo.

Não podemos, pois, qualificar o procedimento ao abrigo deste despacho como tratando­ se de uma inspecção externa, não tendo ocorrido qualquer violação do artº 63° n° 3 do RCPIT.

E, ao invés no procedimento ao abrigo da Ordem de serviço n° ....., que abrangeu os anos de 2003, 2004, 2005 e 2006 foram cumpridas as especificidades que a lei elenca para o procedimento de inspecção externa.

Improcede o fundamento invocado pelo impugnante quanto ao procedimento de inspecção.»

Vejamos.

Conforme alíneas B), C), D) e E) do probatório, em 22/03/2007 foi emitida pela DSIT uma proposta para emissão de despachos com vista à recolha de elementos em diversos sujeitos passivos no sector das farmácias da RAM. Nessa sequência, foi exarado o Despacho nº ....., cujo conteúdo o impugnante tomou conhecimento e assinou. A referida recolha de elementos respeitava aos exercícios de 2003, 2004 e 2005, que teve o seu início em 16/04/2007 e conclusão em 22/06/2007, conforme Nota de Diligência (Art. 61º do RCPIT) junta aos autos, a fls. 470.

Da informação emitida ao abrigo do Despacho nº ....., referida na alínea F) do probatório, consta que foi verificado a existência de margens brutas inferiores ao praticado para o sector e, por amostragem foram determinadas e apurou-se o custo das mercadorias vendidas e cada uma das taxas. Em consequência da correcção efectuada quanto à margem bruta os valores de IVA foram corrigidos.

O impugnante regularizou voluntariamente a situação descrita, conforme alínea G) do probatório.

Na informação, supra referida, propõe-se a Emissão de Ordem de Serviço Externa para os exercícios de 2003, 2004, 2005, 2006 e 2007, «de forma a dar seguimento a um Projecto de Correcções por deduções indevidas de IVA mencionado em regularização de vendas.»

E, conforme alínea H) do probatório, foi proferido despacho de concordância para a emissão da Ordem de Serviço, pelo que em 13/07/2007 foi remetida Carta Aviso ao impugnante, ao abrigo da Ordem de Serviço nº ....., com incidência aos exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006, em IRS e IVA, cfr. alínea I) do probatório.

Invoca o recorrente que o Despacho nº .....e a Ordem de Serviço nº ..... são ambos procedimentos de inspecção externa e que são coincidentes no sujeito passivo, imposto e períodos de tributação (2003 a 2005), pelo que o segundo procedimento é ilegal, por violar expressamente o art.63º, nº 3, da LGT.

Ora, a referida norma dispunha (redacção à data) que:

«O procedimento da inspecção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objectivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspecção ou inspecções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas.»

Na resolução desta questão faremos apelo ao decidido no Acórdão deste TCAS de 14/04/2015, Proc. 05674/12, disponível em www.dgsi.pt, em que se discutia questão semelhante, por concordarmos inteiramente com os seus fundamentos, e onde, a agora Relatora foi 1ª Adjunta, tendo-se escrito o seguinte:

«4.2. Posto isto, enfrentemos, agora, as demais questões colocadas: errou o Tribunal a quo ao ter julgado legalmente inadmissível a realização de dois procedimentos externos que visem a mesma entidade quando num deles a Administração Tributária não tome qualquer posição sobre a situação tributária daquela e ao concluir que a inexistência de despacho autorizador do segundo procedimento inspectivo com fundamento em factos novos afecta a validade da liquidação de imposto (conclusões V e VI)?

A apreciação desta questão impõe, antes de mais, que tracemos o quadro jurídico em que esse conhecimento se deve mover e a nossa decisão necessariamente haverá de assentar.

Nesse sentido, comecemos por relevar a própria definição que o legislador nos dá de procedimento tributário, plasmada no artigo 54° n.º 1 da LGT: «O procedimento tributário compreende toda a sucessão de actos dirigida à declarado de direitos tributário», aí se compreendendo, designadamente, as acções preparatórias ou complementares de informação e fiscalização tributária (al. a) do referido preceito)

Procedimento e exercício de direitos esses que, sem prejuízo do disposto naquela lei (LGT), constará do diploma regulamentar próprio, conforme previsão e remissão efectuado no n.º 6 do mesmo artigo e diploma e que deve ser entendida como sendo feita para o Decreto-Lei n.°413/98, de 31/12.

Nesse diploma surge, desde logo no seu artigo 1.º, os princípios e regras aplicáveis aos actos de inspecção, sendo de salientar, atenta a matéria em discussão nos autos, o princípio da proporcionalidade, nos termos do qual as acções integradas no procedimento de inspecção tributária devem ser adequadas e proporcionais aos objectivos de inspecção tributária (vide, ainda, artigos 5.º e 7.º do mesmo diploma) e no seu artigo 2.º, os objectivos visados com os mesmos procedimentos o procedimento de inspecção tributária visa a observação das realidades tributárias, a verificação do cumprimento das obrigações tributárias e a prevenção das infracções tributárias.

Por sua vez, no n°4 do artigo 63° da LGT, o legislador, para além de reiterar que o procedimento de inspecção e os deveres de colaboração tem se ser os adequados e proporcionais aos objectivos a prosseguir, determina que só pode haver lugar a mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspecção ou inspecções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas.

Conforme resulta do art. 13º, alínea b) do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária e Aduaneira (RCPIT), o procedimento pode qualificar-se como externo quando os actos de inspecção se efectuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso.

O mesmo resulta do disposto no n.°1 do artigo 34.° do RCPIT, nos termos do qual «quando o procedimento de inspeção envolver a verificação de contabilidade, livros de escrituração ou outros elementos relacionados com a actividade da entidade a inspecionar, os atos de inspeção realizam-se nas instalações ou dependências onde estejam ou devam legalmente estar localizados os elementos».

No que tange em especial à recolha de elementos, o artigo 56.° n.°1 do RCPIT expressa que as fotocópias e extractos serão efectuados nas instalações ou dependências onde se encontram os livros.

Acresce que, em conformidade com o artigo 51.º n.° 2 do RCPIT, «o sujeito passivo ou obrigado tributário ou o seu representante deve assinar a ordem de serviço indicando a data da notificação, a qual, para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspeção», do qual também se conclui que o procedimento inspetivo destinado à consulta, recolha e cruzamento de informação constitui um procedimento externo.

Por último, importa salientar que o artigo 46.º n.º 7 do RCPIT que «as ações de inspeção que visem a mera consulta, recolha e cruzamento de elementos junto do sujeito passivo, de qualquer área territorial, com quem o sujeito passivo inspecionado mantenha relações económicas são efetuadas mediante entrega, por parte do funcionário da nota de diligência que indica a tarefa executada.». O que significa que, nos procedimentos inspectivos que visam a consulta, recolha e cruzamento de informação, não há lugar à elaboração de relatório dirigido ao contribuinte visado.

Em suma, face ao preceituado no Regulamento a que vimos fazendo referência, o procedimento de inspecção tanto pode ter em vista a averiguação da situação tributária do sujeito passivo e, sendo caso disso, alterar os elementos declarados, como a mera recolha de elementos. Porém, se tais fins implicarem a análise da contabilidade ou elementos desta, o procedimento corre nas instalações de contribuinte inspeccionado ou no local onde tais elementos se devam encontrar, ou seja, em tais situações o procedimento é, necessariamente, externo.

Ora, estando provado nos autos que quanto ao exercício de 2001 e relativamente à Recorrida decorreram dos procedimentos inspectivos, um, a coberto do Despacho 2005 01296, datado de 07/06/2005 e notificado à impugnante em 13/06/2005, destinado à consulta, recolha e cruzamento de elementos; outra, a coberto da Ordem de Serviço n.° …………………, datada de 13/09/2005 e notificado à impugnante em 14/09/2005, do qual resultaram as correcções agora em análise, e que ambos decorreram nas instalações da impugnante, forçoso é concluir que ambos os procedimentos se devem qualificar como externos, não pode senão concluir-se pela ilegalidade do procedimento.

A esta conclusão não obsta, como bem se disse na sentença recorrida, o facto de os objectivos visados serem distintos uma vez que a restrição prevista no n.° 4 do artigo 63.° da LGT, é estabelecida em função, não do tipo ou fim do procedimento, mas sim do local onde o mesmo deva ocorrer: a lei visa impedir os incómodos que as fiscalizações externas são susceptíveis de provocar ao sujeito passivo inspeccionado, assegurando, por essa via, a adequação e proporcionalidade entre tais incómodos e os fins que a inspecção visa prosseguir.

Note-se, aliás, que para precaver situações limite ou de absoluta necessidade da ocorrência de duas inspecções externas relativamente ao mesmo ano, tributo e sujeito, por terem entretanto surgido novos factos relevantes para o âmbito e objectivo da inspecção/fiscalização, o legislador admitiu como possível que esse novo procedimento ocorra desde que a Administração Tributária emita despacho fundamento descriminando essa situação, isto é, emita um despacho fundamentado em factos novos.

Despacho esse que não foi proferido no caso concreto, pelo menos tal se não mostra comprovado, nem, de resto, se descortina qualquer referência à sua existência nos articulados dos autos, incluindo aqui as alegações de recurso.

E não diga a Recorrente, como o faz neste recurso, e em último recurso, que de todo o modo, mesmo a verificar-se esta ilegalidade, nunca a consequência da mesma deve ser a declaração de ilegalidade do procedimento por num desses procedimentos a Administração Tributária não ter tomado posição “sobre a situação tributária da entidade visada”, situação em que deveria aqui aplicar-se o principio do aproveitamento do acto.

Ou seja, e se bem entendemos nesta parte a conclusão de recurso, a Recorrente, admitindo agora que a entidade visada nos dois procedimentos foi a mesma, in casu, a Impugnante, pretende que a ilegalidade reconhecida seja deteriorada em mera irregularidade alegando que apenas foi proferida decisão num desses procedimentos.

Discordámos deste fundamento por duas ordens de razão.

A primeira, é a de que o princípio do aproveitamento do acto – que, como sabemos, ainda que não tenha expressão legal no nosso ordenamento jurídico mas tem vindo a ser acolhido, hoje pacificamente, na nossa doutrina e jurisprudências enquanto meio de reforçar a eficácia da actividade administrativa na prossecução do interesse público (1) - se aplica apenas às situações em que a actuação da administração é vinculada, o que não é o caso (para além de que se trata de “aproveitar” um acto não obstante o vício que lhe é próprio, no caso do próprio procedimento, e não decorrente de actos/procedimentos terceiros, como é ocorrer na situação de que nos ocupámos).

A segunda é a de que, a adopção desse entendimento não só conduziria a esvaziar de qualquer sentido útil a proibição estabelecida no artigo 64.º n.º 4 da LGT, como também legitimaria que a Administração Fiscal realizasse, sem qualquer fundamento, de forma repetida, relativamente ao mesmo sujeito e quanto aos mesmos tributos, os procedimentos inspectivos que bem entendesse, sem sequer se preocupar neles em observar quaisquer regras, designadamente os prazos processuais que imperativamente se encontram fixados para a prática dos actos que ao longo do procedimento são realizados, por lhe bastar, a final, independentemente da fase do procedimento em que se encontre, alcançar a qualificação de “ilegalidade irrelevante” pela qual aqui pugna, “não tomar posição expressa sobre a situação tributária da visada”.

O que, naturalmente, é inaceitável, quer do ponto de vista dos princípios e valores jurídicos subjacentes ao ordenamento jurídico tributário, em especial dos que regulam o procedimento inspectivo, quer os próprios direitos e garantias que no Código de Procedimento e de Processo Tributário e na nossa Lei Fundamental são reconhecidos aos contribuintes, recordando-se que, nos termos do artigo 266.º da CRP, toda a actividade da Administração Tributária, embora directamente direccionada para a realização do interesse público (em primeira linha, o da obtenção de receita), deve pautar-se pela subordinação e respeito à Lei e à Constituição, isto é, respeitar os direitos e interesses legítimos dos cidadãos (princípio da legalidade), da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da boa fé que, salvo o devido respeito, a assumpção por este Tribunal pela tese defendida pela Recorrente, violaria.»

Retornando ao caso em apreço, tal como invoca o recorrente os procedimentos de inspecção ao abrigo do Despacho N°..... e ao abrigo da Ordem de serviço n°....., foram ambos procedimentos de inspecção externa.

Aliás, tal facto não é controvertido, uma vez que é reconhecido pela Fazenda Pública na sua contestação, onde no art. 4º, escreveu o seguinte:

«Assim, munido do competente despacho (.....) dirigiu-se o técnico às instalações da “Farmácia .....” através da qual o ora impugnante exerce a sua actividade (…)»

Aliás, sempre a tal conclusão se teria de chegar pelo que escreveu o Inspector Tributário na Informação, referida nas alíneas F) e Z) do probatório, quanto à metodologia seguida na referida acção de inspecção, e que mostra bem que não se trata de elementos que estivessem, simplesmente, à disposição da AT e que pudessem ser apreciados fora das instalações do sujeito passivo.

Aqui chegados, e estando provado nos autos que quanto aos exercícios de 2003, 2004 e 2005, e relativamente à Recorrente decorreram dois procedimentos inspectivos, um, a coberto do Despacho N°....., destinado à consulta, recolha e cruzamento de informações; outra, a coberto da Ordem de serviço n°....., do qual resultaram as correcções agora em análise, e que ambos decorreram nas instalações do impugnante, forçoso é concluir que ambos os procedimentos se devem qualificar como externos, não pode senão concluir-se pela ilegalidade do procedimento.

A esta conclusão não obsta o facto de os objectivos visados serem distintos uma vez que a restrição prevista no n.° 4 do artigo 63.° da LGT, é estabelecida em função, não do tipo ou fim do procedimento, mas sim do local onde o mesmo deva ocorrer: a lei visa impedir os incómodos que as fiscalizações externas são susceptíveis de provocar ao sujeito passivo inspeccionado, assegurando, por essa via, a adequação e proporcionalidade entre tais incómodos e os fins que a inspecção visa prosseguir.

Mas mais, caso houvesse absoluta necessidade da ocorrência de duas inspecções externas relativamente aos mesmos anos, tributo e sujeito, por terem entretanto surgido novos factos relevantes para o âmbito e objectivo da inspecção/fiscalização, o legislador admitiu como possível que esse novo procedimento ocorra desde que a Administração Tributária emita despacho fundamento descriminando essa situação, isto é, emita um despacho fundamentado em factos novos.

Ora, no caso em apreço, nos autos não se descortina rasto desse despacho, nem tal foi invocado, pelo que temos de concluir pela sua inexistência.

Pelo que se conclui que o procedimento de inspecção ao abrigo da Ordem de Serviço nº ..... foi realizado de forma ilegal, com a consequente ilegalidade dos consequentes actos que absorvem essa mesma ilegalidade e nenhum efeito em relação aos ora impugnantes com respeito aos exercícios de 2003, 2004 e 2005.

Pelo que a sentença recorrida, quanto a esta matéria, fez uma incorrecta interpretação e aplicação do nº 3 do art. 63º da LGT, pelo que terá de ser revogada neste segmento.

Alega, ainda, a recorrente que a sentença recorrida fez ainda incorrecta interpretação e aplicação das normas sobre a repartição do ónus da prova, ao manter correcções à matéria colectável com base em pressupostos de exercícios diferentes, designadamente correcções do ano de 2006 baseadas em supostas anulações indevidas alegadamente verificadas com respeito ao exercício de 2007, e consequentemente, ao não julgar ilegais as consequentes liquidações por erro sobre os pressupostos de facto e de direito. [conclusão de recurso I)]

Vejamos.

«A A. Fiscal no exercício da sua competência de fiscalização da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei, actua no uso de poderes estritamente vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabendo-lhe o ónus de prova da existência de todos os pressupostos do acto de liquidação adicional. Mais deve chamar-se à colação que a Administração Fiscal, no âmbito do procedimento tributário, está sujeita ao princípio do inquisitório (cfr.artº.58, da L.G.T.), o qual é um corolário do dever de imparcialidade que deve nortear a sua actuação. Este dever de imparcialidade reclama que a Fazenda Pública procure trazer ao procedimento todas as provas relativas à situação fáctica em que vai assentar a decisão, mesmo que elas tenham em vista demonstrar factos cuja revelação seja contrária aos interesses patrimoniais da Administração. Mais se deve realçar que o órgão instrutor pode utilizar, para conhecimento dos factos necessários à decisão do procedimento, todos os meios de prova admitidos em direito (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; artº.72, da L.G.T.).»(1)

O recorrente vem alegar que a sentença recorrida fez ainda incorrecta interpretação e aplicação das normas sobre a repartição do ónus da prova, ao manter correcções à matéria colectável com base em pressupostos de exercícios diferentes, designadamente correcções do ano de 2006 baseadas em supostas anulações indevidas alegadamente verificadas com respeito ao exercício de 2007.

Na realidade, no RIT a que respeita a Ordem de Serviço nº ..... pode ler-se no Capítulo III – DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL, o seguinte:

«No decorrer da acção inspectiva foram detectadas as seguintes situações:

I - Anulações indevidas de vendas

Através de uma análise às declarações de IVA, constatou-se que o contribuinte apresentava consecutivamente no campo 40, regularizações a seu favor, com alguma materialidade. Estes valores originavam na sua maior parte, declarações de IVA com crédito de imposto. Uma vez solicitado um esclarecimento sobre tal facto, o contribuinte alegou tratarem-se de regularizações afectas a vendas a clientes habituais da farmácia, apresentando também extractos contabilísticos que as evidenciavam.

Ao consultar o mapa recapitulativo do dia 28 de Março de 2007 (doc. 1), juntamente com a sua contabilização, verificámos os seguintes factos:

(…)

Como podemos verificar no quadro supra, a emissão dos talões não é considerado para efeitos contabilísticos, contudo as anulações dos mesmos, dá origem a um lançamento de regularização e consequente anulação de vendas, conforme quadro seguinte referente ao dia 31 de Março de 2007 (doc.2), onde verificamos o seguinte:

(…)

Como podemos verificar neste quadro, os talões que não foram contabilizados durante a sua emissão, são tratados contabilisticamente na sua anulação.

A contabilização destas regularizações tem vindo a constituir desde 2003 até 2006, omissões/inexactidões na contabilidade e consequentemente nos valores apresentados nas declarações de rendimentos do contribuinte, representando uma infracção a nº 1 do art. 57º do C.I.R.S.. Destes factos, resultam também a falta de entrega de IVA ao Estado, infracção ao nº 1 do artigo 26º e artigo 40º do C.I.V.A..

Sendo assim, foram apurados os valores facturados por exercício, que posteriormente foram indevidamente anulados e consequentes regularizações de IVA, conforme quadros abaixo:

(…)»

Em face do transcrito do RIT, nesta alegação, temos de dar razão ao recorrente.

É que a AT fundamentou as correcções meramente aritméticas à matéria tributável dos exercícios de 2003 a 2006 (sendo só este último exercício o que interessa para a situação concreta) tendo em consideração documentação relativa ao exercício de 2007 [o mapa recapitulativo do dia 28 de Março de 2007 (doc. 1) e quadro seguinte referente ao dia 31 de Março de 2007 (doc.2).

Ora, estando nós perante um método directo de determinação do imposto devido – correcções meramente aritméticas -, deveria ter sido usado um método directo de avaliação.

Assim, as correcções à matéria colectável com base em pressupostos de exercícios diferentes, designadamente, correcções do ano de 2006 baseadas em anulações indevidas alegadamente verificadas com respeito ao exercício de 2007, não se podem manter, pelo que forçoso é concluir pela anulação da liquidação respeitante ao exercício de 2006.

Aqui chegados, mantém-se a liquidação respeitante a IVA do exercício de 2007, efectuada na sequência do RIT realizado em 28/11/2007, em cumprimento da Ordem de Serviço nº ....., conforme alíneas P), Q) e R) do probatório.

Alega o recorrente que a sentença recorrida não considerou ou apreciou acriticamente a prova documental produzida em sede de audiência, da qual não resulta ter havido incumprimento das normas fiscais, designadamente, as supostas anulações alegadamente indevidas por parte do recorrente [conclusão de recurso K].

Não se concorda com esta alegação do recorrente.

O Tribunal a quo apreciou devidamente a prova documental e testemunhal produzida.

O facto de a decisão não ter ido ao encontro da pretensão do recorrente não significa que a prova não tenha sido criticamente apreciada, o que, aliás, fica demonstrado ao longo da sentença recorrida, e com especial incidência na motivação.

«Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).» (2)

Termos em que improcede esta alegação.

Vem, ainda, o recorrente invocar a questão da culpa como pressuposto da responsabilidade por juros compensatórios em violação do disposto nos artigos 96º do CIVA e 35º da LGT e ainda invocar que a decisão recorrida é contraditória com a sua fundamentação em matéria de responsabilidade por juros compensatórios.

Mas não tem razão.

Na sentença recorrida fez-se uma correcta interpretação da questão tendo-se considerado que se encontravam verificados os requisitos previstos nos artigos 35º da LGT e 89º do CIVA, pelo que são devidos os juros compensatórios liquidados pela AT, uma vez que julgou ser de formular um juízo de censura à actuação do impugnante.

Não se compreende em que medida o facto de se apoiar num parecer exterior aos autos é merecedor de censura, uma vez que é prática corrente nos Tribunais.

Termos em que improcede a presente alegação.

Por último, invoca o recorrente o vício de forma de falta de fundamentação, por considerar que a mesma não é clara, congruente e suficiente.

Mais uma vez não concordamos com a alegação do recorrente.

«A nossa conclusão de existência de fundamentação tem em consideração o seguinte quadro legal:
O artº 268º, nº 3 da Constituição da República dispõe que os actos administrativos carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos.
O artigo 77.º/1 da LGT determina que a fundamentação deve consistir, no mínimo, numa sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão, ou numa de declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas.
Por força do n.º 2 do mesmo artigo a fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.
O art. 125.º/1 do CPA, determina a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso, parte integrante do respectivo acto, equivalendo à falta de fundamentação a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do acto.

Ora, é sabido que a consagração constitucional deste dever de fundamentação expressa, integrado nas chamadas garantias dos administrados, tem em vista assegurar a quem seja afectado nos seus direitos ou interesses, o direito de conhecer as razões que terão determinado a adopção da decisão administrativa que lhe diz respeito.

A jurisprudência e a doutrina têm consagrado o entendimento de que um acto se encontra suficientemente fundamentado quando dele é possível extrair qual o percurso cognoscitivo seguido pelo agente para a sua prática. (Ver neste sentido, desde logo o acórdão deste STA de 23/05/2012 tirado no recurso 0870/11, no qual o ora relator interveio como adjunto e ainda os acórdãos 01.04.1992, AD de 22.02.1995, pag. 590, de 28.5.87, in AD 315, 367, de 12.02.87, in AD 317, 581, de 11.05.89, in AD 335, 1398, de 19.05.88 in Ad 325, 38, de 25.10.88, in AD 327, 37, e de 10.01.1989, in AD 339, 303, todos citados no Código de Procedimento Administrativo, anotado e comentado, de José Manuel Botelho, Pires Esteves e José Cândido de Pinho, 2ª edição, pags. 396 e segs.)

Acresce dizer, na senda do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11.12.2007, recurso 615/04, in www.dgsi.pt «que o grau de fundamentação há-de ser o adequado ao tipo concreto do acto e das circunstâncias em que o mesmo foi praticado, de molde a satisfazer a divergência existente entre a posição da Administração Fiscal e a do contribuinte».

E, o vício da falta de fundamentação dos actos administrativos, como vem sendo salientado pela doutrina e pela jurisprudência, é de natureza formal e não substancial, enfermando o acto de falta ou insuficiência de fundamentação quando não externa de modo claro, suficiente e congruente, as razões de facto e de direito que o determinaram e o seu sentido decisório.» (3)

Em sede de conclusões de recurso, o recorrente não se alonga sobre o invocado vício de forma, limitando-se a dizer que a fundamentação dos actos tributários não é clara, congruente e suficiente.

Ora, entendemos que a mesma é suficiente, e que o acto tributário em causa está fundamentado, tanto assim, que o impugnante bem o entendeu, e não teve qualquer dificuldade em o impugnar.

Termos em que improcede a presente alegação.

Face ao supra exposto, julgamos parcialmente procedente o presente recurso, revogando parcialmente a sentença recorrida, e julgando parcialmente procedente a impugnação, e consequentemente, anulando as liquidações de IVA dos exercícios de 2003 a 2006 e respectivos juros compensatórios, mantendo-se a sentença quanto ao mais, o que se determinará no dispositivo.


***


III - DECISÃO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em julgar parcialmente procedente o presente recurso, revogar parcialmente a sentença recorrida, e julgar parcialmente procedente a impugnação, e consequentemente:

- anular as liquidações de IVA dos exercícios de 2003, 2004, 2005 e 2006 e respectivos juros compensatórios;

- mantendo-se a sentença quanto ao mais.

Custas pelas partes, na proporção do decaimento.

Registe e Notifique.
Lisboa, 8 de Julho de 2021

[O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Desembargadoras Maria Cardoso e Catarina Almeida e Sousa]

_______________________
(1) Acórdão do TCAS de 13/03/2014, Proc.07216/13, disponível em www.dgsi.pt
(2) Acórdão do TCAS de 25/06/2019, Proc. 2459/14.0BESNT, disponível em www.dgsi.pt
(3) Acórdão do STA de 14/10/2015, Proc. 01784/13, disponível em www.dgsi.pt